sorrindo na praça [da igreja do desterro, ontem (16/9/2006), 18h]

Minha mãe e eu passávamos em frente à Praça do Pescador (Portinho), rumo ao Largo da Igreja do Desterro, quando percebemos uma morena olhando pra cima, na direção da secular construção de uma torre só, enquanto atravessava a Avenida. “Vocês sabem onde fica a Igreja do Desterro?”, perguntou-nos. “Vais ao Chorando na Praça? Estamos indo pra lá”, perguntei/respondi.

Subimos os três a escadaria por sobre a sede da Flor do Samba, ao lado do Bar da Didica. Os chorões já se aqueciam e os comerciantes pareciam, inicialmente, não acreditar na iniciativa: faltavam mesas e cadeiras para quem desejava sentar, ouvir boa música e, claro, tomar uma cerveja – que não chegou gelada do jeito que gostamos, mas foi, aos poucos, melhorando. Mais um pouco e (quase) todo mundo estava confortavelmente instalado.

Ricarte Almeida Santos – “incansável batalhador pelo chorinho no Maranhão”, como bem observou Adriana, pedagoga e bacharel em filosofia, ex-aluna do Lara Ribas (vulgo SESI do Santa Cruz), a morena do início do texto, com quem dividimos a mesa – anunciou o projeto: iniciativa do Clube do Choro do Maranhão, tinha até ali, apenas a Associação do Pessoal da Caixa como patrocinadora. “Chorando na Praça: o choro na comunidade” terá edições mensais por diversos bairros da capital maranhense, a exemplo do “Samba da Minha Terra”, que talvez tenha lhe inspirado. O próximo agraciado será o Anjo da Guarda, em data e local a confirmar [novidades em breve, neste blogue].

O Regional Tira-Teima abriu a noite. Entre os choros instrumentais, um cantado: “Ray-Ban”, de Cesar Teixeira. Não por coincidência, Paulo Trabulsi (cavaquinho solo) e Léo Capiba (pandeiro) – este com uma camisa preta com uma inusitada imagem de Kurt Cobain e a inscrição “Nirvana” – tocaram nessa faixa em “Shopping Brazil”, disco de estréia do autor.

O segundo grupo a tocar foi o Toque Brasileiro, liderado por Luiz Jr., um dos mais versáteis violonistas em atividade no Maranhão (ele que também tocou no excelente disco supra). Ele anuncia “Samba pra Lua”, música quilométrica do irmão Carlinhos Carvalho (piano), que “tá no nosso disco que nunca saiu…”. Ouve-se então uma espécie de chorinho progressivo. Depois, Luiz Jr. se coloca na trincheira de quem luta – com todas as forças, atesto a veracidade da fala – pela música instrumental no Estado. E brinca com o batido slogan do PSTU: “Só a luta muda a vida!”

É a vez do grupo Um a Zero – nome provavelmente inspirado na música homônima de Benedito Lacerda e Pixinguinha, ícone maior do gênero. “Um dos mais novos grupos de chorinho da cidade”, anuncia o incansável Ricarte, misto de produtor, assessor de imprensa, locutor e funções outras que aparece(re)m. O trio – violão, cavaquinho e pandeiro – ataca. É gol! Um a Zero. “Czardas” (de Vitório Monte), com o pandeiro entrando somente na parte mais acelerada da música. Dois a Zero. “Brasileirinho” (Waldir Azevedo). Três a Zero. É goleada! E a filha do jornalista e músico Hamilton Oliveira, um bebê que mal começou a andar, arrisca uns passinhos de dança e aplausos.

O Instrumental Pixinguinha – cuja formação é toda de professores da Escola de Música Lilah Lisboa – chega desfalcado. Zezé Alves (flauta) passa pela mesa e cumprimenta este escriba. Ao microfone, chamam Léo Capiba para substituir o pandeirista faltoso, além de Zezé, que parecia não ter se tocado, ainda, que já iria começar a apresentação de seu grupo.

Joãozinho Ribeiro, professor universitário, compositor e poeta que, menino, correu as ruas do Desterro onde morou – e, de coração, ainda mora e é habitado – é chamado para uma participação especial. Diz que lhe mexeram com a alma e o coração e anuncia a retomada do Projeto Serenata dos Amores, que outrora embalava quinzenais noites de sexta-feira das ruas, becos e ladeiras daquele bairro mágico: dia 29 de setembro, às 21h, o cortejo sairá da porta do Jornal Pequeno, indo – tocando, cantando, declamando poemas – até o Largo dos Amores, que é como se rebatiza o Largo da Igreja do Desterro por ocasião da Serenata. Com “S” maiúsculo.

Saiba Rapaz” (gravada por Josias Sobrinho) e “Milhões de Uns” (gravada por Célia Maria, música vencedora do Prêmio Universidade FM em 2002), ambas de sua autoria, são cantadas por Joãozinho Ribeiro, que se reveza ao microfone com a flauta de Zezé, que esbraveja gestualmente com o técnico de som. Encerrando sua participação, Joãozinho canta “Terra de Noel” (de Josias). Ele(s) não tira(m) o chapéu para qualquer vagabundo, como diz a letra do samba, mas para iniciativas como essa, de democratização do acesso à cultura para comunidades que muitas vezes não têm oportunidades, vale a pena tirar. Chapéu na mão, devolve a batuta ao Instrumental Pixinguinha, que executa ainda os clássicos “Delicado” (Waldir Azevedo) e “Santa Morena” (Jacob do Bandolim).

Uma jam-session mesclando músicos maranhenses e tocantinenses – que, de passagem pela Ilha, assistiam à estréia do projeto – formou-se, sob o comando do “tarado” Luiz Jr. Sopros, violão, alegria: a noite terminou em gafieira.

P.s.: se a ausência da namorada, que viajava a trabalho, não permitiu a plenitude da noite, este blogueiro arrumou outro motivo, lá em cima, para que nem tudo, na ocasião, fosse perfeito: uma péssima foto da ótima apresentação do Tira-Teima.

2 respostas para “sorrindo na praça [da igreja do desterro, ontem (16/9/2006), 18h]”

  1. Lembrei de ti.Hoje, fui à uma exposição sobre a história da propaganda política. Sobretudo cartazes. Foi exibido um curta, “Maranhão 66”, sobre a politicagem de Sarney… e suas promessas não cumpridas.Ah! Aqui em Vix teve o X Femusquim… algo parecido com o evento que participou.Muito bacana.

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