O choro de Rui Mário na emocionante primeira noite de Lençóis Jazz e Blues Festival 2025

Rui Mário e seu Quarteto, na abertura do Lençóis Jazz e Blues Festival 2025, ontem (21), no Teatro Sesc Napoleão Ewerton - foto: Zema Ribeiro
Rui Mário e seu Quarteto, na abertura do Lençóis Jazz e Blues Festival 2025, ontem (21), no Teatro Sesc Napoleão Ewerton – foto: Zema Ribeiro

Rui Mário chorou no palco. Pura emoção. Como a que fez sentir o público presente. Era a primeira vez dele ali, em um show solo, ele geralmente visto como músico acompanhante e diretor musical de um monte de artistas, como ele mesmo lembrou.

Ao lado de sua sanfona, seu nome figura em fichas técnicas de álbuns como “Shopping Brazil” (2004), de Cesar Teixeira, “Dente de ouro” (2005), de Josias Sobrinho, e “Olho de boi” (2009), de Gildomar Marinho, para citar poucos.

Acompanhado do irmão Tião Lima (zabumba) e do sobrinho Vinícius Lima (triângulo e pandeiro), o núcleo pé de serra de seu quarteto, mais o groove dos ensandecidos Dedé Valença (baixo) e Marcones Pinto (guitarra), Rui Mário (sanfona) fez um show vibrante, dançante (pena estarmos sentados nas poltronas de um teatro em vez de “numa sala de reboco” ou numa praça da cidade), num passeio entre os guarda-chuvas que se convencionaram chamar forró e jazz.

A base do repertório desfilado pelo quinteto foi o álbum “Baião de doido”, que Rui Mário lançou este ano. Começaram pela faixa-título e desafilaram um rosário de referências e reverências que passou por Seu Raimundinho (pai do sanfoneiro e patriarca de uma família de músicos, sei lá quantos trios de forró pé de serra é possível formar ao longo dos galhos de sua árvore genealógica) — “Frevo pro Seu Raimundinho” —, pela filha Maria Eduarda (muitos familiares do músico na plateia) — “Xote desencabulado” — e pelo colega de instrumento Eliézio — “Meu nobre Eliésio” —, outra figura fácil em fichas técnicas de discos da música popular brasileira produzida no Maranhão, ídolo e amigo “que vivia lá em casa, chegava às cinco da manhã, aí está meu pai que não me deixa mentir; aprendi muita coisa com ele”, lembrou Rui Mário.

A emoção de Rui Mário não era jogo de cena para conquistar plateia. Suas lágrimas, no entanto, não se confundiam com timidez: no papel de frontman, o artista estava à vontade, evocando um Jimi Hendrix (1942-1970) na desenvoltura: certamente o americano tocaria daquele jeito se tivesse nascido no Nordeste brasileiro e fosse sanfoneiro em vez de guitarrista. O maranhense só não usou os dentes para fazer soar seu fole.

No bloco dedicado a Hermeto Pascoal (1936-2025), homenageado da edição 2025 do Lençóis Jazz e Blues Festival, Rui Mário equilibrou-se entre a conhecidíssima “Bebê”, em inspirado arranjo, e uma menos óbvia, e tão interessante quanto, “Suíte Norte Sul Leste Oeste”.

“Eu sempre quis dizer isso”, Rui Mário agora ria, enquanto agradecia à produção do festival e anunciava sua saideira, incitando o público a pedir mais uma. “E agora, que não tem no repertório?”. Acompanhado apenas dos parentes, formando um dos trios de forró pé de serra possíveis na árvore genealógica de Seu Raimundinho, antes da foto de costas para o público, atacaram o “Toque de pife”, de Dominguinhos (1941-2013), outra referência fundamental para qualquer sanfoneiro. E a apresentação de ontem foi mais um atestado de que Rui Mário não é um sanfoneiro qualquer.

A noite de abertura da edição 2025 do Lençóis Jazz e Blues Festival aconteceu ontem (21) no Teatro Sesc Napoleão Ewerton. O primeiro show da noite foi do Tiago Fernandes Trio — ele ao violão sete cordas, mais Valdico Monteiro (percussão) e Victtor Sant’anna (bandolim) —, que se apresentou no hall do Condomínio Fecomércio, recepcionando o público. Um show sóbrio e elegante, que incluiu temas como “Canto de Ossanha” (Baden Powell e Vinícius de Moraes), “Samba do avião” (Tom Jobim) e “Boi de Catirina” (Ronaldo Mota).

A noite foi encerrada pelo Mark Lambert Trio, num passeio por rock, jazz e blues, entre temas de nomes como Al Green e Ray Charles (1930-2004), entre outros. O líder, cantor e guitarrista radicado há oito anos em São Paulo, conquistou a plateia de cara, quando se apresentou, brincando: “eu sou norte-americano, ninguém é perfeito”.

Ladeado por Glécio Nascimento (baixo) e Max Sallum (bateria), o uso de pedais de efeitos pelo guitarrista e pelo baixista — a quem Lambert se referiu muitas vezes ao longo da apresentação — faziam o power trio soar por vezes como a eletrônica dos alemães do Kraftwerk. Dançamos sentados.

A programação — inteiramente gratuita — do Lençóis Jazz e Blues Festival 2025 continua sexta-feira (24), às 20h, na Concha Acústica Reinaldo Faray (Lagoa da Jansen). As atrações são o bandolinista Wendell de La Salles, o Jayr Torres Quarteto e o mineiro Beto Guedes.

A etapa Barreirinhas acontece na Avenida Beira-Rio, dias 31 de outubro e 1º. de novembro, também a partir das 20h; na primeira noite por lá as atrações são Luciana Pinheiro, Vanessa Moreno e Arismar do Espírito Santo e Morgana Moreno; na noite de encerramento se apresentam o Jota P Quarteto, Alice Caymmi e os americanos JJ Thames & Prado Brothers Band.

“O comentário é quase geral”

O compositor Chico Saldanha - foto: Ribamar Nascimento/ divulgação
O compositor Chico Saldanha – foto: Ribamar Nascimento/ divulgação

O compositor Chico Saldanha (acompanhado por Marcão ao violão) é o convidado desta quarta-feira (25) no projeto Quarta no Solar. Capitaneado por Aziz Jr. e Chico Nô e aberto pela discotecagem de Pedro Dreadlock, o evento semanal, em pouco tempo, consolidou-se no calendário cultural da capital maranhense, sendo realizado sempre a partir das 19h no Solar Cultural da Terra Maria Firmina dos Reis (Rua Rio Branco, 420, Centro). O couvert artístico individual custa apenas R$ 15,00.

Chico Saldanha é um dos mais versáteis compositores maranhenses, passeando com igual desenvoltura pelos ritmos da cultura popular de seu estado natal e gêneros como o blues, o choro e o brega, num caldeirão sonoro de referências as mais variadas, entre a música, a literatura e o cinema, além, é claro, de sua própria memória prodigiosa, ao evocar e trazer para suas criações personagens como Babalu (na canção homônima), famoso dublador dos primórdios da TV Difusora, e Mário Mentira (em “É Tudo Verdade”), um vizinho seu na São Pantaleão que fez jus ao apelido que lhe deu sobrenome, entre outros.

Natural de Rosário, Saldanha mudou-se cedo para São Luís, vindo morar numa São Pantaleão habitada por gênios da estirpe de Cesar Teixeira (que chegou a ver engatinhando), João Pedro Borges e Ubiratan Sousa – no encarte de Emaranhado (2007), estes três nomes comparecem aos agradecimentos àqueles que os levaram ao caminho da música.

Entre os covers de Beatles da juventude aos grandes festivais – sua “Absolutamente” venceu a etapa maranhense do Canta Nordeste, festival outrora promovido pela Rede Globo de Televisão –, Chico Saldanha é um nome consolidado na história da música popular brasileira produzida no Maranhão, como compositor, autor de quatro álbuns até aqui – além do citado, Chico Saldanha (1988), Celebração (1998) e Plano B (2017) –, incluindo pérolas como “Itamirim”, “Linha Puída” e “Choro de Memórias”, e como memória viva, enciclopédia deste fazer musical.

Arrisco-me a soar imodesto, mas entre os poucos mas fiéis leitores não preciso esconder o orgulho em ser seu parceiro em “Dolores”, letra que escrevi em homenagem a Dolores O’Riordan (1971-2018), vocalista de The Cranberries, que ele musicou e gravou com a participação especial de Regiane Araújo.

Não preciso lembrar também que foi através de Chico Saldanha que as músicas hoje tão de conhecidas do repertório do elepê Bandeira de Aço (1978) chegaram a Marcus Pereira (1930-1981) e a Papete (1947-2016) – seu parceiro em “Pindaré”, para citar mais um clássico. O resto é história e é sempre um enorme prazer ouvi-lo contar. E cantar.

Chico Saldanha completou 79 anos em junho passado e segue ativo e criativo. Uma de suas mais recentes criações já têm duas gravações: além do próprio autor, antes Elizeu Cardoso gravou o presente que ganhou e fez de “Arco-íris” clássico instantâneo, do verso que intitula este texto, que eu não canso de pedir em rodas de violão ou qualquer outra oportunidade que me surja diante dos olhos, ouvidos e coração.

Um letrista bissexto entre ídolos e amigos

Zema Ribeiro, Regiane Araújo e Chico Saldanha (com o Led Zeppelin ao fundo), no Zabumba Records. Foto: divulgação

A morte de Dolores O’Riordan (1971-2018), em 15 de janeiro de 2018, foi, para mim, golpe de difícil assimilação. A cantora e compositora irlandesa, vocalista da banda The Cranberries, tinha apenas 46 anos. Lembro particularmente de minha dificuldade em noticiar o acontecimento no então diário Balaio Cultural, programa que produzo e apresento com Gisa Franco há mais de sete anos, na Rádio Timbira.

Dizem que quando estamos perto da morte um filme inteiro se passa na cabeça da gente. Com Dolores O’Riordan morria um pedaço de minha adolescência – à época eu já era um quase quarentão, ave, Leminski! Estudante do ensino médio na segunda metade da década de 1990, comprei os três primeiros discos da banda em sociedade com um colega de turma e revezávamos os álbuns entre minha casa e a dele; muito além dos discos, a amizade durou até ele sucumbir ao neofascismo bolsonarista – “war child/ victim of political pride”.

Em algum dia do ano passado eu estava dirigindo quando ouvi, no rádio do carro, uma música dos Cranberries. Não lembro se era “Linger” ou “Ode To My Family” – mas com certeza era uma das duas. Quando cheguei ao destino, liguei o computador e um poema me veio como um jorro, quase como se eu o psicografasse.

Escrita a letra de “Dolores”, enviei ao cantor e compositor Chico Saldanha – que já havia musicado “Dorflex”, ainda inédita. Que também deve ter lá suas manhas no psicografismo, já que no mesmo dia me enviou, por um aplicativo, um esboço de melodia, que ele cantava se acompanhando ao violão, com a seguinte mensagem: “veja se está no rumo”.

Quem sou eu para julgar. A mim, a pegada blues da melodia do ídolo tornado amigo e parceiro, caía como uma luva – perdoem o clichê, mas essas cervejas e essa lua, em véspera de lançamento de parceria com Chico Saldanha, botam a gente comovido como o diabo.

Dolores. Capa. Reprodução

Mais um ano se passou – ano e meio, para ser exato, Cassiano! – e o rosariense resolveu começar a gravar umas músicas inéditas (sim, outras vêm aí!). “Dolores” furou a fila e ele não queria cantar sozinho. Ousei convidar Regiane Araújo, cantora e compositora que desde a primeira audição me impactou tanto quanto Dolores O’Riordan, voz necessária e destacado talento de sua geração.

O sim de Regiane Araújo me deixou contente: era um encontro de talentos e gerações em torno da homenagem a um ícone pop da envergadura de Dolores O’Riordan. Chico Saldanha (voz) e Regiane Araújo (voz) são acompanhados por Fernando Hell (bateria), Daniel Nobre (guitarra e violão aço), Mauro Travincas (baixo), Ricardo Foca (gaitas) e Luiz Cláudio (percussão, arranjo, produção e direção musical). A música foi gravada no Zabumba Records.

Para a capa do single, lembrei de um velho sofá que fotografei durante a pandemia de covid-19, tentando estabelecer um diálogo com a capa de “No Need To Argue” (1994), o segundo álbum dos Cranberries, em que a banda está sentada em um ambiente interno; na capa de “Dolores” o sofá está rasgado e vazio, abandonado em uma calçada que começa a ser tomada pelo mato, à frente de um muro carcomido pelo tempo.

Dolores O’Riordan segue viva em sua música atemporal e na saudade e memória do fã-clube mundo afora, inclusive este letrista bissexto. Se voltasse no tempo e estivesse no elenco de “A Viagem”, novela de Ivani Ribeiro que a Rede Globo exibiu em 1994, cuja trama, de inspiração kardecista, abordava a vida após a morte – e a que The Cranberries compareceu com “Linger” à trilha sonora internacional –, eu mesmo perguntaria se ela gostou da homenagem.

*

Leia a letra:

DOLORES (Chico Saldanha/ Zema Ribeiro)

para Dolores O’Riordan

Nunca mais encontrei Dolores na balada
Ela nunca mais me disse nada
Enquanto eu bebia ao pé do balcão

Dolores nunca mais subiu ao palco pr’uma canja
Mesmo que apareça outra banda
Ouço apenas o vazio de meus pensamentos

A balada já não tem a mesma graça
Nunca mais pedi um drinque estranho
Desligaram o som
Não se ouve mais When you’re gone
When you’re gone

Eu que sou uma gata sem eira nem beira,
Já virei zumbi
Zombie

Aos poucos fui perdendo os discos
Que passei a vida a colecionar
Que passei a vida a colecionar

Dolores foi embora sem dizer goodbye
Tropeço na saudade quando a noite cai
Procuro uma palavra, não vou encontrar
Ninguém vem me dizer onde ela foi morar

Sua voz se diluiu no sinal vermelho
No cruzamento entre a morte e a canção
Eu bato ponto todo dia no balcão
Na doce ilusão de um dia ela voltar

*

“Dolores” chega às plataformas de streaming nesta segunda (30). Faça o pré-save:

Edvaldo Santana faz curta temporada em São Luís

[release]

O cantor e compositor Edvaldo Santana em show comemorativo dos 30 anos de "Lobo Solitário", mês passado, no Sesc Pompéia. Foto: Milton Michida/ Divulgação
O cantor e compositor Edvaldo Santana em show comemorativo dos 30 anos de “Lobo Solitário”, mês passado, no Sesc Pompéia. Foto: Milton Michida/ Divulgação

Artista celebra 30 anos de “Lobo Solitário” (1993), seu disco solo de estreia

"Lobo Solitário" (1993). Vinil. Capa. Reprodução
“Lobo Solitário” (1993). Vinil. Capa. Reprodução

O cantor e compositor paulista Edvaldo Santana já tem quase 50 anos de carreira, se contarmos a partir do disco de estreia da banda Matéria-Prima, que integrou, lançado em 1975. Sua estreia solo aconteceu em 1993, com o lançamento de “Lobo Solitário”, que trazia parcerias com Ademir Assunção, Arnaldo Antunes, Glauco Mattoso, Haroldo de Campos (1929-2003) e Paulo Leminski (1944-1989), além de releituras de Raul Seixas (1944-1989) e Tom Zé.

Valendo-se da máxima punk “faça você mesmo”, com ousadia, coragem e esperança, Edvaldo Santana botou o violão nas costas e já se apresentou por Piauí e Ceará, reafirmando sua ascendência nordestina – é filho de pai piauiense e mãe pernambucana –, bastante perceptível em sua música, marcada pelo cruzamento destas raízes com o blues norte-americano.

Ao longo da carreira, Edvaldo Santana soma oito discos solo, os mais recentes “Edvaldo Santana e Banda Ao Vivo 2” (2017) e “Só Vou Chegar Mais Tarde” (2016) – neste, canta “Ando Livre” (Edvaldo Santana) em dueto com a maranhense Rita Benneditto; a música foi composta após o autor conhecer São Luís e visitar o Bar do Léo, citado na letra. Versado também nas coisas do Maranhão, canta, na faixa-título de “Jataí” (2012): “para cantar um reggae-xote com pandeiro de Salim/ que um negro da Jamaica foi baixar em São Luís/ Ê, São Luís, tambor de crioula”. Ano passado lançou os singles “Vuelo Iluminado”, “Eu Quero É Mais (Humanidade)”, “E aí, José?” e “Irmãos Ciganos”, disponíveis nas plataformas de streaming.

Foto: Edson Kumasaka/ Divulgação
Foto: Edson Kumasaka/ Divulgação

Edvaldo Santana estará em São Luís entre os dias 29 de agosto (terça-feira) e 2 de setembro (sábado) e cumpre agenda em diversos espaços na cidade (veja programação abaixo). Guiado pelos versos de Milton Nascimento e Fernando Brant (1946-2015) em “Nos Bailes da Vida”, “todo artista tem de ir aonde o povo está”, suas apresentações terão preços populares. “É uma viagem sem patrocínio, eu quero cantar e tocar, e espero encontrar com quem quer me ouvir. No fundo, quero me divertir e espero que quem chegar junto por estas noites, se divirta também”, convida o artista.

No repertório das apresentações, acompanhando-se ao violão, Edvaldo Santana passeará por canções de “Lobo Solitário” e de outros álbuns de sua discografia, bem como clássicos da música popular brasileira que gosta de interpretar.

SERVIÇO

O quê: show “30 anos de Lobo Solitário, voz e violão”
Quem: o cantor e compositor Edvaldo Santana
Quando: de 29 de agosto a 2 de setembro
Onde: ver agenda abaixo
Quanto: idem
Informações: (98) 99166-8162
Apoio cultural: Hostel dos Poetas

AGENDA

29 de agosto (terça-feira), 20h: Quintal da Sol (Rua Edson Brandão, quadra 1A, casa 8, Alemanha), R$ 15,00

30 de agosto (quarta), 20h: Hostel dos Poetas (Rua da Montanha Russa, Centro, em frente ao Icbeu), R$ 15,00

31 de agosto (quinta), 19h, Solar Cultural da Terra Maria Firmina dos Reis (Rua Rio Branco, 420, Centro, atrás da Caixa Econômica Federal da Praça Deodoro), R$ 10,00

1º. de setembro (sexta), Miolo Café Bar (Av. Litorânea, nº. 100, Calhau), R$ 15,00

2 de setembro (sábado), Amabile Cozinha (Rua Projetada, 17, Solar dos Lusitanos, Turu), R$ 15,00

Palco Mundo e a alegria do reencontro com a boa música

O Gabriel Grossi Quarteto. Foto: Zema Ribeiro

O baixista Nema Antunes dedicou seu show a seus pares de instrumento Arthur Maia (1962-2018) e Mauro Sérgio, falecido ano passado, vítima de covid-19. Com ele, no palco, um sexteto formado no Maranhão, para a apresentação, incluindo dois integrantes do Quarteto Buriti – de que o contrabaixista Mauro Sérgio, ex-professor da Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo, fez parte: Ronald Nascimento (bateria) e Daniel Cavalcanti (trompete e flugelhorn), este também professor da Emem. Ao piano, Marcelo Carvalho, autor de um dos números instrumentais do roteiro, gravado por Nema em “Plúmbeo”, seu disco mais novo. O grupo se completava com Israel Dantas (guitarra), Ricardo Mendes (saxofone) e Renato Serra (teclado) e demonstrou, ao longo da apresentação, que a prática leva à perfeição, tal a qualidade da performance.

Era o show de abertura do Palco Mundo 2022, projeto que integra o circuito Lençóis Jazz e Blues Festival, normalmente realizado em paralelo ao evento, no segundo semestre, com apresentações em Barreirinhas e São Luís. Nenhuma das seis atrações do line up dos dois dias do evento é novidade na produção de Tutuca Viana: todos já se apresentaram em edições anteriores do LJBF. Mas valeu a pena o reencontro de artistas com a plateia, sentimento recíproco traduzido em palavras ouvidas tanto no palco como entre o público.

Os artistas celebravam esse reencontro, após dois anos de lives e esporádicas apresentações presenciais. Não sei se isso potencializou a ranzinzice do repórter, cada vez menos tolerante com aqueles que vão a teatros para ver o show através da tela do smartphone ou que aproveitam qualquer intervalo para ver ou ouvir, obviamente sem fones de ouvido, para azar da vizinhança, o último vídeo do tik tok ou a última mensagem de áudio enviada no grupo da família. Depois não me venham reclamar de Zé da Chave, que obviamente chegou na metade da primeira apresentação, instalou-se na frisa mais próxima à direita do palco e atacou com seu molho.

A apresentação seguinte era do gaitista brasiliense Gabriel Grossi, acompanhado por Eduardo Farias (piano e teclados), Michael Pipoquinha (baixo) e Sérgio Machado (bateria), outro super grupo.

O show foi pautado no repertório de seu disco mais recente, “Re disc cover”, um trocadilho esperto que joga com o fato de ser um disco de releituras de clássicos do pop rock das décadas de 1960 a 90 e sua redescoberta, seja por um público mais jovem, seja por amantes da música instrumental brasileira com pouca relação com bandas como Oasis, Nirvana, Queen e Jackson 5, entre outras – em maio do ano passado ele conversou com Gisa Franco e este repórter, no Balaio Cultural, da Rádio Timbira AM, sobre o álbum.

Grossi se entrega completamente no palco, entre despir o repertório das letras que estamos acostumados a cantar e vesti-lo com sua gaita, quase à beira do esgotamento físico: seu rosto se avermelha, os joelhos dobram, e entre um solo e outro dos músicos que lhe acompanham, muitos goles d’água, para dar conta do recado. De “Isn’t she lovely”, de Stevie Wonder, passando por “Smells like teen spirit”, do Nirvana, “Wonderwall”, do Oasis, “Ben”, do Jackson 5, “Message in a bottle”, do Police, e “Another one bites the dust”, do Queen. Ao reafirmar o prazer de estar em São Luís e falar da força da cultura do Maranhão, lembrou-se que a ilha do amor é também a Jamaica brasileira, antes de atacar de “Redemption song”, de Bob Marley.

Foi o grande show da noite, numa noite de três grandes shows. A quinta-feira seria encerrada com a apresentação do majestoso Filó Machado, setentão paulista mais conhecido e respeitado fora do Brasil, como tantos de nossos gênios. Cantor, compositor, arranjador e multi-instrumentista, apresentou um show autoral, em que prestou homenagens a “Vadeco” (o título da música remete a seu professor de violão), e lembrou a importância do aprendizado oferecido pela experiência de tocar na noite, em bares e boates.

“Se eu não tivesse tido essa experiência, agora eu estaria nervoso, me perguntando o que fazer”, disse, senhor da situação e arrancando risos e aplausos da plateia. Quando um roadie assomou ao palco para corrigir uma sobra de frequência no violão de Felipe Machado (seu neto, que cantou dois bonitos sambas autorais), ele tornou a divertir o público: “eu sou curioso. Eu fiquei vendo aqui e até esqueci de vocês”, disse, para mais gargalhadas. E continuou, num jogo de melismas e onomatopeias repetido pelo público, elogiado pelo artista. Nessa brincadeira, cantou sem o microfone, sempre acompanhado pelo público, e assim, desceu do palco e deu uma volta ao redor da plateia até retornar para junto do grupo que o acompanhava, que se completava com o mesmo baterista de Gabriel Grossi, Sérgio Machado (seu filho), Fábio Leandro (piano e teclados), Carlinhos Noronha (baixo) e Jota P (saxofones).

A programação do Palco Mundo continua hoje (25), a partir das 19h, com apresentações de Gabriela Marques, Bebê Kramer e Arismar do Espírito Santo. A entrada é gratuita e as pulseiras de acesso ao teatro podem ser retiradas na bilheteria, desde as 14h de hoje, sugerindo-se a troca por um quilo de alimento não perecível. A arrecadação será doada à ONG ludovicense Pouso Obras Sociais.

Em nome dos mineiros

Foto: Zema Ribeiro
Foto: Zema Ribeiro

 

O mineiro Toninho Horta subiu ao palco do Teatro Arthur Azevedo com um papel na mão, que colocou sobre a mesa onde já repousava um copo d’água, com as bordas cobertas por um guardanapo.

Sentou-se, empunhou o violão e agradeceu por estar ali, “em nome dos mineiros, Lô Borges, Beto Guedes, Bituca, é muito bom estar aqui, abrindo a 11ª. edição do Lençóis Jazz e Blues Festival, num tempo em que é grande a representatividade da música instrumental brasileira lá fora”, apontou.

Revezando-se entre temas cantados e instrumentais, começou o show com Durango Kid (parceria dele com Fernando Brant), gravada por Milton Nascimento na década de 1970. Em Aqui ó (da mesma dupla) citou o tambor de crioula, elogiando a grandeza da cultura popular do Maranhão.

Seguiram-se Igreja do Pilar, dedicada a Ouro Preto, e Meu amor infindo,  homenagem a mãe, falecida em 2013. “Ela foi a primeira a reconhecer meu talento, tocava bandolim na banda ​​de meu avô”, lembrou.

Ainda sozinho ao violão tocou Ville kids friends, que compôs durante um curso que ele ministrou na Escandinávia. Em seguida convidou Marcelo Carvalho para assumir um dos dois teclados dispostos no palco. Com ele tocou Waiting for Angela.

Na sequência, somam-se ao duo Israel Costa (violão), anunciado como guitarrista, e Renato Serra (teclado). O quarteto toca Diana (outra parceria com Fernando Brant), sucesso do Boca Livre. “Se tiver alguma Diana na plateia, peço desculpa, mas essa música foi feita para uma cachorrinha. Já que Manuel era um jipe”, lembrou, fazendo a plateia rir, antecipando outro hit que não faltaria ao set list.

Leonel Almeida (contrabaixo) e Ronald Nascimento (bateria) acabaram de completar o grupo enquanto Toninho Horta troca o violão pela guitarra. Atacam de Voo dos urubus, com Horta a princípio tocando de costas para a plateia, a reger o grupo. Depois é a vez de Summertime (Ira e George Gershwin), “já que a gente está num festival de jazz e blues”.

A banda sai e Horta torna ao violão. Presta uma homenagem a João Gilberto. Lembra que influenciado pelo baiano fez uma música aos 13 anos, O barquinho vem, “embora mineiro não tenha mar”, brincou. Canta Desafinado (Tom Jobim e Newton Mendonça), acompanhado pelo coral da plateia.

Ao elogiar novamente o Teatro Arthur Azevedo, lembra-se do dia em que foi ao Carnegie hall ver a Filarmônica de Viena regida por Leonard Bernstein. “Eu fiquei no sétimo ou oitavo andar, vendo os músicos lá embaixo. Esse Teatro Arthur Azevedo não brinca em serviço”, afirmou, antes de tocar um tema de Henry Mancini.

A banda volta e Toninho Horta troca o violão pela guitarra no meio da música, enquanto cita Josias Sobrinho, Nosly e Papete. Lembrou-se de Leandro Gomes, “meu primeiro produtor em São Luís na década de 1980, há quase 40 anos. Essa eu dedico aos grandes talentos do Maranhão”, oferece antes de tocar Beijo partido.

Já em clima de bis, mandou Manuel, o audaz (mais uma parceria com Fernando Brant), para delírio da plateia. E agradeceu: “Quero saudar o Tutuca”, o produtor já havia tentado trazê-lo em outras edições do festival. “Minas agradece vocês pelo bom gosto. Esse estado é um país”, finalizou.

Serviço

O 11º. Lençóis Jazz e Blues Festival acontece dias 16 e 17 de agosto (Circuito São Luís, Concha Acústica Reinaldo Faray, Lago da Jansen); e dias 23, 24 e 25 de agosto (Circuito Barreirinhas, Av. Beira-Rio). Entre os destaques da programação – acesse completa – estão Paula Santoro, Trio Corrente, Bebê Kramer, Zé Paulo Becker (com participação especial de Roberta Sá), Blues Etílicos, Afrôs, Mahmundi, Gildomar Marinho, Elizeu Cardoso, Quarteto Buriti (com participações especiais de Gabriela Marques, Célia Maria e Milena Mendonça), Dani Black, Rita Benneditto e Wilson Zara (que encerra a programação com seu tradicional Tributo a Raul Seixas).

O bluesman brasileiro

Ao vivo 2. Capa. Reprodução

 

Quando completou 40 anos de carreira, em 2016, Edvaldo Santana colocou na rua o petardo certeiro Só vou chegar mais tarde, apontado pela crítica como o melhor álbum de uma carreira pautada pela coerência.

Alicerçado sobre o repertório daquele disco, mas também relendo faixas de trabalhos anteriores, Santana, acompanhado de uma verdadeira big band, subiu ao palco do Sesc Pompeia para um show memorável: eram 12 músicos em cena, incluindo o próprio Edvaldo (voz e violão) e a cantora Alzira E (vocais).

O show foi gravado e, antes tarde do que nunca, virou disco: Ao vivo 2 atesta que Santana é o grande bluesman brasileiro – embora disso já soubesse quem acompanha sua trajetória há algum tempo.

Filho de piauienses, nascido, criado e moldado artisticamente em São Miguel Paulista (lembrada em Ruas de São Miguel, parceria com Roberto Claudino, e Sou da quebrada), Edvaldo Santana é o artista brasileiro que melhor encarna o blues americano, sem abrir mão de sua brasilidade. Se Raul Seixas foi pioneiro ao mesclar rock com baião, Santana é a própria encarnação brasileira do blues. Gênero musical quase sempre associado à tristeza, a obra do bardo é pautada pela alegria, como canta em Quem é que não quer ser feliz, que fecha o disco ao vivo à guisa de bis.

Naipe de metais com o elegante reforço de uma tuba (de Eliezer Tristão, que também toca trombone), o show registrado em disco tem ainda o luxo de um gaitista exclusivo – isto é, não é um músico que toca outro instrumento e aqui e ali encara a gaita: Bene Chireia. A banda se completa com Ubaldo Versolato (clarinete e saxofone tenor), Claudio Faria (trompete), Gó (trombone), Reinaldo Chulapa (contrabaixo), Daniel Szafran (teclado), Leandro Paccagnella (bateria), Ricardo Garcia (percussão) e Luiz Waack (banjo e guitarra).

Mesmo os sambas de Santana têm inclinações blueseiras, casos de Gelo no joelho (parceria com Luiz Waack) e Dom, a primeira, autobiográfica, repassando a carreira de craque peladeiro em campos de várzea – outro talento do músico –; a segunda uma comovente homenagem a Sócrates, líder da democracia corintiana. Ambas, como se percebe, devotadas ao futebol, podendo fazer frente a qualquer clássico de Chico Buarque, Jorge Benjor ou Skank quando o assunto é o esporte bretão.

Citações explícitas ou implícitas em sua obra, aproximam-no também de Belchior, afinal de contas, outro bluesman de mão cheia. A Ao vivo 2 comparecem homenagens a parceiros, gente de seu convívio e ídolos. A título de exemplo, apenas em 40 figuram Beatles, Arnaldo Antunes, Ademir Assunção, Tom Zé, Paulo Lepetit, Matsuo Bashô, Haroldo de Campos e, entre outros, a banda Matéria-Prima, na qual começou a carreira, em 1976.

Cabral, Gagarin e Bill Gates (parceria com Ademir Assunção) perpassa evoluções tecnológicas e frustrações, também com citações sutis (por exemplo a Chão de estrelas, o clássico de Orestes Barbosa e Silvio Caldas) e O retorno do cangaço cita Antonio Conselheiro e Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, ao criticar a corrupção como instituição consolidada (e em pleno funcionamento) no Brasil.

O disco foi gravado em dezembro de 2016, poucos meses depois do impeachment da presidenta Dilma Rousseff, bem antes, portanto, das eleições, da chegada de Bolsonaro ao poder, e da propina de 40 milhões por deputado pela aprovação da reforma da previdência. O que demonstra que o blues de Edvaldo Santana é também afiado e antenado.

*

Veja o clipe de Gelo no joelho (Edvaldo Santana e Luiz Waack):

https://youtu.be/Yh33ZuWnpwg

Hamilton de Holanda apresenta releitura afro de Jacob do Bandolim em São Luís

Músico falou ao blogue sobre influências, carreira e o show de hoje (18) no 10º. Lençóis Jazz e Blues Festival

Jacob Black. Capa. Reprodução

Reinventor do bandolim, o brasiliense Hamilton de Holanda traz hoje a São Luís o show Jacob Black, cuja base do repertório é um dos quatro discos que dedica a Jacob do Bandolim no ano de seu centenário – os outros são Jacob 10zz, Jacob Bossa e Jacob Baby.

No 10º. Lençóis Jazz e Blues Festival ele sobe ao palco da Concha Acústica Reinaldo Faray (Lagoa da Jansen), às 21h20, depois de Pedro Figueiredo e Samuca do Acordeon, e antes de Ed Motta – veja a programação completa.

Hamilton de Holanda (bandolim 10 cordas) estará acompanhado de Rafael dos Anjos (violão) e Bernardo Aguiar (percussão). Já apontado como o Hendrix do bandolim ele nega a referência em entrevista exclusiva a Homem de vícios antigos: está mais para Armandinho Macedo.

Foto: Felipe Diniz

Você está chegando de uma turnê com três discos. Como é administrar essa diversidade de parceiros e formações?
Isso vem em função do artístico, as coisas, as ideias, os encontros, as composições. O show que eu vou fazer em São Luís está muito ligado ao disco que está sendo lançado hoje, que se chama Jacob Black. É um dos quatro discos que eu estou fazendo em homenagem a Jacob do Bandolim. Este é um disco que tem um lado mais ligado à percussão, a características afro da música, foi gravado com dois percussionistas, o Thiago da Serrinha, o Luiz Augusto e o Rafael dos Anjos no violão. Em São Luís eu vou fazer com o Rafael dos Anjos e o Bernardo Aguiar na percussão. A gente vai fazer um show mais ligado a este repertório, mas vou fazer músicas minhas também, Caprichos, muito ligado também à improvisação, a gente gosta muito de improvisar. É tudo em função do artístico, as coisas que vão acontecendo, os encontros, e no final das contas eu acabo que tenho uma porção de discos, mesmo. Eu tenho 40 anos de idade, mas já tenho mais de 30 discos gravados e não paro. E vou fazendo cada vez mais, não quero parar.

Jacob é até hoje considerado a grande referência do bandolim no Brasil, mas você reinventa o instrumento. Há um passo adiante aí quando você coloca duas cordas a mais. Como é que foi esse processo de invenção, esse estalo? E a aceitação, por que você acaba, a partir disso, influenciando outros bandolinistas.
Na verdade, por incrível que pareça, a ideia veio do violão. Quando eu comecei a estudar violão, o universo da harmonia, dos acordes, isso me encantou de uma maneira definitiva. Eu fui aprendendo, tirava as músicas do João Gilberto, as harmonias do Tom Jobim, umas coisas assim de MPB e começava a tentar passar para o bandolim. E começava a tentar fazer aquilo que a gente chama de polifonia, misturando ritmo, harmonia e melodia. Eu via um violão, às vezes um pianista tocando, um acordeonista, tocando aquela coisa cheia, completa, e queria fazer no bandolim também. Daí tive a ideia, pedi para um amigo fazer um bandolim de 10, com um par de cordas mais graves, por que aí eu teria mais possibilidade de fazer essa polifonia. Foi daí a ideia. Isso foi desenvolvido com tempo. Em 2000 foi o ano que ele fez, o Virgílio Lima. No começo de 2002 eu me mudei pra França, fui morar sozinho, aproveitei, desenvolvi um monte de coisas, arranjos, compus músicas especialmente para o 10 cordas, foi um momento que eu desenvolvi bastante um tipo de linguagem para esse bandolim. Na verdade dentro dele também tem o de oito cordas, é um instrumento que você pode tocar as músicas do bandolim de oito cordas como um bandolim de oito cordas, só que ele tem esse recurso. Realmente, hoje em dia, 18 anos depois, eu vejo que muitos músicos estão tocando o bandolim de 10 cordas, alguns que tocavam o de oito passam para o de 10, alguns já aprendem direto o de 10, alguns guitarristas, já vi um monte de guitarristas que adora o bandolim de 10 cordas, não só no Brasil, como em outros países. Eu fico muito feliz de ter contribuído para o bandolim brasileiro.

Você vem obviamente da escola de Jacob do Bandolim, mas já foi considerado pela crítica como o Hendrix do bandolim. Mas a gente sabe que essa fórmula Jacob mais Hendrix é igual a Hamilton de Holanda não é suficiente para te explicar. Quem mais você colocaria no caldeirão de referências e influências?
O Hendrix eu não colocaria, por que ele não me influenciou em nada. Eu o conheci depois, bem depois. Se tem alguém que me influenciou com esse tipo de pegada foi o Armandinho, a influência que eu tive do Hendrix foi pelo Armandinho. Acho que é mais um apelido por alguma coisa relacionada ao instrumento, não à música em si. Eu colocaria o próprio Armandinho, o Raphael Rabello talvez tenha sido o cara que mais me influenciou, o Hermeto Pascoal, o Baden Powell, as composições de Milton Nascimento, do Tom Jobim, do Chico Buarque, os chorões, as músicas mais antigas, o Ernesto Nazareth, adoro jazz, adoro a música flamenca, o Paco de Lucia, me ligo em músicas da Venezuela, fui muito influenciado pela música da Venezuela. A minha maneira de ver a música é realmente plural. Eu tenho a minha língua, assim como nascido no Brasil, eu falo português, é a minha língua mãe, eu aprendi a falar inglês, francês, espanhol, eu aprendi a tocar jazz, a tocar flamenco, são outras linguagens. Mas a minha linguagem materna é o choro, então eu tenho essa possibilidade de ter a minha raiz, a minha árvore, que é o choro, o samba, o frevo, meus pais são pernambucanos, mas meus braços e meus galhos vão crescendo pra lados que eu gosto de conhecer. Eu gosto de música, sou curioso, gosto de conhecer. Por isso minha música tem essa cara, como um Brasil que vai pro mundo.

Você está vindo a São Luís com o show de um disco em homenagem a Jacob do Bandolim, que é um grande nome do choro. São Luís acabou se configurando como uma importante praça de choro, ao lado de Recife, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília. O que você conhece de música do Maranhão em geral e de choro particularmente?
De choro particularmente eu conheço o Robertinho Chinês, e outro dia eu vi um vídeo do Wendell Cosme, quebrando tudo, muito bom, muito bom, adorei. Eu sei que aí tem uma cena forte, meu amigo das antigas João Pedro Borges, violonista. Ontem mesmo eu estive com a Marrom [a cantora Alcione], no Prêmio da Música [Brasileira], minha amiga. Hoje eu quero conhecer mais gente aí.

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Ouça A ginga do Mané (Jacob do Bandolim), com Hamilton de Holanda:

Servicinhos

Três releases de três eventos assessorados pela parceira Vanessa Serra com este que vos perturba. Para você que acha que nada acontece em São Luís ou que reclama que quando fica sabendo já aconteceu ou que acha que o blogueiro anda distante deste terreninho, onde já é possível ver o capim verdejar. Como dizemos este que vos perturba e a companheira de bancada Gisa Franco, na Agenda Cultural do Balaio Cultural, na Rádio Timbira (que completou 77 anos ontem, 15): “para você não ficar perdido”.

SABOR DE BIS

Após sucesso do Circuito Barreirinhas, é grande a expectativa para a continuação do 10º. Lençóis Jazz e Blues Festival em São Luís, este fim de semana

O sucesso de público do circuito Barreirinhas – mais de 6 mil pessoas ao longo dos três dias de programação (tenha uma ideia de como foi aqui, aqui e aqui) – celebrou à altura a marca de 10 edições do Lençóis Jazz e Blues Festival. Quem esteve na Avenida Beira-Rio, onde o palco foi armado, pode presenciar um desfile de talentos e shows emocionantes, além da exposição fotográfica comemorativa (vista por mais de 600 pessoas), que traça um rico painel dos artistas que já passaram pelo palco do festival – e que também poderá ser conferida em São Luís, este fim de semana (dias 17 e 18 de agosto).

É quando acontece o Circuito São Luís, que terá como palco a Concha Acústica Reinaldo Faray (Lagoa da Jansen), além do Palco Mundo, montado na área externa da concha. Uma vasta programação promete agitar a sexta (17) e o sábado (18) da capital maranhense. Não faltam motivos para comemorar.

Atrações – Além das 10 edições do festival idealizado e produzido por Tutuca Viana, por exemplo, o público poderá cantar o “parabéns a você” a João Donato, um dos papas da bossa-nova. O acriano radicado no Rio de Janeiro completa 84 anos de idade exatamente no dia em que toca no Lençóis Jazz e Blues Festival: o pianista é uma das atrações da primeira noite, na sexta-feira (17), ocasião em que se apresentam ainda o gaitista brasiliense Gabriel Grossi e a cantora carioca Taryn Szpilman.

As apresentações do palco principal começam às 20h15. O Palco Mundo antecede-o, com início às 18h. Na sexta-feira (17), quem abre a programação é o bandolinista e cavaquinhista maranhense Wendell Cosme, que apresentará seu projeto “Ritmos e Sons”. Na sequência, também no Palco Mundo, se apresenta o grupo Norjazztinos, formado por Henrique Duailibe (teclado), Nataniel Assunção (bateria), Edinho Bastos (guitarra) e Davi Oliveira (contrabaixo). A programação deste palco paralelo volta após o encerramento dos shows do palco principal, às 23h30, com o blues de Dário Ribeiro, seguido do projeto Movimento Cidade, com os djs Neiva e Félix.

Entorno – Além do Palco Mundo, o entorno da praça também movimentará a exposição fotográfica comemorativa dos 10 anos do Lençóis Jazz e Blues Festival, a Feira da Lagoa, com exposição e comercialização de artesanato produzido no Maranhão, e a Feira Gourmet, com a presença de várias lanchonetes da capital maranhense, colocando um cardápio variado à disposição do público.

O Quarteto Crivador. Foto: divulgação

Sábado – A segunda noite ludovicense do festival terá como atrações, no Palco Mundo, antes dos shows do palco principal, a partir das 18h, o Quarteto Crivador – formado por Marquinhos Carcará (percussão), Rui Mário (sanfona), Wendell de la Salles (bandolim) e Júnior Maranhão (ex-Luiz Jr., violão sete cordas) – e o violonista piauiense Josué Costa. E fechando a noite, o blues de Daniel Lobo, seguido, novamente, dos djs do projeto Movimento Cidade.

Em meio a tudo isso, o palco principal apresenta, a partir das 20h15, os gaúchos Pedro Figueiredo e Samuca do Acordeon, seguidos por Hamilton de Holanda e o “Baile do Flashback”, de Ed Motta.

Formação – Marca dos 10 anos de Lençóis Jazz e Blues Festival é a preocupação com o caráter formativo do evento. 140 pessoas passaram, nesta edição, pelas oficinas oferecidas em Barreirinhas. Em São Luís serão realizadas duas oficinas e uma palestra. Na sexta-feira (17), das 9h às 12h, na Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo (Emem), o acordeonista Samuca do Acordeon ministra a oficina “GPS da Roda de Choro”; também na sexta-feira, das 15h às 18h, no mesmo local, é a vez do flautista e saxofonista Pedro Figueiredo ministrar a oficina “’Tecniquês’ para músicos – técnicas de sonorização e gravação de instrumentos e voz”. As inscrições podem ser realizadas pelo site do festival – endereço em que também pode ser acessada sua programação completa, inteiramente gratuita – recomenda-se a quem quiser, a doação de alimentos não perecíveis, cuja arrecadação será revertida em favor da Creche Caminhando com Cristo, do Parque Jair.

Extra – No dia 23 (quinta-feira), às 16h, acontecerá a palestra “Música e deficiência visual: dificuldades e superações”, ministrada pelo pianista, arranjador, compositor, cantor e publicitário Henrique Duailibe. A palestra será realizada no auditório da Uemanet, no Campus da Universidade Estadual do Maranhão (UEMA).

Realização de Tutuca Viana Produções, o 10º. Lençóis Jazz e Blues Festival tem patrocínio da Companhia Energética do Maranhão (Cemar), através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Maranhão, e do Banco do Nordeste e Potiguar, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet), e apoio de Sesc, Prefeituras de São Luís e Barreirinhas, Fiema/Sesi, Sebrae, FotoSombra, Tory Brindes e Clara Comunicação.

Serviço

O quê: 10º. Lençóis Jazz e Blues Festival – Circuito São Luís
Quem: várias atrações, no Palco Principal e Palco Mundo
Quando: dias 17 e 18 de agosto (sexta e sábado), às 18h
Onde: Concha Acústica Reinaldo Faray (Lagoa da Jansen) e área do entorno
Quanto: grátis
Patrocínio: Companhia Energética do Maranhão (Cemar), através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Maranhão, e Banco do Nordeste e Potiguar, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura (Lei Rouanet)

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JUVENTUDE E “ESTÉTICA DIFERENTE” MARCAM PRÓXIMA EDIÇÃO DE RICOCHORO COMVIDA NA PRAÇA

Segunda edição da temporada 2018 acontece dia 25 de agosto (sábado), às 19h, na Praça da Igreja do Desterro (Centro histórico), com o dj Joaquim Zion, Mano’s Trio e Ivan Sacerdote

Após o sucesso da edição inaugural, são grandes as expectativas para a segunda edição da temporada 2018 do projeto RicoChoro ComVida na Praça, que acontece dia 25 de agosto (sábado), na Praça da Igreja do Desterro (Centro histórico).

O que já é bonito vai ficar ainda mais. Estamos falando, é claro, do cartão postal da secular igreja, que ganhará por uma noite, além da moldura de paralelepípedos e azulejos, a moldura musical de um verdadeiro desfile de talentos, uma constelação de craques das notas musicais.

O dj Joaquim Zion. Foto: divulgação

A noite começa com o dj Joaquim Zion, nome quase sempre vinculado à cena reggae, mas também profundo conhecedor de música brasileira, sobretudo das raízes negras que ajudaram a fundar e consolidar a riqueza da tradição de nossa música popular. Esta vertente é parte do que ele pretende mostrar, a partir de sua coleção de vinis, durante sua apresentação.

O Mano’s Trio. Foto: StudioA (Taciano Brito e Carolina Jordão)

O grupo anfitrião da noite é o Mano’s Trio, formado pelos jovens Wesley Sousa (teclado), Mano Lopes (violão sete cordas e voz) e Fofo Black (bateria), cujos talentos são inversamente proporcionais à média de idade do trio.

O grupo promete um passeio pelo Choro e pelo cancioneiro popular brasileiro, com destaque, no repertório, para nomes como Chico Buarque, Edu Lobo, Ernesto Nazareth e Pixinguinha, com espaço também para composições autorais – temas instrumentais de autoria de Mano Lopes. Quem também comparecerá ao repertório é o jovem compositor amazonense Stênio Marcius, de quem Mano Lopes cantará o samba-choro Máscaras no chão.

Lopes antecipa que “o grupo vai fazer show de choro tradicional, mas com uma estética diferente, com teclado, bateria e violão sete cordas”, em perfeita sintonia com os propósitos do projeto RicoChoro ComVida na Praça, de estimular diálogos e atritos.

O Mano’s Trio terá como convidado o clarinetista baiano Ivan Sacerdote, um dos grandes nomes de seu instrumento no Brasil. Clarinetista, compositor e arranjador, Sacerdote é bacharel em clarinete pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e Mestre em Música (Criação e Interpretação) pela mesma instituição, e já tocou com nomes como Armandinho Macedo, Gabriel Grossi, Hermeto Pascoal, Nailor Proveta, Paulinho da Viola, Rosa Passos e Seu Jorge, entre outros.

O clarinetista baiano promete um passeio pelo Choro em diálogo com outros estilos musicais, “uma outra roupagem para um repertório mais clássico”, além de “uma homenagem a João do Vale”.

Sacerdote foi premiado no II Concurso “Devon & Burgani” Jovens Clarinetistas Brasileiros, em 2015, desde quando a marca o patrocina. Seu disco solo de estreia, Aroeira, completamente autoral, sai este ano – durante sua apresentação o público ludovicense poderá conferir uma das músicas do cd.

Fórum – Em sua passagem por São Luís, Ivan Sacerdote participa ainda, na véspera de sua apresentação no projeto RicoChoro ComVida, do “1º. Fórum Interinstitucional de Música: Produção Cultural em Música no Maranhão”, realizado em parceria pelas Universidades Estadual (UEMA) e Federal do Maranhão (UFMA).

O projeto RicoChoro ComVida na Praça é parceiro do evento. Ivan Sacerdote ministrará oficina de clarinete, dia 24, às 18h. Entre os palestrantes do evento estão o professor mestre Ricarte Almeida Santos (IEMA), produtor de RicoChoro ComVida na Praça, o professor mestre Wanderson Silva (do Conselho Estadual de Cultura) e o produtor cultural Tutuca Viana, que participarão de uma mesa redonda mediada pelo professor mestre Daniel Lemos (UFMA/ UEMA/ Unirio/ Fapema), também no dia 24, às 15h. O Fórum acontece no Auditório da Uemanet, no Campus Universitário Paulo VI.

Acessibilidade — Todas as edições de RicoChoro ComVida na Praça garantem a presença confortável de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. O projeto itinerante conta com banheiros acessíveis, assentos preferenciais com sinalização, audiodescrição e tradução simultânea em libras.

RicoChoro ComVida na Praça é uma realização de Eurica Produções, Girassol Produções Artísticas e RicoChoro Produções Culturais, com patrocínio de TVN, através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Maranhão.

Serviço

O quê: segunda edição da temporada 2018 do projeto RicoChoro ComVida na Praça
Quem: dj Joaquim Zion, Mano’s Trio e Ivan Sacerdote
Quando: dia 25 de agosto (sábado), às 19h
Onde: Praça da Igreja do Desterro (Centro histórico)
Quanto: grátis
Patrocínio: TVN, através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Maranhão

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“TOCA RAUL!”

Contra o sistema e a crise, cantor Wilson Zara mantém tradição e realiza show anual em homenagem a Raul Seixas

Divulgação

Com uma carreira relativamente curta, precocemente encerrada pela morte aos 44 anos, em 1989, Raul Seixas mantém a fidelidade e preferência do público. “Toca Raul!”, dos gritos mais ouvidos pelos bares e bailes da vida, além da devoção que revela, já virou piada e meme e segue mostrando a força e a atualidade do roqueiro baiano.

“Raul, sempre vivo na luta contra o sistema” é o título escolhido pelo cantor Wilson Zara para o Tributo a Raul Seixas deste ano. O nome do show alude ao conturbado momento político por que passa o Brasil e à dificuldade em realizar o espetáculo diante da conjuntura de crise – há alguns anos o show era realizado em praça pública, de graça, e este ano teve que voltar aos moldes iniciais, com a cobrança de ingresso para cobrir os custos de sua realização.

Wilson Zara e Raul Seixas têm uma forte ligação desde que o primeiro ouviu o segundo pela primeira vez. A verdade contida nas letras de Raul e a força com que estas verdades eram ditas foram cruciais para que Zara tomasse a decisão de abandonar o estável emprego de bancário e ir viver de música.

“Eu é que não me sento no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar”, bradava o baiano em Ouro de tolo, petardo de 1973 que, de tão forte e atual, parece ter sido escrita ontem.

Desde 1992 Wilson Zara realiza, anualmente, um show em homenagem ao ídolo baiano, que era fã de Elvis Presley e Luiz Gonzaga, e cuja música dialoga diretamente com os universos do rock’n roll – pelo que acabou se tornando mais conhecido – e do baião. O primeiro Tributo a Raul Seixas teve como título A hora do trem passar, de um dos clássicos do repertório do artista, e foi apresentado em Imperatriz, cidade em que Zara então morava.

Este ano o Tributo a Raul Seixas será apresentado no Fanzine (Praça Manoel Beckman, Av. Beira-Mar, Centro). Os ingressos custam R$ 20,00 e podem ser adquiridos no local. Wilson Zara (voz e violão) será acompanhado por Moisés Ferreira (guitarra e efeitos), Marjone (bateria), Mauro Izzy (contrabaixo) e Dicy (vocal).

No repertório, clássicos do repertório do Maluco Beleza, como Eu nasci há 10 mil anos atrás, Gitâ, Rockixe, As minas do Rei Salomão, Eu também vou reclamar, Sociedade Alternativa, How could I know?, Sessão das 10 e SOS, entre muitas outras. Quem gritar “Toca Raul!” certamente terá seu pedido atendido.

Serviço

O quê: Tributo a Raul Seixas – 2018
Quem: Wilson Zara e banda
Quando: dia 25 de agosto (sábado), às 21h
Onde: Fanzine (Praça Manoel Beckman, Av. Beira-Mar, Centro)
Quanto: R$ 20,00 (à venda no local)

Lançamento do Lençóis Jazz e Blues Festival terá show de Leila Maria, hoje

A cantora Leila Maria. Foto: divulgação

 

“Em minha gestão o Tutuca não ganhará nada, está fora. A briga com o Ronald [Pinheiro, compositor] mostrou o quanto ele estava engajado politicamente com o grupo que faz oposição ao nosso”, desferiu o então secretário de Estado da Cultura Luiz Bulcão, em entrevista, cerca de um mês após a consolidação do golpe que tirou Jackson Lago (1934-2011) do Palácio dos Leões e devolveu a cadeira de governadora a Roseana Sarney.

Ainda não sabíamos, mas em 2009 aconteceria a primeira edição do maior feito de Tutuca como produtor: o hoje longevo Lençóis Jazz e Blues Festival, que colocou o Maranhão definitivamente no mapa das grandes produções do gênero – aquela primeira edição contou com o patrocínio da Cemar, ainda sem a chancela da Lei Estadual de Incentivo à Cultura, com que a empresa continuou a parceria, até hoje.

Hoje (27), logo mais às 20h, no Teatro Arthur Azevedo (Rua do Sol, Centro), acontece o lançamento da comemorativa 10ª. edição do festival, que em 2018 terá, como de praxe, duas etapas: a primeira em Barreirinhas, entre os dias 10 a 12 de agosto, e a segunda em São Luís, no fim de semana seguinte (17 e 18).

No lançamento do festival quem canta é a carioca Leila Maria, que a crítica especializada costuma dizer tratar-se da voz brasileira de Billie Holiday. Os ingressos para o evento podem ser trocados na bilheteria do teatro por um quilo de alimento não perecível, cuja arrecadação será revertida em favor da Creche Caminhando com Cristo, do Parque Jair (São José de Ribamar/MA).

Entre as atrações confirmadas para a edição de 2018, o cantor e compositor mineiro Lô Borges, que presta homenagem aos 75 anos do parceiro Milton Nascimento; o gaitista Jefferson Gonçalves, bluesman talvez de presença mais constante nestes 10 anos de festival; o pianista pernambucano Amaro Freitas, grata revelação da música instrumental brasileira; Fauzi Beydoun, artista à frente do fenômeno reggae Tribo de Jah, desta feita mostrando sua porção bluesman; o pianista acriano João Donato, um dos inventores da bossa nova (se apresenta em São Luís dia 17 de agosto, data em que completa 84 anos de idade); o gaitista brasiliense Gabriel Grossi; a cantora carioca Taryn Szpilman; o reinventor do bandolim Hamilton de Holanda; e o violonista piauiense Josué Costa, outra jovem e grata revelação da música instrumental brasileira – programação completa no site do festival.

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Ouça Leila Maria em Swing, brother, swing (Clarence Williams/ Walter Bishop/ Lewis Raymond):

Um revival de futuro

Ronaldo Rodrigues, Luciana Simões e Christian Portela, da formação original da Bota o Teu Blues Band. Arte e fotografia: Laila Razzo/ Base SLZ
Ronaldo Rodrigues, Luciana Simões e Christian Portela, da formação original da Bota o Teu Blues Band. Arte e fotografia: Laila Razzo/ Base SLZ

 

Não faltam atestados do parentesco entre blues e rock. Uma das provas mais recentes é a volta às origens dos Rolling Stones. Os roqueiros setentões voltam ao bom e velho blues em Blue & Lonesome, seu ótimo novo disco.

Há pouco mais de 20 anos em São Luís uma banda fez história na cena da cidade. Com seu nome incomum, a Bota o Teu Blues Band tornou-se lendária. Aproveitando a passagem do guitarrista Ronaldo Rodrigues pela Ilha, o grupo se reunirá para uma única apresentação nesta sexta-feira (27), no Fanzine Rock Bar.

A casa, definida no material de divulgação como “o mais novo local alternativo de São Luís”, iniciou suas atividades no último dia 14, com show da mítica Velhas Virgens. Em seu currículo já constam shows de Da Ghama (ex-Cidade Negra), Fauzy Beydoun e Cachorro Grande.

Gerente da casa, o músico Beto Ehongue (Canelas Preta, ex-Negoka’apor, ex-Som do Mangue), comenta a receptividade do público: “Foi maravilhosa. O público ficou fascinado com a casa, sua estrutura, acessibilidade, localização e principalmente com a proposta cultural da casa, que é de incluir São Luís no roteiro cultural do país, além de abrir espaço para a música feita por estas bandas”, contexto em que se insere esta reunião da Bota o Teu Blues Band.

Ronaldo Rodrigues, guitarrista da formação original, após uma temporada em Londres, acabou fixando morada no Rio de Janeiro, onde cursou o bacharelado em bandolim na UFRJ. Ex-integrante, em São Luís, de bandas como Palavra de Ordem e Som do Mangue, a partir da vivência musical na capital carioca, o músico acabou mais identificado com o chorinho. Mas nunca abandonou a guitarra. Ele  comenta o prazer do reencontro com a cidade e com os amigos: “Sempre é muito bom rever os parentes e velhos amigos. Aproveito pra fazer algumas apresentações, como o evento Black & Tal, que realizo no Chico Discos e que se encaminha pra sua quarta edição [3 de fevereiro]. Dessa vez tem uma particularidade, que é reunir boa parte da Bota o Teu Blues Band, que fundei junto com os irmãos Burgue – Heremburgue e Indemburgo –, há 23 anos, pra fazer um show comemorando a amizade e o velho rock/blues. Pena eles não poderem fazer parte mas contaremos com Luciana Simões nos vocais e Christian Portela [guitarrista] que também fizeram parte da formação original”

“Está sendo uma divina nostalgia reviver a banda, o repertório. Apesar de quase não fazer parte do que toco hoje em dia, é prazeroso. Há muito tempo não tocava num projeto contendo o bom e velho rock e seu inseparável amigo blues [risos]”, continua.

Ronaldo anuncia a formação que subirá ao palco para este Bota o Teu Blues Band Revival e o que a banda está preparando: “Infelizmente Heremburgue e Indemburgo, baixo e bateria, respectivamente não poderão participar, mas nos deram o aval pra seguir adiante. Da formação original faremos parte eu [guitarra e bandolim], Christian Portela [guitarra, gaita e vocais] e Luciana Simões [vocais]. O repertório está baseado no que fazíamos há mais de 20 anos, muito blues e medalhões do hard rock lado B, como Iron Butterfly, Grand Funk Railroad, O Terço, Mutantes, entre outros… O baixo fica sob a batuta de Fernando Japona e a bateria de Thierry Castelo Branco”.

Entre os nomes, Japona acrescenta Cream e Deep Purple, e aponta novos rumos para a sonoridade da banda. “Ronaldo toca bandolim e curte choro, eu toco violão e curto folk, blues e samba. [Os arranjos] são funkeados, shuffles, traditional, soul, jazz! Progressivo também!”, lista.

A importância da Bota o Teu Blues Band é tamanha que Beto Ehongue destaca: “acho que foi o início do que chamamos da nova cena musical da cidade, contribuiu para o surgimento de outros grupos importantes da musica local atual”.

O hoje gerente do Fanzine Rock Bar conviveu musicalmente com Ronaldo Rodrigues: este foi guitarrista da Som do Mangue, cujo vocalista era aquele. “Ronaldo é multi, não só nos instrumentos, mas nas ideias, e era peça muito importante dentro do processo de criação do Som do Mangue, com uma bagagem imensa”, elogia.

A apresentação da Bota o Teu Blues Band olha para o passado, mas ao mesmo tempo aponta para o futuro. Ao menos o da relação da casa com a música produzida aqui. “Esta é uma bandeira forte da Fanzine, seja feita agora ou em outra época, e esse resgate da Bota O Teu é apenas o começo do que pensamos para a música local”, compromete-se Beto Ehongue.

Serviço

O quê: show da Bota o Teu Blues Band – com Luciana Simões e Os Carabinas
Quando: sexta-feira (27), às 22h
Onde: Fanzine Rock Bar (Av. Beira-Mar, Praça Manuel Beckman, próximo à Delegacia da Mulher)
Quanto: R$ 20,00

Esfregando genialidade na cara da humanidade

Mate minha mãe. Capa. Reprodução
Mate minha mãe. Capa. Reprodução

 

O que quer alguém que já venceu o Oscar, o Pulitzer e o Obie Awards ao se meter e fazer uma graphic novel? Esfregar sua genialidade na cara da humanidade? “O que é que pode fazer um homem comum neste presente instante?”, hein, meu caro Belchior?

O melhor a fazer é deleitar-se com o exagerado talento de Jules Feiffer, 87, esfregado em nossa cara página a página, quadro a quadro de Mate minha mãe [Companhia das Letras/ Quadrinhos na Cia., 2015, 160 p., leia um trecho].

50 tons de cinza (e marrom) que realmente valem a pena, trama bem urdida, nada a ver com o soft pornô, best seller em livrarias e cinemas – refiro-me à coloração desta obra-prima de Feiffer, ser incomum e raro (redundo?), avalizado na contracapa por Neil Gaiman, Art Spiegelman, Chris Ware e Stan Lee. Querem mais?

Com talento mais que comprovado em outras áreas, Feiffer, escritor e cartunista com mais de 35 livros publicados, estreia em grande estilo com esta graphic novel policial, recheada de música. Não à toa, suas personagens cantam e dançam (às vezes literalmente), equilibrando-se na corda bamba entre o rabisco e a obra de arte.

Assistente de Will Eisner na adolescência, Feiffer, de cara, agradece a mestres que dão pistas das referências encontradas em Mate minha mãe: os quadrinhistas Milton Caniff e o próprio Eisner, os romancistas Dashiell Hammett, Raymond Chandler e James M. Cain e os cineastas John Huston, Billy Wilder e Howard Hawks.

Dividida em dois atos, a história se passa nas décadas de 1930 e 40. Pode soar clichê, mas parece impossível fugir da comparação dos quadrinhos com o cinema (noir): os diálogos rápidos, os capítulos curtos, a agilidade das personagens, saltando fora dos quadrinhos, os núcleos se cruzando: cinco mulheres e um alcoólatra arremedo de detetive.

Blues, bom humor, ironia: Feiffer tira um sarro de Hollywood, onde se passa a segunda parte da história, com uma personagem transgênero desfilando entre as estrelas, em determinado momento convertidas em atrações para soldados em guerra.

Gênio!

Turnê de Chiquinho França chega a mais quatro cidades esta semana

[release]

Foto: divulgação. Facebook do artista.
Foto: divulgação. Facebook do artista.

 

Bacabal, Pedreiras, Codó e Caxias. Estes são os próximos destinos do trem musical de Chiquinho França, que aporta acompanhado de sua banda nestas cidades, para shows do projeto Sons e Trilhos.

Guitarrista e bandolinista consagrado, Chiquinho França apresenta um repertório versátil, passeando do rock, jazz e blues ao choro, frevo e baião, um pé na modernidade, outro na tradição, as duas mãos na música de qualidade.

Acompanhado por JBlues (teclado), Mauro Sérgio (contrabaixo) e Oliveira Neto (bateria), Chiquinho França, um dos mais requisitados instrumentistas maranhenses, promete emocionar as plateias. “Na verdade, quem se emociona sou eu, ao poder oferecer ao público a música que aprendi vendo um ceguinho tocar na rodoviária de Santa Inês, minha cidade natal”, afirma o músico, lembrando as origens musicais.

Nesta segunda metade da turnê, Chiquinho França se apresenta na Praça São José (Praça do Bolo, Centro), em Bacabal, dia 15 (quarta), às 20h30; no dia seguinte (16), no mesmo horário, na Maçonaria Renascença Pedreirense (Praça do Jardim, Centro), em Pedreiras.

Sexta-feira (17) é a vez de Codó: Chiquinho França e banda se apresentam na Praça Ferreira Bayma, às 20h30. Sábado (18), no mesmo horário, é a vez de Caxias. Na terra do poeta Gonçalves Dias a apresentação acontece no Centro de Cultura (Praça do Panteon, Centro).

Todas as apresentações são gratuitas e abertas ao público. A última apresentação da turnê acontecerá em São Luís, em data, horário e local a definir. Sons e Trilhos tem realização da Zarpa Produções e patrocínio da Companhia Energética do Maranhão (Cemar), através da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Maranhão.

Divino jazz

Sublime encontro: Yilian Canizares com Rosa Reis e as caixeiras na derradeira noite do Lençóis Jazz e Blues Festival. Foto: Taciano Brito
Sublime encontro: Yilian Canizares com Rosa Reis e as caixeiras do Divino na derradeira noite do Lençóis Jazz e Blues Festival. Foto: Taciano Brito

 

Só soube da existência da cubana Yillian Canizares através do amigo Ruan Didier. Mais ainda: que ela estaria na sexta edição do Lençóis Jazz e Blues Festival, sábado passado (9), na noite de encerramento do mesmo.

Catei uns vídeos no youtube e me mandei para a Maria Aragão, palco ludovicense do festival que aconteceu também em Barreirinhas, fazendo jus ao nome, uma semana antes.

Cheguei à praça ainda a tempo de ver mais da metade do show de Joyce Moreno. À tarde, por do sol, Ponta do Bonfim, noite, tinha ido verouvir Alberto Trabulsi (acompanhado por Reuber Rocha, guitarra, e Guilherme Raposo, teclado, num set de MPB, fechando com uma bela autoral, cujo título não memorizei), Bruno Batista (ao violão, acompanhado por Luiz Jr. se revezando entre violão sete cordas, guitarra e banjo, esbanjando inéditas, mostrando que compõe cada vez melhor, além de uma especialíssima participação de Claudio Lima) e Danilo Caymmi (que cantou e tocou flauta, acompanhado de André Siqueira ao violão, passeando por repertório autoral, do pai e de Tom Jobim, que descobriu-o cantor, sobre o que você lerá mais numa entrevista que publico em breve).

Fechados os parênteses, devo dizer: Joyce e Yilian Canizares foram os únicos shows que vi do 6º. Lençóis Jazz e Blues Festival. A brasileira é conhecida de longa data, tem presença razoável em minha coleção de discos e, há muito, ansiedade de minha parte por ver um show seu. A violinista e cantora cubana surpreende.

Quando vi seu pianista deixar o palco, imaginei que ela fosse atacar de Eche mis quejas al mar, em que canta e toca violino, acompanhada do baixista e do percussionista ao cajon. Acertei em cheio. Além do diálogo musical com este instrumento que se sobressai nessa música, ela dança. É de tirar o fôlego!

Mas o momento sublime mesmo, da noite, e eu apostaria do festival, se tivesse assistido a outros shows, foi quando Canizares dialogou com caixeiras do Divino, num encontro só comparável, talvez, ao de Maria Bethânia e Omara Portundo em disco e show.

Ela conversou com a plateia, arriscando-se ao português para o básico, “boa noite”, “obrigado”. O resto, perguntou se entendíamos espanhol e se arriscou, elogiou a beleza da cidade, agradeceu a presença do público, fora o que não consegui captar/memorizar. Alguém já disse que a música é a única linguagem universal.

De imediato me peguei perguntando: como será que se armou este encontro? Que mãos dos deuses da música teriam dado uma pitada destes temperos cubanos e brasileiros para este momento único, para o qual faltam adjetivos? Só a magia explica, se é que carece explicação.

Na hora, pensei que se escrevesse algo sobre o festival, a noite, ou os shows a que assisti, teria o título de “Divino jazz”.

Aí está.

Em família

Um é especialista em jazz, o outro em rock. Ambos têm programas de rádio dedicados aos gêneros a que se dedicam. Um tem livros publicados sobre o assunto, o outro tem uma banda. Estamos falando dos Pellegrini, pai e filho, Augusto e Paulo.

Hoje eles se encontram no palco do Amsterdam (Lagoa), no show Do blues ao rock, que promoverá o encontro de Augusto Pellegrini com a Mr. Simple, de Paulo Pellegrini (voz e teclado), Otávio Parga (contrabaixo), Marcio Reis (guitarra) e Nuna Gomes (bateria).

No repertório caprichado, nomes como Elvis Presley, Ray Charles, Eric Clapton, Beatles, Pink Floyd e Louis Armstrong, entre outros. O show acontece às 21h30min e os ingressos custam R$ 20,00. É pra mais que se sentir em casa: é pra se sentir em família.