Carta aberta a parentes e amigos bolsominions

“Apesar de você, amanhã há de ser outro dia”
(Chico Buarque)

“É pena eu não ser burro; eu não sofria tanto”
(Raul Seixas)

“Meu coração não se cansa de ter esperança”, como cantou o recém-oitentão Caetano Veloso. Ao longo dos últimos quatro anos não foram poucas as vezes em que alertei parentes, amigos e conhecidos – ou deveria chamá-los todos/as de ex? – acerca do bolsonarismo, cuja máquina de mentir é tão perversa que acaba transformando seus próprios entusiastas em vítimas do próprio esquema.

Ainda em 2018 fui tachado por um par de parentes de “fanático”, adjetivo que acompanhava palavras como lulista, petista, dilmista, esquerdista ou comunista. Logo eu, que nunca deixei de fazer justas críticas ao PT e seus líderes enquanto o partido esteve no poder – ao contrário de quem, após um mandato inteiro de desmandos de Jair Bolsonaro, segue aplaudindo-o desavergonhada e acriticamente.

Falo de gente pobre, gente como eu. Não é nem gente remediada, que diante de qualquer emergência possa fazer um saque em uma poupança e resolver um imprevisto. Gente que se nega a perceber que é inaceitável o retorno do Brasil ao mapa da fome, sendo o país um dos maiores produtores de alimentos do mundo; gente que se nega a perceber que é impossível pagarmos tão caro por combustíveis fósseis, sendo o país um dos maiores produtores de combustíveis fósseis do mundo. A quem me lê agora e não simpatiza com Jair Bolsonaro e sua família, peço perdão pelas repetições e redundâncias, mas estas são necessárias, vocês sabem o porquê.

É claro que é muito mais fácil receber uma figurinha engraçada, um meme, um vídeo curto e imediatamente repassar por aplicativos de mensagens e redes sociais em geral. Mas nem sempre o mais fácil é o melhor ou o correto. Ler dá trabalho, interpretar texto dá trabalho, pesquisar dá trabalho – ter consciência de classe, então, nem se fala. Checar, então, se uma notícia é verdadeira ou não, mesmo que isto custe apenas perguntar a algum conhecido, dá muito trabalho.

“Mas esta checagem deveria ser papel dos próprios jornalistas”, uns podem argumentar, não sem razão. Sim, deveria: mas muitos de meus colegas de profissão sucumbiram ao bolsonarismo, mesmo que o líder neofascista seja uma ameaça ao exercício crítico e livre de nossa profissão, além de à nossa própria existência. Fora que não são apenas jornalistas que usam redes sociais, estas ferramentas que têm suas vantagens, mas também deram voz a uma legião de imbecis, como ainda teve tempo de afirmar Umberto Eco (1932-2016).

Um presidente da república é uma referência política, moral e cultural. Para o bem ou para o mal – e esta antítese está bem desgastada, quando a extrema-direita se posiciona como “o bem” para derrotar “o mal” (seja o comunismo, o lulismo, o petismo, a esquerda, os vermelhos), mesmo pecando, ao usar o nome de Deus em vão, para mentir. Cristianismo e bolsonarismo são doutrinas absolutamente incompatíveis.

Jair Bolsonaro se elegeu com a cantilena vazia do pseudocristianismo escondido em um de seus slogans de campanha: “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”, esgarçou o versículo bíblico do evangelho de São João. Na prática a teoria é outra e qualquer investigação sobre si ou sua família é colocada em sigilo de 100 anos.

Faço questão de escrever este texto puxando as coisas apenas pela memória, sem consultar links ou reler matérias – fosse citar exemplos cotidianos, uma carta aberta não seria suficiente, melhor seria escrever logo um livro, mas já há excelentes publicações revelando as entranhas do bolsonarismo e seu modus operandi, desde o processo que resultou em sua ida à reserva do Exército até a relação dele e sua família com as milícias cariocas.

O Partido dos Trabalhadores está fora do poder há seis anos e qualquer verdade dita a um simpatizante de Jair Bolsonaro ainda é invariavelmente rebatida com um “e o PT?”, “e o Lula?”, “e a Dilma?”. Em meio a isso, a prisão, covarde, pois injusta, pois sem provas, do maior líder político vivo da América latina, pelas mãos de um juiz e procuradores corruptos, o lavajatismo a serviço do bolsonarismo, cujos objetivos eram tirar das eleições de 2018 o então líder em todas as pesquisas de opinião e alimentar o antipetismo.

Mentiras têm pernas curtas: a farsa caiu, a casa dos golpistas caiu, e o governo Bolsonaro, quatro anos depois de eleito, nada tem para mostrar que tenha beneficiado a vida de qualquer brasileiro, a não ser a do próprio nanopresidente, de seus familiares e aliados de ocasião, cujas burras nunca enchem.

Vivemos há dois anos e meio uma crise sanitária global, com distintos comportamentos em relação a seu combate ao redor do mundo. A opção do Brasil governado pelo neofascismo foi retardar a compra de vacinas enquanto tentava negociar propinas e as sórdidas mentiras de toda ordem do Hitler tupiniquim que acabaram por colaborar para o inchaço do número de óbitos, hoje em mais de 700 mil, muitos dos quais poderiam ter sido evitados, se o adorador de Ustra tivesse agido em prol do povo, em vez de ficar imitando gente morrendo por falta de ar. Tudo indica que a história se repetirá com a varíola dos macacos, infelizmente.

Por vários motivos, diversos gênios da criação artística brasileira faleceram nos últimos anos: Agnaldo Timóteo (1936-2021), Aldir Blanc (1946-2020), Cassiano (1943-2021), Dona Inah (1935-2022), Flávio Migliaccio (1934-2020), João Gilberto (1931-2019), Letieres Leite (1959-2021), Mário Luiz Thompson (1945-2021), Moraes Moreira (1947-2020), Nelson Sargento (1924-2021), Paulo Diniz (1940-2022), Paulo Gustavo (1978-2021), Rubem Fonseca (1925-2020), Sérgio Sant’Anna (1941-2020), Tarcísio Meira (1935-2021). Em nenhum caso o ocupante do Palácio do Planalto decretou luto oficial, lançou nota de pesar ou sequer publicou qualquer coisa em redes sociais, manifestando condolências a familiares e fãs-clubes.

“Que diferença faria?”, poderão me perguntar. É o simbólico que nos diferencia dos animais. E este profundo desprezo pelas artes – tidas como coisa de esquerdistas – é um dos símbolos do fascismo.

Por falar nisso, apesar de este texto se intitular “Carta aberta a parentes e amigos bolsominions”, outra categoria poderia estar no título: não perdoo artistas bolsonaristas. É uma contradição em termos. O desmonte sistemático das políticas culturais – e do próprio Ministério da Cultura – já seria motivo suficiente para que o candidato à reeleição não encontrasse apoio entre a classe. E particularmente acredito que artistas, “as antenas da raça” no dizer de Ezra Pound (1885-1972), sejam bem maiores que bobagens como “mamata da Rouanet” ou “caixa preta do BNDES”.

Falando em mamata, por que é mesmo que quem se indigna com a corrupção só se indigna com a corrupção do PT? Os governos de Lula e Dilma, além dos investimentos em órgãos de controle e fiscalização, criaram o Portal da Transparência e nunca interferiram em aparelhos como a Polícia Federal a fim de livrar quaisquer de seus quadros em investigações. Lideranças petistas foram condenadas, presas, perderam cargos. Ou seja: foram punidos por seus crimes. Resumindo: cortaram na própria carne.

Apesar do desejo de alguns, no Brasil (ainda) não existe pena de morte – quer dizer, até existe informalmente, fora da lei, para a população negra, moradores de periferias e pequenos traficantes. Então o que explica o cinismo de quem até hoje se revolta com uma tapioca comprada com cartão corporativo, mas não se revolta com os milhões torrados diariamente pelo atual mandatário da república, sob a proteção dos sigilos centenários?

Volto aos artistas: aqueles que se respeitam e nutrem respeito por seu público têm lado e assumem. E não se trata de ser petista, lulista, dilmista ou beneficiário de leis de incentivo à cultura através de renúncia fiscal. Trata-se de assumir uma postura diante da encruzilhada civilização x barbárie, autoritarismo x democracia, alegria x tristeza, humanidade x desumanidade. O Brasil é o país da alegria e grande parte dela nos é dada por artistas – imaginem o que teria sido do isolamento social sem as lives, os streamings ou quaisquer outras formas de arte e entretenimento. Como podem artistas apoiarem quem representa a tristeza e a morte? Ou, a esta altura do campeonato, aferrarem-se a uma suposta neutralidade? “Se você fica neutro em situações de injustiça, você escolhe o lado do opressor”, já diria o Nobel da Paz Desmond Tutu (1931-2021).

Polarização existia nos tempos em que Lula e Dilma disputavam eleições contra Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso, José Serra e, entre outros, Geraldo Alckmin. Ora, se Alckmin entendeu a necessidade de alianças para livrar o Brasil do neofascismo e do neonazismo, qual é a sua dificuldade em entender?

Há uma barbárie em curso no Brasil, basta acompanhar o noticiário: do capoeirista Moa do Katendê (1954-2018), entre o primeiro e o segundo turnos da eleição de 2018, ao campeão mundial de jiu-jítsu Leandro Lo (1989-2022) no último fim de semana, passando pela vereadora Marielle Franco (1979-2018) e o motorista Anderson Gomes (1978-2018), o bolsonarismo mata. “Ah, mas o presidente não apertou o gatilho em nenhum destes casos”, apelará um/a bolsonarista, que deve, no entanto, acreditar na facada desferida por Adélio Bispo durante (te)at(r)o de campanha de Bolsonaro em 2018. De fato não puxou o gatilho, mas reiteradamente incentiva o ódio e a eliminação física de opositores em discursos, além de ter facilitado o porte e a posse de armas à população em geral, colaborando para o ambiente de terror e guerra civil que o Brasil, mais do que nunca, vive (ou morre?).

Qual terá sido o peso da postura de artistas contrários à ditadura militar brasileira instaurada em 1964 para o fim do regime de exceção em 1985? Obviamente é difícil calcular. Mas sua recusa em calar, que os levou a prisões, torturas, exílios, desaparecimentos e censuras, certamente colaborou para que o pesadelo acabasse. Não há clima, tempo, espaço, nem motivo para neutralidade. Goste-se ou não de Lula, do PT, ou de quaisquer nomes e partidos postos à disputa.

Não é preciso sentir dor para se indignar com a dor alheia. Não é preciso passar fome para se indignar com a fome alheia. Não é preciso ser negro para lutar contra o racismo. Não é preciso ser homossexual para lutar contra a homofobia e a violência que dela decorre. Não é preciso ser indígena para ser contra o desmatamento e o garimpo ilegais na floresta. Não é preciso ser mulher para se indignar contra os assustadoramente crescentes números de estupros e feminicídios. Basta ser humano e ter alguma empatia e alguma consciência de que o estímulo à lei da selva, por ação ou omissão, não nos serve nem nos representa.

Esta singela missiva é um último chamado à razão a parentes, amigos e artistas bolsonaristas. Errar é humano e não é vergonhoso admitir erros. Antes tarde do que nunca. Ainda é tempo de reconstruir o Brasil. Ou ao menos de não deixar terminarem de destruí-lo. Nem simpatizantes e defensores de Bolsonaro aguentariam um eventual segundo mandato deste governo da necropolítica e da destruição sistemática. Até por que, caso esta tragédia aconteça, sequer existirá Brasil. E quem diz/ia que foi enganado em 2018 não vai ter desculpa dessa vez.

São Luís/MA, 11 de agosto de 2022

Zema Ribeiro, jornalista antifascista

Pagu (1º./9/2010-2/8/2014)

Pagu partiu para alguma espécie de céu de bichos de estimação. Foto: Zema Ribeiro
Pagu partiu para alguma espécie de céu de bichos de estimação. Foto: Zema Ribeiro

 

Presente de Luana, prima de minha esposa, Pagu chegou à nossa casa, cuja decoração acabaria por influenciar, em 8 de dezembro de 2010 – já veio com o nome, que achamos por bem manter. Tinha três meses, nascera a 1º. de setembro. Encheu ainda mais a casa de alegria, era o xodó de crianças e adultos que nos visitam e foi personagem constante em meus perfis em redes sociais, sobretudo o instagram.

Lembro-me que, antes dela, não curtia bichos de estimação – havia criado passarinhos na infância, mas hoje tenho outras ideias sobre bichos presos – e Pagu mudou isso, embora minha afeição fosse por ela, apenas, e não por bichos de estimação em geral.

Pagu morreu na madrugada de hoje (2), na rua, vítima de um ataque de um grupo de cachorros, segundo o relato de um vizinho. Não cheguei a ver o corpo, embora tenha tido vontade.

Este texto não se pretende jornalismo, obituário, tributo ou coisa que o valha. É um texto egoísta, uma tentativa de minimizar o sofrimento de perguntas e comentários futuros de parentes e amigos que me leem, os membros do, digamos, “fã clube” da gata saudosa.

Bater, revidar, ignorar: pra tudo tem hora

Este ano este blogue completa 10 anos, somados os outros endereços por que passou antes de se instalar neste em definitivo, o que torna mais correto dizer que em abril próximo eu completo 10 anos blogando.

10 anos movidos por pura vontade e necessidade de dizer. Uma década sem um centavo de patrocínio público ou privado. Tempo de aprendizado, de cabeçadas, de arrependimentos, de textos ruins, mas também de evolução. Quase um terço da vida dedicados a indicar aos poucos mas fiéis leitores livros, discos e filmes de que gostei. Mas também de meter o bedelho onde não sou chamado. 10 anos entre agradar e desagradar, que nem Jesus Cristo foi unanimidade, não é, Nelson Rodrigues?

Mais que tudo, em abril próximo – se eu não desistir até lá – completo 10 anos de resistência e independência, num Maranhão em que quase tudo parece depender de apadrinhamentos políticos, cooptações, benesses, panelinhas e que tais.

São 10 anos dedicando meu tempo livre, ou roubando-o do trabalho ou da esposa, para fazer algo em que acredito. Não digo isso para jactar-me, mas não abro mão de minhas convicções e ideais.

Neste tempo, ganhei leitores, amigos e inimigos, ainda bem que não em igual proporção. Estive envolvido em debates importantes e necessários, mas em muita polêmica desnecessária e desgastante, sobretudo nas chamadas redes “sociais”. Coisa que não vale a pena.

Amadureci. Hoje prefiro canalizar esforços e energias mais concentradamente. Quem me conhece sabe que continuo sem fugir de uma boa briga. Mas ela tem que valer a pena. Gratuita ou não, não vou revidar uma agressão só pra demonstrar valentia. Assim sigo meu caminho.

Jair Bolsonaro: ignorante ou ignorante?

Parece que o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) e seu partido desistiram da presidência da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Uma boa notícia, ao menos. No vídeo, entre outras aberrações, ele diz que “Pedrinhas é a única coisa boa que tem no Maranhão”, um flagrante desrespeito com a população não apenas maranhense. Não, senhor deputado, não basta não cometer delitos para não ir parar em Pedrinhas. Ou o senhor desconhece a enorme quantidade de presos provisórios que cumprem pena maior que se tivessem tido condenação? Ou você não sabe que entre os últimos 65 mortos no sistema prisional maranhense havia inocentes? Que nesta estatística também estavam pessoas cujos delitos não chegam a ser tão hediondos quanto um assassinato, um estupro, um sequestro ou esse seu discurso típico de um general de pijamas, viúva da ditadura militar, até hoje lamentando-lhe o fim? Por que não defender o encarceramento em massa de políticos de colarinho branco que, através do desvio de recursos públicos, negam direitos e políticas públicas ao conjunto da população, contribuindo para o aumento assustador da criminalidade e da violência? Espero que depois de desistir da CDH o deputado seja obrigado a desistir, nas urnas, de sua vaga na Câmara dos Deputados.

Na minha infância eu costumava ouvir a palavra “ignorante” com dois significados: o dicionarizado, de quem ignora, não sabe, não conhece; e outro, usado para pessoas grosseiras. Quero saber em que categoria o deputado Jair Bolsonaro se enquadra. No fundo, na dos ignorantes que gostam de ser grotescos e repulsivos, folclóricos da pior maneira possível.

Mais justiça, mais segurança, mais direitos humanos, menos Felicianos, menos Bolsonaros!

[Com alguns acréscimos e revisão, outra nota que trago acá do facebook; a rede social não tem, por exemplo, um sistema de busca decente, e além do mais eu sou um homem de vícios antigos]

Caos no sistema penitenciário: há tempos o governo tem as mãos banhadas de sangue

Em cerca de 10 dias o saldo de mortos na Penitenciária de Pedrinhas chega a 18 – ontem (9) foram 13, mais 30 feridos – e o seríssimo problema tenta ser encoberto pela mídia governista como mera “guerra de gangues”. Puro cinismo! Outra tentativa dos poderosos de tapar o sol com a peneira foi responsabilizar a descoberta de um plano de fuga pela rebelião: não colou, um detento desmentiu a versão – no próprio jornal governista.

A tática é conhecida: membros de facções rivais são colocados juntos e o resultado é o banho de sangue que lava as páginas e ajuda a vender jornais. As autoridades tapam o nariz e fazem de conta que não têm nada a ver com isso. Hoje reforçada pela tecnologia e redes sociais, o mau gosto espalha-se rapidamente e em larga escala.

“Governar é cuidar das pessoas”, apregoa o slogan das propagandas governistas. A apática Roseana Sarney tem as mãos – se não o corpo todo – banhadas de sangue, após seguidas carnificinas, dentro e fora dos presídios. Se isto é cuidar das pessoas, melhor dispensar.

Aos mortos, sequer resta dignidade – algo que já não tiveram em vida – membros expostos no açougue humano para o deleite de um público de um freak horror show.

As redes sociais, as mesmas que proliferam os registros do terror, ajudam a espalhar boatos: um arrastão aqui, um não saiam de casa acolá. O que só torna as coisas ainda piores do que já estão, a realidade mais bruta e cruel que a ficção.

“Providências terão de ser tomadas”, disse Aluísio Mendes, secretário de segurança pública, ao jornal de seus patrões, O Estado do Maranhão. Há tempos deveriam ter sido tomadas: a começar pelo domínio da corrupção no sistema penitenciário, se não o que explica a entrada de drogas e armas em presídios?

Deixo um exemplo antigo, tão antigo que o próprio Aluísio Mendes já era secretário. Nem preciso dizer quem (já) era a governadora do Estado, preciso?

Perfil de Flávio Reis no facebook é falso

Com a capa do livro Guerrilhas de avatar e o nome do amigo e professor Flávio Reis, um falso perfil no facebook solicitou a amizade deste blogueiro ontem. Não aceitei de cara e desconfiei, chegando a ler as postagens: textos publicados por ele no jornal Vias de Fato, além de peças de divulgação de seu terceiro livro, lançado em 2012. O fake chegou a receber boas vindas de alguns amigos (reais) desavisados.

Por e-mail, o autor dos recém-relançados Cenas marginais e Grupos políticos e estrutura oligárquica no Maranhão, afirmou: “é claro que não sou eu. Tem como avisar lá? É muito chato alguém ficar falando como se fosse você”.

O recado está dado: o fã de João Gilberto – para citar alguém que tem perfil falso no facebook – não está nesta nem em qualquer rede social. O blogue ia noticiar marcando o fake, mas parece que quem quer que estivesse por trás disso já desistiu da empreitada.

A ‘milícia 36’ é a nova camisa do sequestrador?*

Não se sabe de onde partiu um vídeo que está garantindo gozos coletivos à blogosfera suja do Maranhão. E do Brasil, já que também entrou na onda Reinaldo Azevedo, da Veja, tido por seus alunos por estas bandas como “democrata” e apontado como o blogueiro mais lido do Brasil.

Não vou postar o vídeo aqui nem linkar ninguém: já o fiz em redes sociais (expressão que detesto, pois é exatamente o contrário). Leitores que se interessarem podem procurá-los, vídeo e links, em minhas contas no tuiter (grafia abrasileirada intencionalmente) e no facebook. Ou mesmo direto na blogosfera suja do Maranhão, o noticiário infectado infelizmente sempre liberado para banho.

Aos fatos. Acusam o candidato à prefeitura de São Luís Edivaldo Holanda Júnior (PTC) de montar uma milícia, um grupo paramilitar para “tocar o terror” contra o candidato João Castelo (PSDB). O vídeo tem coisas estranhas. A começar por quem filma. Quem o faz? Por que em alguns momentos filma sem interferência e mostra rostos e noutros concentra a câmera (um celular ou máquina digital) em pés ou na total escuridão, como se o fizesse às escondidas?

O vídeo é tosca e bizarramente editado: terão todos os seus momentos sido captados durante o mesmo evento? Por que foi postado por um fake (usuário apócrifo, anônimo) no youtube e encaminhado por e-mail (fake idem, milicia36@bol.com.br) a alguns internautas (conforme relataram a este blogueiro via tuiter)?

É possível imaginar a baba escorrendo nos teclados no momento exato em que alguns blogueiros faziam repercutir o vídeo, já assistido por mais de cinco mil pessoas no exato instante em que escrevo este texto, direto no painel do blogue.

Não digo nem que um candidato nem que outro seja culpado ou inocente, mas o vídeo mostra o nível a que chegou a política maranhense. De qualquer forma um episódio ridículo em se comprovando o envolvimento de qualquer candidato, de um lado ou de outro.

Uma coisa não deixa de ser engraçada: os mesmos blogueiros que condenam “a formação de uma milícia” filmada no vídeo que agora faz sucesso na internet costumam elogiar o trabalho da “briosa” (adjetivo que eles adoram) polícia militar e seu serviço velado.

O serviço velado, apelidado de “inteligência” da PM, age cotidianamente, tortura e extermina sobretudo a juventude da periferia de nossa capital. Nunca li uma linha de qualquer destes blogueiros criticando esta praga incrustada no seio da corporação.

A ação criminosa do serviço velado, protegida pela impunidade reinante, merece discussão séria e profunda. As polícias deveriam preparar uma ação para coibir a compra de votos e outras práticas espúrias nessa reta final de campanha, no dia da eleição, inclusive apurar e punir quem quer que tenha responsabilidades e lucre com o citado vídeo.

*Em 1989 os sequestradores do empresário Abílio Diniz (grupo Pão de Açúcar) apareceram na televisão vestindo camisas de Lula (à época a Justiça Eleitoral ainda permitia a distribuição de brindes como camisas a eleitores), então candidato do PT à presidência da República; o fato, junto da edição pela Rede Globo do debate entre os candidatos, ele e Fernando Collor (então no PRN), deu no que deu.

Nossa miséria cultural (ou: acorda, serpente!)

[Do Vias de Fato de maio]

Pode haver luz no fim do túnel, será um trem vindo na direção oposta?, Nossa Senhora da Vitória, rogai por nós!

POR ZEMA RIBEIRO

Um texto revoltado da cantora Nathália Ferro, publicado primeiro em sua conta no Facebook e depois repercutido por alguns periódicos locais, ganhou certa repercussão, apontando diversos problemas por que passa nossa produção cultural, digo, da Ilha de São Luís do Maranhão e do estado como um todo.

Criticava o marasmo a que está relegada a cena artística na capital maranhense, cujo aniversário de 400 anos se avizinha e sobre o que nada foi feito – aquele relógio ridículo na cabeceira da ponte do São Francisco, não conta.

A cantora criticava a tudo e a todos – e suas críticas, claro, eram merecidas, tendo sido repercutidas e comentadas também pelo poeta e compositor Joãozinho Ribeiro, ex-secretário de cultura do Estado do Maranhão, em sua coluna semanal no Jornal Pequeno.

Keyla Santana, atriz, também colocou a boca no trombone. Ela buscou o financiamento de uma peça em que atuava pela internet, num sistema de crowdfunding, financiamento coletivo já bastante utilizado no centro-sul do país, que aqui sequer engatinha, com razão: a iniciativa estatal aposta em mais do mesmo, a privada faz jus ao trocadilho. Como incentivar pessoas comuns, como este que escreve, o caro leitor, a cara leitora, a enfiar a mão no bolso e bancar o que quer que seja?

Diversos agentes culturais envolvidos com a feitura do projeto BR-135, capitaneado pelo casal Criolina, Alê Muniz e Luciana Simões, têm discutido propostas e possibilidades para que se avance no rumo da implementação de efetivas políticas públicas de cultura por estas plagas. Além de reuniões e debates, a galera está fazendo, se movimentando, mostrando nomes e coisas interessantes, misturando, experimentando. É daí e assim que pode surgir o novo.

Foi justamente o mote para o texto de Nathália Ferro: o pouco público presente às edições do BR-135, realizadas no Circo Cultural da Cidade, fruto inclusive, segundo ela, da desunião da classe artística local – alguns certamente mais preocupados com “meus projetos” e a procura por financiamentos (quase sempre estatais) para “meu próximo disco”, “meu próximo livro”, “minha próxima peça de teatro” ou mesmo para a inclusão de “meu show” no circuito junino.

O BR-135 tem a ideia de mostrar o que de novo a cena ilhéu tem produzido, numa demonstração de altruísmo digna de louvor: com o reconhecimento nacional que têm hoje, Alê Muniz e Luciana Simões sequer precisariam morar em São Luís. No entanto, preferem ficar, tentar fazer algo diferente e mostrar que é possível conquistar o país a partir da Ilha (sem qualquer daqueles adjetivos cuja maioria perdeu completamente o sentido).

Keyla Santana, pela internet, conseguiu algo próximo da metade dos três mil reais de que necessitava para botar seu bloco na rua, isto é, sua peça no palco de um teatro da capital, uma pequena temporada de dois dias. Para não perder o que alguns haviam investido, seu marido completou, do próprio bolso, a outra metade do valor restante.

Experiência bem sucedida de crowdfunding, fora da rede mundial de computadores, foi a realização do I Festival de Poesia do Papoético – Prêmio Maranhão Sobrinho, organizado pelo poeta e jornalista Paulo Melo Sousa. O Papoético, tertúlia semanal realizada no Bar Chico Discos, no centro da capital maranhense, é um espaço privilegiado para a discussão de assuntos relativos à arte e cultura, tendo aberto uma trincheira para os insatisfeitos com o status quo.

Paulão, como é mais conhecido seu mentor, levantou os fundos necessários à realização do festival principalmente entre os frequentadores habituais do debate-papo semanal, além de entre amigos, professores universitários e artistas em geral. O festival, cuja final será realizada dia 31 de maio no Teatro Alcione Nazaré, no Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, na Praia Grande, premiará em dinheiro os primeiros lugares em poema e interpretação e os segundos e terceiros lugares em cada categoria com livros, discos, revistas e outros produtos culturais, tudo arrecadado entre aqueles citados doadores e com a realização de rifas.

A organização solicitou ao Comitê Gestor dos 400 anos de São Luís, integrado por secretarias e órgãos públicos municipais e estaduais, apoio para a realização do festival, de orçamento modestíssimo. Sequer recebeu resposta, mostrando o desinteresse generalizado dos poderes públicos para qualquer iniciativa criativa que não parta de sua burocracia interna. O problema é que nada criativo parece vir dali. O festival recebeu mais de 100 inscrições de diversas cidades do Brasil e custou menos de 3 mil reais, com cortes em gorduras como material de divulgação (folders e cartazes), importantes em qualquer empreitada cultural.

Teimosos, os organizadores do Papoético já anunciam sua próxima invenção: um concurso de fotografia terá regulamento anunciado já em junho, com base no mesmo esquema. Dia 7, Chico Saldanha e Josias Sobrinho apresentam, no Chico Discos, o show DoBrado ResSonante, que estreou em Brasília/DF. Os ingressos custam R$ 20,00 e podem ser adquiridos antecipadamente no local. Toda a renda será revertida para a realização do concurso de fotografia.

O Estado – tanto faz ler prefeitura e/ou governo – é tímido e continua apostando apenas em grandes festas populares, quais sejam, os períodos carnavalesco e junino, salvo raríssimas exceções. É o que dá mídia, é, em tese, o que dá voto – sobretudo, embora pareça óbvio, em ano eleitoral.

Faltam cerca de 100 dias para o aniversário da cidade. Não se ouve falar ainda em programação ou, antes, em planejamento de quaisquer ações comemorativas. Mas não é por isso, ou não só por isso, que clamam os artistas revoltados, aqueles que não se satisfazem com o tilintar de umas poucas moedas nos pires, um tapinha nas costas, a logomarca de um órgão público em seu disco, livro ou programa, e, no fundo, um grande “cala a boca” em qualquer vírgula que se oponha às péssimas gestões que hoje têm o Maranhão e sua capital São Luís. E aqui o comentário não se restringe ao aspecto cultural.

O que estes artistas requerem, com propriedade, é a pulsação constante da Capital Americana da Cultura, é que ela faça jus ao título. Mais que um troféu, um papel, um certificado, um evento, São Luís e o Maranhão precisam deixar o passado e a teoria de lado. É preciso viver o presente e vivê-lo na prática: já não somos Athenas Brasileira – se é que um dia fomos – e mais que bumba meu boi e/ou tambor de crioula para turista ver, é preciso que nossos logradouros sejam ocupados por arte permanentemente. É capital da cultura ou não é?

São Luís e o Maranhão não estão as maravilhas anunciadas na televisão pelas gestões municipal e estadual. Na propaganda, tudo parece correr às mil maravilhas, de propaganda nossos gestores são bons – pudera, é preciso descarregar toneladas de maquiagem para ludibriar o povo e garantir a perpetuação dos grupos no poder. A realidade é outra e é esta que precisa ser enfrentada para que algo mude. Que não emudeçam os artistas que estão corajosamente tocando as feridas para curá-las. E que ao coro dos descontentes somem-se cada vez mais artistas. Ou não, que cultura é coisa de todos nós.

A nossa miséria cultural está exposta, fratura que carece de urgente cura. Só não sente nem vê quem não quer. Já é mais que hora dessa serpente acordar!

Melhor que o Google Maps

Amanhã é o lançamento da Campanha Popular pelo Direito Humano à Educação Pública, Gratuita e de Qualidade, iniciativa da Cáritas Brasileira Regional Maranhão, onde também trabalho, e outras entidades parceiras.

Aí o David, que trabalha comigo, pediu que eu desenhasse um mapa, indicando como chegar ao local; eu pensei que era um mapa para ele chegar e, quando me espantei, o desenho que eu fiz já tava rodando aí pelas redes sociais e arredores.

Como diriam os Mutantes: "não vá se perder por aí!"