Arnaldo Antunes não faz mais do mesmo

[sobre Acústico, show que Arnaldo Antunes apresentou sábado passado (9), no Mandamentos Hall, Lagoa, São Luís. Desaviso: isto não é jornalismo!]

Acústico MTV (2012) é o terceiro disco ao vivo de Arnaldo Antunes em cinco anos, mas isso não o coloca no rol daqueles compositores brasileiros que todos os anos lançam o mesmo disco. O ex (ou eterno?) titã está em outro grupo: o dos mais instigantes e interessantes compositores brasileiros na ativa.

O repertório de seu novo disco passeia por várias fases da carreira: solo, com os Titãs, Tribalistas, além do registro em sua própria voz para músicas que fizeram sucesso na voz de outros intérpretes, casos de Alma (parceria com Pepeu Gomes, sucesso na voz de Zélia Duncan), Sem você (parceria com Carlinhos Brown gravada como Busy man pelo baiano com participação especial de Marisa Monte) e De mais ninguém (parceria com Marisa Monte gravada por ela e regravada por Nelson Gonçalves). E ainda há espaço para inéditas.

Arnaldo Antunes não é de se repetir: se em Ao vivo no estúdio (2007), os convidados eram os tribalistas Carlinhos Brown e Marisa Monte e os titãs Branco Melo e Nando Reis, em Ao vivo lá em casa (2011) eram Erasmo Carlos e Jorge Benjor; agora, neste Acústico MTV (2012) são Nina Becker e Moreno Veloso, o que dá ideia das possibilidades da obra de sua obra, tão diversa.

Foi basicamente o repertório de Acústico MTV que Arnaldo Antunes apresentou em São Luís sábado passado (9), no Mandamentos Hall (Lagoa). Um show irretocável. Nem mesmo as quase duas horas e meia de atraso para o início conseguiram diminuir seu brilho, a demora certamente uma estratégia da casa para vender sua bebida cara em seu ambiente climatizado, um som mecânico anos-80-remix criando o clima para quando a banda subisse ao palco.

Quem pagou pelos ingressos – salgados para os padrões ilhéus, pista a 70 reais, no dia – certamente achou bem pago, que valeu cada centavo, caso deste que vos perturba, que assistiu ao show às próprias custas, cantando quase todo o repertório e relevando até mesmo o comportamento da turma que assiste a shows não pelos próprios olhos, mas pelas lentes de máquinas fotográficas e/ou telefones celulares que servem de.

Mesmo a pouco mais de metro e meio do palco, por vezes tive que ver mãos e braços não batendo palmas ou se agitando alegremente ao som de Arnaldo Antunes e banda, mas empunhando o que há de mais moderno em se tratando de tecnologia. O palco da casa, a propósito, deveria ser mais alto, já que o público não-VIP assiste ao show de pé – ou seja, quem está mais distante do palco verá ainda menos artista e mais braços, mãos, máquinas, celulares, flashes.

Vestido de branco, qual um chef, a camisa com aqueles botões não ao centro, Arnaldo Antunes demonstra alegria o tempo inteiro sobre o palco, talvez feliz com sua ótima banda – ou melhor, constelação: Betão Aguiar (contrabaixo), Chico Salém (violão), Edgard Scandurra (violão), Marcelo Aguiar (bateria) e Marcelo Jeneci (sanfona e teclado) –, talvez feliz com a receptividade do público, com o novo disco, ou certamente com tudo isso ao mesmo tempo. É sincero o seu “espero que vocês estejam se divertindo aí tanto quanto nós aqui” dirigido ao público. Nem mesmo algumas falhas no som o irritaram. Ou ao menos ele não demonstrou. Nem mesmo a graça sem graça do despropositado grito de “toca Raul!”, se é que ele ouviu.

Hora e meia de show depois, bis incluso, hora de tentar comprar o disco novo e catar autógrafo. Não consegui. Um simpático Jeneci me informou que a caixa com os discos de Arnaldo Antunes já haviam sido guardadas, pois o músico pegaria em instantes uma van rumo ao aeroporto. Ele não havia trazido seu Feito pra acabar (2010), de que tenho somente cópia, como lhe disse. E Curumin, de quem também esperava comprar os discos solo, acabou não vindo. Já fui uns bons pares de vezes onde ainda se vendem discos em São Luís, em busca do Acústico MTV, hoje inclusive, sem sucesso. Tê-lo e ouvi-lo vez em quando certamente tornará ainda mais viva a lembrança da agradável passagem deste artista multifacetado e sua banda idem pela capital maranhense.

p.s.: agradecimentos do blogue a Bruna Castelo Branco e Polyana Amorim, pelo diálogo, e Samir Aranha Serra, pela fotografia que roubei de seu facebook.

Nossa miséria cultural (ou: acorda, serpente!)

[Do Vias de Fato de maio]

Pode haver luz no fim do túnel, será um trem vindo na direção oposta?, Nossa Senhora da Vitória, rogai por nós!

POR ZEMA RIBEIRO

Um texto revoltado da cantora Nathália Ferro, publicado primeiro em sua conta no Facebook e depois repercutido por alguns periódicos locais, ganhou certa repercussão, apontando diversos problemas por que passa nossa produção cultural, digo, da Ilha de São Luís do Maranhão e do estado como um todo.

Criticava o marasmo a que está relegada a cena artística na capital maranhense, cujo aniversário de 400 anos se avizinha e sobre o que nada foi feito – aquele relógio ridículo na cabeceira da ponte do São Francisco, não conta.

A cantora criticava a tudo e a todos – e suas críticas, claro, eram merecidas, tendo sido repercutidas e comentadas também pelo poeta e compositor Joãozinho Ribeiro, ex-secretário de cultura do Estado do Maranhão, em sua coluna semanal no Jornal Pequeno.

Keyla Santana, atriz, também colocou a boca no trombone. Ela buscou o financiamento de uma peça em que atuava pela internet, num sistema de crowdfunding, financiamento coletivo já bastante utilizado no centro-sul do país, que aqui sequer engatinha, com razão: a iniciativa estatal aposta em mais do mesmo, a privada faz jus ao trocadilho. Como incentivar pessoas comuns, como este que escreve, o caro leitor, a cara leitora, a enfiar a mão no bolso e bancar o que quer que seja?

Diversos agentes culturais envolvidos com a feitura do projeto BR-135, capitaneado pelo casal Criolina, Alê Muniz e Luciana Simões, têm discutido propostas e possibilidades para que se avance no rumo da implementação de efetivas políticas públicas de cultura por estas plagas. Além de reuniões e debates, a galera está fazendo, se movimentando, mostrando nomes e coisas interessantes, misturando, experimentando. É daí e assim que pode surgir o novo.

Foi justamente o mote para o texto de Nathália Ferro: o pouco público presente às edições do BR-135, realizadas no Circo Cultural da Cidade, fruto inclusive, segundo ela, da desunião da classe artística local – alguns certamente mais preocupados com “meus projetos” e a procura por financiamentos (quase sempre estatais) para “meu próximo disco”, “meu próximo livro”, “minha próxima peça de teatro” ou mesmo para a inclusão de “meu show” no circuito junino.

O BR-135 tem a ideia de mostrar o que de novo a cena ilhéu tem produzido, numa demonstração de altruísmo digna de louvor: com o reconhecimento nacional que têm hoje, Alê Muniz e Luciana Simões sequer precisariam morar em São Luís. No entanto, preferem ficar, tentar fazer algo diferente e mostrar que é possível conquistar o país a partir da Ilha (sem qualquer daqueles adjetivos cuja maioria perdeu completamente o sentido).

Keyla Santana, pela internet, conseguiu algo próximo da metade dos três mil reais de que necessitava para botar seu bloco na rua, isto é, sua peça no palco de um teatro da capital, uma pequena temporada de dois dias. Para não perder o que alguns haviam investido, seu marido completou, do próprio bolso, a outra metade do valor restante.

Experiência bem sucedida de crowdfunding, fora da rede mundial de computadores, foi a realização do I Festival de Poesia do Papoético – Prêmio Maranhão Sobrinho, organizado pelo poeta e jornalista Paulo Melo Sousa. O Papoético, tertúlia semanal realizada no Bar Chico Discos, no centro da capital maranhense, é um espaço privilegiado para a discussão de assuntos relativos à arte e cultura, tendo aberto uma trincheira para os insatisfeitos com o status quo.

Paulão, como é mais conhecido seu mentor, levantou os fundos necessários à realização do festival principalmente entre os frequentadores habituais do debate-papo semanal, além de entre amigos, professores universitários e artistas em geral. O festival, cuja final será realizada dia 31 de maio no Teatro Alcione Nazaré, no Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, na Praia Grande, premiará em dinheiro os primeiros lugares em poema e interpretação e os segundos e terceiros lugares em cada categoria com livros, discos, revistas e outros produtos culturais, tudo arrecadado entre aqueles citados doadores e com a realização de rifas.

A organização solicitou ao Comitê Gestor dos 400 anos de São Luís, integrado por secretarias e órgãos públicos municipais e estaduais, apoio para a realização do festival, de orçamento modestíssimo. Sequer recebeu resposta, mostrando o desinteresse generalizado dos poderes públicos para qualquer iniciativa criativa que não parta de sua burocracia interna. O problema é que nada criativo parece vir dali. O festival recebeu mais de 100 inscrições de diversas cidades do Brasil e custou menos de 3 mil reais, com cortes em gorduras como material de divulgação (folders e cartazes), importantes em qualquer empreitada cultural.

Teimosos, os organizadores do Papoético já anunciam sua próxima invenção: um concurso de fotografia terá regulamento anunciado já em junho, com base no mesmo esquema. Dia 7, Chico Saldanha e Josias Sobrinho apresentam, no Chico Discos, o show DoBrado ResSonante, que estreou em Brasília/DF. Os ingressos custam R$ 20,00 e podem ser adquiridos antecipadamente no local. Toda a renda será revertida para a realização do concurso de fotografia.

O Estado – tanto faz ler prefeitura e/ou governo – é tímido e continua apostando apenas em grandes festas populares, quais sejam, os períodos carnavalesco e junino, salvo raríssimas exceções. É o que dá mídia, é, em tese, o que dá voto – sobretudo, embora pareça óbvio, em ano eleitoral.

Faltam cerca de 100 dias para o aniversário da cidade. Não se ouve falar ainda em programação ou, antes, em planejamento de quaisquer ações comemorativas. Mas não é por isso, ou não só por isso, que clamam os artistas revoltados, aqueles que não se satisfazem com o tilintar de umas poucas moedas nos pires, um tapinha nas costas, a logomarca de um órgão público em seu disco, livro ou programa, e, no fundo, um grande “cala a boca” em qualquer vírgula que se oponha às péssimas gestões que hoje têm o Maranhão e sua capital São Luís. E aqui o comentário não se restringe ao aspecto cultural.

O que estes artistas requerem, com propriedade, é a pulsação constante da Capital Americana da Cultura, é que ela faça jus ao título. Mais que um troféu, um papel, um certificado, um evento, São Luís e o Maranhão precisam deixar o passado e a teoria de lado. É preciso viver o presente e vivê-lo na prática: já não somos Athenas Brasileira – se é que um dia fomos – e mais que bumba meu boi e/ou tambor de crioula para turista ver, é preciso que nossos logradouros sejam ocupados por arte permanentemente. É capital da cultura ou não é?

São Luís e o Maranhão não estão as maravilhas anunciadas na televisão pelas gestões municipal e estadual. Na propaganda, tudo parece correr às mil maravilhas, de propaganda nossos gestores são bons – pudera, é preciso descarregar toneladas de maquiagem para ludibriar o povo e garantir a perpetuação dos grupos no poder. A realidade é outra e é esta que precisa ser enfrentada para que algo mude. Que não emudeçam os artistas que estão corajosamente tocando as feridas para curá-las. E que ao coro dos descontentes somem-se cada vez mais artistas. Ou não, que cultura é coisa de todos nós.

A nossa miséria cultural está exposta, fratura que carece de urgente cura. Só não sente nem vê quem não quer. Já é mais que hora dessa serpente acordar!

Arte pela arte

Longe do descompromisso: Chico Saldanha e Josias Sobrinho fazem show hoje, no Chico Discos, em prol da próxima empreitada do Papoético.

 

Chico Saldanha e Josias Sobrinho voltam a subir juntos em um palco hoje (7), acompanhados de Marcão (violão e cavaquinho), Mauro Travincas (contrabaixo) e Jeca Jecowisky (percussão). Depois de pouco mais de mês da estreia do show DoBrado ResSonante em Brasília/DF, o espetáculo poderá finalmente ser conferido pelos ludovicenses. Os artistas já haviam se apresentado juntos em São três léguas, outros bois e muito mais, de 1999, e Noel, Rosa secular, que teve edições em 2010 e 2011, ocasião em que homenagearam o Poeta da Vila ao lado de Cesar Teixeira e Joãozinho Ribeiro.

Na capital federal foram duas apresentações. Aqui não há anúncio, ao menos por enquanto, de um bis, embora o Chico Discos, bar que abrigará o show de hoje, comporte confortavelmente apenas cerca de 60 pessoas, plateia certamente menor do que merecem os autores de clássicos como Terra de Noel e Linha puída, Josias e Chico, respectivamente.

Mas a causa é boa: a ideia inicial era angariar fundos para o I Festival de Poesia do Papoético, que após muita ralação de Paulo Melo Sousa, o Paulão, seu idealizador, e do envolvimento de mais alguns teimosos e de doações de amigos e simpatizantes, conseguiu se pagar. DoBrado ResSonante, no entanto, continua sendo um show beneficente, em prol da arte: o valor arrecadado com os ingressos vendidos para a noite de hoje será revertido para a premiação do I Concurso de Fotopoesia do Papoético, cujo regulamento será publicado em breve (aqui neste blogue). A premiação deve acontecer em setembro, mês de comemoração dos controversos 400 anos de São Luís.

Sobrinho e Saldanha estão no cenário musical desde a década de 1970. O primeiro integrou a trupe do Laborarte, o segundo correu por fora, tendo ambos participado de festivais de música desde então. Ambos estrearam em disco na década seguinte, o primeiro no rastro do reconhecimento proporcionado pela gravação de Papete para quatro músicas suas no antológico Bandeira de aço [Discos Marcus Pereira, 1978] – De Cajari p’ra capital, Dente de ouro, Engenho de flores e Catirina –, o segundo fazendo de sua Itamirim clássico imediato e retumbante, na interpretação arrebatadora de Tião Carvalho em seu disco de estreia [Chico Saldanha, 1988].

Seus discos mais recentes são Dente de ouro (2005), de Josias, e Emaranhado (2007), de Saldanha. Ambos completamente autorais, o primeiro uma mescla de grandes sucessos e músicas inéditas, com participações especiais de César Nascimento, Papete, Lenita Pinheiro (sua esposa) e Zeca Baleiro; o segundo, quase completamente inédito, a exceção é Linha puída, gravada num arranjo diverso do bumba meu boi que é originalmente, com a participação de Lenita Pinheiro. Josias, ao lado de Gerude e Inaldo Bartolomeu, canta com Saldanha em É tudo verdade, onde este conta em versos a história de seu Mário Mentira, como era conhecido um morador da Rua de São Pantaleão de sua infância e adolescência. Zeca Baleiro, diretor musical em algumas faixas, canta na faixa-título, moderno boi de zabumba.

Algumas músicas de Dente de ouro e Emaranhado estão no repertório de DoBrado ResSonante, que se completa com músicas inéditas de Josias Sobrinho e Chico Saldanha, além de releituras de conterrâneos como Cesar Teixeira [Botequim] e Zeca Baleiro [Babylon], entre outros.

Papoético premiará hoje vencedores de seu I Festival de Poesia

Dos 110 inscritos, 21 poemas concorrem hoje na final do I Festival de Poesia do Papoético – Prêmio Maranhão Sobrinho, organizado pelo poeta e jornalista Paulo Melo Sousa. Os poetas Celso Borges e Josoaldo Rego compuseram a comissão julgadora da categoria, que terá ainda Mariano Costa e Gilson César julgando as interpretações, na noite de hoje. O evento, com entrada franca, terá início às 19h, no Teatro Alcione Nazaré, no Centro de Criatividade Odylo Costa, filho (Praia Grande).

Doações, em dinheiro e produtos culturais, e rifas garantiram os quase 3 mil reais necessários à realização do festival, fruto da necessidade de expansão dos encontros semanais do Papoético, onde se discute cultura e arte de modo geral, embora o espaço não se furte a debater temas outros, qual quando abrigou o lançamento da Campanha Estadual de Combate à Tortura, organizada pela Sociedade Maranhense de Direitos Humanos (SMDH) e outras entidades da sociedade civil, em 22 de março, data em que o bárbaro assassinato do artista popular Jeremias Pereira da Sivla, o Gerô, completou cinco anos.

Cato da matéria Noite de premiação para a literatura (acesso exclusivo para assinantes do jornal, com senha), capa do caderno Alternativo no jornal O Estado do Maranhão de hoje (31), o seguinte depoimento de Paulão, como é mais conhecido o organizador do Papoético, de seu festival de poesia e de um concurso de fotografia que será lançado hoje, com inscrições abertas a partir de amanhã (1º.): “Infelizmente o que temos é uma omissão dos poderes públicos, dos quais não conseguimos nenhum apoio. No entanto, recebemos apoio de pessoas que acreditam na proposta, na literatura, na arte como instrumento transformador”.

Este blogue acompanhou o processo de perto: cedeu seu espaço ao abrigar em uma aba regulamento e ficha de inscrição para o festival, esteve presente a algumas edições do Papoético, acompanhou por e-mail cada agradecimento que Paulão enviava a cada um que doou livros, revistas, discos, dinheiro, aos que, como o blogueiro, compraram pontos de duas rifas realizadas e por aí vai. Além de um gesto de educação e gratidão, a garantia da transparência e lisura do processo.

Tardios e recalcados ufanistas ainda se orgulham de dizer que moram na Athenas Brasileira, embora já quase não se encontrem livrarias e lojas de discos por aqui. Gestores públicos ainda se orgulham de adjetivos que talvez já não façam sentido (se é que um dia o fizeram), à guisa de propagandear aos quatro(centos) ventos a beleza exclusividade televisiva da cidade quatrocentona. Um festival como o que se encerra hoje, que busca descobrir novos talentos, valorizar a tão propagada “terra de poetas”, é solenemente ignorado pelos poderes públicos: ao pedido de apoio do comitê organizador ao Comitê Gestor dos 400 anos de São Luís sequer (h)ouve resposta.

Este blogue continua aliado a iniciativas desta natureza: amanhã a aba [PAPOÉTICO], onde você encontra, por exemplo, a lista dos 21 poemas classificados para a final de logo mais à noite, será trocada por outra que trará regulamento, ficha de inscrição e notícias acerca do concurso de fotografia que será lançado hoje. Para 2012 está previsto ainda um concurso de contos, que este blogue também divulgará em momento oportuno. “Após a premiação, haverá comemoração no Chico Discos”, avisa Paulão.

DoBrado ResSonante na Ilha

Chico Saldanha e Josias Sobrinho reapresentam, em São Luís, show que estrearam em Brasília mês passado. A causa é boa: um concurso de fotografia que em breve será anunciado pelos teimosos, graças a Deus!, organizadores do Papoético, os mesmos que realizaram seu I Festival de Poesia, cuja final acontece amanhã (31), no Teatro Alcione Nazaré (Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, Praia Grande), de graça, às 19h.

A renda do show será revertida para o citado concurso de fotografia. Faça parte dessa história e ajude a realizá-lo. O show acontece no Bar Chico Discos, onde cabem confortavelmente 60 pessoas. Garanta o seu antecipadamente, detalhes na imagem que ilustra este post.

Fito bem podia ser sigla de Fábrica de Invenção de Tom Zé

[antes, dois avisos: um: isso não é jornalismo; e outro: o blogueiro viajou às próprias expensas]

A plateia cantou junto o show inteiro. No repertório, várias fases da carreira

Há coisa de 10 anos, eu, menino recém-entrado na boemia, assisti a um maravilhoso show de Tom Zé no Circo da Cidade, em São Luís. A abertura ficou por conta de Cesar Teixeira e na plateia, lotada, estava o saudoso Mestre Antonio Vieira, cuja obra o baiano elogiaria durante o show.

Passei o espetáculo inteiro entre assisti-lo e conversar com dona Neusa Santana Martins, esposa e memória do gênio de Irará. Lembro que, ao saber de sua apresentação na Ilha, fiz contato com o escritório do tropicalista em São Paulo e consegui comprar alguns discos que me faltavam na coleção.

Eufórico, furei a fila dos autógrafos, levado por dona Neusa: apertei a mão da banda inteira, abracei Tom Zé, lembrei de Caetano Veloso, em seu Verdade Tropical, escrevendo algo sobre o brilho dos olhos daquele homem miúdo na estatura, gigante no que faz – pude comprová-lo pessoalmente. Peguei autógrafo em Jogos de armar – Faça você mesmo, então seu disco mais novo, cuja turnê chegava ali por 2002 ou 3 em São Luís. Algum fotógrafo, no camarim, fez um retrato nosso, eu, o fã, e Tom Zé, o ídolo – jornalismo era algo em que eu apenas engatinhava ainda e, como não ia resenhar o show, não primei pelo “distanciamento”. Na ocasião eu era tiete mesmo. O fotógrafo pegou meu telefone. Deveria me cobrar no trabalho, dias depois, e entregar a foto. Nunca cobrou. Nunca vi a foto (se ela existir e o fotógrafo por acaso estiver lendo isto aqui, ainda estou disposto a pagar).

10 anos depois ou quase isso, estou a passeio em Curitiba e, conhecendo a urbe num ônibus de turismo, próprio para tal, descemos, eu e minha esposa, no Museu Oscar Niemeyer, também conhecido como Museu do Olho, por causa de uma das formas extravagantes da arquitetura do gênio centenário e damos de cara com a programação do Fito, o Festival Internacional de Teatro de Objetos, invenção do Sesi.

O público era enorme em uma área montada ao lado do museu, com várias salas onde aconteciam os espetáculos, em que, pelos anúncios que vimos espalhados pela cidade, um saca-rolhas se transformava em uma bailarina, uma chaleira vermelha virava uma senhora irada e assim sucessivamente. Éramos turistas, minha esposa já havia concluído as obrigações de trabalho que a haviam levado à capital paranaense e agora curtíamos a cidade. Adentrando o recinto do Fito, Naná Vasconcelos encerrava um show e um locutor anunciava outras atrações. A última do dia (sábado, 26) seria Tom Zé. Em meio ao “teatro de objetos”, ele era anunciado como “música/contramúsica”, eu leria depois, no programa. “Vamos terminar o passeio e voltar para cá”, decidi sozinho pelo casal. A jardineira, um ônibus aberto que de meia em meia hora circula por nem lembro quantos pontos turísticos curitibanos, ainda nos levaria à Ópera de Arame e Pedreira Paulo Leminski – o poeta mereceria um capítulo à parte, que talvez eu escreva por aqui em breve – e em Santa Felicidade, onde degustamos lasanha e vinho artesanal deliciosos. Antes, já havíamos passado pelo Passeio Público.

Niemeyer sempre me interessa, mas, qual “os barzinhos do Largo da Ordem”, o Museu Oscar Niemeyer estava entre as dicas do amigo Ademir Assunção. “Grande Ademir!”, eu repetia enquanto passeávamos, por lá, na noite anterior, entre bonitos botecos como o Bar do Alemão e o Sal Grosso. Ali ainda voltaríamos no domingo, para comprar lembranças para as sobrinhas e uns poucos parentes, a grana era curta. “Só nós mesmo para fazermos turismo assim”, eu dizia. Felisos. Lisos, mas felizes.

Tom Zé apresentou um show bastante interessante, passeando por diversas fases da carreira: músicas compostas no período da ditadura militar, como Todos os olhos (primeiro verso: “de vez em quando todos os olhos se voltam pra mim”; último verso: “eu sou inocente”) e Augusta, Angélica e Consolação aos estudos de samba, Hein?, e pagode, O amor é um rock e ElaEu – esta, abriu o show e foi repetida no meio, a pedido de uma fã mais próxima ao palco. Em Menina, amanhã de manhã, ele lembrou, generoso mas não modesto, da gravação de Mônica Salmaso, talvez definitiva, para a canção. “Eu sou a Mônica, ele é o Salmaso”, disse apontando para Jarbas Mariz, com quem dividiu os vocais, “uma dupla caipira”, prosseguiu, “menina amanhã de manhã quando a gente acordar quero te dizer que a felicidade vai desabar sobre os homens”.

O baiano ri e faz rir, conta histórias, diverte-se divertindo. Tira sons percussivos de agogôs e esmeris – com as luzes apagadas, as faíscas-estilhaços iluminam aquela espécie de galpão, completamente lotado. Em O jingle do disco, faixa pouco conhecida de The hips of tradition, do período de sua redescoberta a partir do interesse de David Byrne por sua música na década de 1990, ele exibe réplicas de vinis, cujos cds eram vendidos por dona Neusa, além de esposa e memória, assistente, secretária, produtora, empresária e quantos ofícios ela puder dar conta, sempre simpática.

Cumprimentei-a, antes do show, comprei dois discos que ainda não tinha. Depois acompanhei, cantando, grande parte do show, gratuito. Em Xique-xique foi até possível arriscar uns passinhos de dança, ou balançar o corpo cansado, algo próximo de, o que o espaço permitia, talvez nem dois pra lá, dois pra cá, no galpão entupido de adultos e crianças, remanescentes da programação que teve início à tarde. No bis, 2001, “parceria com Rita Lee”, com a plateia cantando junto, Jimmy renda-se e Moeda falsa: Tom Zé, que já havia tirado onda com os curitibanos, mudou a letra, lembrando-se das colônias germânicas e europeias em geral que ajudaram a formar e ainda habitam a cidade. O show não terminaria com o “eles vão tomar no fiofó”, verso final de Moeda falsa. Educado, “Mister Tom Zí” – a pronúncia de seu nome pelos americanos que o (re)descobririam há algum tempo – agradeceria o carinho dos paranaenses que tão atentamente prestaram atenção em sua música e performance. Aliás, que fique o registro: não é qualquer um que faz aquilo aos quase 80. Muito pulo e jogo de perna que eu, aos 30, não arrisco.

Do Maranhão, estando ali por mera sorte, senti-me contemplado nos agradecimentos. Depois de mais ou menos hora e meia de show preferi não enfrentar a fila do camarim e arriscar finalmente ter minha foto com Tom Zé, embora tenha anunciado a vontade à dona Neusa, antes dele subir ao palco. Mas era preciso acordar cedo no domingo, data em que estava marcado nosso retorno à São Luís: no espaço de tempo que ainda sobrava, ainda havia turismo a fazer.

Uma ‘casa’ nas alturas

“Aqui é minha casa quatro horas por dia”. As palavras foram ditas por Vinicius de Oliveira Melo, 35 anos, bem longe de casa. Pendurado a sete metros de altura, ele é um dos ativistas que estão se revezando para impedir a saída do navio Clipper Hope, próximo a São Luís do Maranhão.

O cargueiro rumava para o Porto do Itaqui, onde seria carregado com ferro gusa – matéria-prima do aço – manchado por desmatamento e trabalho escravo. Nos últimos sete dias de bloqueio, Vinicius se acostumou à rotina. Com uma garrafa de água, algumas frutas e muita disposição, ele tem encarado a tarefa numa boa.

Leia o texto completo.

São Luís sedia Marcha das Vadias

Engana-se quem, à menção da Marcha das Vadias, pensa logo e apenas em oba-oba e/ou zoada sem propósito. O vídeo a seguir dá uma ideia do que será o protesto, que chega à São Luís no próximo dia 26 (sábado):

Chegar à Ilha no próximo sábado é modo de dizer. A Marcha, movimento internacional também conhecido por Slut Walk, tem diversas atividades antes da caminhada em si, conforme programação abaixo, que este blogue recebeu por e-mail da assessoria de comunicação local (há atividades desde sábado passado, 19, o blogue anuncia apenas o que está por vir):

22 (terça-feira), 19h, Odeon Sabor e Arte (Praia Grande): Seminário da Primeira Marcha das Vadias de São Luís, com entidades da sociedade civil organizada, órgãos públicos e pessoas interessadas em discutir a causa;

23 (quarta), 10h, Praça Deodoro: Intervenção artística e conscientização > 18h, Praia Grande: intervenção artística de conscientização no Tambor de Crioula de Mestre Amaral;

24 (quinta), horário e local a definir (o blogue avisará tão logo receba a informação): Mesa-redonda de conscientização da população e comunidade acadêmica sobre questões de gênero;

25 (sexta), 19h: Rota de arrecadação, divulgação e conscientização em bares e boates da cidade (circuito Praia Grande, Lagoa da Jansen, Av. Litorânea, Choperia Marcelo, Choperia Kabão etc.);

26 (sábado), 13h, Av. Litorânea: 1ª. Marcha das Vadias de São Luís: concentração no início da avenida, próximo ao bar Raízes, marcha até a Praça dos Pescadores, seguida de programação cultural.

Movimento internacional de mulheres criado em Toronto, no Canadá, a Marcha das Vadias já percorreu mais de 30 cidades em diversos países. A de São Luís ocorrerá simultaneamente às de Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo.

Maiores informações pelo blogue, facebook, tuiter e/ou e-mail.

Cinemuseu

Entre os próximos dias 16 a 20 de maio acontece simultaneamente em todo o Brasil a 10ª. Semana Nacional de Museus. Em todo o Brasil é modo de falar: só acontece, obviamente, onde tem museu. E museu, a exemplo de biblioteca, teatro e cinema, tem em pouco lugar.

Esta 10ª. edição da semana tem como tema Museus em um mundo em transformação: novos desafios, novas inspirações. Na capital maranhense tem como subtema São Luís 400 anos: História, memória e cultura.

Por aqui a programação é de responsabilidade do Museu Histórico e Artístico do Maranhão (Rua do Sol, 302, Centro), órgão vinculado à Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão, acéfala há algum tempo, desde a saída de Bulcão, chefe da pasta. Quer dizer…

A programação completa tá aqui. Completa é modo de dizer. Francisco Colombo assina a curadoria da mostra de curtas e médias metragens maranhenses. Como pela programação disponibilizada no site do MHAM não se sabe que filmes o diretor de No fiel da balança irá exibir, este blogue avisa:

dia 18 > A solidão de Dom Quixote (direção: Vinícius Vasconcelos e Márcio Vasconcelos, 15 min.), Athenas Brasileira (direção: João Paulo Furtado, 18 min.), O destruidor de ilhas (direção: Denis Carlos, 15 min.) e Infernos (direção: Frederico Machado, 13 min.).

19 > Fronteiras de imagens (direção: Murilo Santos, 22 min.) e Aperreio (direção: Doty Luz e Humberto Capucci, 20 min.).

20 > Tambor de crioula (direção: Murilo Santos, 16 min.) e Em busca da imagem perdida (direção: Beto Matuck, 26 min.).

Toda a programação da semana é gratuita.

Pequena amostra do jornalismo de Décio Sá

Quando escrevi Do assassinato de Décio Sá, sob o impacto do choque que a notícia me causou, evitei, na ocasião, momento de dor sobretudo para familiares e amigos, deter-me ao sem-número de adjetivos com que o jornalista foi agraciado, principalmente por pares de ofício e prática.

A notícia me alcançou ainda na noite em que o funcionário do Sistema Mirante foi brutal e covardemente executado em um bar na Avenida Litorânea: um tio meu ligou dando a notícia, rápida e nacionalmente repercutida pelo fato de Décio ser jornalista e ter falado com outros perto de morrer. Na manhã seguinte recebi ainda telefonemas, sobre o assunto, de uma tia e de meu irmão.

Desde a noite em que Décio foi atingido sem chance de defesa pelos tiros que o matariam começaram a pipocar na internet textos revoltados com o crime e carregados de elogios os mais variados a ele, alguns cínicos, outros oportunistas, pouquíssimos sinceros (tem gosto pra tudo). De uma hora para outra, ele havia se tornado, do Maranhão, “o maior/melhor jornalista”, “o maior/melhor repórter”, “o maior/melhor jornalista político”, “o maior/melhor repórter investigativo”, “a maior/melhor figura do jornalismo online”, “o maior/melhor nome de sua geração”, “o mais corajoso jornalista destas bandas”, o “destemido”, o “independente” e por aí vai. Sobre este último adjetivo, diga-se, nunca colou o descolar de seu blogue dos domínios do Imirante (portal de internet do Sistema) à época da mais recente campanha eleitoral de Roseana Sarney ao governo do Estado, repetido por outro blogueiro comprometido única e exclusivamente com os patrões.

Nem me darei ao trabalho de linkar os elogios todos, pois são tantos que não caberiam neste post. Penso até que mais e descabidos elogios só mesmo quando da partida de seu grande patrão, quando esta ocorrer.

Menos, gente! Por favor! Décio Sá era um jornalista extremamente alinhado aos patrões, por vezes um distribuidor gratuito de ofensas (nem tão gratuitas assim, tudo tem um preço), pouco afeito ao contraditório, comprometido até a alma com uma forma de fazer jornalismo que se baseia na chantagem e em ganhos pessoais, às favas a ética, a verdade e o interesse público. Como, aliás, o são muitos dos que ora o elogiam. Como o farão com o próximo jornalista assassinado, que tão logo tombe levará Décio a perder todos os tronos a que foi alçado antes mesmo de sua alma chegar ao destino final.

Eis um assunto extremamente melindroso de se tocar. Mas é preciso colocar os pingos nos is, “cada lugar na sua coisa” (ave, Sérgio Sampaio!), a bem do interesse público, do bom jornalismo, da verdade, enfim. Décio era Sá, não era Santo!

A postura deste blogue permanece a mesma: o frio e planejado assassinato de Décio Sá deve ser investigado e os culpados punidos dentro da lei. Não venham, caros comentaristas de blogues de plantão, inventar a pena de morte particularmente para este caso.

Se imagens de sistemas de segurança fossem usados ou recompensas de cem mil reais fossem oferecidas pela iniciativa privada em outros casos, já teríamos justiça feita a Flavianos, Cabeças, Josimos e tantos outros “anônimos ilustres” (salve, professora Dinacy Corrêa!). Em tempo: muito estranho empresas oferecerem estes pacotes ao Disque Denúncia e não sambarem publicitariamente sobre o corpo do defunto, não lucrarem com a justiça que supostamente estão ajudando a fazer.

Abaixo, matéria de ontem (25) na Folha de S. Paulo (link exclusivo para assinantes com senha; grifos do blogue). Os dois últimos parágrafos dão uma perfeita amostra do que era o jornalismo by Décio Sá. Continue Lendo “Pequena amostra do jornalismo de Décio Sá”

O charme de Lucap & Nosotros no Chico Discos

Lucap (C), acompanhado de Guilherme Raposo (E) e Hamilton Oliveira (D)

O charme do Chico Discos, que não cansamos de elogiar, é inversamente proporcional ao seu tamanho, o do bar, não o do proprietário. Aconchegante, 50, no máximo 60 pessoas lhe garantem a lotação total. Se o espaço é pouco, sobra talento. Consolidado como um dos mais interessantes espaços culturais surgidos nos últimos tempos numa São Luís sempre ressentida da carência de coisas do tipo, Chiquinho, um ex-sebista que ainda tem algumas sobras do acervo a decorar as paredes do lugar, nega qualquer palavra que não “bar” para definir sua casa.

Dando prosseguimento à temporada iniciada mês passado, o cantor, compositor e violonista André Lucap volta ao palco do Chico Discos (Rua Treze de Maio, 389, esquina com Afogados, sobre o banco Bonsucesso), acompanhado dos músicos Guilherme Raposo (teclado) e Hamilton Oliveira (contrabaixo), o duo Nosotros. No repertório, músicas autorais, do álbum inédito On, a ser lançado em breve, e releituras de nomes como Beatles, Beck, Bob Marley, Johnny Cash, Joy Division, New Order, Nine Inch Nails e Vitor Ramil.

O show acontece nesta sexta-feira (20), às 21h. Os ingressos custam R$ 12,00. Maiores informações: (98) 8159-1990.

A poesia cortante de Celso Borges

Fazia tempos eu não experimentava a sempre deliciosa porção de paçoca e creme de macaxeira preparada por dona Antonia, ela uma das vendedoras de comida daquelas barracas ali por perto do Centro de Criatividade Odylo Costa, filho, na Praia Grande. A terceira opção, para quem prefere, é o arroz de maria isabel. Meu pratinho foi acompanhado por um copo “considerado” de suco de abricó. Uma delícia!

Apesar do coquetel servido – e disputado – ao final, foi a fome quem me fez deixar o recinto apressado, na noite da última terça-feira (10), ocasião em que, no citado centro, o poeta Celso Borges apresentou seu Sarau Cerol, acompanhado por Beto Ehongue (trilhas e efeitos eletrônicos no laptop), Alê Muniz (guitarra) e Luiz Cláudio (percussão) – anunciados como participações especiais, os dois últimos tocaram o show inteiro. Se na barraca de dona Antonia eu saciava minha fome de comida, antes eu já havia me embriagado de poesia da melhor qualidade.

Da esquerda para a direita, Alê Muniz, Celso Borges, Luiz Cláudio e Beto Ehongue

A apresentação aconteceu numa Galeria Valdelino Cécio absolutamente lotada. Celso Borges leva ao palco sua experiência de misturar poesia e música, sobretudo a comprovada em seus livros-discos XXI (2000), Música (2006) e Belle Époque (2010), onde a palavra de papel vira a palavra de ruído e este/esta é música. Qual Cacaso, Chacal e Leminski, para citar apenas três poetas que admira, ele, também letrista de música popular, parceiro de gente que sai pelo ladrão, incluindo os integrantes de seu power-trio aquela noite.

Uma São Luís surreal, de propósito ou por acaso, sabe-se lá, lhe servia de fundo de palco, perfeito contraste para um poeta que tira sarro do cânone, da oficialidade em torno dos controversos 400 anos de sua cidade natal e até mesmo dos “turistas de pacote” com seus “boizinhos de butique”.

“O futuro tem o coração antigo”: Celso Borges, quase 53, talvez por isso não tenha saudades do passado. Copia a frase do escritor italiano Carlo Levi – que já usara de epígrafe em XXI – para colar no título de seu próximo livro, a ser publicado ainda em 2012. “Antigamente era antigamente e era muito pior”, reza noutro poema, A saudade tem seus dias contados, de Belle Époque.

De uma forma ou outra, ninguém sai intacto, imune, impune de uma apresentação de Celso Borges – e aí caberiam palavras como show, espetáculo e quetais: quem já gosta(va) de poesia sai gostando ainda mais, quem não gosta(va), passa a gostar, nem que seja um tiquinho, todos contentes com as possibilidades que a poesia pode oferecer, para além de saraus modorrentos, monótonos, mofados, enfadonhos.

Sarau, a palavra em si, geralmente assustadora, lembrando professoras de literatura velhas, chatas e de óculos fundo de garrafa, recitando de cor e por força nos querendo obrigar a decorar sonetos do século retrasado.

“Serol foi feito pra cortar”, já havia escrito, com s, em Pedra de cantarei, poema de Persona non grata (1990) que virou música, um tambor de mina em parceria com Zeca Baleiro (em XXI). Para cortar de vez clichês e sustos, o poeta unta com cerol a linha do sarau.

Por que poesia pode e deve pulsar e fazer pulsar. Como ele diria em A serpente (Outra lenda), outra parceria com Zeca Baleiro, além do saudoso Ramiro Musotto: “eu quero ver a serpente acordar/ pra nunca mais a cidade dormir”.

Trapixixita

É certeira a afirmação do músico Chico Nô em e-mail recebido pelo blogue, ao classificar a Tribo do Pixixita, que completa nove edições hoje, como “uma mostra da música maranhense contemporânea”, ele um dos discípulos do homenageado, o evento já cravado no calendário musicultural da Ilha.

Tribo é corruptela de tributo a este “artista quase sem obra”, conforme me confidenciou Nelsinho Martins, filho de José Carlos Martins, o Pixixita. “Ele era sobretudo um cara que gostava de brincar, de música e de ser amigo. Gostava de tocar sem compromisso, tipo, no teu quintal, numa farra; se tu chamasse ele pro palco, pra tocar no teu show, aí ele já ficava envergonhado, era muito tímido”, lembra o professor de capoeira do Laborarte.

Um time de bambas de primeira linha da música produzida hoje no Maranhão ocupará o Trapiche Bar, na Ponta d’Areia, mesmo em caso de chuva, a partir das 21h: Ângela Gullar, Célia Leite, Chico Maranhão, Criolina, Dicy Rocha, Erivaldo Gomes, Gerude, Instrumental Pixinguinha, João Madson, Nosly, Rosa Reis, Tutuca e Zé Maria Medeiros, além do citado Chico Nô e dos poetas Celso Borges, Moisés Nobre e Paulo Melo Sousa. Direto de São Paulo, o maranhense de Cururupu Tião Carvalho fará o show de encerramento da noite. Mas certamente muitos artistas não anunciados devem dar o ar da graça e arte nesta noite que promete.

Engenheiro civil de formação, Pixixita teve na música sua grande paixão: figura querida por quantos o conheceram, foi professor da Escola de Música do Maranhão. Falecido em 2002, tem sido lembrado anualmente por esta festa que cresce a cada edição. Os ingressos custam apenas R$ 20,00 e podem ser adquiridos no local. Abaixo, alguns momentos da edição de 2009, pra você entrar no clima, sacar qual é e ter desperto o desejo de pintar por lá mais tarde:

Mais Cesar Teixeira

A HORA DOS ANGELUS

CESAR TEIXEIRA

Ouçam! Ouçam a voz do tempo!

Sinistros navios piratas invadiram a ilha de Tupã com seus brasões, arcabuzes e espadas para o vernissage de uma nova França. Porém a arma mais desumana foi a cruz erguida em nome de Jesus sobre o sangue Tupinambá. Oh, desgraça! Oh, infâmia! Ainda hoje os filhos de Maria continuam sendo assassinados na Terra Prometida que lhes servirá de túmulo…Do pó para o pó! Desde então, todos os dias o cadáver de Cristo é arrastado para o Calvário do Itaqui tendo cravos de ferros nas mãos e nos pés. Embarcando, atravessa o Aqueronte para ser vendido nos sujos mercados colonialistas.

Misericórdia! Misericórdia!

Há 400 anos os galos cantam Misericórdia, mas as feridas continuam abertas. Úlceras da fome e do abandono se alastram pela madrugada Como um grito de tambor execrado pelos ouvidos surdos de políticos e autoridades. Autoridades de latrina! Urubus! Por que festejar o patrimônio desumano da miséria e do luto na Hora do Angelus, quando os sinos da anunciação pedem liberdade? Cidadãos de São Luís! Os fariseus vestidos de cordeiros são os mesmos ladrões que assaltam palafitados e jantam suas vísceras no Congresso Nacional. Não vos deixeis cair na tentação do bolo confeitado da infâmia, com suas velas de sangue e de breu. A faca está nas mãos de Lúcifer e as fatias serão negociadas entre os porcos da corte. Quem de vós irá comer desse bolo de aniversário?

Cristo Ressuscitará? Cristo Ressuscitará?

Siiiiiim! Cidadãos de São Luís…É chegada a hora! A hora de libertar Anjos e Lázaros Massacrados por políticas públicas de mentira! Fortalecei a trincheira contra a corrupção e o tráfico de almas! Basta! São 400 anos de miséria, de injustiça, de mãos implorando: Esmola pelo amor de Deus! Mas Deus também está sendo vendido no mercado negro das multinacionais que fabricam miséria e cobram dízimos dos crucificados pela fome. Cidadãos de São Luís, é chegada a hora do Anjo Rebelde! A mensagem revolucionária do filho de Deus já está em nossos corações. Ora pro nobis; Sancta Dei Genetrix…

Hoje o Verbo da Liberdade se fará carne!

[Por ocasião da Via Sacra. Roubei do Vias de Fato]