Ainda peguei um pedaço da mixagem do mundo com Pedro Sobrinho [Festa Mixando o Mundo, sexta-feira, 23, 19h]. A praça Nauro Machado estava movimentada para além do fato de ser sexta-feira. A programação cultural do Laboratório Internacional de Mídias Livres estava impecável.
Depois do DJ-professor, era a vez de Didã, Erivaldo Gomes e a Fogo, Cordas e Tarraxas animarem o público ao som de hits já conhecidos, de tão ouvidos n’A vida é uma festa! e no rádio, via seus bons discos [Amor brotando, dela; Pensamentos drobados (sic), dele]. Fiquei bebericando uma cachaça com canela, prevendo que teria que estar aquecido, caso a chuva caísse: O céu escuro anunciava, forte, para logo mais.
Outros preferiam aquecer-se de outra maneira: correndo pela praça feito crianças. Até onde vi, a brincadeira era inocente e se dava entre íntimos. Não sei se estou certo, se vi (de) tudo. Afinal de contas, estava ali para assistir aos shows. O fato é que, a polícia, por um motivo ou outro, recolheu uma turma para seu trailer, instalado na calçada da Câmara Municipal de Vereadores. Bom, recolher não chega a ser eufemismo, mas oculta o que de fato os policiais faziam: algemavam os adolescentes, davam-lhes socos, tapas e “bicudos” (chutes) nas costas. Em homens que já não podiam reagir.

[Policiais torturavam adolescentes ao vivo, em cores e sob a chuva. Foto: Zema Ribeiro]
Cesar Teixeira já estava no palco – e certamente não viu isso, pois, conhecendo o seu temperamento como eu modéstia a parte conheço, teria dito umas poucas e boas aos policiais – quando a chuva desabou. Ficamos eu, Reuben e Bruno sob a chuva, enquanto minha esposa e Graciane foram se proteger sob a aba do trailer da polícia. Qual não foi a surpresa delas – e nossa – quando os fardados retiraram de lá os adolescentes e jogaram sob a chuva: “Te molha aí pra aprender o que é bom, vagabundo!”, ou coisa que o valha, diziam. Não sem mais tapas, socos e pontapés.
Revoltadas, as meninas argumentaram corretamente que este não é(ra) papel da polícia, sendo retrucadas por algum babaca que dizia que “por causa de gente como vocês é que existe esse tipo de marginais”, ou coisa que o valha. Penso que é por conta de policiais e de pessoas (com pensamentos) assim que as coisas andem do jeito que (des)andam.

[Cesar Teixeira: artista e público se confundindo. Foto: Zema Ribeiro]
A chuva caía ainda mais grossa e antes que a confusão piorasse, saímos dali para o palco, onde à beira, o público não pequeno tentava se proteger da chuva. Cesar Teixeira, vendo a agonia, deixou que artista e público se misturassem sobre o palco: “podem subir”, autorizou. O forró comia solto quando a produção temeu pelo desabamento do palco – risco iminente. “Vamos cair na chuva, que quem tem medo de morrer não nasce”, Moisés Nobre pedia que a turma descesse. Ordem obedecida, não sem um pouco de demora. O jornalista compositor mandou Boi da Lua, anunciando sua saideira: “Vamos encerrar que a turma tem que puxar um fino para pegar o voo”.
Depois era a vez do Fino Coletivo subir ao palco e mandar hits de seu primeiro e ótimo disco. A turma contagiou os molhados. Experiência inédita para a banda: “Essa vai entrar pra nossa história”, disseram. Certamente para muitos ali também: o blogueiro nunca esteve tão ensopado para ver show de artista nenhum. “Nunca antes” na história.

[Fino Coletivo. Capa. Reprodução]
A chuva de matar sapo não permitia que ninguém acendesse um fino, particular ou coletivo. Nem arrisquei tirar a pessimáquina fotográfica do bolso. Temia por vê-la estragada, de tão molhada que estava minha roupa. Estávamos encharcados até a alma: água e boa música. “Minha língua é um copo d’água na tua boca de dragão”. Água, boa música e cachaça com chuva – já não havia como proteger o copo – o corpo, há muito estava desprotegido.
Os ladrilhos da praça nos seguraram em momentos de tarja preta sem receita, “esse funk é tarja preta/ remédio forte/ esse samba é tarja preta/ remédio forte”. O Fino Coletivo – como Wado, seu ex-integrante, que tocou na noite anterior –passou por São Luís em Boa hora. Que voltem logo!

esse show foi muito legal, já conhecia o trabalho deles, mas ao vivo e debaixo de chuva foi inesquecível!!! o melhor é q vc sentia q a banda tava empolgada em tocar ali, mesmo na chuva! zema, gostei muito dos teus textos, jornalismo cultural de qualidade em meio a tanta coisa ruim por aí!>abraços
o show foi algo inesquecível. que venham novamente! obrigado, fernanda. um grande abraço!