Música em Ação capacita mais de 150 crianças e jovens em Cedral e Guimarães

[JP Turismo, Jornal Pequeno, hoje]

Idealizado e coordenado pelo professor Raimundo Luiz, ex-diretor da Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo, o projeto teve patrocínio da Wilson Sons através da Lei Federal de Incentivo à Cultura

O idealizador e coordenador Raimundo Luiz (o segundo a partir da direita) e professores das oficinas do projeto Música em Ação. Foto: divulgação
O idealizador e coordenador Raimundo Luiz (o segundo a partir da direita) e professores das oficinas do projeto Música em Ação. Foto: divulgação
Oficina do núcleo de cordas do projeto Música em Ação. Foto: divulgação
Oficina do núcleo de cordas do projeto Música em Ação. Foto: divulgação
Após sua palestra, o professor Daniel Lemos brindou os alunos com uma apresentação. Foto: divulgação
Após sua palestra, o professor Daniel Lemos brindou os alunos com uma apresentação. Foto: divulgação

“Eu tinha chegado na sessão na época e fiquei loucamente curioso pra saber que monte de coisa pretinha era aquela. “Ah, isso aqui é música, é partitura!”. Ela me levou à Escola de Música, em 1980, já fora do período de inscrição, me apresentou para a então diretora Olga Mohana. Ela já tinha esse sonho que nós temos até hoje, de ter uma Orquestra Sinfônica no estado. Ela já me viu tocando violino, já me ofereceu o violino pra estudar. Eu não tinha instrumento e queria isso mesmo”.

A fala é de um entusiasmado Raimundo Luiz, multi-instrumentista, professor aposentado e ex-diretor-geral da Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo, em seu depoimento à Chorografia do Maranhão, série de entrevistas publicadas por este repórter com os irmãos Ricarte e Rivânio Almeida Santos, posteriormente reunidas no livro homônimo, publicado em 2018 em parceria pelas editoras Pitomba! e Edufma.

O mesmo entusiasmo segue motivando o integrante do Instrumental Pixinguinha, formado por professores, nos corredores da Emem: Raimundo Luiz poderia estar se dedicando tão somente a curtir a aposentadoria ou as rodas boemias de choro da ilha que adotou o garoto vindo de Jacarequara, povoado de Cedral (Guimarães antes da emancipação), mas o amor pela música e pela educação musical seguem motivando-o a inventar ações como o projeto Música em Ação – Meio Norte Maranhão, que leva oficinas de educação musical, instrumentos e ações de contrapartidas sociais aos municípios de Guimarães e Cedral.

O projeto Música em Ação tem patrocínio da Wilson Sons, através da Lei Federal de Incentivo à Cultura, e é uma realização da Sol Maior Produção Musical, que já conta mais de 10 anos de atividades de produção na capital e sobretudo no interior do estado do Maranhão, em projetos artísticos e educativo nos quais tomaram parte integrantes dos corpos docentes das Universidades Estadual e Federal do Maranhão, além da Emem, entre outros. As atividades são desenvolvidas em escolas e sindicatos, através de parcerias com estes e as secretarias municipais de educação, além das próprias prefeituras municipais, que apoiam a iniciativa.

O projeto foi encerrado em fevereiro, tendo atendido mais de 150 alunos com oficinas de musicalização (flauta doce), cordas e sopros. “Estamos muito felizes em trabalhar na formação cultural de crianças e jovens destas cidades”, afirmou Raimundo Luiz, idealizador e coordenador do Música em Ação.

“Nós só temos a agradecer ao professor Raimundo Luiz por proporcionar esse projeto. Guimarães só tem a agradecer por este trabalho, a cidade só tem a ganhar, Guimarães é um grande celeiro musical”, afirmou Osvaldo Gomes, prefeito do município, reconhecido como berço do bumba meu boi sotaque de zabumba.

“Este projeto é algo que nós devemos incentivar e abraçar cada dia mais, para que ele seja fortalecido e possa acontecer. Sou muito feliz por poder ter a minha filha participando desse projeto”, declarou Fernanda Cardoso, mãe de aluna.

Maria Vitória, aluna do núcleo de cordas, também revela, emocionada: “eu tinha muita vontade de um dia pegar num violão, nunca tinha pegado; aí apareceu essa oportunidade e eu aproveitei, estou me sentindo muito bem”. Kahyo Martins, do mesmo núcleo, afirma: “eu gostei muito, a comunidade toda está envolvida, eu espero muito que continue no próximo ano”. Também do núcleo de cordas, Skarlleth Santos, realça o caráter social do ensino da música: “essa oportunidade que abriram para a gente foi muito importante, foi abrindo novas portas, e em vez de o jovem estar em outros lugares, está aqui, curtindo e aprendendo coisas novas. Em Guimarães, além da sede, o projeto chegou também à comunidade de Damásio, graças a uma parceria com o polo 20 do projeto Bombeiro-Mirim.

“A música, além de uma oportunidade de formação, de futuro para quem pratica, mas traz muitos valores juntos, é uma oportunidade de trabalhar educação, respeito, pertencimento, identidade, e é muito bom ver essa equipe trabalhando. Que venham mais projetos como esse, pois as crianças e jovens estão precisando de oportunidades”, afirmou Wagner Ramos, do departamento de responsabilidade social da Wilson Sons, que patrocina o projeto.

O pianista e professor Daniel Lemos, sintetiza: “Para mim foi uma honra tomar parte no projeto, com uma palestra intitulada “A música no currículo escolar”, seguida de uma intervenção musical. Projetos belíssimos como esse, que tem trazido a música para as crianças, mostrando a questão da formação cidadã, do qual a música é um tipo de conhecimento específico e muito importante para o desenvolvimento social de nosso país, o nosso futuro, e também importante destacar a questão da geração de renda, de você trazer os bolsistas, os trabalhadores, jogar esse recurso para regiões do interior, descentralizando o capital. É uma iniciativa muito importante e a gente espera que outras venham a acontecer no futuro. Estão de parabéns todos os membros da equipe, o professor Raimundo Luiz, e será sempre um prazer colaborar com iniciativas tão valiosas como essa”.

Subiu Canuto Santos, do Boi da Vila Passos

Mestre Canuto Santos, do Boi da Vila Passos (19/1/1925-5/8/2013)

“Quando era pequeno, quem me levava para assistir ao boi de zabumba era um senhor com quem me criei. Seu nome era Raimundo Nonato Sousa e o de meu pai era Raimundo Nonato Santos, só mudando o sobrenome.

Fui gostando da brincadeira de bumba-meu-boi e me adaptei. Além da brincadeira de bumba-boi, existiam, no interior, festas carnavalescas, mas, como o senhor com quem fui criado não gostava de carnaval, eu também não participava dessas festas.

Sempre gostei do boi de zabumba. Nunca quis participar de outro sotaque, porque onde nasci e me criei só tinha boi de zabumba, não tinha outro boi. Essa paixão é de criança!

[…]

Acho que puxei ao lado de minha mãe, porque meu pai não gostava de brincadeira, não dançava. Minha mãe era muito festeira. Gostava de Escola de Samba, de dançar. Puxei a ela.

Tem gente que parece que vem ao mundo só para encher o mundo de pernas.

[…]

A cidade de São Luís era só uma rua, pode-se dizer. Só ia até o Canto da Fabril, o chamado caminho grande. Tudo era no escuro. Isso aqui era mangue, apicum: a maré alta levava tudo. Assim era o mar na terra. A Vila Passos só tinha o nome de passos, pois até carro puxado a burro não podia entrar. Era só água.

Onde é o campo Nhozinho Santos, era um cemitério, chamado de Cemitério dos Passos. A partir de 1950, houve certo desenvolvimento. Aqui tudo era mato.

[…]

Na minha ausência, não sei quem vai assumir. Ninguém vai querer, porque não dão conta do recado. Existem vários descendentes de Misico [Raimundo Hemetério, de quem seu Canuto herdou o Boi da Vila Passos], mas eles não querem assumir. Se quisessem, teriam feito desde o início. Não quiseram. Estavam com tudo nas mãos. Acho até que, quando eu parar, a brincadeira pára.”

*

Trechos do depoimento de Canuto Santos (19/1/1925, Porto de Baixo, Guimarães/MA) à série Memória de velhos. Depoimentos: Uma contribuição à memória oral da cultura popular maranhense. São Luís: Lithograf, 1999 (p. 45-70), v. 5, grifos originais da edição; a foto que ilustra este post, de Albani Ramos, também foi roubada do volume.

No São João deste ano, Canuto não foi à Igreja de Nossa Senhora das Graças, na Vila Passos, receber a bênção para iniciar a temporada, como costumeiramente fazia, tendo sido representado por uma filha.

Estava em seus planos retornar à Guimarães natal, tendo este ano a matança do boi sido iniciada por lá, no povoado vimarense de Guajerutiua. Estava em meus planos entrevistar o “conterrâneo”. Cheguei atrasado. Requiescat in pace, mestre Canuto!