SÃO LUÍS 400 ANOS: UM PLANO DIRETOR PARA A CULTURA DA CIDADE

 

por Joãozinho Ribeiro (*)

 

Um Município precisa de um Plano Diretor para a Cultura? O que significa isto?

Continuidade administrativa é um dos pilares da edificação de um Plano Diretor para qualquer projeto decente de desenvolvimento de uma cidade, que não se confunde necessariamente com a perpetuação dos seus administradores, nem com a mania de quase todo governante de dividir a história da cidade em “antes e depois de mim”. Em função deste tipo de raciocínio, inúmeros projetos culturais permanecem inacabados e os produtores culturais submetidos a uma crônica e cruel instabilidade, que dificulta o planejamento e a realização de investimentos a médio e longo prazo. Não se trata aqui só dos planos diretores a que fazem referência as leis orgânicas dos municípios, mas dos objetivos estratégicos, dos macros-objetivos da cidade em termos de cultura que transcendem esta ou aquela administração e os mecanismos que incorporem  a população para atingi-los como protagonista das ações culturais. O ponto fundamental é que estes objetivos possam ser traduzidos em metas quantificáveis, programas ou projetos objetivos. Plano Diretor não pode ser filosofia do governo, mas a expressão prática dessa filosofia. Um Plano Diretor para a Cultura não deve ser documento tecnocrático, distante dos centros decisórios reais da cidade, mas um projeto capaz de promover coesão e mobilizar a cidade em sua direção. São Luís precisa de um Plano Diretor para a Cultura?

Entendemos que sim, assim como também é o entendimento contido na Agenda 21 da Cultura para as Cidades, aprovada em maio de 2004, no Fórum Universal das Culturas, de Barcelona, da qual reproduzimos os seguintes compromissos assumidos pelas centenas de autoridades locais presentes:

 

  1. COMPROMISSOS

(…)

  1. Promover a implementação de formas de “avaliação do impacto cultural” para considerar, com caráter preceptivo, as iniciativas públicas ou privadas que impliquem alterações significativas na vida cultural das cidades.
  2. Considerar os parâmetros culturais na gestão urbanística e em toda a planificação territorial e urbana, estabelecendo as leis, normas e os regulamentos necessários que assegurem a proteção do patrimônio cultural local e a herança das gerações antecessoras.

(…)

  1. Implementar ações que tenham como objetivo a descentralização das políticas e dos recursos destinados à área cultural, legitimando a originalidade criativa das chamadas periferias, favorecendo os setores sociais vulneráveis, defendendo o princípio do direito à cultura e ao conhecimento de todos os cidadãos sem discriminações de nenhum tipo. Esta determinação não deverá passar por alto as responsabilidades centrais e, particularmente, as que referem ao necessário financiamento que todos os projetos de descentralização exigem.

O que não podemos entender, e até nos causa espanto, é a pauta de discussões da II Conferência Municipal das Cidades – evento realizado no auditório do Hotel Abevville durante os dias 4, 5 e 6 de julho, promovido pela Prefeitura de São Luís – não ter contemplado este tema, justamente no momento em que se discute a atualização do Plano Diretor da cidade.

Felizmente, a coordenação do evento, diga-se de passagem bastante solícita, concedeu-nos um tempo para uma intervenção, momento em que fizemos a seguinte colocação:

 

“Entendemos que elaborar um Plano Diretor para uma cidade é, antes de tudo, sonhá-la. E, como é possível se sonhar uma cidade como São Luís – Patrimônio Cultural da Humanidade – sem ouvir os seus artistas e poetas? Como pode não estar reservado, nestas rodadas de discussões, um capítulo dedicado à cultura. A cidade histórica de Recife, também Patrimônio da Humanidade, que sempre costumamos tomar como referência, recentemente atualizou o seu Plano Diretor; e lá, um capítulo generoso e decente foi dedicado à Cultura”.

 

Só então os representantes do Poder Público reconheceram o grande equívoco, e pediram à platéia presente as necessárias desculpas pelo grave esquecimento.

Talvez por causa de esquecimentos como esse é que Olinda abocanhou o importante título de “Capital Brasileira da Cultura – 2006”, na última 5ª feira (30/6); pois teve o mérito de apresentar um respeitável programa de atividades culturais para o ano respectivo. Como cidade eleita terá, entre outras vantagens, projeção como referência da cultura nacional, restauro do patrimônio histórico e atração de investimentos privados.

O presidente das organizações Capital Americana da Cultura e da Capital Brasileira da Cultura, Xavier Tudela aproveitou a oportunidade para afirmar na cerimônia de entrega do prêmio: “Olinda Capital Brasileira da Cultura 2006 é um marco que representa a vontade do povo brasileiro em querer mostrar ao mundo a sua imensa riqueza cultural e visa valorizar a identidade cultural de cada país e utilizar a cultura como instrumento de transformação social. O Brasil foi escolhido para ser o primeiro país do continente americano a ter a sua própria capital nacional da cultura pelo seu enorme potencial e diversidade cultural”.

Esperamos que na próxima edição deste cobiçado prêmio nossa querida cidade concorra com todo o potencial que brota da sua diversificada e rica produção cultural. Para tanto, de uma vez por todas, é preciso acabar com tantos adiamentos e discutir uma política pública de cultura para o Município, pois quanto mais adiamento se fizer, mais aumentará o passivo cultural.

A cidade precisa ouvir seus poetas, seus escritores, pesquisadores, produtores e agentes culturais em geral; pois todos têm grandes contribuições para dar à atual administração do Prefeito Tadeu Palácio. O que não pode mais se perpetuar é essa “operação avestruz” na Cultura da cidade.

Queremos discutir o Plano Diretor, queremos participar democraticamente da elaboração de uma política municipal de cultura, como já se encontra previsto na Lei Orgânica do Município (parágrafo único, do art. 156); queremos ver implantado o Sistema Municipal de Cultura, sintonizado com o Sistema Nacional, que está sendo implantado em todo o país pelo Ministério da Cultura; fato que permitirá compartilhar, dentre outros benefícios:

  1. a) o fortalecimento dos sistemas de financiamento específicos da cultura, nas suas respectivas esferas administrativas;
  2. b) a integração e otimização dos recursos financeiros destinados às políticas culturais;
  3. c) a implantação de sistemas setoriais das diversas áreas da cultura – bibliotecas, museus, centros culturais, artes em geral, patrimônio cultural, entre outras – com participação e controle social;
  4. d) a implantação e disponibilização democrática do Sistema Nacional de Informações Culturais, constituído de banco de dados sobre bens, serviços, programas e instituições de natureza cultural;
  5. e) a implementação integrada de programas e projetos de capacitação e aprimoramento de setores e instituições culturais específicos;
  6. f) a cooperação técnica para a realização de planejamento estratégico, no âmbito do Sistema nacional de Cultura;
  7. g) a articulação com as diversas redes/setores da cultura brasileira;
  8. h) a facilitação de fluxos de projetos culturais em circuitos nacionais.

 

No breve espaço que nos foi concedido pelos organizadores da II Conferência Municipal das Cidades, também aproveitamos para divulgar a instalação do Fórum Cultura Cidadã, que já está discutindo democraticamente nas comunidades a preparação da I Conferência Municipal de Cultura, e solicitamos a aprovação de uma moção de apoio à realização deste evento.

No momento, aguardamos o sinal positivo do Prefeito Tadeu Palácio a um pedido de audiência que lhe foi oficialmente solicitada (protocolado no dia 28/6) para podermos, em parceria com a Prefeitura, agilizar as ações para realizarmos, até o mês de setembro, a I Conferência Municipal de Cultura da Cidade de São Luís.

 

(*) poeta/compositor, integrante da Coordenação do Fórum Cultura Cidadã

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