São Luís e os outros 400

“Cidade és minha paisagem / feita de tempo e de mim / de tudo aquilo que somos / e o que seremos, enfim”.
 
O que será que lateja no coração de uma cidade às vésperas de se tornar quatrocentona, cercada de celebrações que não disfarçam uma disputa sem precedentes ou pudores pela sua direção política para os próximos anos? O que será que anda nas cabeças e nas bocas dos seus habitantes, confinados no breu da escuridão da cidadania, reduzida a manifestação solitária de uma cabine eleitoral, por meio de uma convocação obrigatória a cada quatro anos?
 
“Debaixo da ponte há um mundo / feito de gente esquecida / crianças queixando infâncias / infâncias queixando a vida”.
 
É desta cidade que não está nos postais destinados aos turistas que nos visitam, nem nas propagandas milionárias pagas com dinheiro público veiculadas a cada minuto nos meios de comunicação privados, que falamos. Da cidade dos becos e ladeiras, das palafitas e palmeiras, dos subúrbios e sobrados, que insistem em compartilhar a geografia humana de outros desenhos urbanos, excluídos das pranchetas dos planejadores do seu destino, para mergulhá-la numa insana especulação imobiliária, verticalizando a vida, entregue a sanha desenfreada dos automóveis.
 
“Um mundo dentro da ponte / desafiando a cidade / amarga sobre os instantes / as suas necessidades”.
 
A São Luís de um milhão de habitantes, que comemora oficialmente esta semana seus 399 anos, é uma cidade, sobretudo, excludente e desigual; despossuída do mínimo de políticas públicas voltadas para os grandes problemas que afligem a imensa maioria de sua população. O transporte de massas, decente e seguro, o saneamento básico e a água de qualidade, disponíveis principalmente para a população que vive nos grandes aglomerados urbanos que circundam a cidade, com toda a certeza, são os maiores desafios a exigirem urgentes soluções.
 
“A ponte que une dois lados / separa muitos caminhos / por cima, uns vão pisando / debaixo, outros sozinhos”.
 
A qualidade de vida nestas circunstâncias, até mesmo dos abastados é duvidosa, que dirá da imensa maioria dos habitantes da Ilha de Upaon-Açu, excluída dos processos decisórios e da condução dos seus próprios destinos, diante da falência das formas de representação política que já não representam mais nada no plano institucional, a não ser os interesses econômicos de gestores e parlamentares cada vez mais enterrados no mar de lama da corrupção, com seus tentáculos abarcando todas as entranhas dos podres poderes da nossa República Federativa.
 
“Calçando os pés com a esperança / agasalhada no escuro / entrando na fila imensa / que espera pelo futuro”.
 
E por falar em representação política, em recente artigo publicado na Folha de São Paulo, na edição de 19/6/2011, intitulado Você no Parlamento, Oded Grajew, presenteou os leitores com a seguinte e notável reflexão:
 
“Os países que possuem os melhores indicadores de qualidade de vida são aqueles em que a democracia participativa mais avançou, nos quais a sociedade e as organizações sociais mais participam nas decisões e no acompanhamento das políticas públicas, fazendo prevalecer o interesse público acima dos interesses corporativos”.
 
Manchete do Jornal Pequeno deste último domingo, 04/09: Brasileiros organizam nas redes sociais ‘O DIA DA INDIGNAÇÂO’, programado para o 7 de setembro próximo. Quem sabe, poderá se transformar num grande momento para expressarmos nas ruas e avenidas deste País todo descontentamento da população contra o perigoso rumo que a nação está tomando, ajoelhada e perplexa diante do caos da corrupção; uns, acomodados pelo conformismo do discurso apocalíptico, enquanto outros justificando suas omissões pela inevitabilidade do particularismo de suas conveniências.
 
Nestas circunstâncias, cabe lembrar e fazer valer o providencial e atualíssimo discurso do líder negro e religioso Martin Luther King:
 
“O que mais preocupa não é o grito dos sem-caráter, dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons”.
 
[Com o texto acima, de Joãozinho Ribeiro, publicado na edição de segunda-feira (5) no Jornal Pequeno, este blogue presta sua homenagem à capital maranhense, tão maltratada pelos gestores públicos. Terá a Ilha-capital algo a comemorar? Os trechos em negrito-itálico são de poema (o livro Paisagem feita de tempo) e música (o choro Milhões de uns) do poeta-compositor-colunista]

Roberto Costa, o herege

O deputado Roberto Costa
O deputado Roberto Costa, gemedor-cantador
Afilhado político do senador 90% honesto João Alberto e, “tal pai, tal filho”, servo fiel da oligarquia Sarney, o deputado estadual Roberto Costa (PMDB), em Um canto-gemido por São Luís, procura vangloriar-se dos “feitos”de seu grupo político pela capital maranhense. Cai em contradição ao evocar os versos de Oração Latina, hino adotado por trabalhadores e movimentos sociais do Maranhão, de autoria de Cesar Teixeira. Uma heresia.

O discurso do deputado é raso. Tenta apenas “defender” o grupo Sarney e “atacar” o grupo Castelo e, quiçá, o ex-neo-sarneysta-agora-nem-sei-o-quê Tadeu Palácio. Inteligente, aliás, a pergunta recebida por e-mail do ator Uimar Jr.: “Um Palácio, um Castelo… o que será que vem agora?”, referindo-se ao pleito municipal vindouro. Mas tergiverso.

O texto – na falta de termo mais adequado para definir aquele amontoado de palavras sem sentido – é, segundo o deputado, sua homenagem antecipada aos 399 anos que São Luís completa quinta-feira que vem. Seu artigo é finalizado com um arrogante “tenho dito”, como se o parlamentar fosse algum dono da verdade.

Outra heresia é colocar Cesar Teixeira e José Sarney na mesma linha, entre “os nossos vultos históricos, os escritores e poetas, os compositores, cantores e outros artistas que contribuíram e emolduram a nossa Athenas Brasileira”.

Entra em contradição e blasfêmia também o Jornal Pequeno, com larga trajetória de combate ao sarneysmo – mesmo quando isso significa, por exemplo, “legitimar” (ou tentar) a gestão Castelo –, ao garantir espaço privilegiado para o peemedebista vociferar seu vazio.

Prescrições – Hino adotado, nunca imposto, Oração Latina deve ser usada em manifestações legítimas por causas idem: greves de professores, policiais e outras categorias, em acampamentos de quilombolas, indígenas e sem-terra, contra os governos Castelo, Roseana, Dilma e/ou quaisquer governos, empresas, grupos etc. que violem os direitos humanos, tenham as mãos sujas de corrupção, e não só. Enfim, bons motivos, legítimos, não faltam.

A quem malsiná-la e/ou a seu compositor, recomendamos sabão neutro (nem castelista, nem sarneysta): antes, lavem a boca e as mãos.

De como Roseana Sarney gosta de preto e de índio

Só assim Roseana Sarney quer saber de preto e índio
Este blogue recebe com alegria a notícia do título de patrimônio cultural imaterial brasileiro dado ao complexo cultural do bumba meu boi, ontem (30), em Brasília/DF (o que já havia acontecido anos antes com o tambor de crioula).

Roseana Sarney não perde a pose e a oportunidade e aproveita para “sambar” com diversos personagens de uma de nossas mais destacadas manifestações culturais, outrora alvo de perseguição policial e da elite branca e endinheirada.

Aí é bonito posar ao lado de preto e de índio, os grandes estorvos ao “desenvolvimento” patrocinado pelos governos estadual e federal. Indígenas, quilombolas e sem-terra estão, mais uma vez, acampados na sede do Incra, em São Luís. A governadora nunca se dignou a pisar por lá, nem em junho nem agora, com as mesmas sandálias que valsam toadas.

Roseana Sarney não é índia, não é Catirina e duvido mesmo que levasse algum prêmio na Dança dos Famosos do Domingão do Faustão, devendo ser reconhecida como dançarina apenas por seus fieis bajuladores de plantão. “Como dança a governadora!”, devem suspirar emocionados ao vê-la arriscar um passo ou outro para posar para a mídia que lhe serve e lhe ajuda a sustentar a pose.

A governadora é, ao contrário, a dona da fazenda, a dona do mar, aquela que nega a língua e outros nacos do boi a índias, índios, Catirinas, Pais Franciscos, quilombolas, sem-terra e maranhenses outros, famintos e sedentos de justiça e paz, no campo e na cidade.

Secma: s de silêncio

Mesmo contra a vontade da Secretaria de Estado da Cultura, sociedade civil tem se mobilizado para participar dos Fóruns Regionais de Cultura, etapas prévias ao Fórum Estadual

Numa clara tentativa de desmobilizar e desarticular a participação da sociedade civil, a Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão (Secma) pouco tem divulgado a realização de Fóruns Regionais de Cultura como etapas preparatórias à realização do Fórum Estadual de Cultura, previsto para os próximos dias 20 e 21 de setembro, em São Luís, ocasião em que será eleito o Conselho Estadual de Cultura (Consec).

Três fóruns regionais já aconteceram: em Balsas, dia 9 de agosto, em Buriticupu, dia 11, e em Itapecuru, dia 23 – lá, para se ter uma ideia, apenas três pessoas da sociedade civil da cidade anfitriã participaram, tendo São Luís a maior delegação, com 20 representantes, esforço explicado pela atriz, gestora e produtora cultural Elizandra Rocha: “A participação tem sido importante para derrubarmos as tentativas de manipulação na eleição do Consec. Em Itapecuru conseguimos derrubar algumas propostas no regimento”, afirma. Entre elas, a manutenção de privilégios ao ex-presidente do Consec: ele, conforme o regimento, membro da Comissão Eleitoral Estadual, poderia ser votado para o cargo de conselheiro e/ou delegado.

A capital São Luís, que concentra o maior número de agentes culturais no Maranhão, por exemplo, não contou, no calendário e geografia da Secma, com a realização de uma etapa prévia à estadual. Hoje (25) acontece a edição de Codó. Além de pouco divulgados, os fóruns foram ainda reduzidos: em vez dos cinco originalmente anunciados nesta notícia publicada pela assessoria de comunicação da Secma – numa das raras que encontramos “dando um Google” no assunto –, acontecerão apenas quatro fóruns regionais prévios ao estadual. O de hoje junta as mesorregiões Leste e Centro do Maranhão – com outro fórum, previsto para o município de Presidente Dutra, simplesmente deixando de acontecer e, idem, contribuindo para o esvaziamento da participação da sociedade civil no processo.

Por um motivo – a falta de divulgação e, portanto, de transparência – ou por outro – a pressa com que o processo se dá e a concentração geográfica – o “toque de caixa” da Secma talvez “se justifique” pelo seguinte: o Consec está com mandato vencido desde o ano passado.

Procurados pela reportagem para falar sobre o assunto, o ex-presidente do Consec Armando Nobre, o secretário de Estado de Cultura Luiz Bulcão e sua assessoria não se manifestaram até o fechamento da matéria.