Entre o riso e a desgraça, A cabeça do santo tem inspiração fantástica

Foto: Márcio Vasconcelos
Foto: Márcio Vasconcelos

Livro da cearense Socorro Acioli começou a ser moldado quando autora participou de oficina de contos com Gabriel García Márquez.

A publicidade do novo livro de Socorro Acioli – vencedora do Jabuti de literatura infantil ano passado, com Ela tem olhos de céu – tem sido feita toda sobre a oficina de contos ministrada pelo recém-falecido Gabriel García Márquez, de que ela participou. Faz sentido. Certamente sua participação no concorridíssimo evento do colombiano, ganhador do prêmio Nobel de Literatura, ajudou a cearense a moldar seu romance A cabeça do santo [Companhia das Letras, 168 p., 2014; leia um trecho], cujas ideias iniciais foram concebidas ali.

O livro conta a história de Samuel, ateu que parte em direção à fictícia Candeia, no real Ceará, para atender ao pedido de sua mãe moribunda: encontrar seu pai e sua avó, que o rapaz não conhecia. Samuel torna-se o típico romeiro, perdendo tudo pelo caminho, até chegar à cidade, ser mal recebido pela mulher recomendada e ir parar na cabeça oca de um Santo Antônio largada no chão.

Esta a senha para o leitor adentrar uma série de acontecimentos entre o trágico e o cômico, que poderá leva-lo a relacionar a obra a, por exemplo, O auto da compadecida, de Ariano Suassuna.

A cabeça do santo. Capa. Reprodução

Não pensem os apressados, no entanto, que A cabeça do santo é mais do mesmo, cópia do que quer que seja, ou para iniciados – embora este blogueiro acredite que fará bastante sucesso entre os romeiros de Canindé (que batiza um capítulo do livro) e arredores. Socorro Acioli é hábil na construção de diálogos, na condução da trama, recheada de acontecimentos extraordinários em uma cidade de ar fantasmagórico, e em fazer rir da desgraça sem soar politicamente incorreta. Tampouco cabe tentar rotulá-la regionalista ou coisa que o valha.

À cabeça de Santo Antônio chegam vozes de mulheres que rezam em busca de maridos, casamentos, amores. É lá que Samuel encontra Francisco, seu primeiro amigo na cidade. À custa de uma chantagem, se utiliza do moleque que conhece todas as almas viventes daquele pedacinho de Nordeste para tirar alguma vantagem do que escuta.

Os “milagres” casamenteiros de Samuel logo chamam a atenção de romeiros de cidades vizinhas, meios de comunicação e políticos inescrupulosos, cujos planos são atrapalhados quando Candeia, de cidade quase abandonada, transforma-se em destino de turismo religioso.

Antes de tudo uma história de amor, A cabeça do santo deve alçar o nome de Socorro Acioli ao círculo dos grandes das letras nacionais.

Foto – A foto que abre este post compõe capa, lombada e contracapa de A cabeça do santo. É do fotógrafo maranhense Márcio Vasconcelos, de seu ensaio Na trilha do Cangaço – O sertão que Lampião pisou, vencedor do prêmio Funarte Marc Ferrez de Fotografia.

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