Diário Cultural de hoje

[Antes aviso, um errinho no texto abaixo: o título da música de Silas de Oliveira é, na verdade, “Aquarela Brasileira”, e não “Aquarela do Brasil” (essa, de Ary Barroso), conforme publicado. A correção foi enviada, ontem mesmo, para o Diário da Manhã, que acabou publicando o texto que seguiu no primeiro e-mail]

Pra sempre carnaval: o batuque plural do Monobloco

O carnaval acabou, o Diário da Manhã voltou a circular. E a vida ser um eterno carnaval, é possível? O colunista acredita que sim, que pra ele a vida tem sido assim, infindáveis audições do Monobloco, disco que ele só descobriu após o carnaval, recomendando-o a seguir.

O carnaval acabou. Mas a alegria não. Há pessoas que se contrapõem ao pensamento do sambista, “três dias pra sorrir, um ano pra chorar” e conseguem ser felizes (quase) o tempo inteiro. Outras são tristes (quase) o tempo inteiro. Outras alternam risos e lágrimas nas faces. Esteja você em que grupo estiver, recomenda-se o ótimo Monobloco ao vivo, do grupo carioca homônimo, surgido a partir de oficinas de percussão ministradas por Pedro Luís e A Parede, no finzinho do século passado.

Uma pena que o mercado musical – e literário e artístico e cultural em geral – ludovicense seja tão, digamos, lento. E digo mercado não em termos de produção: os discos não chegam – ou chegam muito tarde –, os livros, idem, os filmes também e por aí vai, que isso é assunto pra outra ocasião.

O Monobloco chega a reunir quatro mil pessoas por noite, em bailes de pré-carnaval, com o pique de cinqüenta mil, em desfiles pelas orlas de Leblon e Ipanema, Rio. O disco – um show, em todos os aspectos – foi gravado com vinte e cinco músicos, entre instrumentistas e vocalistas. Aliando as tradições das festas de pré-carnaval, o grupo não se limita a um repertório de sambas e marchinhas, sem transformar o disco em algo chato, algo comum em suspeitas alquimias sonoras por aí.

“Ô coisinha tão bonitinha do pai” é o verso que abre o disco. O “clássico” pagode de Jorge Aragão é seguido por outra composição sua: “Vou festejar”, onde se ouve “você pagou com traição a quem sempre lhe deu a mão”. Depois, Pedro Luís, “Rap do Real”, do segundo disco de PLAP, e “Miséria S.A.”, sucesso de sua lavra, êxito na gravação d’O Rappa. Vêm “Os orixás” (Luís Carlos Fritz), e “tu vens, tu vens”, “Anunciação”, de Alceu Valença; “Tropicana”, do mesmo Alceu em parceria com Vicente Barreto. É hora de carnavalizar Tim Maia: com participação de Pedro Quental, seguem “Primavera (Vai chuva)” (Cassiano e Silvio Rochael), “Do Leme ao Pontal”, “O descobridor dos sete mares” (Michel e Gilson Mendonça) e “Imunização racional (Que beleza)”. Fernanda Abreu sobe ao palco e comanda um “Baile da pesada”, parceria dela com Rodrigo Maranhão (cavaquinho). E é hora de carnavalizar o rap: os mc’s Junior e Leonardo cantam, com o Monobloco “Endereço dos Bailes”, (deles), “Igualdade” (Moleque Dolores), “Rap das armas” (deles também) e o famosíssimo “Rap da Felicidade” (Kátia e Julinho Rasta), dos versos “eu só quero é ser feliz, andar tranqüilamente na favela onde eu nasci”. Daí o grupo lembra Silas de Oliveira, “Aquarela Brasileira”: “vejam essa maravilha de cenário!”, é, um show do Monobloco. Aí, bem, ou melhor, Ben, que Jorge já é carnavalizado por si só: “Taj Mahal”, “Filho Maravilha (Fio Maravilha)” e “País Tropical”. Daí Lenine – presente nos projetos de PLAP desde o primeiro disco – lembra a baianidade mansa de Dorival Caymmi, “Suíte dos pescadores” – “minha jangada vai sair pro mar, vou trabalhar, meu bem-querer” – e a doce violência de Sérgio Sampaio, “Eu quero é botar meu bloco na rua”. Com “É hoje”, a sabedoria de Didi e Mestrinho fecham o disco com uma pergunta que o leitor/ouvinte pode responder, sem medo de errar: “diga, espelho meu, se há na avenida alguém mais feliz que eu”. Não há, Monobloco, não há.

Quem dera a vida fosse um eterno carnaval, frasezinha comum de se ouvir por aí. Pode ser assim. Siga as instruções: ponha “Monobloco ao vivo” no seu aparelho de som, aperte o play e… batuca, folião!

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