De como Roseana Sarney gosta de preto e de índio

Só assim Roseana Sarney quer saber de preto e índio
Este blogue recebe com alegria a notícia do título de patrimônio cultural imaterial brasileiro dado ao complexo cultural do bumba meu boi, ontem (30), em Brasília/DF (o que já havia acontecido anos antes com o tambor de crioula).

Roseana Sarney não perde a pose e a oportunidade e aproveita para “sambar” com diversos personagens de uma de nossas mais destacadas manifestações culturais, outrora alvo de perseguição policial e da elite branca e endinheirada.

Aí é bonito posar ao lado de preto e de índio, os grandes estorvos ao “desenvolvimento” patrocinado pelos governos estadual e federal. Indígenas, quilombolas e sem-terra estão, mais uma vez, acampados na sede do Incra, em São Luís. A governadora nunca se dignou a pisar por lá, nem em junho nem agora, com as mesmas sandálias que valsam toadas.

Roseana Sarney não é índia, não é Catirina e duvido mesmo que levasse algum prêmio na Dança dos Famosos do Domingão do Faustão, devendo ser reconhecida como dançarina apenas por seus fieis bajuladores de plantão. “Como dança a governadora!”, devem suspirar emocionados ao vê-la arriscar um passo ou outro para posar para a mídia que lhe serve e lhe ajuda a sustentar a pose.

A governadora é, ao contrário, a dona da fazenda, a dona do mar, aquela que nega a língua e outros nacos do boi a índias, índios, Catirinas, Pais Franciscos, quilombolas, sem-terra e maranhenses outros, famintos e sedentos de justiça e paz, no campo e na cidade.

Para uma grande dama

Os olhos verdes
da atriz pornô

quando dançam fora de órbita
disparam no céu incolor

lampejos
de uma arte rara

flashbacks
de tragédia grega
e teatro nô

sacerdotisa fast-food
a preferida do imperador

Os olhos verdes
da atriz pornô

são duros como
os olhos da virgem

não cabem
no discurso marginal

sua obra é sua moral:
pura vertigem

Os olhos verdes
da atriz pornô

anulam toda teoria
longe das luzes & ohos vorazes
despem as lentes verdes de contato
e encaram nus a luz do dia.

*

Poema de Fernando Abreu, de seu novo livro, aliado involuntário [Exodus, 2011]. O poema virou música, pelas mãos de Nosly, com quem o poeta divide o palco em Letra & Música, espetáculo poético-musical-plástico com as participações especiais de Lúcia Santos e Fernando Mendonça, que inaugura, na ocasião, a exposição Cuidado, flores!, além de dar uma canja no palco, ele que já assinou projeto gráfico de disco de Nosly (Nave dos sonhos) e, músico bissexto, já musicou coisas de Fabreu. Detalhes no Overmundo e/ou no cartaz abaixo:

Em tempo: o poema que batiza este post não está em Parador, disco novo de Nosly, que traz outra parceria da dupla: Você vai me procurar.

Em tempo 2: ainda escreverei acá sobre aliado involuntário e Parador. Questão de tempo.

Secma: s de silêncio

Mesmo contra a vontade da Secretaria de Estado da Cultura, sociedade civil tem se mobilizado para participar dos Fóruns Regionais de Cultura, etapas prévias ao Fórum Estadual

Numa clara tentativa de desmobilizar e desarticular a participação da sociedade civil, a Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão (Secma) pouco tem divulgado a realização de Fóruns Regionais de Cultura como etapas preparatórias à realização do Fórum Estadual de Cultura, previsto para os próximos dias 20 e 21 de setembro, em São Luís, ocasião em que será eleito o Conselho Estadual de Cultura (Consec).

Três fóruns regionais já aconteceram: em Balsas, dia 9 de agosto, em Buriticupu, dia 11, e em Itapecuru, dia 23 – lá, para se ter uma ideia, apenas três pessoas da sociedade civil da cidade anfitriã participaram, tendo São Luís a maior delegação, com 20 representantes, esforço explicado pela atriz, gestora e produtora cultural Elizandra Rocha: “A participação tem sido importante para derrubarmos as tentativas de manipulação na eleição do Consec. Em Itapecuru conseguimos derrubar algumas propostas no regimento”, afirma. Entre elas, a manutenção de privilégios ao ex-presidente do Consec: ele, conforme o regimento, membro da Comissão Eleitoral Estadual, poderia ser votado para o cargo de conselheiro e/ou delegado.

A capital São Luís, que concentra o maior número de agentes culturais no Maranhão, por exemplo, não contou, no calendário e geografia da Secma, com a realização de uma etapa prévia à estadual. Hoje (25) acontece a edição de Codó. Além de pouco divulgados, os fóruns foram ainda reduzidos: em vez dos cinco originalmente anunciados nesta notícia publicada pela assessoria de comunicação da Secma – numa das raras que encontramos “dando um Google” no assunto –, acontecerão apenas quatro fóruns regionais prévios ao estadual. O de hoje junta as mesorregiões Leste e Centro do Maranhão – com outro fórum, previsto para o município de Presidente Dutra, simplesmente deixando de acontecer e, idem, contribuindo para o esvaziamento da participação da sociedade civil no processo.

Por um motivo – a falta de divulgação e, portanto, de transparência – ou por outro – a pressa com que o processo se dá e a concentração geográfica – o “toque de caixa” da Secma talvez “se justifique” pelo seguinte: o Consec está com mandato vencido desde o ano passado.

Procurados pela reportagem para falar sobre o assunto, o ex-presidente do Consec Armando Nobre, o secretário de Estado de Cultura Luiz Bulcão e sua assessoria não se manifestaram até o fechamento da matéria.

Tudo vai ficar da cor que você quiser

O poeta e jornalista Ramon Mello está à frente de uma campanha para arrecadar fundos para a montagem de uma exposição com telas do artista plástico, poeta, romancista etc. Rodrigo de Souza Leão, subido em 2009.

Mello é curador da obra de Leão, que vem sendo (re)lançada pela editora Record. “A cada mergulho em seu universo – seja nos livros, na peça que estou em cartaz, nos vídeos e em tantas outras coisas que ele deixou – reafirmo a minha vontade de tornar a sua criação mais conhecida. Foi com grande surpresa que me dei conta de que em poucos meses de EAV ( Escola de Artes Visuais do Parque Lage), Rodrigo produziu mais de 40 telas, algumas chegando a medir 3 metros, numa impressionante imersão em seu universo de inúmeras vozes e imagens”, conta-nos por e-mail.

O Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro se interessou em expor as telas e poemas de Leão, já tendo agendado a exposição que batiza este post para entre 12 de novembro de 2011 e 15 de janeiro de 2012. Sem patrocínio, Mello está correndo atrás de viabilizar a grana para o projeto, na raça, na cara e na coragem.

No vídeo abaixo ele conta um pouco mais da empreitada:

Para colaborar e saber mais, aqui.

A foto na foto

Em homenagem ao Dia Mundial da Fotografia, celebrado ontem

 
Apolônio Melônio (do Boi da Floresta) e Seu Beleza, sobreviventes do navio cargueiro Maria Celeste que explodiu em 16 de março de 1954 próximo ao porto e da Avenida Beira Mar matando 16 pessoas – estivadores e tripulantes. A fotografia dos dois personagens foi feita durante as gravações de um documentário que venho realizando sobre essa tragédia que abalou São Luís.
 
[Foto e legenda de Murilo Santos, roubadas da conta do facebook do grande cineasta]

Berrando no terreiro alheio

O bumba meu boi surgiu no Maranhão ou no Piauí? Ou em outro lugar?

ZEMA RIBEIRO

“O meu boi morreu/ que será de mim/ manda buscar outro, maninha/ lá no Piauí”. A quadra popular me vem imediatamente à cabeça quando o Overmundo me alcança com a encomenda de uma matéria que aborde as discordâncias entre maranhenses e seus vizinhos do Piauí em relação ao bumba meu boi – diriam os segundos que o folguedo teria origem lá; afirmam os primeiros que bois como os nossos só existem aqui, como se de bumba boi tivesse falado Gonçalves Dias em seu célebre poema Canção do exílio.

O primeiro comentário que faço é com minha esposa: “Eu nunca ouvi falar nem em boi no Piauí, quanto mais que o boi teria surgido lá”, ela afirma, aqui o boi como sinônimo de bumba meu boi, a manifestação cultural, não aquele que vai ao matadouro e berra menos que o homem, como na máxima de Torquato Neto, o ilustre piauiense da Tropicália: “Leve um boi e um homem ao matadouro. Aquele que berrar mais é o homem, mesmo que seja o boi”.

Como a bandeira maranhense idealizada pelo poeta Sousândrade, o bumba meu boi traz elementos das três raças que constituíram o povo do Maranhão: o negro, o índio e o branco. Para o folclorista Luís da Câmara Cascudo, “o bumba meu boi surgiu no meio da escravaria do nosso país, bailando, saltando, espalhando o povo folião, suscitando grito, correria, emulação. O negro, que desejava reviver as folganças que trouxera da terra distante, para distender os músculos e afogar as mágoas do cativeiro nos meneios febricitantes de danças lascivas, teve participação decisiva nessa criação genial, nela aparecendo dançando, cantando, enfim, vivendo. Os indígenas logo simpatizaram com a ‘brincadeira’, foram conquistados por ela e passaram a representá-la, incorporando-lhe também suas características. O branco entrou de quebra, como o elemento a ser satirizado e posto em cheque pela sua situação dominante”.

Cláudia Márcia Ferreira organizou o livro Festas populares brasileiras, onde aponta as denominações que a ‘brincadeira’ ganha no país: “Folguedo de origem ibérica, difundiu-se por todo o Brasil. Está presente nos mais variados festejos dos ciclos junino, natalino e carnavalesco, com denominações diferentes. Tem as seguintes variantes: boi-bumbá (Amazonas e Pará); boi-de-reis (Acre, Ceará, Paraíba e Espírito Santo); boi-calemba (Rio Grande do Norte); boi surubim (Ceará); boi malhadinho ou boi-pintadinho (Rio de Janeiro); boi ou boizinho (São Paulo e Rio Grande do Sul); e boi-de-mamão (Pernambuco e Santa Catarina). Como bumba-meu-boi ocorre nos estados do Maranhão, Piauí, Pernambuco, Alagoas e a Bahia”.

Domingos Vieira Filho, que hoje batiza importante Centro de Cultura Popular localizado na Praia Grande, um dos três bairros do Centro Histórico da capital maranhense, afirmou: “É quase certo que nos veio a folgança através dos negros escravos que saindo da Bahia atingiram o Maranhão através do Piauí. Em terras maranhenses se acrescentou de novos elementos num processo comum ao folclore, e se diferenciou da brincadeira do boi na área do Nordeste açucareiro, embora conserve muitos pontos em comum no que concerne ao fio temático e à personália”.

O folclorista maranhense seria taxativo ao afirmar que “não existem mais dúvidas quanto às origens históricas desse folguedo dramatizado que resiste ao passar dos anos”. Menos, seu Domingos, menos. As respostas, entre brincantes ouvidos por este repórter em um arraial, não reconheciam o Piauí como possível origem para o bumba meu boi e algumas tiravam um Parnaíba de sarro com os vizinhos. “Boi no Piauí? Não! Lá seria bumba meu bode”, “Se o boi começou no Piauí e hoje eles não têm nada, os maranhenses trouxeram tudo pra cá. É meio sem rumo isso do boi ter começado lá” e “Pode até ser, ter boi lá hoje, ou mesmo ter começado lá. Mas tudo que tem no Piauí no Maranhão tem melhor” eram as respostas mais comuns.

Originário do Maranhão ou do Piauí, o primeiro provável registro sobre o bumba meu boi na imprensa brasileira vem de Pernambuco e data de 1840. Foi feito pelo Pe. Miguel do Sacramento Lopes Gama, que editava O Carapuceiro, um dos pioneiros na crônica de costumes do país – não confundir com o colunismo social insosso que se lê por aqui, aí e além. Em A estultice do bumba-meu-boi, de 11 de janeiro daquele ano, o frei mestre criticava a ridicularização da figura de um sacerdote entre os personagens do bumba pernambucano e criticava a sociedade em geral por conhecer mais de novelas que da Bíblia.

Definido em seu cabeçalho como um “periódico sempre moral e só per accidens político”, assim terminava o texto do jornal naquela data: “Mas como há de se proibir o bumba-meu-boi, se dona Mariquinhas, dona Teté, dona Canexa, dona Chiquinha, dona Belinha, dona Faustolina, dona Fandangolina, dona Galopinda, dona Caxuxolina gostam tanto deste precioso divertimento? Alardeamos os nossos progressos de civilização, e ainda aplaudimos o bumba-meu-boi, folguedo que, sobre o que tem de imoral, pode-se chamar o non plus ultra da estupidez e da tolice! Não sei quando tomaremos juízo”.

As principais críticas recebidas pelos grupos de bumba meu boi no Maranhão dizem respeito à sua parintinização: se outrora eram formados por pessoas das comunidades em que os bois estavam inseridos e/ou se formavam, atualmente é adotado certo padrão de beleza, com índios “sarados” e índias “malhadas”. O termo diz respeito à cidade de Parintins, no Amazonas, onde os bois bumbás mais se assemelham às escolas de samba cariocas que aos bois maranhenses.

Na região amazônica a disputa é ferrenha, com apenas dois grupos – Caprichoso e Garantido – brigando pelos títulos, ano a ano. Por lá a lata de coca-cola, originalmente vermelha, já chegou a ser pintada de azul para satisfazer uma das torcidas. É algo mais acirrado que Vasco e Flamengo, Grêmio e Internacional, ou para ficarmos aqui por nossas fronteiras, Sampaio e Moto ou River e Flamengo do Piauí.

No Piauí, embora o número de grupos seja maior, há também o caráter competitivo no período junino. É o que nos informa o Proparnaíba, sobre o São João 2011, cujo título ficou dividido entre os bois Garantido e Rei da Boiada. No Maranhão não há competição entre grupos – nem mesmo quando estes se encontram nos louvores dedicados a São Pedro (29) e São Marçal (30 de junho) – o máximo que acontece são desafios, em que um cantador tira uma toada de improviso em desafio a outro, de outro batalhão – como são denominados por aqui os grupos de bumba meu boi.

Para Andréa Oliveira, jornalista que escreveu Nome aos bois: tragédia e comédia no bumba-meu-boi do Maranhão – de onde laçamos várias citações ao longo desta reportagem – a polêmica Maranhão-Piauí acerca do folguedo não existe: “Isso é mais aquela venha mania de querer colocar Maranhão e Piauí como rivais em tudo”, afirma. “Não creio que os piauienses se arvorem a querer a paternidade do bumba meu boi. E nós, no Maranhão, às vezes podemos achar que somos os pais da manifestação por que ela é o que há de mais representativo em nossa cultura popular, como no Piauí o são as quadrilhas. É impossível precisar onde surge o bumba meu boi, que ganhou características diversas, sendo incorporado de diferentes maneiras em diversas culturas. Com diferentes nomes ele está presente em diversos estados do país”.

Se o bumba meu boi nasceu no Maranhão, no Piauí ou em outro lugar, pouco importa: é polêmica para mesa de bar – ou para aquelas cervejas tomadas em pé arraiais afora. O que importa são o brilho e a beleza das festas juninas – no Maranhão, no Piauí ou em qualquer canto do país. Polêmica por polêmica o saudoso Antonio Vieira, compositor maranhense de primeira grandeza, subido há pouco mais de dois anos, alimentava a de que o carimbó é uma invenção do Maranhão roubada pelos paraenses. Mas essa já é outra história – pra boi dormir?

[Materinha que escrevi pro número 2 da revista Overmundo]

“Eu vou pro Rio de Janeiro/ vou ser artista/ vou morar na Lapa”*

A faceira senhorita simpática da foto ao lado se despede temporariamente da Ilha: semana que vem ela entra em estúdio no Rio de Janeiro, acompanhada de feras do naipe de Luciana Rabello (direção musical) e João Lira (arranjos) para gravar um disco inteiramente dedicado à obra de mestre Paulo César Pinheiro.

Hoje (13), Alexandra Nicolas participa de uma roda de samba com muito samba de roda, acompanhada do grupo Argumento, no La Musique (Lagoa, rua da antiga Red), no projeto Favela Chic, a partir das 18h (a produção não informou o valor dos ingressos).

*O título do post são versos de Pra chorar no Rio, parceria de Gildomar Marinho e Ricarte Almeida Santos.

Joca Reiners Terron ou a imaginação crítica: poéticas da leitura em Sonho interrompido por guilhotina

[…]

Esta não é senão a narrativa que devolve Raduan Nassar àquele tempo, personagem de Joca Reiners Terron em “Cem Mil Frangos Fantasmas”. Pródigo renitente sob o olhar de um narrador que tem diante de si uma entrevista concedida ao repórter Elvis Cesar Bonassa, da Folha de S. Paulo, em 1995, décadas à frente desse dia. As respostas de Nassar dão a liga para a malha movediça dessa história, a memória arrebatada da escrita de Um copo de cólera, a rotina dos dias gastos no fio vivo da navalha exposta na conversa em que o autor cavalga novamente o verbo, e quem sabe a ignição dessa lembrança possa atear clareza sobre seu abandono da literatura?

[…]

Um irredutível, profundo vitalismo, que se espraia noutras direções. Certamente na direção de testar espaços periféricos à literatura, esta senhora. Torquato Neto e sua fissura pelo Super-8; Paulo Leminski interessado em vídeo, música popular, publicidade, histórias em quadrinhos; Waly Salomão em trânsito sobretudo com Hélio Oiticica, Lygia Clark, Jards Macalé; Jorge Mautner com sua literatura bombástica, sua música e os roteiros de cinema – não raro, os espíritos inquietos do período se aproximam das linguagens mais velozes, aquelas que causam micoses na pele totalitária do país e facilitam que, à revelia, a informação circule.

[…]

Aqui e aqui trechos (donde catei os acima) do trabalho que batiza este post, a dissertação de meu amigo-irmão Reuben da Cunha Rocha, que ele defende logo mais na ECA/USP. A ele, todo o sucesso, mais que merecido. Força, bróder!

Joca Reiners Terron ou a imaginação crítica: poéticas da leitura em Sonho interrompido por guilhotina

[…]

Esta não é senão a narrativa que devolve Raduan Nassar àquele tempo, personagem de Joca Reiners Terron em “Cem Mil Frangos Fantasmas”. Pródigo renitente sob o olhar de um narrador que tem diante de si uma entrevista concedida ao repórter Elvis Cesar Bonassa, da Folha de S. Paulo, em 1995, décadas à frente desse dia. As respostas de Nassar dão a liga para a malha movediça dessa história, a memória arrebatada da escrita de Um copo de cólera, a rotina dos dias gastos no fio vivo da navalha exposta na conversa em que o autor cavalga novamente o verbo, e quem sabe a ignição dessa lembrança possa atear clareza sobre seu abandono da literatura?

[…]

Um irredutível, profundo vitalismo, que se espraia noutras direções. Certamente na direção de testar espaços periféricos à literatura, esta senhora. Torquato Neto e sua fissura pelo Super-8; Paulo Leminski interessado em vídeo, música popular, publicidade, histórias em quadrinhos; Waly Salomão em trânsito sobretudo com Hélio Oiticica, Lygia Clark, Jards Macalé; Jorge Mautner com sua literatura bombástica, sua música e os roteiros de cinema – não raro, os espíritos inquietos do período se aproximam das linguagens mais velozes, aquelas que causam micoses na pele totalitária do país e facilitam que, à revelia, a informação circule.

[…]

Aqui e aqui trechos (donde catei os acima) do trabalho que batiza este post, a dissertação de meu amigo-irmão Reuben da Cunha Rocha, que ele defende logo mais na ECA/USP. A ele, todo o sucesso, mais que merecido. Força, bróder!

Os buracos de São Luís, tema recorrente

Já falei de buracos, aliás, motivos das críticas mais recorrentes à gestão do tucano João Castelo em São Luís, que tem bem mais que buracos como bons motivos para elas.

Abaixo, filminho que fiz hoje pela manhã, quando transitava pela avenida Camboa, no rumo do trabalho. O que acontece: buracos que haviam sido recém-consertados estão novamente abertos, tornando o trânsito lento, expondo inclusive motoristas a multas.

Isso que mostro é coisa pequena, mas dá ideia do descaso com que a capital maranhense tem sido tratada pelas autoridades de plantão. As imagens podem ser toscas, a ideia pode não ser original, mas foi divertido fazer, apesar de arriscado e de eu torcer e trabalhar por uma cidade melhor.

Todo mundo fala em 400 anos, mas como a cidade estará ao completar os 399 que se avizinham?

O piti do dotô

Cena 1: médico chega atrasado a uma clínica Unihosp em São Luís, ontem (10) à tarde. Cena 2: alguém, com senso de humor, diz algo como “até que enfim, atrasadão”. Cena 3: médico, sem senso de humor, vai embora e diz que não vai atender ninguém e manda os pacientes que o aguardavam pacientemente (redundância intencional) tomarem naquele lugar (este blogue se reserva o direito de não publicar o termo de baixo calão utilizado por ele). Cena 4: o “piti” do médico, “doutor” José Mauro Carvalho (de camisa azul), chamando a todos de moleques, filmado abaixo pelo celular da bibliotecária Marla Silveira. Quem é mesmo o moleque? Alô, CRM!

Ainda Morros disso…

A paisagem morruense, por si só, já compensa a viagem, que, vá lá, não é tão longa: 90 quilometrozinhos nos seperam, a Ilha de seus belos rios. E quando Morros, além do Una e outras belezuras, agrega todo mundo em seu 4º. Fest Una, encarar o congestionamento na nunca duplicada BR-135, quebrar a esquerda em Bacabeira, pedir a bênção a vovó em Rosário e seguir até o destino, vale ainda mais a pena:

Detalhes e programação completa aqui.

Um assalto hilariante

Assalto ao Banco Central [Brasil, 2011, 104min., ação (comédia?) direção: Marcos Paulo] é um bom filme e justificaria sala cheia. Infelizmente, não é o que acontece – ou fui eu quem demorou muito a ir? Na em que vi, cerca de vinte almas riram bastante durante a sessão. Por que é um filme engraçado. Não faz apologia ao crime, tampouco termina com a moral de “o crime não compensa”.

“Conta”, “detalhadamente”, a história do plano, de sua execução e das investigações do assalto ao Banco Central, acontecido na capital cearense em 2005, o maior do século, como nos lembra o cartaz. Na ocasião foram levados 164 milhões de reais por quem o planejou durante meses, entre conseguir plantas, pensar e executar a obra do túnel, que começa na casa alugada pelos assaltantes e termina no cofre da instituição, fora do alcance das câmeras de segurança e dos sensores eletrônicos.

A riqueza de detalhes me faz crer que há muito de ficção ali, sem tirar-lhe o brilho. Como, aliás, outro filme nacional que narra outro assalto mui famoso: a versão cinematográfica dO Assalto ao Trem Pagador [Brasil, 1962, 102min., drama/policial, direção: Roberto Farias] não tem, por exemplo, Ronald Biggs, o pai do Mike da Turma do Balão Mágico, quem se lembra?: os assaltantes são favelados cariocas. E por lembrar do grupo de Jairzinho e Simony, Os Smurfs estão em minha fila de coisas por ver particular.

Mas voltemos à ficção baseada em fatos reais. Por exemplo, a mulher (Carla, interpretada por Hermila Guedes) do Mineiro (Eriberto Leão), que vira mulher do Barão (Milhem Cortaz, sempre um monstro em suas interpretações) – o líder da gangue – e depois volta ao Mineiro. Ou seu irmão evangélico (Devanildo, interpretado por Vinicius de Oliveira, o menino de Central do Brasil), que entra inocentemente na parada e acaba cometendo vários pecados, roubar o banco apenas um deles.

Tatu, personagem de Gero Camilo, "irado" após o "banho"
Tatu, personagem de Gero Camilo, "irado" após o "banho"

E tem Gero Camilo, que no papel de Tatu (nome mais que apropriado para um cavador de túneis), rouba a cena (como sempre, né?): a em que sua britadeira encontra um cano de esgoto no caminho e ele toma um banho de bosta é um dos momentos de risada geral, mesmo com pouca gente na sala. Ô, Léo! Toca aí Tatu, Engenheiro do Metrô, clássico de Bidu e Antonio Carlos, sucesso na voz de Alcione, que bem poderia ter entrado na trilha sonora da película.

O elenco é carregado de globais (Lima Duarte, Guilia Gam etc.), algo óbvio numa obra da Globo Filmes: mas não encontraremos ali as comédias sem graça do canal dos Marinho (e da empresa cinematográfica “afiliada”), em que A Grande Família é exceção, de onde um Tonico Pereira é pescado para ser um engenheiro “comunista” que vai gastar sua parte do roubo com vinhos em Paris. É possível até que os constantes forwards e rewinds da narrativa confundam algum espectador mais desavisado – recurso necessário: diz se você não acharia chato ver a história de um assalto que começa com o plano, tem a execução no meio e acaba com a condenação/prisão de parte dos envolvidos?

Assalto ao Banco Central não é nenhum Tropa de Elite – e penso que nem queria ser mesmo. Mas merece ser visto por bem mais gente.

Tio coruja filma sobrinha linda bailarina

Maria Clara é apaixonada por Pagu. À noite, antes de dormir, inclui tanto ela quanto Lili (irmã de Pagu) e os filhotes em suas orações de guria com dois anos e pouco. E às vezes vai lá em casa só para visitar nossa gata, por quem costumeiramente pergunta. Na mais recente visita catei a máquina fotográfica e, além de vários retratos, fiz o filminho aí embaixo, em que ela canta uma música que eu não conheço, lembrando alguns passinhos do balé que já ensaia antes mesmo de ir à escola.

É linda ou não é? Zico, apelido que a já vascaína Maria Clara ganhou quando a prima Manuela chamou-lhe de “bebezico” (algo como bebezinho na língua desses seres miúdos), é uma das crianças do elenco de Se7e, 8ito, “espetáculo de ballet com bailarinas do projeto Dança Criança e o ballet jovem Olinda Saul dias 20 e 21, às 19h, no Teatro Arthur Azevedo. Direção: Olinda Saul. Produção: Associação dos Amigos do Projeto Dança Criança. Ingressos: R$ 30,00 (plateia e frisa), R$ 20,00 (camarote e balcão) e R$ 10,00 (galeria)”, de acordo com a nota da página 2 do Caderno Alternativo do jornal O Estado do Maranhão.