No célebre poema O analfabeto político, o dramaturgo e poeta alemão Bertolt Brecht afirma categoricamente em um de seus versos: “o pior analfabeto é o analfabeto político”. Ele critica aqueles que batem no peito para dizer que odeiam política, ignorando que de decisões políticas dependem o preço do feijão, da farinha, do aluguel. Tudo na vida depende de uma decisão política, eu ousaria dizer.
Aconteceu ontem, estendendo-se até hoje, a maior rebelião de que já se teve notícia em um presídio do Maranhão. Foi no anexo do Presídio São Luís, no Complexo Penitenciário de Pedrinhas, no bairro homônimo, em São Luís. A rebelião teve início quando detentos conseguiram render um agente penitenciário, tomando-lhe a arma e alvejando-o – a última notícia que temos é que o mesmo encontra-se internado no Hospital São Domingos. Outros agentes penitenciários, monitores e mulheres de detentos foram feitos reféns.
Saldo: 18 mortos. Três deles decapitados. Há informações – não confirmadas por este blogue – de que todos os assassinados tiveram seus pênis decepados. Tudo é política, repito. Mas daí a quererem reduzir isto à politicagem é um pouco demais.
Parte da imprensa, na cobertura do motim, optou por tentar mostrar a influência da governadora Roseana Sarney junto ao governo federal, alardeando que o ministro da Justiça Luiz Paulo Barreto enviaria, hoje, policiais especializados em negociações com detentos, para dar fim à rebelião. É um pouco demais. A Nota do Governo do Estado, publicada em O Estado do Maranhão [9.nov.2010, Polícia, página 7, acesso mediante senha para assinantes], a seguir transcrita na íntegra (em itálico), é simplesmente ridícula:
A governadora Roseana Sarney conversou, durante a tarde desta segunda-feira (ontem), com o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, para pedir apoio na condução das negociações com os presos rebelados do Presídio São Luís, em Pedrinhas.
O Ministério da Justiça vai enviar, em avião especial, nas primeiras horas desta terça-feira (9), uma equipe de policiais especializados em negociação com presos.
A governadora Roseana Sarney acompanha, desde as primeiras horas da rebelião, tudo o que vem acontecendo no presídio e pediu empenho máximo às autoridades que estão atuando na tentativa de encerrar a rebelião e tranqüilizar a população carcerária, agentes penitenciários e familiares de presos e funcionários do presídio.
Sabe-se que há um estado de tensão permanente entre facções de presos e que, somou-se a isso, o evento em que um agente penitenciário acabou dominado por um grupo que se apossou de sua arma para dar início à rebelião.
No Maranhão, assim como nos demais estados, a superlotação dos presídios é uma realidade. Esse problema está sendo enfrentado pelo Governo do Estado com a construção de novas unidades prisionais nas regiões de Imperatriz, Pinheiro e São Luís.
Declaração de Cézar Bombeiro, presidente do Sindicato dos Servidores do Sistema Penitenciário do Estado do Maranhão (Sindspem), na mesma página 7 de O Estado do Maranhão de hoje: “O Presídio São Luís é considerado de Segurança Máxima, entretanto, os colegas não dispõem de nenhuma estrutura. Somos apenas cinco para conter um total de 700 detentos. É humanamente impossível que um profissional consiga atender este tipo de demanda. Este episódio é a prova de que a segurança nos presídios do estado precisa ser reavaliada”.
O problema não é apenas a segurança nos presídios: é a segurança pública como um todo. Na verdade, está para além da segurança pública: o problema do Maranhão é um problema de gestão pública. A construção de unidades prisionais, propagandeada na nota do Governo do Estado, por si só não resolverá o problema.
A implementação, execução e manutenção de políticas públicas que efetivem os direitos humanos – água, alimentação adequada, saneamento básico, educação, saúde, cultura, lazer etc. – é que irão resolver o problema, ainda que a longo prazo. Os imediatistas que adoram repetir que “direitos humanos só defendem bandidos” dirão que “agentes penitenciários estão sendo baleados e presos estão morrendo agora”. Treplico-lhes com uma indagação: há quantos anos e mandatos Roseana Sarney está no poder?
Agora mesmo, durante a campanha eleitoral, Roseana Sarney prometeu 72 hospitais ao povo. É mais uma promessa que não cumprirá, ao menos não nesse mandato. Cabe lembrar que entre as reivindicações dos detentos estava o fornecimento de água: o presídio estava sem água há quase um mês. Detentos são antes de tudo, cabe lembrar, seres humanos sob a custódia do estado.
Outra reivindicação dos detentos é a mudança da direção do presídio. Resta saber o que dirá Cézar Bombeiro, que em julho, à época do Caso Matosão, afirmou: “Nós entendemos que primeiro o governo deveria investigar os fatos para saber se Carlos James [então secretário adjunto de Administração Penitenciária] é inocente ou não. O governo condenou o servidor por antecipação, em razão de uma denúncia de um traficante” [Jornal Pequeno, 26.jul.2010]. As falas de Bombeiro, no presente e no passado, são preconceituosas, corporativistas e oportunistas. Em suma, ridículas.
Fora a rebelião em Pedrinhas, assaltos a banco e o assassinato de uma liderança quilombola em Charco, município de São Vicente Férrer, ocuparam o noticiário de hoje. O que os meios de comunicação alinhados à oligarquia Sarney não conseguirão esconder é o caos por que passa o sistema de segurança pública do Maranhão na gestão de Roseana Sarney, recentemente eleita com apenas 50,08% dos votos, comandando um “arrastão”.
FILOSOFIA DE ALCOVA
Marco Aurélio D’Eça, autointitulado blogueiro de referência é realmente um exemplo. Do que não se deve fazer, em se tratando de jornalismo. Ele, funcionário fantasma da prefeitura de Urbano Santos, conforme atesta o blogueiro e professor Iranilton Avelar, superou-se no quesito “ridículo”, em três textos postados hoje.
Primeiro afirmou que O alvo é Aluísio Mendes…, defendendo a tese, mais idiota impossível, de que a rebelião em Pedrinhas não passaria de “um complô (…) para desestabilizar o atual secretário de Segurança”: todos sabem(os) que o titular da pasta é o deputado reeleito Raimundo Cutrim, que teve que se desincompatibilizar de suas funções para concorrer às eleições de outubro passado. D’Eça tenta minimizar o motim para atender aos interesses da oligarquia. Não colou.
Depois, o hair-journalist, em O fator Jorge Murad… (que mania horrível essa de usar reticências nos títulos de seus textos – textos?), puxa o saco (eufemismo) do patrão: “técnico altamente preparado, homem de posições claras e abertas, é o nome de peso do governo Roseana Sarney (PMDB)”. O próprio primeiro-cavalheiro do Maranhão deve ter sentido vergonha destas poucas linhas tão carregadas de bajulação. Cabe perguntar: se “Murad é fundamental para o futuro do Maranhão”, como afirma o blogueiro, por que Roseana Sarney não lhe dá uma secretaria de Estado? Na última capitania hereditária brasileira o povo é governado a partir da alcova. E ladrões de galinha superlotam Pedrinhas…
Para fechar o dia com chave de merda, D’Eça reproduz trecho de Não tenho pena deles…, texto pavoroso de Gilberto Léda, que certamente bem poderia ter sido escrito e assinado pelo serviçal miranteano. Entre outros absurdos, o blogueiro defende a pena de morte, “para pagar às famílias a dor que lhes foi causada e proteger a comunidade da volta de monstros ao convívio social”. A comunidade já convive com monstros: basta acessar determinados blogues ou ler certos jornais.
Cabe lembrar aos blogueiros, um escrevendo o outro endossando, que o (governo do) Estado tem grande responsabilidade no desenho desse cenário, por ação ou omissão. E como tal seus agentes deve(ria)m ser responsabilizados. É fácil, simples, prático e bastante cômodo jogar a culpa nas costas de quem já carrega cruzes mais pesadas, por vezes carregando-as mais que o tempo necessário por conta da lentidão da justiça. A mesma que favorece, com celeridade, a quem interessa…






