RicoChoro ComVida na Praça homenageia Chico Maranhão

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Repertório do disco “Lances de agora” (1978) será lembrado em frente à igreja onde foi gravado; compositor completou 80 anos neste agosto

Uma viagem no tempo. É o que promete o último sarau da temporada 2022 do projeto RicoChoro ComVida na Praça, que acontece este sábado (27), às 19h, no Largo da Igreja do Desterro, no Centro Histórico da capital maranhense, em meio aos festejos de São José do Desterro.

A sacristia da secular igreja foi palco, em junho de 1978, das gravações do antológico elepê “Lances de agora”, do compositor Chico Maranhão, com o acompanhamento do Regional Tira-Teima. O disco foi lançado pela gravadora Discos Marcus Pereira, do incansável pesquisador do cancioneiro de um Brasil desconhecido pela maioria dos brasileiros.

Show de Cláudio Lima será uma homenagem a Chico Maranhão. Foto: divulgação
A cantora Dicy fará uma participação especial durante a homenagem. Foto: divulgação

Chico Maranhão completou 80 anos neste agosto, de modo discreto, como é de seu feitio, ao contrário de outros oitentões ilustres da música popular brasileira. Ele receberá homenagem do cantor Cláudio Lima, convidado desta edição do sarau, que apresentará show com o repertório de “Lances de agora”, com a participação especial da cantora Dicy.

O poeta Celso Borges lerá trechos de “Lembranças, lenços, lances de agora: memórias e sons da cidade na voz de Chico Maranhão” . Foto: Layla Razzo. Divulgação

Ainda na ocasião, o poeta e jornalista Celso Borges fará novo lançamento do livro “Lembranças, lenços, lances de agora: memórias e sons da cidade na voz de Chico Maranhão” (Palavra Acesa, 2022, 265 p.), misto de bastidores da gravação do disco e biografia de Chico Maranhão, com uma boa dose de imaginação poética – ao aproximar Maranhão e Bob Dylan, por exemplo.

Quarteto Crivador. Montagem. Divulgação

Cláudio Lima e Dicy serão acompanhados pelo Quarteto Crivador, formado por Marquinho Carcará (percussão), Rui Mário (acordeom e direção musical), Tiago Fernandes (violão sete cordas) e Wendell de la Salles (bandolim). O nome do grupo é tomado emprestado de um dos tambores da parelha do tambor de crioula, ritmo genuinamente maranhense que também é alvo do interesse do compositor homenageado, seja em músicas que compôs, seja na Turma do Chiquinho, grupo de tambor de crioula que comandou durante a década de 1990.

As atrações se completam com o dj Jorge Choairy, o mais tropicalista de nossos disc-jóqueis, antropofagicamente falando: seu set list é fruto de uma alimentação sonora que não conhece preconceitos, abarcando diversos gêneros, épocas e geografias, numa salada sonora sempre suculenta.

RicoChoro ComVida na Praça é uma realização da Sociedade Artística e Cultural Beto Bittencourt, com produção de Girassol Produções e RicoChoro Produções Culturais, que agradecem ao deputado federal Bira do Pindaré, que tornou possível a realização desta edição do evento, ao destinar emenda parlamentar à Prefeitura Municipal de São Luís, através da Secretaria Municipal de Cultura (Secult).

Acessibilidade cultural – Os saraus RicoChoro ComVida na Praça garantem acessibilidade cultural, com banheiros químicos adaptados, assentos preferenciais, audiodescrição e tradução simultânea em Libras, a língua brasileira de sinais.

Arte na luta contra a fome – O projeto RicoChoro ComVida na Praça é parceiro do “Pacto pelos 15% com fome”, da ONG Ação da Cidadania. Atualmente mais de 33 milhões de brasileiros não têm o que comer. O objetivo da campanha é “promover uma grande aliança entre entidades da sociedade civil e empresas, grupos de mídia, agências de comunicação e publicidade, pessoas físicas, artistas e influenciadores, para atuarem na linha de frente no combate à fome e às desigualdades sociais”. O evento é gratuito e aberto ao público, mas recomenda-se a doação de um quilo de alimento não-perecível, como gesto concreto de engajamento na campanha. O volume arrecadado será destinado a comunidades em situação de vulnerabilidade social.

Divulgação

Serviço

O quê: sarau RicoChoro ComVida na Praça
Quem: dj Jorge Choairy, Quarteto Crivador, o cantor Cláudio Lima, com participação especial de Dicy Rocha, e o poeta e jornalista Celso Borges
Quando: dia 27 (sábado), às 19h
Onde: Largo da Igreja do Desterro, Centro Histórico de São Luís
Quanto: grátis
Informações: @ricochoro (instagram e facebook)

Carta aberta a parentes e amigos bolsominions

“Apesar de você, amanhã há de ser outro dia”
(Chico Buarque)

“É pena eu não ser burro; eu não sofria tanto”
(Raul Seixas)

“Meu coração não se cansa de ter esperança”, como cantou o recém-oitentão Caetano Veloso. Ao longo dos últimos quatro anos não foram poucas as vezes em que alertei parentes, amigos e conhecidos – ou deveria chamá-los todos/as de ex? – acerca do bolsonarismo, cuja máquina de mentir é tão perversa que acaba transformando seus próprios entusiastas em vítimas do próprio esquema.

Ainda em 2018 fui tachado por um par de parentes de “fanático”, adjetivo que acompanhava palavras como lulista, petista, dilmista, esquerdista ou comunista. Logo eu, que nunca deixei de fazer justas críticas ao PT e seus líderes enquanto o partido esteve no poder – ao contrário de quem, após um mandato inteiro de desmandos de Jair Bolsonaro, segue aplaudindo-o desavergonhada e acriticamente.

Falo de gente pobre, gente como eu. Não é nem gente remediada, que diante de qualquer emergência possa fazer um saque em uma poupança e resolver um imprevisto. Gente que se nega a perceber que é inaceitável o retorno do Brasil ao mapa da fome, sendo o país um dos maiores produtores de alimentos do mundo; gente que se nega a perceber que é impossível pagarmos tão caro por combustíveis fósseis, sendo o país um dos maiores produtores de combustíveis fósseis do mundo. A quem me lê agora e não simpatiza com Jair Bolsonaro e sua família, peço perdão pelas repetições e redundâncias, mas estas são necessárias, vocês sabem o porquê.

É claro que é muito mais fácil receber uma figurinha engraçada, um meme, um vídeo curto e imediatamente repassar por aplicativos de mensagens e redes sociais em geral. Mas nem sempre o mais fácil é o melhor ou o correto. Ler dá trabalho, interpretar texto dá trabalho, pesquisar dá trabalho – ter consciência de classe, então, nem se fala. Checar, então, se uma notícia é verdadeira ou não, mesmo que isto custe apenas perguntar a algum conhecido, dá muito trabalho.

“Mas esta checagem deveria ser papel dos próprios jornalistas”, uns podem argumentar, não sem razão. Sim, deveria: mas muitos de meus colegas de profissão sucumbiram ao bolsonarismo, mesmo que o líder neofascista seja uma ameaça ao exercício crítico e livre de nossa profissão, além de à nossa própria existência. Fora que não são apenas jornalistas que usam redes sociais, estas ferramentas que têm suas vantagens, mas também deram voz a uma legião de imbecis, como ainda teve tempo de afirmar Umberto Eco (1932-2016).

Um presidente da república é uma referência política, moral e cultural. Para o bem ou para o mal – e esta antítese está bem desgastada, quando a extrema-direita se posiciona como “o bem” para derrotar “o mal” (seja o comunismo, o lulismo, o petismo, a esquerda, os vermelhos), mesmo pecando, ao usar o nome de Deus em vão, para mentir. Cristianismo e bolsonarismo são doutrinas absolutamente incompatíveis.

Jair Bolsonaro se elegeu com a cantilena vazia do pseudocristianismo escondido em um de seus slogans de campanha: “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”, esgarçou o versículo bíblico do evangelho de São João. Na prática a teoria é outra e qualquer investigação sobre si ou sua família é colocada em sigilo de 100 anos.

Faço questão de escrever este texto puxando as coisas apenas pela memória, sem consultar links ou reler matérias – fosse citar exemplos cotidianos, uma carta aberta não seria suficiente, melhor seria escrever logo um livro, mas já há excelentes publicações revelando as entranhas do bolsonarismo e seu modus operandi, desde o processo que resultou em sua ida à reserva do Exército até a relação dele e sua família com as milícias cariocas.

O Partido dos Trabalhadores está fora do poder há seis anos e qualquer verdade dita a um simpatizante de Jair Bolsonaro ainda é invariavelmente rebatida com um “e o PT?”, “e o Lula?”, “e a Dilma?”. Em meio a isso, a prisão, covarde, pois injusta, pois sem provas, do maior líder político vivo da América latina, pelas mãos de um juiz e procuradores corruptos, o lavajatismo a serviço do bolsonarismo, cujos objetivos eram tirar das eleições de 2018 o então líder em todas as pesquisas de opinião e alimentar o antipetismo.

Mentiras têm pernas curtas: a farsa caiu, a casa dos golpistas caiu, e o governo Bolsonaro, quatro anos depois de eleito, nada tem para mostrar que tenha beneficiado a vida de qualquer brasileiro, a não ser a do próprio nanopresidente, de seus familiares e aliados de ocasião, cujas burras nunca enchem.

Vivemos há dois anos e meio uma crise sanitária global, com distintos comportamentos em relação a seu combate ao redor do mundo. A opção do Brasil governado pelo neofascismo foi retardar a compra de vacinas enquanto tentava negociar propinas e as sórdidas mentiras de toda ordem do Hitler tupiniquim que acabaram por colaborar para o inchaço do número de óbitos, hoje em mais de 700 mil, muitos dos quais poderiam ter sido evitados, se o adorador de Ustra tivesse agido em prol do povo, em vez de ficar imitando gente morrendo por falta de ar. Tudo indica que a história se repetirá com a varíola dos macacos, infelizmente.

Por vários motivos, diversos gênios da criação artística brasileira faleceram nos últimos anos: Agnaldo Timóteo (1936-2021), Aldir Blanc (1946-2020), Cassiano (1943-2021), Dona Inah (1935-2022), Flávio Migliaccio (1934-2020), João Gilberto (1931-2019), Letieres Leite (1959-2021), Mário Luiz Thompson (1945-2021), Moraes Moreira (1947-2020), Nelson Sargento (1924-2021), Paulo Diniz (1940-2022), Paulo Gustavo (1978-2021), Rubem Fonseca (1925-2020), Sérgio Sant’Anna (1941-2020), Tarcísio Meira (1935-2021). Em nenhum caso o ocupante do Palácio do Planalto decretou luto oficial, lançou nota de pesar ou sequer publicou qualquer coisa em redes sociais, manifestando condolências a familiares e fãs-clubes.

“Que diferença faria?”, poderão me perguntar. É o simbólico que nos diferencia dos animais. E este profundo desprezo pelas artes – tidas como coisa de esquerdistas – é um dos símbolos do fascismo.

Por falar nisso, apesar de este texto se intitular “Carta aberta a parentes e amigos bolsominions”, outra categoria poderia estar no título: não perdoo artistas bolsonaristas. É uma contradição em termos. O desmonte sistemático das políticas culturais – e do próprio Ministério da Cultura – já seria motivo suficiente para que o candidato à reeleição não encontrasse apoio entre a classe. E particularmente acredito que artistas, “as antenas da raça” no dizer de Ezra Pound (1885-1972), sejam bem maiores que bobagens como “mamata da Rouanet” ou “caixa preta do BNDES”.

Falando em mamata, por que é mesmo que quem se indigna com a corrupção só se indigna com a corrupção do PT? Os governos de Lula e Dilma, além dos investimentos em órgãos de controle e fiscalização, criaram o Portal da Transparência e nunca interferiram em aparelhos como a Polícia Federal a fim de livrar quaisquer de seus quadros em investigações. Lideranças petistas foram condenadas, presas, perderam cargos. Ou seja: foram punidos por seus crimes. Resumindo: cortaram na própria carne.

Apesar do desejo de alguns, no Brasil (ainda) não existe pena de morte – quer dizer, até existe informalmente, fora da lei, para a população negra, moradores de periferias e pequenos traficantes. Então o que explica o cinismo de quem até hoje se revolta com uma tapioca comprada com cartão corporativo, mas não se revolta com os milhões torrados diariamente pelo atual mandatário da república, sob a proteção dos sigilos centenários?

Volto aos artistas: aqueles que se respeitam e nutrem respeito por seu público têm lado e assumem. E não se trata de ser petista, lulista, dilmista ou beneficiário de leis de incentivo à cultura através de renúncia fiscal. Trata-se de assumir uma postura diante da encruzilhada civilização x barbárie, autoritarismo x democracia, alegria x tristeza, humanidade x desumanidade. O Brasil é o país da alegria e grande parte dela nos é dada por artistas – imaginem o que teria sido do isolamento social sem as lives, os streamings ou quaisquer outras formas de arte e entretenimento. Como podem artistas apoiarem quem representa a tristeza e a morte? Ou, a esta altura do campeonato, aferrarem-se a uma suposta neutralidade? “Se você fica neutro em situações de injustiça, você escolhe o lado do opressor”, já diria o Nobel da Paz Desmond Tutu (1931-2021).

Polarização existia nos tempos em que Lula e Dilma disputavam eleições contra Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, José Serra e, entre outros, Geraldo Alckmin. Ora, se Alckmin entendeu a necessidade de alianças para livrar o Brasil do neofascismo e do neonazismo, qual é a sua dificuldade em entender?

Há uma barbárie em curso no Brasil, basta acompanhar o noticiário: do capoeirista Moa do Katendê (1954-2018), entre o primeiro e o segundo turnos da eleição de 2018, ao campeão mundial de jiu-jítsu Leandro Lo (1989-2022) no último fim de semana, passando pela vereadora Marielle Franco (1979-2018) e o motorista Anderson Gomes (1978-2018), o bolsonarismo mata. “Ah, mas o presidente não apertou o gatilho em nenhum destes casos”, apelará um/a bolsonarista, que deve, no entanto, acreditar na facada desferida por Adélio Bispo durante (te)at(r)o de campanha de Bolsonaro em 2018. De fato não puxou o gatilho, mas reiteradamente incentiva o ódio e a eliminação física de opositores em discursos, além de ter facilitado o porte e a posse de armas à população em geral, colaborando para o ambiente de terror e guerra civil que o Brasil, mais do que nunca, vive (ou morre?).

Qual terá sido o peso da postura de artistas contrários à ditadura militar brasileira instaurada em 1964 para o fim do regime de exceção em 1985? Obviamente é difícil calcular. Mas sua recusa em calar, que os levou a prisões, torturas, exílios, desaparecimentos e censuras, certamente colaborou para que o pesadelo acabasse. Não há clima, tempo, espaço, nem motivo para neutralidade. Goste-se ou não de Lula, do PT, ou de quaisquer nomes e partidos postos à disputa.

Não é preciso sentir dor para se indignar com a dor alheia. Não é preciso passar fome para se indignar com a fome alheia. Não é preciso ser negro para lutar contra o racismo. Não é preciso ser homossexual para lutar contra a homofobia e a violência que dela decorre. Não é preciso ser indígena para ser contra o desmatamento e o garimpo ilegais na floresta. Não é preciso ser mulher para se indignar contra os assustadoramente crescentes números de estupros e feminicídios. Basta ser humano e ter alguma empatia e alguma consciência de que o estímulo à lei da selva, por ação ou omissão, não nos serve nem nos representa.

Esta singela missiva é um último chamado à razão a parentes, amigos e artistas bolsonaristas. Errar é humano e não é vergonhoso admitir erros. Antes tarde do que nunca. Ainda é tempo de reconstruir o Brasil. Ou ao menos de não deixar terminarem de destruí-lo. Nem simpatizantes e defensores de Bolsonaro aguentariam um eventual segundo mandato deste governo da necropolítica e da destruição sistemática. Até por que, caso esta tragédia aconteça, sequer existirá Brasil. E quem diz/ia que foi enganado em 2018 não vai ter desculpa dessa vez.

São Luís/MA, 11 de agosto de 2022

Zema Ribeiro, jornalista antifascista

Os presentes da noite

TEXTO: ZEMA RIBEIRO
FOTOS: RIVÂNIO ALMEIDA SANTOS

A dj Josy Dominici
Apresentação da campanha “Pacto pelos 15% com fome”, da Ação da Cidadania
O Regional Caçoeira
O cantor e compositor Vinaa
Os cantores e compositores Paulinho Pedra Azul e Djalma Chaves

Não é apenas o encontro de artistas cantando e tocando e a plateia batendo palmas. Camadas se desdobram e palavras como encanto e magia bem servem para tentar traduzir o que aconteceu na noite de sábado (6), na Praça do Letrado, no Vinhais. Servem, embora eu não saiba se são suficientes. Creio que não, afinal de contas, tudo ali transbordava, seja a qualidade das apresentações, o ambiente aconchegante e afetuoso, o clima de feira com as barracas do entorno, a alegria de encontros e reencontros.

Era do que se tratava: após dois anos suspensas em razão do isolamento social imposto pela pandemia de covid-19 (breve exceção se abriu ano passado quando os saraus foram realizados nos jardins do Museu Histórico, com controle de acesso), os chorões e choronas da ilha estavam ávidos por uma roda de choro nos moldes a que estavam acostumados. Mas a de sábado foi além.

O evento abriu espaço para a coordenação estadual da campanha “Pacto pelos 15%”, da Ação da Cidadania, que busca doações e voluntários para amenizar o flagelo da fome, que atormenta mais de 30 milhões de brasileiros, além dos que vivem em situação de insegurança alimentar. Além de falas de representantes da ONG, vídeos da campanha foram exibidos ao longo da programação.

A dj Josy Dominici voltou a se apresentar após cerca de 10 anos dedicando-se a outras frentes. Sua sequência aqueceu o ótimo público presente, com um repertório de muito bom gosto, entre clássicos do samba e choro, música popular brasileira e reggae, além de elementos da cultura popular do Maranhão.

O caminho foi seguido pelo Regional Caçoeira: choro, baião, bumba meu boi e samba, com pitadas jazzy, integraram o cardápio de Ricardo Mendes (clarinete, flauta e saxofones), Wanderson Silva (pandeiro), Wendell Cosme (cavaquinho de seis cordas e bandolim de 10 cordas) e Thiago Fernandes (violão de sete cordas). O virtuosismo e versatilidade do quarteto levaram o público a um passeio por clássicos de Pixinguinha, Severino Araújo, Donato Alves, Raimundo Makarra e Coxinho, entre outros, além de temas autorais de Wendell, como o “Baião das três”, composta por ele especialmente para o sarau.

Vinaa revelou que ansiava estar no palco de RicoChoro ComVida na praça já há algum tempo. Lembrou-se das origens, do acolhimento por nomes como Cury – autor de “O que me importa”, sucesso de Tim Maia que figurou em seu repertório àquela noite – e Zeca Baleiro – com quem gravou “Cicatriz (No regresa)” em “Elementos e hortelãs na terra dos eucaliptos” (2019), seu segundo disco, também presente ao setlist.

“Agora vocês me dão licença para eu botar os óculos de Cartola”, pediu, antes de cantar “O mundo é um moinho”, clássico do repertório do mangueirense, um dos grandes momentos de uma noite para lá de especial.

Também acompanhado pelo Regional Caçoeira, Djalma Chaves, ao violão, iniciou sua apresentação com o clássico absoluto “Aquarela brasileira” (Silas de Oliveira), apresentando um repertório de clássicos que incluiu também, entre outras, “Tristeza” (Niltinho Tristeza). E foi ele o responsável pela grande surpresa da noite, ao chamar ao palco o parceiro mineiro Paulinho Pedra Azul, que de passagem pela ilha, deu uma canja inspirada, elogiando o grupo anfitrião.

“Você já é ludovicense, é o mineiro mais maranhense que eu conheço”, afirmou Djalma Chaves, ao que Pedra Azul retrucou: “só falta oficializar”. Antes da participação musical, leu um poema que havia escrito na manhã de sábado, exaltando as belezas de São Luís, cidade com que mantém estreita e longeva relação – ganhará melodia?

Começou por “Carinhoso” (Pixinguinha), cantada em dueto com Djalma Chaves. Em seguida, provocado pelo grupo, atacou de “Cantar” (Godofredo Guedes) e aos pedidos de mais um e com a capacidade de improviso do Caçoeira (que não havia ensaiado com o convidado surpresa), atendeu com “Jardim da fantasia” (Paulinho Pedra Azul), certamente um de seus maiores clássicos.

Presente à Praça do Letrado, o jornalista e historiador Marcus Saldanha, em uma rede social, sintetizou a noite: “uma noite de presentes para os presentes”.

O próximo sarau RicoChoro ComVida na Praça acontece dia 20 de agosto (sábado), às 19h, na Praça Nossa Senhora de Nazaré (Cohatrac). As atrações são o dj Marcos Vinícius, o Instrumental Tangará, a cantora Bia Mar e o cantor Carlinhos da Cuíca. O evento é uma realização da Sociedade Artística e Cultural Beto Bittencourt, com produção de RicoChoro Produções Culturais e Girassol Produções.

Joãozinho Ribeiro apresenta seu choro (en)cantado e solidário

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Show acontece sábado (13), no Convento das Mercês; evento é parceiro da campanha “Pacto pelos 15% com fome” e ingressos podem ser trocados por um quilo de alimento não-perecível

O compositor Joãozinho Ribeiro. Foto: Murilo Santos. Divulgação

O compositor Joãozinho Ribeiro apresenta no próximo sábado (13) o show “Choro (en)cantado”, cujo repertório valoriza esta faceta de sua obra.

Invariavelmente, quando ouvimos falar de choro – ou chorinho, como o gênero também é conhecido – assenta-se seu nascimento no Rio de Janeiro, embora pesquisas demonstrem que esta música urbana já era praticada em outras praças, simultaneamente. O inventário do padre João Mohana (1925-1995), por exemplo, inclui diversas partituras de choro, de autores maranhenses, datadas ainda do século XX.

Um dos mais versáteis e gravados compositores do Maranhão, Joãozinho Ribeiro sempre teve um pé no choro, seja por influências percebidas aqui e acolá, seja na criação de choros “puros”, caso, por exemplo, do clássico “Milhões de uns”, de sua autoria, que colecionou prêmios desde seu registro pela cantora Célia Maria, em 2001.

O show que Joãozinho Ribeiro apresentará sábado que vem passeia por sua porção chorão e contará com as participações especiais de Anna Cláudia, Daniel Lemos, Fátima Passarinho, Mariana Rosa e Rose Fontoura. A produção é de Lena Santos.

Joãozinho Ribeiro e convidados serão acompanhados por Arlindo Pipiu (violões de seis e sete cordas e direção musical), Jovan Lopes (trombone), João Neto (flauta), Gustavo Belan (cavaquinho), Carbrasa (pandeiro) e Madson Peixoto (tantan).

A noite musical abrigará também o lançamento do livro “Letras e silêncio: o caos sentimental”, de Camila Cutrim. A solidariedade também vai marcar presença: os ingressos para acesso ao espetáculo se darão mediante a troca por um quilo de alimento não-perecível, que serão doados à campanha “Pacto pelos 15% com fome”, da Ação da Cidadania, que busca minimizar o sofrimento de mais de 30 milhões de brasileiros que atualmente passam fome – e de outros tantos que vivem em situação de insegurança alimentar.

Serviço: Choro (en)cantado, show de Joãozinho Ribeiro e convidados. Dia 13 de agosto (sábado), às 19h, no Convento das Mercês. Ingressos: um quilo de alimento não-perecível

“Comida, diversão e arte”

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RicoChoro ComVida na Praça terá três edições presenciais em agosto; projeto estabeleceu parceria com a Ação da Cidadania na campanha “Pacto pelos 15% com fome”

Chorinho (1942). Candido Portinari. Reprodução

15% da população brasileira não têm o que comer atualmente, no maior retrocesso da história do país. É pensando nestes mais de 33 milhões de brasileiros que a Ação da Cidadania lançou, no último dia 15 de julho, a campanha “Pacto pelos 15% com fome”, que visa “promover uma grande aliança entre entidades da sociedade civil e empresas, grupos de mídia, agências de comunicação e publicidade, pessoas físicas, artistas e influenciadores, para atuarem na linha de frente no combate à fome e às desigualdades sociais”. O objetivo é “viabilizar doações diretamente para as instituições do Pacto e cadastrar voluntários na luta contra a insegurança alimentar”.

No Maranhão, a primeira iniciativa a abraçar a causa é o projeto RicoChoro ComVida na Praça, que terá três edições presenciais em agosto: dias 6, 20 e 27, nas praças do Letrado (Vinhais), Nossa Senhora de Nazaré (Cohatrac) e Largo da Igreja do Desterro, respectivamente, sempre às 19h. Os eventos são gratuitos e abertos ao público.

“Este evento sempre prezou pelo diálogo e pela diversidade, além do afeto. Palco e plateia em comunhão no exercício de fazer e fruir boa música, alimento para a alma. Agora, diante da tragédia social brasileira, irmanamo-nos a esta importante iniciativa da Ação da Cidadania, sempre lembrando o início de tudo, com os ideais do sociólogo Herbert de Souza, o Betinho. É colocar em prática a máxima dos Titãs: “a gente quer comida, diversão e arte”, aproveitando ainda para agradecer à sensibilidade do deputado Bira do Pindaré, pelo apoio ao projeto, e à Prefeitura de São Luís, através da Secretaria Municipal de Cultura, fundamental para viabilizá-lo”, comenta o sociólogo e radialista Ricarte Almeida Santos, idealizador e coordenador de RicoChoro ComVida na Praça.

No primeiro sarau, as atrações são a dj Josy Dominici, o Regional Caçoeira e os cantores Vinaa e Djalma Chaves; depois é a vez do dj Marcos Vinícius, Instrumental Tangará, a cantora Bia Mar e o cantor Carlinhos da Cuíca; e na última edição desta temporada, o sarau terá como atrações o dj Jorge Choairy, o Quarteto Crivador e o cantor Cláudio Lima, com a participação especial da cantora Dicy.

RicoChoro ComVida na Praça é uma produção de RicoChoro Produções Culturais e Girassol Produções Artísticas. O evento garante acessibilidade cultural para pessoas com deficiência, com assentos prioritários, banheiros acessíveis, audiodescrição e tradução simultânea em libras, a língua brasileira de sinais.

Educação, só na fachada

Maranhão tem 161 escolas com nome dos Sarney, mas 61% dos moradores não têm ensino básico

CHICO OTÁVIO

Nome de Roseana Sarney ainda não cobriu o de Paulo Freire em escola rebatizada, mas já está nos uniformes escolares

No ano em que foi declarado patrono da educação brasileira, Paulo Freire (1921-1997) ficou menor no Maranhão. Por decisão da Secretaria estadual de Educação, o nome do educador será apagado da fachada do prédio anexo de uma escola pública de Turu, bairro de São Luís. Em seu lugar, será pintado o novo nome da escola: Centro de Ensino Roseana Sarney Murad. Os uniformes dos alunos já foram mudados.

No Maranhão, o sobrenome Sarney já está em 161 escolas, mas a mudança em Turu não deve ser interpretada apenas como mais um sinal do culto à família de Roseana. Para a direção da escola, o importante é ter a certeza de que o nome da governadora pintado na fachada atrairá mais recursos e outros paparicos da administração central de um estado onde 61% das pessoas, com 10 anos de idade ou mais, não chegaram a completar a educação básica (de acordo com dados do Censo 2010). Isso é sarneísmo, movimento político liderado pelo senador José Sarney (PMDB), que comanda o Maranhão há quase cinco décadas.

— Sarney nem mora aqui. Seu controle só é ativado em momentos muito específicos — disse o professor Wagner Cabral, do Departamento de História da Universidade Federal do Maranhão (UFMA).

Sarneísmo, uma história de 47 anos

Reportagem publicada ontem no GLOBO revelou a existência de uma rede de falsas agências de turismo que fornece mão de obra barata, arregimentada no interior do Maranhão, para a lavoura de cana-de-açúcar e para a construção civil do Sudeste e do Centro-Oeste. Para os especialistas ouvidos pelo jornal, o fenômeno é resultado de uma perversa combinação de fatores, da má distribuição da terra à tragédia educacional no estado, todos fortemente associados ao sarneísmo.

Desde 1965, quando José Sarney (PMDB) assumiu o governo maranhense, o grupo do atual presidente do Senado venceu dez eleições para governador, chefiou o Executivo local por 41 anos e só perdeu o controle político do estado em duas ocasiões: quando o aliado e então governador José Reinaldo Tavares rompeu com o sarneísmo, em 2004, e dois anos depois, quando Jackson Lago (PDT) derrotou sua filha e herdeira política, Roseana, que concorria ao terceiro mandato de governadora. Mesmo assim, por pouco tempo: em 2009, Lago teve o mandato cassado por compra de votos.

O sarneísmo é um movimento diferente de outras correntes políticas, como o getulismo ou o brizolismo. Não se sustenta na adoração da figura do líder e nem tem uma base popular. Em lugares como Codó, Timbiras e Coroatá, cidades a 300 quilômetros de São Luís, que formam uma espécie de enclave do trabalhador barato no interior do estado, só se vê o nome Sarney em prédios públicos. Todavia, a cada abertura das urnas eleitorais, a família reafirma um poder que nem a estagnação econômica foi capaz de ameaçar.

— De um lado, Sarney é homem de ligação com o governo federal. Tem poder em Brasília por ser uma peça fundamental no jogo da governabilidade. De outro, mantém as prefeituras de pires na mão — sustenta Wagner Cabral.

— Ele fala por uma questão ideológica e política. Sarney proporcionou um salto de progresso no estado. Os fatos históricos são diferentes — rebate o jornalista Fernando César Mesquita, porta-voz de Sarney.

No Maranhão, a força do sarneísmo está na pequena política. Quando descobriu que a escola Paulo Freire, onde trabalha, seria rebatizada com o nome da governadora, a professora Marivânia Melo Moura começou a passar um abaixo-assinado para resistir à mudança. A retaliação não demorou:

— A direção ameaçou transferir-me — disse a professora, que mora no mesmo bairro da escola e vai de bicicleta ao trabalho.

A Secretaria de estado da Educação alega que o anexo da escola Paulo Freire mudou de nome porque foi incorporado à estrutura, já existente, do Centro de Ensino Roseana Sarney Murad, “devido à necessidade de uma estrutura organizacional, com regimento, gestão e caixa escolar próprios, no referido anexo”.

O Maranhão, onde quase 40% da população é rural, é uma espécie de campeão das estatísticas negativas. Enquanto o Brasil tem 28% de trabalhadores sem carteira assinada, o percentual no estado supera os 50%. Na relação dos 15 municípios brasileiros com as menores rendas, listados pelo IBGE, nada menos do que dez cidades são maranhenses. O chefe do escritório regional do Instituto, Marcelo Melo, acrescenta ainda que apenas 6% dos maranhenses estudam em cursos de graduação, mestrado e doutorado. Separados, os números já assustam. Se combinados, o efeito é devastador.

— O resultado desses índices de qualificação é uma mão de obra de baixa qualidade.

O professor Marcelo Sampaio Carneiro, do Centro de Ciências Sociais da UFMA, explicou que a estrutura do mercado de trabalho no Maranhão possui duas características principais. A primeira é a elevada participação do trabalho agrícola no conjunto das ocupações, com destaque para os postos de trabalho gerados pela agricultura familiar. Por conta de diversos fatores, ele disse que tem havido uma forte destruição de postos de trabalho nesse setor. De acordo com o Censo Agropecuário, em 1996 existiam 1.331.864 pessoas ocupadas no campo maranhense; em 2006 esse número baixou para 994.144 pessoas. Isso explica, por exemplo, o arco de palafitas miseráveis que cerca o centro histórico de São Luís.

A segunda é a inexistência de ramos industriais dinâmicos que consigam absorver essa oferta de mão de obra, já que a principal atividade industrial no Maranhão é o beneficiamento primário de produtos minerais, como a fabricação de alumínio e alumina pela Alumar e a produção de ferro-gusa por pequenas unidades fabris instaladas ao longo da Estrada de Ferro Carajás. Por esse motivo, o estado, que nos anos 50, 60 e 70 do século passado recebia migrantes, passou, a partir dos anos 1980, a exportar mão de obra. E nem mesmo a sistemática transferência de recursos, via programas sociais, foi suficiente para deter esse esvaziamento:

— A transferência de renda pode até livrar as famílias da fome, mas não é capaz de dinamizar a economia da região — disse Carneiro.

[O Globo, 7 de maio de 2012, grifos do blogue]