Uma amizade atávica

JP Turismo conversou com os poetas Celso Borges e Fernando Abreu sobre o lançamento de Akademia dos Párias: a poesia atravessa a rua, antologia que celebra os 30 anos do movimento poético que agitou a Ilha

POR ZEMA RIBEIRO
ESPECIAL PARA O JP TURISMO

Os poetas Celso Borges e Fernando Abreu durante entrevista no Cafofo da Tia Dica. Foto: ZR (29/4/2016)
Os poetas Celso Borges e Fernando Abreu durante entrevista no Cafofo da Tia Dica. Foto: ZR (29/4/2016)

Quando Fernando Abreu voltou à São Luís – “eu sou daqui, mas só nasci aqui; passei a infância em Grajaú”, localiza –, foi estudar piano. A Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo funcionava ao lado de sua casa, na Rua da Saavedra, no Centro da cidade, o que gerou uma pergunta de um desconfiado Gilles Lacroix, então professor do instrumento na instituição: “mas é só por isso que você quer estudar piano?”, referindo-se ao fato de ele morar perto da escola. “Não. Quero estudar piano por que quero ser músico”, respondeu.

Foi por pouco: Fabreu, como hoje o jornalista e poeta é conhecido pelos amigos mais íntimos e leitores em geral, não tinha, no entanto, piano em casa, para as lições. Olga Mohana, então diretora da EMEM, orientou-o a procurar dona Maria Eugênia Borges, que morava na Rua da Paz, também no Centro, e tinha um piano em casa. Era a mãe do poeta Celso Borges. Fabreu tinha por volta de 14 anos e CB estava às voltas com o lançamento de Cantanto [ed. do autor], sua estreia na poesia, de 1981.

“Uma amizade atávica”, exclama Fabreu, para lembrar-se, logo depois, de que o avô de Celso ajudara seu pai a se estabelecer em São Luís. “Ele ficou anos ocupando um imóvel, sem pagar aluguel. Com a barbearia custeou seu curso de odontologia, depois pagou os aluguéis, mas nada teria acontecido sem aquela força”, agradeceu.

As lembranças vão se emendando umas às outras como cigarros acesos nas baganas dos anteriores, embora ninguém fume durante a entrevista regada a água e coca-cola. No Cafofo da Tia Dica, detrás da Livraria Poeme-se, na Praia Grande, converso com os poetas sobre os 30 anos que a Akademia dos Párias, movimento integrado por eles nas décadas de 1980 e 90, completa em 2016, e que será comemorado com o lançamento da antologia Akademia dos Párias: a poesia atravessa a rua.

“Eu sou mais ou menos seis anos mais velho que toda a turma”, revela Celso, à época já formado em jornalismo pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) – onde grande parte dos párias se encontrou, principalmente nos corredores do curso de Comunicação Social –, pai de família e com carteira assinada no Sistema Mirante de Comunicação. “Eu tinha completa liberdade na rádio [Mirante FM, inaugurada há pouco], levei Ademar Danilo [jornalista e dj] para fazer o Reggae Night, ele já tinha um conhecimento fabuloso do ritmo”, lembra.

“A gente ouvia Bob Marley, Peter Tosh, Jimmy Cliff. Foi através de Ademar que começamos a ouvir outros nomes da Jamaica”, enumera Fabreu. “O estúdio era pequenininho, mas uma vez Celso levou a galera lá, botou a gente sentado no chão, crivou de perguntas e publicou uma entrevista”, conta. O papo saiu na Guarnicê, que era um encarte do jornal O Estado do Maranhão – depois a revista circularia de forma independente –, editada por Celso com Roberto Kenard e Joaquim Haickel.

Ronaldão lendo um poema no lançamento do número 3 da revista Uns & Outros, no bar de Betto Pereira, no São Francisco, em 1986 ou 87. Foto: acervo Párias.
Ronaldão lendo um poema no lançamento do número 3 da revista Uns & Outros, no bar de Betto Pereira, no São Francisco, em 1986 ou 87. Foto: acervo Párias.

“Outro cara importante foi Ronaldão. Era um cara versado em Bob Dylan, Kraftwerk, Pink Floyd. Encarnou um personagem, sumiu. Ninguém sabe por onde anda. A última vez que eu falei com ele, ao telefone, foi em 1997. Guaracy [Brito Jr.] também já sacava muito de música, Joy Division”, Celso lista outros autores de poemas que estarão na antologia.

Indago-lhe o critério de seleção. Ele não titubeia: “primeiro os poemas que sobreviveram ao momento; depois, poemas que tinham o espírito pária. São 25 poetas, muitos deles só publicaram ali, na Uns & outros [revista editada pela Akademia dos Párias], naquele momento”, revela. O único poema que não saiu na revista foi justamente Pária, de Celso Borges, que encerra seu Pelo avesso [1985]: “somos poucos/ cada vez menos/ somos loucos/ cada vez mais”, diz um trecho do poema, que não por acaso ilustrava a camisa que o poeta escolheu para conversar com o JP Turismo. Vestido de preto, Fabreu saudava o citado Bob Marley e sua One love. Paz, amor e poesia, bem traduzindo o clima pária.

Influências – O surgimento da Akademia dos Párias se dá no apagar das luzes da ditadura militar brasileira, que assombrou o país por 21 anos. “Coincidiu também com uma abertura gráfica, editoras como a Brasiliense começaram a publicar [Paulo] Leminski, Chacal, John Fante, [Charles] Bukowski”, lista Fabreu. “Caprichos e relaxos, Drops de abril, Pergunte ao pó, Cartas da rua e Mulheres eram bíblias, uma espécie de Pentateuco particular”, enumera CB.

Galera Pária no antigo Hotel Quatro Rodas, em 1986. Foto: acervo Párias
Galera Pária no antigo Hotel Quatro Rodas, em 1986. Foto: acervo Párias

“Nós éramos amados e odiados em igual medida. Muita gente adorava, a gente vendia revistas, fazia saraus em bares e, claro, bebia muito. Outros chamavam a gente de “viado”, por que era tudo muito orgânico, a gente se abraçava, se beijava em público”, lembra Fabreu. E completa, pensando em Allen Ginsberg, Jack Kerouac e companhia: “mal comparando, éramos como os beats, ao redor de quem orbitavam também figuras que não escreviam ou escreviam ocasionalmente”.

Uns & outros – A revista Uns & Outros teve oito números publicados em 10 anos – o último saiu em 1996. “Havia uma necessidade de publicar. As pessoas estavam escrevendo, de repente se reunia o material, se cotizava e pensava-se que com o dinheiro da venda da revista a gente pagaria o que ficou devendo na gráfica e investiria no próximo número: mas a farra era grande e nunca havia caixa”, ri Fabreu.

“Gosto de pensar na importância da revista. Havia um vazio. Se pensarmos no que foi feito em termos de agito literário nas décadas anteriores, é nada. É claro que havia os livros de [os poetas Bandeira] Tribuzzi, Nauro [Machado], [José] Chagas – mas outras leituras nos interessavam mais. A Uns & Outros serviu para mostrar que poesia podia ser feita por quem não é da Academia Maranhense de Letras e eu gosto de pensar que anos depois, embora soe estranho, já que eu fiz parte também, influenciou, por exemplo, a revista Pitomba!”, celebra Celso.

ServiçoAkademia dos Párias: a poesia atravessa a rua, a antologia, será lançada no próximo dia 19 de maio (quinta-feira), às 19h, na livraria Poeme-se (Rua João Gualberto, 52, Praia Grande), com recital de poesia.

[Jornal Pequeno, JP Turismo, sexta-feira, 6 de maio de 2016]

Os ringues de Fernando Abreu

Manual de pintura rupestre. Capa. Reprodução
Manual de pintura rupestre. Capa. Reprodução

Feito um poeta do século passado, o jornalista Fernando Abreu, 51 anos completados no último dia 12, funcionário concursado, bate ponto em um órgão público, mas sua poesia está longe do enfado e da burocracia.

Quem o conhece sabe da raridade de suas aparições públicas. Seu tempo ocioso, e bote bastantes aspas em ocioso, gasta lendo, sobretudo poesia, e ouvindo música.

Seus poemas não se contentam com a página do livro, embora não a menosprezem. Se, num país que não lê, poesia menos ainda, é preciso ganhar alguns ouvidos, “me deixa ser guru dessa galera”, como diz uma parceria do poeta com Zeca Baleiro.

Sua fama de eremita é conhecida entre os amigos, que festejam suas raras presenças em eventos literários – com o poeta Eduardo Júlio foi curador da Feira do Livro de São Luís ano passado.

Um dia após o Dia Nacional da Poesia, Fernando Abreu, ou simplesmente Fabreu, para os mais íntimos, sai de casa amanhã (15) para lançar seu Manual de pintura rupestre [7Letras, 2015, 75 p., R$ 20,00 no lançamento].

É o quarto livro de Fabreu, ex-integrante da Akademia dos Párias, movimento poético que fez barulho na Ilha na década de 1980 e início da de 90. Manual de pintura rupestre, seu primeiro título publicado por uma grande editora, aparece depois de Aliado involuntário [Exodus, 2011], O umbigo do mudo [Clara Editora, 2003] e Relatos do escambau [Exodus, 1998]. A Exodus é uma casa inventada pelo poeta para se publicar.

Se nos dois primeiros livros seus poemas estavam mais para Leminski e Oswald de Andrade, entre a piada, a rapidez, o chiste de mesa de bar, e no penúltimo terem ganhado volume, neste quarto título Fabreu atingiu um nível de maturidade poética fruto de exercício, leitura e autocrítica.

Apesar do salto, Fabreu é um poeta pé no chão. “Quem lida com esse negócio de escrever e publicar poesia não pode alimentar muitas ilusões pra não se frustrar. Começa que não somos um país de leitores, e muito menos de poesia”, declarou ao Homem de vícios antigos, sem que sua fala soe amarga.

“No caso da 7Letras me atraiu o cuidado que eles tem com seus produtos em termos de acabamento, programação visual etc. Geralmente os livros são bem bonitos, e o meu não fugiu à regra”, continua, sem falsa modéstia.

De suas leituras cotidianas, muitas referências estão em Manual de pintura rupestre. Se os poetas são “as antenas da raça”, como nos ensinou Pound, a sintonia de Fabreu aponta em várias direções.

A começar por Terence Mckenna, filósofo e etnobotânico norte-americano que emprestou uma das epígrafes da obra – a outra é de Jorge de Lima: “o xamã é o ancestral remoto do poeta e do artista”, diz um trecho dO alimento dos deuses.

Em tempos de instantâneos no instagram e descartáveis no snapchat, o grande trunfo de um poeta é lapidar poesia onde ninguém mais a enxerga, num mundo cada vez mais embrutecido. O cotidiano é matéria-prima de Fabreu: “uma xícara de café fumegante/ o rosto de alguém que caminha/ lembrando de uma música/ amantes fugindo a pé do fim do mundo/ o cachorro paciente esperando pra atravessar/ na faixa de pedestres”, observa em Aqui agora, poema que abre este Manual de pintura rupestre.

O estado das coisas abre o leque de referências de Fabreu que percorrerá as páginas desta sua nova obra, citando Lord Byron, Glauco Mattoso e Dylan Thomas. Uns citados textualmente, outros na sutileza da sacada, ao longo do livro aparecerão ainda Carl Gustav Jung, Carlos Drummond de Andrade, Friedrich Engels (não confundir com outro Friedrich, o Hegel), Gonçalves Dias, Herbert Marcuse, João Bosco e Aldir Blanc, João Carlos Martins, Karl Marx, Noel Rosa, Roberto Bolaño, Rosa Luxemburgo, Sigmund Freud, Wilhelm Reich, William Blake, William Burroughs e William Carlos Williams.

Fabreu está sintonizado em poesia, música, política, denúncia social, crítica aos mercadores da fé televisionada, psicanálise, futebol, filosofia, erotismo. “quando não escrevendo nada/ ser mais poeta do que nunca/ todo antenas poros sentidos/ ser que se trespassa de tambores/ a palavra antes da palavra”, o Mestre sala dos ares é ótima síntese ou cartão de visitas.

Serviço – O poeta Fernando Abreu lança Manual de pintura rupestre nesta terça-feira (15), às 18h30, na Galeria Trapiche Santo Ângelo (Praia Grande, em frente ao Terminal de Integração). A noite de autógrafos terá recital com os Mamutes Elétricos: Fernando Abreu (voz e poemas), Erivaldo Gomes (percussão) e Marcos Magah (voz e guitarra).

Leia em primeira mão três poemas de Manual de pintura rupestre:

DA BOCA PRA FORA

vai com deus, papai!
no sinal que acaba de abrir,
aceito a bênção do menino
mesmo não tendo
as moedas
para o pão ou pedra
que, por segundos, iluminariam
suas entranhas ou sua mente
no vão dessa noite brasileira
em que me vejo órfão de uma dor
que sequer mereço sentir

DE UM COMERCIAL DE TV

depois de atravessar a cidade
sob os olhares agradecidos da multidão
o boneco gigante anunciando
ofertas imperdíveis
foi se postar por trás da loja principal da rede
onde
do alto de seus
mais de dez metros de altura
abençoou os fiéis

PARALELAS

qual é a diferença
entre o revolucionário
que recusa a esmola ao mendigo
para não atrasar o fim da burguesia
e o burguês piedoso
que nega a mesma moeda
ao mesmo mendigo
porquevaitudopracachaça&crack?

[pp. 31, 33, 35]

Arqueologia poética

Aos 26 anos Mayra Fontebasso cursa o último período de Letras na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), no interior paulista. Natural de Itu, a mãe da Clarice ganha a vida mexendo ou produzindo textos alheios: “pesquisadores, professores universitários, advogados, jornalistas, escritores e políticos que querem textos e discursos mais bem elaborados” procuram a moça à frente da Leitura Profissional, onde escreve, edita, revisa e traduz.

Mayra é também contadora de histórias e diz gostar “de fingir que toco chorinho ao violão”. Ela segue sem se levar muito a sério: “descobri que estudo literatura e tento fazer isso a sério, mas falta dinheiro”, apresenta-se.

Raça nº. 13, 1929. Capa. Reprodução
Raça nº. 13, 1929. Capa. Reprodução

Sua pesquisa de conclusão de curso é sobre “Os modernistas e a revista Raça (1927-1934)”, sob orientação do Prof. Dr. Wilton José Marques e, faz questão de frisar, apoio financeiro do CNPq. A publicação circulou na região no período assinalado.

Ela revela desde sempre se interessar “pela história do interior paulista e seus arranjos políticos pautados por interesses oligárquicos e perpetuadores de desigualdades que persistem até hoje”. Reside em São Carlos/SP desde 2008 e a partir de um estágio na Fundação Pró-Memória local passou a estudar a “falsa vanguarda” do movimento modernista Verde-Amarelo a partir de sua manifestação literária na revista são-carlense do final dos anos 1920.

Foi em meio a essa pesquisa que deu com os óculos em três poemas desconhecidos de Carlos Drummond de Andrade [1902-1987] publicados na Raça. É ela quem prefere, com razão, o termo “desconhecidos” em vez de “inéditos”, já que embora não constem de nenhum livro do autor, antologias ou estudos sobre sua obra, os poemas foram publicados na revista (leia-os ao final deste post). É um Drummond inocente, bem diferente do que reconheceríamos como um dos maiores poetas brasileiros do século passado, efígie das notas de cinquenta cruzados novos, homenagem póstuma da Casa da Moeda brasileira no final da década de 1980 – o verso da nota trazia o poema Canção amiga, musicada por Milton Nascimento em 1978.

Sobre os achados Mayra Fontebasso conversou com o Homem de vícios antigos.

A pesquisadora metendo os óculos nos perdidos de Drummond. Foto: Wilson Aiello
A pesquisadora metendo os óculos nos perdidos de Drummond. Foto: Wilson Aiello

Como foi o seu grito de “eureka!” ao se deparar com os três poemas desconhecidos de Drummond?
Na verdade as reações foram mais como “Quem é o charlatão se passando por Drummond?” e um “Ahhh, duvido que seja Drummond! Não tem nem o Andrade na assinatura…”. Acho que qualquer leitor do consagrado itabirano teria essa reação ao se deparar com os poemas. Eu, particularmente, conhecia a obra do poeta apenas a partir do livro Alguma poesia [1930]; além do mais, no periódico são-carlense que estudo – a revista Raça, publicada entre 1927 e 1934 – é comum vários colaboradores assinarem com pseudônimos, uma estratégia para evitar desafetos com leitores e para os editores ‘encherem’ as páginas da revista, já que provavelmente vários textos sem autoria e mesmo com nomes suspeitos eram produzidos por eles. Ainda, os poemas eram assinados por um “Carlos Drummond”, sem o Andrade, o que de início me chamou a atenção. Bastou a leitura de alguns títulos especializados, porém, para eu ter a certeza de que essa era uma assinatura do poeta muito utilizada ao longo dos anos 1920. Tirei a teima por meio do livro organizado pelo professor Antônio Carlos Secchin, chamado 25 poemas da triste alegria [CosacNaify, 2012], escrito por Drummond em 1924 e até então desconhecido. Nesse livro há um texto sobre os pseudônimos utilizados por Drummond, o que me levou à Bibliografia comentada de Carlos Drummond de Andrade minuciosamente organizada por Fernando Py, que fez um levantamento de toda a obra drummondiana publicada de 1918 a 1934 [2ª. edição, aumentada; Fundação Casa de Rui Barbosa, 2002]. Em nenhum destes livros os poemas da revista são-carlense apareciam, nem mesmo no Inventário do Arquivo Carlos Drummond de Andrade, que possui mais de dois mil itens aos cuidados da Fundação Casa de Rui Barbosa, encontrei qualquer referência aos poemas da Raça. Com esses livros foi que passei a conhecer o jovem Drummond que publicava principalmente no jornal republicano Diário de Minas. Inclusive suspeito que haja uma coletânea de mais de 140 poemas-em-prosa semelhantes a estes que encontrei em uma monografia defendida na UFMG que, infelizmente, não está disponível para leitura online em lugar nenhum e já virou um mito para mim. Preciso passar por Minas Gerais e correr atrás desse trabalho.

Você é estudante do último período de Letras. Sua pesquisa é sobre a revista Raça. Qual a abordagem de seu trabalho monográfico?
Olha, a abordagem é a paixão em enxergar na literatura toda uma organização de pensamento sobre o que se falava e se escrevia em uma dada época. Vou tentar simplificar: gosto de pensar sobre como se relacionavam num determinado período a obra literária, no caso a revista Raça, o seu público leitor e a sociedade que permitiu que essa obra surgisse e circulasse. Dizem que essa é uma abordagem historiográfica, mas desconfio que esse seja o nome que deram para essas pessoas loucas como eu que amam papeis antigos e “fontes primárias” que nos fazem espirrar e que são um amontoado de peças de um quebra-cabeça que dificilmente poderá ser completado. Estudando a Raça tenho a oportunidade de entender melhor como pensava a ala mais conservadora do movimento modernista, aquela vinculada aos Verde-Amarelos como Cassiano Ricardo, Menotti del Picchia e Plínio Salgado, para citar alguns nomes que aparecem na revista. Consigo, então, olhar ao mesmo tempo para o movimento modernista a nível nacional conflitando-o com o dado local, com a recepção de suas ideias e com as articulações de intelectuais conhecidos com personalidades locais que possuíam um projeto de construção para um país, um projeto de nação calcado na definição do que seria justamente a “raça brasileira” em meio aos mitos do caldeamento e da mistura entre o que denominam – nessa ordem hierárquica –como bandeirantes paulistas, indígenas e negros. Na minha pesquisa pretendo delinear melhor quem são e como pensavam os escritores modernistas que contribuíram para a revista são-carlense, discutindo o projeto editorial que sustentava um projeto de nação para o Brasil. Já no TCC o tema Drummond será incontornável e vamos ver o quanto conseguirei me aprofundar na produção de juventude do poeta.

Os poemas de Drummond são ruins, o que é justificável: era então um autor bastante jovem e ainda desconhecido. Como você os localizaria dentro da obra do poeta? Acha que ele se envergonharia deles?
Eu sou bem na minha, sabe? Sou mãe, lutei muito para chegar perto de concluir minha graduação, sempre tive que trabalhar para me manter na universidade, sei que não li nem um quinto do que deveria ter lido até agora para fazer o que faço… Aliás, suspeito muito do que faço e do que penso, e tenho certeza que esse badalo todo o Drummond é que criou só para se vingar de mim aumentando expectativas em torno da minha pesquisa [risos]. Certamente ele detestaria o que estou fazendo. Não gosto de dizer que os poemas são ruins, prefiro dizer que são imaturos, ingênuos, “manjados”; mas têm o seu encanto justamente por nos lembrar de que o Drummond não nasceu grande. Ele também seguiu modelos, idolatrou outros poetas, por vezes os imitou descaradamente até achar o seu próprio estilo e publicou essas “bobeiras de juventude” loucamente, passando a vida negando essas produções e tentando escondê-las. São poemas-em-prosa (ou prosa poética), um estilo de escrita usado por muitos poetas porque permite certa narração mais próxima à realidade ao mesmo tempo em que contém elementos poéticos como o ritmo e a métrica, as metáforas, as imagens resgatadas por meio da linguagem poética. Drummond escreveu muitos poemas-em-prosa, então não é uma novidade para os estudiosos, mas esses achados reforçam o que o pesquisador John Gledson apontou já nos anos 1980 [Poesia e Poética de Carlos Drummond de Andrade, Ed. Duas Cidades, 1981]: Drummond não nasceu moderno e passou por um processo de formação, embora ainda haja certa resistência a essa leitura. São poemas “penumbristas” porque se vinculam a uma tendência literária do período de transição entre os séculos XIX e XX no Brasil, pré-modernista, como chamam os especialistas. O Penumbrismo não chegou nem a ser uma “escola literária”, foi mais uma estética, um estilo calcado nos poetas franceses e italianos que tratavam de temas intimistas. No Rio de Janeiro, onde residiam escritores como Ronald de Carvalho, que inclusive cunhou o termo “penumbrismo”, essa estética era mais difundida. Nos anos 1920 o jovem Drummond lia muito Ronald de Carvalho e também Guilherme de Almeida, Ribeiro Couto e Eduardo Guimaraens, todos tributários dessa “atitude penumbrista”. Os traços simbolistas dos poemas que encontrei fazem referência a um Alphonsus de Guimaraens, por exemplo, muito lido e admirado por Drummond. São poemas com o “espírito” da época, “penumbristas” devido às várias reticências e ao tom melancólico e de solidariedade com um outro que não sabemos quem é; e “simbolistas” por evocar imagens como as “mãos soluçantes que dançam”, as “mãos viúvas que tateiam insones” etc. Em uma análise mais séria esses traços são vários e em um artigo futuro pretendo aprofundá-los.

A obra de Drummond vem sendo reeditada pela Companhia das Letras. Você é leitora de Drummond e de poesia em geral? Dele, qual o seu livro predileto? E quais são os teus outros poetas de cabeceira?

A pesquisadora tietando a estátua do poeta em Copacabana. Foto: acervo pessoal
A pesquisadora tietando a estátua do poeta em Copacabana. Foto: acervo pessoal

Eu bebo prosa e transpiro poesia. Não sei se sou boa leitora, mas vou longe quando consigo tempo para ler e até brinco de escrever, nada sério. As reedições de Drummond sempre me deixam ansiosa. Quem dera o mercado editorial fosse mais robusto para os livros não serem tão caros, mas faltam leitores… Livros são caríssimos para mim! É raro eu conseguir comprar alguma edição nova, sorte que existem sebos e bibliotecas. De todos os livros do Drummond é A rosa do povo o que sempre me comove mais, me leva aos prantos e depois me faz rir, me dá um soco no estômago e depois me faz caminhar com fé. A ilustração da primeira edição desse livro logo estará na minha pele, só preciso arranjar tempo para terminar umas adaptações na arte de Santa Rosa [risos], vou colocar mais mulheres nela. Minha cabeceira da cama é um fuzuê. Um vai-e-vem de livros e desenhos e rabiscos… Tem coisa que nunca sai de lá e que nem sempre está em livro. É que tenho o hábito de transcrever o que gosto em pedaços de papeis que se espalham espontaneamente por toda a casa. Cotidianamente, para ficar só na poesia, me deparo com Carolina Maria de Jesus, Manoel de Barros, Patativa do Assaré e Hilda Hilst. Drummond fica sempre ali no cantinho, ele pesa em livro. Tem para todos os humores. Ana Cristina César, Adélia Prado, Cora Coralina, a Patrícia Galvão… Acho que parei no tempo. Olhando aqui ainda vejo um Cacaso de bolso e um Murilo Mendes praticamente impassível em suas letras prateadas.

E de nomes contemporâneos, em prosa ou poesia, você tem lido alguém? Alguém que tenha te chamado a atenção?
Eu parei mesmo no tempo. Leio pouco ou quase nada contemporâneo, não por falta de influência, já que tenho uma porção de amigos que vive comentando várias obras. Gosto muito da escrita do [Milton] Hatoum, [Ariano] Suassuna, e de Paulo Lins, [Luiz] Ruffato, Marcelino [Freire]… Posso ir para fora do Brasil? Morro de amores pelo [José] Saramago… O restante eu realmente não tive meios ainda de sentar para conhecer além dos nomes e da fama.

E já é possível responder quais são os seus planos após a conclusão do curso de Letras?
Depois do curso de Letras eu pretendo ganhar dinheiro [risos]. Falando sério, não sei ainda se a carreira acadêmica é pra mim, pois embora eu ame pesquisar, os recursos para essa área de estudo são escassos. Gosto de agito cultural, de antropofagia literária e a coisa sempre me parece acomodada demais nas universidades. Adoro a ideia de dar aulas para jovens! Quem sabe algum projeto surja desse desejo de transformar as pessoas por meio da literatura… Talvez eu tente uma Pós-Graduação para continuar estudando o pensamento conservador na literatura brasileira, ou talvez eu parta mesmo para projetos e ajude a divulgar o que encontrei para estimular outros pesquisadores. Nesse rolo todo o certo é que continuarei trabalhando com revisões, traduções e aprimoramento de textos. Há oito anos tenho uma empresa nessa área, a Leitura Profissional, e meus clientes são pesquisadores, professores universitários,  advogados, jornalistas, escritores e políticos que querem textos e discursos mais bem elaborados. Primeiro me formo, depois vejo onde hei de fincar minhas raízes.

Fac símile da página com os poemas perdidos do jovem Drummond. Reprodução
Fac símile da página com os poemas perdidos do jovem Drummond. Reprodução

POEMAS PERDIDOS

Revista Raça, nº. 13, jun.1929, p. 32 – São Carlos/SP

Acervo de Octavio C. Damiano – Fundação Pró-Memória de São Carlos

[Ortografia atualizada pela pesquisadora. O poema compõe parte do corpus da pesquisa de iniciação científica Os modernistas e a revista Raça (1927-1934), empreendida por Mayra de Souza Fontebasso sob a orientação do Prof. Dr. Wilton José Marques (Departamento de Letras/UFSCar) e o financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Contato: leituraprofissional@gmail.com]

O poema das mãos soluçantes, que se erguem num desejo e numa súplica

Como são belas as tuas mãos, como são belas as tuas mãos pálidas como uma canção em surdina…
As tuas mãos dançam a dança incerta do desejo, e afagam, e beijam e apertam…
As tuas mãos procuram no alto a lâmpada invisível, a lâmpada que nunca será tocada…
As tuas mãos procuram no alto a flor silenciosa, a flor que nunca será colhida…
Como é bela a volúpia inútil de teus dedos…

O poema das mãos que não terão outras mãos numa tarde fria de Junho

Pobres das mãos viúvas, mãos compridas e desoladas, que procuram em vão, desejam em vão…
Há em torno a elas a tristeza infinita de qualquer coisa que se perdeu para sempre…
E as mãos viúvas se encarquilham, trêmulas, cheias de rugas, vazias de outras mãos…
E as mãos viúvas tateiam, insones, − as friorentas mãos viúvas…

O poema dos olhos que adormeceram vendo a beleza da terra

Tudo eles viram, viram as águas quietas e suaves, as águas inquietas e sombrias…
E viram a alma das paisagens sob o outono, o voo dos pássaros vadios, e os crepúsculos sanguejantes…
E viram toda a beleza da terra, esparsa nas flores e nas nuvens, nos recantos de sombra e no dorso voluptuoso das colinas…
E a beleza da terra se fechou sobre eles e adormeceram vendo a beleza da terra…

Carlos Drummond

Obra em progresso: primeira chamada

E 2016 começou!

Amanhã (5), a partir das 19h, no Chico Discos, Reuben da Cunha Rocha lança os primeiros três volumes (de um total de meia dúzia) de Siga os sinais na brasa longa do haxixe [Pitomba!], poética epopeia sci-fi.

A entrada é franca, cada volume custa a bagatela de 10 reais.

Busca

O poeta Joãozinho Ribeiro resgatou, entre objetos deixados por um cunhado recentemente falecido, um trecho do poema Guerra que te quero paz, que segue publicado ao fim deste post. O intento é encontrar o restante do poema, com alguém que o autor de Milhões de uns possa tê-lo compartilhado no passado. Notem: Joãozinho não procura um parceiro para fechar o poema. Quer saber se, entre os amigos de longa data, alguém sabe, lembra, viu, tem cópia com a outra parte etc., etc., etc. Se alguém puder ajudar, agradecemos antecipadamente.

GUERRA QUE TE QUERO PAZ

Entre as feridas da bomba
Uma criança sem rosto
Vagueia pelos subúrbios
Da cidade destruída
Catando os cacos de infância
Subtraídos da vida

Sem pátria, sem geografia
Perdida num continente,
Delinquente, guerrilheira,
Ensaia para o futuro
Uma canção de esperança
Bordada em letras de muro

Dos cacos que vai juntando
Edifica sobre as perdas
Uma palavra sofrida
Que vaza as dores do mundo
Queixando as rosas da vida
Esmagadas num segundo

A palavra peregrina,
Imitando o voo dos pássaros
Sobe alpes, cordilheiras,
Invade vitrines, praças,
Devassa quartéis, igrejas
Pelos países que passa

Bumba meu dub

Vibração poética. Foto: ZR (12/12/2015)
Vibrações poéticas. Foto: ZR (12/12/2015)

 

Jornalistas de profissão, o poeta Celso Borges e o DJ Otávio Rodrigues inventaram Poesia Dub em 2004, quando ambos viviam em São Paulo. O nome do espetáculo de poesia no palco, para muito além da leitura de poemas com trilha sonora, remete a uma das especialidades de Otávio, um dos maiores especialistas em Jamaica no Brasil, mas sem se prender a ele.

Embora com apresentações bissextas – Celso Borges voltou a morar em São Luís em 2009 – Poesia Dub já passou por várias formações. Ontem (12), na Praça Nauro Machado, na programação do Festival BR135, foi apresentado por Celso Borges (voz e poemas), Otávio Rodrigues (trilhas, efeitos e percussão adicional), Luiz Cláudio (percussão) e Gerson da Conceição (contrabaixo).

Linguagem abriu a apresentação. É um poema em que o autor convida os espectadores a ouvir, falar, lamber, chupar, morder a sua língua, a linguagem enquanto vírus, não à toa Celso Borges ser chamado de “homem poesia” por alguns, dada sua dedicação à causa. Quase um “vai vir o dia quando tudo que eu diga seja poesia”, de Paulo Leminski, homenageado em Morto vivo: “aos quarenta e quatro” – idade com que o curitibano faleceu – “ainda dói o óbvio”, falacanta CB. “Estou vivo na idade do morto, Leminski”, diz noutro trecho, como a dizer que apesar do mundo estamos aí, “que nem assino embaixo/ que nem moscoviteio/ que nem capricho/ que nem relaxo”, citando alguns de seus poemas mais conhecidos e o clássico Caprichos e relaxos.

Paulicéia é uma ode a São Paulo e São Luís, os dois santos de sua vida, “um em cada um dos meus ombros, trocando sempre de lugar. Ora protetores, ora algozes”, como me declarou CB em uma entrevista em 2007. Rima Fiesp com Masp, símbolos paulistas, e Pompeia com Coreia e Divineia, bairros de lá e cá, com o “venta loló/ pra esse barco andar”, de Chico Maranhão, de refrão. No final, uma homenagem a Torquato Neto: “leve o homem e o boi ao matadouro; quem gritar primeiro é o homem mesmo que seja o boi”.

Otávio Rodrigues programa dub e reggae, mas também ladainhas, tambor de crioula, bumba meu boi e Cordel do Fogo Encantado. Em Ode a Rico Rodriguez, o trombone do mestre jamaicano nascido em Cuba, falecido em setembro passado. “Um dos mais importantes nomes do reggae, integrante dos Skatalites ainda nos anos 1960”, frisou Gerson da Conceição. “Me apaixonei por Rico Rodriguez ao ser apresentado à sua música, no começo dos anos 2000, por Otávio Rodrigues”, agradeceu Celso Borges. “O pobre Rodrigues”, brincou Otávio.

“Eu quero ver quem ainda vai ter medo da Praia Grande!”, bradou Celso, festejando o público do BR135, que ocupou duas praças do bairro nas três noites da programação do festival que ajudou a formatar.

Poesia Dub merece urgentemente registro em disco. Relevante serviço prestado à música e à poesia, é injusto que seus apreciadores fiquem à mercê dos encontros de Celso Borges e Otávio Rodrigues no palco, infelizmente mais raros que um 29 de fevereiro.

Cor de sangue

Arte: Junião (originalmente publicada aqui)
Arte: Junião (originalmente publicada no Ponte)

 

Cinquenta tiros,
média 10 pra cada um.

“A carne mais barata
do mercado
é a carne negra”.

A PM resolveu
tingi-la de vermelho,
quem sabe não lhe
altera o valor?

Branco, só o carro
em que estavam.
Não há espaço
pra lágrima incolor
quando o sangue jorra aos borbotões.

Yesterday!

O poeta Nauro Machado (2/8/1935-28/11/2015. Foto Marcia Carvalho
O poeta Nauro Machado (2/8/1935-28/11/2015). Foto Marcia Carvalho

 

CESAR TEIXEIRA*

Enfim, Nauro Machado venceu sua olimpíada. Aos 80 anos conseguiu romper a corda umbilical de um espaço que, segundo ele próprio, não era seu, “mas do universo” – para a surpresa da Morte, na outra ponta da corda, depois de ver seus planos estratégicos caírem por terra.

O poeta retornou à casa Paterna não como um filho pródigo arrependido, que recebe de prêmio um novilho cevado, mesmo porque não desperdiçou a sua herança, nem abandonou sua cidade como na parábola. Ao contrário, desde a publicação de Campo sem Base, em 1958, não parou de escrever. Foram 37 livros de poesia, além de antologias, ensaios e artigos.

Era esse o seu ofício, e São Luís a sua inspiradora oficina, não obstante o inferno burocrático das repartições públicas. Para tanto, adaptou-se ao cardápio da dor, do sofrimento e até mesmo do “escárnio da (…) província”, a fim de eliminar o homem ilusório e edificar o poeta.

Compartilhava líricas alfarrobas (menos as dos porcos) com prostitutas e artistas amaldiçoados nos becos da Praia Grande e do Desterro, e saudava deus e o mundo com a expressão “meu poeta, meu cabo de guerra”, fosse um deputado ou um chofer de táxi.

“Yesterday!” era sua palavra de ordem, ou melhor, seu canto de guerra inacabado, quando as fartas doses de Santo Antônio dos Lopes sem mel faziam transbordar no poeta uma mistura de alegria e dor – naufrágio íntimo no esôfago da alma, que nos tornaria cúmplices e irmãos de infortúnio.

Somente John Lennon ou o Marinheiro Popeye poderiam nos salvar. E tudo foi ontem.

Nauro Machado retornou ao útero de Deus, “feliz e sofrido, mas verdadeiro”, por ter preenchido o seu espaço com a sua poesia, feito a areia fina de uma milagrosa ampulheta, após consumir toda uma existência e completar-se. Estava morto e reviveu: o filho pródigo agora pode caminhar com seus próprios pés.

Até breve, meu poeta, meu cabo de guerra!

*Cesar Teixeira é jornalista e compositor

Nauro Machado: uma existência consumida pela poesia

 

Todos os sábados o poeta visitava seus pais. Morador do Centro em alguns intervalos da vida, eu mesmo encontrei-o várias vezes no percurso. Às vezes, apenas cumprimentávamo-nos e ele seguia seu caminho; às vezes atrasava-se para o compromisso semanal, quando esticávamos a conversa, sobre temas os mais diversos. O curioso é que a morada de seus pais é o Cemitério do Gavião, no bairro da Madre Deus.

“Não há poesia experimental sem vida experimental”, ensinou-nos Roberto Piva, outro grande. E eu via naquele gesto do poeta, pura poesia. Cumprimentava-me, como de resto a quase todo mundo, “meu poeta!”. A expressão “meu poeta, meu cabo de guerra!”, cunhada por ele, é, até hoje, usada por este obituarista e alguns conhecidos, como saudação.

Nascido em São Luís do Maranhão em 2 de agosto de 1935, Nauro Diniz Machado faleceu na madrugada de hoje (28), aos 80 anos. Tinha hérnia no intestino e há poucos anos lutou contra um câncer no esôfago, período lembrado em Esôfago terminal, seu penúltimo livro, lançado em 2014 – o último, O baldio som de Deus, foi publicado em setembro passado.

Nauro era casado com a também poeta Arlete Nogueira da Cruz, com quem teve um filho, o cineasta Frederico Machado, cujo Infernos, que abre este post, é um retrato cinematográfico do pai, abordando sua dedicação à poesia, a boemia, o alcoolismo e sua relação com a cidade natal. Narrado pelo próprio poeta, o enredo do filme é construído sobre alguns de seus poemas.

No primeiro poema, O parto, de seu primeiro livro, Campo sem base [1958], Nauro Machado já prenunciava suas quase seis décadas restantes: “Meu corpo está completo, o homem – não o poeta./ Mas eu quero e é necessário/ que me sofra e me solidifique em poeta,/ que destrua desde já o supérfluo e o ilusório/ e me alucine na essência de mim e das coisas,/ para depois, feliz e sofrido, mas verdadeiro,/ trazer-me à tona do poema/ com um grito de alarma e de alarde:/ ser poeta é duro e dura/ e consome toda/ uma existência”.

O velório de Nauro Machado está acontecendo na Casa de Antonio Lobo (Rua da Paz, 84, Centro), sede da Academia Maranhense de Letras (AML), da qual não era membro por opção. O sepultamento acontece amanhã (29), às 10h, no Cemitério do Gavião.

Hoje

Divulgação
Divulgação

 

A partir das 19h. Recital com os poetas Celso Borges e Moisés Nobre (e outros que certamente chegarão sem ser anunciados).

Música e poesia de Wilson Zara e Salgado Maranhão visitam Socorro

A Vila Socorro, a 15 km da sede do município de Governador Eugênio Barros/MA, será palco de um raro encontro: neste sábado (10), às 20h, o cantor Wilson Zara e o poeta Salgado Maranhão apresentam-se em uma Noite Cultural, que será realizada na Praça Raimundo Rocha, a praça principal do lugar, em apresentações gratuitas.

A iniciativa é organizada por um grupo de professores. Para um deles, Evando Barros, que ensina alunos do fundamental em Parnarama, o principal objetivo da atividade é “promover o envolvimento cultural, abrir a mente das pessoas”, declarou.

“A cultura musical está muito banalizada, basta ligar o rádio e perceber. De poesia, então, nem se fala. Escolhemos o Zara para mostrar que a música de qualidade ainda persiste, tem espaço. A presença de Salgado Maranhão, poeta nascido na região, também é uma grande honra para nós”, continou Evando.

O poeta Salgado Maranhão em foto de seu fb
O poeta Salgado Maranhão em foto de seu fb

Salgado Maranhão dialogará com os presentes sobre “a poética do retorno” e lerá poemas de sua lavra, com destaque para textos de seu título mais recente, Ópera de nãos [7Letras, 2015]. Wilson Zara mostrará um repertório que vai além de rótulos como “cantor de barzinho” ou “cover de Raul Seixas”. Seu amplo cardápio musical vai de Arrigo Barnabé a Zé Ramalho, passando por Beatles, Belchior, Bob Dylan, Cesar Teixeira, Fagner, Geraldo Azevedo, Milton Nascimento e Zeca Baleiro, entre outros, além de composições autorais.

O cantor Wilson Zara em foto de seu fb
O cantor Wilson Zara em foto de seu fb

Zara (voz e violão) estará acompanhado de sua banda, formada por Mauro Izzy (contrabaixo), Moisés Profeta (guitarra e efeitos) e Marjone (bateria).

Biografias – Salgado Maranhão (José Salgado Santos) nasceu em Caxias/MA, em 1953. Só aprendeu a ler aos 15 anos. Formado em Comunicação pela PUC/SP, tem vários livros publicados e parcerias gravadas por diversos nomes da MPB. Vive no Rio de Janeiro desde 1973. Lá, em 1978, publicou seu primeiro livro, Ebulição da escrivatura: treze poetas impossíveis. Até hoje publicou outros 11, tendo vencido o Jabuti em 1999 com Mural de ventos. Ano passado foi um dos homenageados da Feira do Livro de São Luís.

Natural de Barra do Corda/MA, Wilson Zara (Wilson Oliveira da Silva) abandonou o curso de Letras e o ofício de bancário para dedicar-se integralmente à música. Apresenta-se regularmente na noite ludovicense, onde vive desde o início dos anos 1990. Anualmente apresenta o espetáculo Tributo a Raul Seixas, em homenagem ao roqueiro baiano. Atualmente percorre o Maranhão com o músico Nosly, nas oficinas de teoria musical aplicada à música popular Trilhas e Tons II.

Gritos que não calam

Lambendo e vociferando a cria. Foto: Josoaldo Lima Rêgo
Lambendo e vociferando a cria. Foto: Josoaldo Lima Rêgo

 

Um grito urgente e desesperado ilustra em preto e branco a capa de Fúria, novo petardo poético que Celso Borges lança hoje (16), logo mais às 19h, na Galeria Trapiche Santo Angelo (em frente ao Terminal de Integração da Praia Grande), com entrada franca – a revista custa R$ 20,00 e por ocasião do lançamento, quem comprá-la leva de brinde um cartão postal de Diego Dourado, que assina as ilustrações de Fúria – incluindo capa e contracapa.

Eles já estiveram juntos em Trezeatravéstreze, exposição na Galeria Hum (São Francisco) que juntou 13 poetas e 13 artistas plásticos em um diálogo cultural entre poesia e artes plásticas no mínimo interessante e quiçá então inédito por estas plagas – a que torna agora este par.

Áurea Maranhão e Cláudio Marconcine encarnarão Zuleika e Tavares em performance hoje à noite. Foto: Márcio Vasconcelos
Áurea Maranhão e Cláudio Marconcine encarnarão Zuleika e Tavares em performance hoje à noite. Foto: Márcio Vasconcelos

 

A noite de autógrafos terá exposição de reproduções de 10 ilustrações da revista, além de performance poético-teatral de Áurea Maranhão e Cláudio Marconcine. Ela interpreta Zuleika, ele Tavares, com base em Bazar Belle Epoque, poema de Celso que acabou ficando de fora da revista, em que o poeta critica a sociedade de consumo.

A maioria dos poemas é publicada pela primeira vez em Fúria, apesar de Celso Borges, aqui e acolá, já os ter dito em palcos diversos. Desde XXI (2000), seu primeiro livro-cd, o poeta vem experimentando os atritos entre o poema pensado para o suporte de papel (o livro, no caso, agora, a revista) e o poema se aproximando da música (para além de uma leitura com fundo musical), ele que também é letrista de música e coleciona um invejável rol de parceiros.

Nos últimos anos o poeta tem se apresentado em diversos espetáculos, com vários formatos e parceiros, fazendo a poesia subir ao palco como atração principal. Ele já fazia isso em São Paulo, onde morou por 20 anos, mas coincidiu da frequência se acentuar com seu retorno à Ilha natal, em meados de 2009. Os poemas de Fúria já foram experimentados no palco e bem merecem também registro em disco.

Não à toa conhecido como “homem-poesia”, Celso Borges é um dos maiores poetas e agitadores culturais destas plagas. Desde fins da década de 1970, quando cursava jornalismo na Universidade Federal do Maranhão, participou da feitura de diversas revistas, e Fúria é também uma espécie de homenagem a elas: Arte e Vivência, Guarnicê, Uns & Outros e mais recentemente a Pitomba!, que editou com Reuben da Cunha Rocha e Bruno Azevêdo, por cuja editora homônima se publica o lançamento de hoje. É também uma homenagem a Coyote e Oroboro, duas importantes revistas de literatura nacionais, em que CB também foi publicado, além de fazer uma “calorosa referência à Navilouca, revista de um único e decisivo número, no início dos 70, inspiração presente em quase tudo o que fiz editorialmente”, como ele mesmo afirma em Em lugar de um livro, à guisa de apresentação da revista.

O poeta “está sempre inventando novas guerrilhas para manter sua maquinaria sensível em movimento”, atesta o poeta Ademir Assunção em Fúria contra a falta de delicadeza, um baita endosso ao fazer poético de CB.

Uma das ilustrações de Fúria. Diego Dourado. Reprodução
Uma das ilustrações de Fúria. Diego Dourado. Reprodução

 

A sintonia entre as ilustrações nervosas de Diego Dourado – também poeta – e os poemas furiosos de Celso Borges desafina o coro dos contentes: “prefiro a fúria hemorrágica/ às rimas de hemorroidas”, avisa em Cuidado! Poemas e ilustrações – com ecos de Picasso, Edvard Munch e de nossa violência cotidiana – nascem desse incômodo com o que está posto e parece tão natural.

Por não ser natural uma cidade decrépita transformar seus casarões patrimônio da humanidade em estacionamento surgem poemas como Blockbuster, escrito num acesso de fúria quando o poeta recebeu a notícia de que a casa em que Aluísio Azevedo escreveu O mulato viraria estacionamento. Seu “refrão” é “estacionamento o caralho!/ estacionamento o caralho!”

Ou Canção do exílio: a vingança e Louvação pelo avesso, em que ele destripa poemas canônicos de Gonçalves Dias e Bandeira Tribuzzi, sem perder a delicadeza nem o respeito e o bom humor. Neste, publicado no jornal Vias de Fato, por ocasião do aniversário de 400 anos da capital maranhense, ele saúda: “parabéns, atenas brasileira/ pelos decanos parnasianos/ pelos orelhas de abanos/ parabéns, frança equinocial/ pelos roseanos carcamanos palacianos/ parabéns, ilha do amor, ilha magnética/ pelos danos e esganos”; naquele, opera um mash up de Luiz Ayrão com Gonçalves Dias, em meio à imundície fruto de nossa falta de educação cotidiana e do descaso político (tão ou mais imundo quanto): “olhe aqui preste atenção esta é a nossa canção/ minha terra tem fios elétricos/ onde cantam os bentivis/ nas prisões cabezas cortadas/ no palácio leões senis/ (…)/ nas calçadas cocôs de cães, na assembleia os imbecis”.

“Raiva é energia”, nos ensinou John Lydon. Fúria é energia e urgência, que os berros não podem ficar presos à garganta.

Museu Russo apresenta hoje (25) leitura bilíngue de Maiakovski

Divulgação do recital circulada em redes sociais. Arte: Aleksandr Ródtchenko
Divulgação do recital circulada em redes sociais. Arte: Aleksandr Ródtchenko

 

Carinhosamente apelidado de Museu Russo, o ECI Museum, na rua 14 de Julho (Praia Grande, ao lado da Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo), será palco de uma leitura inédita do russo Vladimir Maiakovski (1893-1930), considerado “o poeta da revolução” – não à toa o epíteto serve de subtítulo a uma conhecia biografia sua, de Aleksandr Mikhailov [Record, 2008].

Intitulado Gente é pra brilhar a tertúlia acontece hoje (25), às 19h, com entrada franca. Tomam parte os poetas maranhenses Celso Borges, Fernando Abreu, Josoaldo Lima Rego e Luís Inácio, além do escritor Adriano Sousa, que recentemente lançou em São Luís o livro Poética de Júlio Bressane: Cinema(s) da Transcriação [Educ/Fapesp, 2015], fruto de sua tese de doutorado. O recital contará ainda com a participação especial de Anastassia Bytsenko, doutora em literatura russa pela Universidade de São Paulo (USP), e Eugenio Itskovich, do ECI Museum.

Gente é pra brilhar será bilíngue; os dois últimos lerão poemas de Maiakovski em sua língua mãe. O arsenal vai muito além de “melhor morrer de vodca que de tédio” e o “sou todo coração”, que de tão conhecidos e repetidos podem, por vezes, ser atribuídos a outros, na selva das redes sociais.

O poeta Celso Borges não nega Maiakovski entre os de sua preferência. Ele antecipa a dinâmica do evento. “Cada um de nós falará quatro poemas do escritor russo, com prioridade para as traduções dos Irmãos Augusto e Haroldo de Campos e de Boris Schnaiderman. Será muito interessante também podermos ouvi-lo na sonoridade da língua russa”, declarou.

Leia um poema de Maiakovski:

Reprodução
Reprodução

A festa de poesia, música e causos de Jessier Quirino

Vizinhos de grito. Capa. Reprodução

 

Ao lançar seu primeiro livro pela recifense Bagaço, que até então trabalhava exclusivamente com literatura infantil, o paraibano Jessier Quirino colocou a pequena editora no circuito nacional. Sucesso de crítica e público, Paisagem de interior predestinava a carreira do arquiteto de formação, poeta, músico e contador de causos por vocação.

Jessier Quirino seguiu fiel à Bagaço, por onde lançou outros livros e discos – era necessário gravar sua voz, já que certos trejeitos e entonações a palavra grafada na página não era capaz de transmitir. Assim surgiram os dois volumes de Paisagem de interior, após livros como Papel de bodega, Bandeira nordestina, Prosa morena e Agruras da lata d’água, entre outros. São oito livros e dois cds.

No youtube, diversos vídeos com seu nome atingem a marca de 300 mil visualizações cada, poucos postados por ele próprio. O fenômeno instigou-o a lançar Vizinhos de grito [2015, R$ 35,00 na Passa Disco], dvd do espetáculo homônimo, também publicado pela Bagaço.

A gravação aconteceu dias 5 e 6 de abril de 2013, no Teatro Boa Vista, em Recife/PE, tendo sido veiculada meses depois pela Globo Nordeste como parte das programações de fim de ano da emissora. Nos extras, trechos da participação de Jessier Quirino no programa Ensaio, comandado por Fernando Faro, além de uma entrevista com o artista.

Jessier Quirino é acompanhado por Adriano Ismael (baixolão e violoncelo), Antonio China (percussão), Claudia Beija (vocal), Laerte Bandeira (violão nylon), Matheus Quirino (percussão), Roberto Muniz (violão 12 cordas, violão sete cordas e sanfona), Vitor Quirino (violão aço e violão nylon) e Ylana Queiroga (vocal).

A apresentação mistura a poesia de Jessier Quirino – falada e escrita, o dvd acompanha libreto com as letras –, causos e música, popular e erudita. O Bolero de Isabel (Jessier Quirino), por exemplo, cita o quase homônimo Bolero, de Ravel, e Uma paixão pra Santinha (Jessier Quirino) traz em si o Estudo nº. 6 de Fernando Sor.

Matança (Augusto Jatobá) tem a participação de Xangai, responsável pela popularização da música. Maciel Melo participa de Paisagem de interior (Jessier Quirino), a que mescla sua Rainha de todos os dias. Ele volta ao palco em Mistério da fé, parceria de ambos.

Não faltam ao roteiro números clássicos e por demais conhecidos de Jessier Quirino, como Parafuso de cabo de serrote (Jessier Quirino), Coco do pé de manga (Jessier Quirino), recém gravada por Túlio Borges em seu novo disco, Batente de pau de casarão, e Papel de bodega (Jessier Quirino), desenvolvida a partir dos versos de Boneca de trapo (Adelino Moreira), que traz como incidental o Choro abodegado (Roberto Muniz).

Para ver e ouvir, dançar ou sorrir, Vizinhos de grito é dvd bastante apropriado. É o produto ideal para rodar, por exemplo, em tevês de barzinhos pelo Brasil. Já que é difícil conquistar este espaço (em disputa), recomendo-lhe começar pela sala de sua casa: os vizinhos (de grito) que virem/ouvirem se interessarão.

A vida e o som da Eddie

Morte e vida. Capa. Reprodução
Morte e vida. Capa. Reprodução

 

“Preto velho, pense merda não, que o mundo já tá cheio, isso não é solução”. Há tempos um refrão não grudava tão fortemente em minha cabeça. É de Queira não, faixa de abertura de Morte e vida (2015), novo da banda Eddie, sexto da carreira, sucessor de Veraneio (2011) – todos os álbuns estão disponíveis para download gratuito no site da banda.

Pergunto a Fábio Trummer, vocalista, guitarrista e letrista da Eddie, qual o lugar e o sentido do álbum físico hoje, quando, sinal dos tempos, os discos podem ser baixados antes de lançados. “O álbum são as musicas, o conjunto, o conceito, a embalagem. É uma forma de termos isso fisicamente, uma sensação de posse deste conceito cantado e tocado pelo Eddie, no caso, mas que ganha sentido na interpretação e apego do público”, comenta.

A banda se completa com Alexandre Urêa (percussão e voz), Andret Oliveira (teclado e trompete), Kiko Meira (bateria) e Rob Meira (contrabaixo). O disco reafirma seu “original Olinda style” – título do segundo álbum, de 2002 – como uma das vozes mais originais surgidas em meio ao manguebeat, o mais recente movimento musical relevante do Brasil – e lá se vão mais de 20 anos –, centrado em Pernambuco, nordeste do país.

Em Morte e vida reaparecem os elementos que caracterizam a banda, presentes desde a estreia, Sonic mambo (1998), o que confere à Eddie já quase 20 anos de carreira, se tomarmos apenas o disco inaugural como marco. Estão lá a denúncia social e a festa, mais o amor – tema constante no novo disco – e o diálogo com a literatura – neste caso, mais explicitamente desde o título, que evoca o clássico Morte e vida Severina, de João Cabral de Melo Neto.

O álbum não é, no entanto, inspirado na obra do poeta pernambucano. “Na verdade isso foi uma coincidência. Apesar de saber do peso do nome, o Morte e vida do álbum veio de um trabalho de mesmo nome dos artistas plásticos Mozart Fernandes e do colombiano Alberto Lizarazo, embora o conceito do Morte e vida Severina se repita aqui no álbum, estes ciclos de morte e vida na existência. O Cabral é uma escola minha”, explica Fábio Trummer.

A propósito, indaguei-lhe sobre a falta de interesse do poeta por música. “O Cabral tinha tanta música nos seus versos que deve ter gasto os ouvidos do homem. Faria coleções de álbuns com os poemas dele”, elogia Trummer.

A faixa-título dialoga diretamente com Buraco de bala, do disco de estreia. “A prova do crime é o corpo/ a prova de Deus/ ao provar a bala, morto/ a prova morreu”, diz a letra de Morte e vida.

Ano passado, o vocalista havia revelado a influência do escritor uruguaio Eduardo Galeano, recém-falecido, e seu As veias abertas da América Latina, em seu projeto solo Super Sub América, em que se aliou com Dieguito Reis (bateria) e Luca Bori (contrabaixo), ambos conterrâneos do Vivendo do Ócio.

Presenças constantes em discos da Eddie, Karina Buhr e Erasto Vasconcelos – irmão de Naná – comparecem: ela canta em Longe de chegar, Pedrada certeira e na faixa-título; ele canta e toca percussão em Alimenta o compositor e toca percussão e assina (em parceria com Trummer, Kiko e Rob Meira) Olho você – inspirado rock que fecha o disco, a poesia da recusa da mulher amada: “lá nos sonhos os sóis são azuis, como um mar, como um céu, como um blues”.

“Ah, eu nunca mais vou esquecer/ aquele beijo foi sensacional/ quando é bom o tempo passa/ mais depressa que a percepção”. Carnaval de bolso, marcha frevada e surfada, exprime a síntese “eddieana”: “um ano inteiro de ressaca/ é hora do juízo final”. É música/álbum para dançar (também), mas pode ser ouvida(o) o ano inteiro.