Nos últimos dias tenho visto fortemente uma campanha grotesca, sobretudo no facebook, em defesa da redução da maioridade penal e, em tom debochado, perguntas sobre onde estariam os defensores de direitos humanos, que supostamente não aparecem quando as vítimas de homicídios são policiais.
A redução da maioridade penal não é a solução para a violência, nem mesmo para minimizá-la. Começar a condenar severamente adolescentes aos 16 anos despertará, sem tardar, daqui a alguns anos, a vontade de reduzi-la, a maioridade penal, para 14, 12, 10 anos e assim sucessivamente. Em breve, cagar nas fraldas seria crime, passível de punição do bebê.
Os que defendem a redução da maioridade penal são, em geral, contra a política de cotas; é mais fácil punir quem também é vítima que atacar as reais causas do problema. Entupir celas de presídios com jovens a partir de 16 anos faria o sistema penitenciário cumprir ainda menos sua função primordial: a de ressocializar quem passa (e sobrevive) por ali.
Quem defende a redução da maioridade penal também é, em geral, a favor da pena de morte. Ora, já não é o que está acontecendo? Só não aos moldes de filmes americanos, onde se aplicam o fuzilamento, a cadeira elétrica, a eutanásia. Ou, em épocas mais distantes, o enforcamento ou a guilhotina. Em praça pública, de preferência, para aumentar a audiência e servir de exemplo a outros “bandidos”, “marginais”, “vagabundos”, que seriam, hoje em dia, digamos, os usuários de crack com seus olhares vidrados, em qualquer retorno ou semáforo.
Em suma, reduzir a maioridade penal não é solução para nada. Por outro lado, o discursinho fajuto de que “os direitos humanos só defendem bandidos” é pra lá de surrado. Repetido à exaustão por uma mídia que compactua com a opinião de que se deva reduzir a maioridade penal ou instituir a pena de morte no Brasil, agora é copiado indiscriminadamente por quem nem sabe que “os direitos humanos” não são uma entidade abstrata. O que são os direitos humanos? São os direitos de pessoas como este que vos escreve, vocês que me leem, moradores de rua, doutores, padres, policiais “que estão contribuindo com a sua parte para o nosso belo quadro social”.
O que muita gente esquece é que moradores de rua, mendigos e mesmo os ditos bandidos também são gente. Igualzinho a quem preconceituosamente torce o nariz e acha que matar quem dorme debaixo do viaduto é solução. Que acha normal a polícia acordar quem dorme no frio, ao relento, a base de cutucões de cassetetes, chutes de coturno, balas (de borracha ou não) e spray de pimenta.
Sabem por que “os direitos humanos”, no caso, as entidades de defesa dos direitos humanos, aprendam, ó preconceituosos!, aparecem quando um jovem negro é assassinado? Por que em geral as circunstâncias são “misteriosas”, o crime é cometido de forma covarde e brutal e o defunto acabará virando mera estatística, às vezes nem isso. Por ele apenas a família, quando muito, às vezes sem a (in)formação necessária para reivindicar seus direitos, seja a reparação (a vida de um filho, tirada, nunca será recuperada) e/ou a punição do(s) agente(s) responsável(is). Policiais por outro lado têm suas associações, sindicatos, o apoio da mídia, sobretudo a que empunha cassetetes em programas sensacionalistas baratos (apesar dos caríssimos patrocínios), além do corporativismo e da impunidade vigentes.
Uma imagem vale mais que mil palavras. Disse até aqui pouco mais que a metade disso, embora não tenha dito tudo. Resumindo, deixo-lhes o sempre genial Carlos Latuff, que traduz perfeitamente toda a hipocrisia vigente, do sistema, da mídia e dos alienadinhos do facebook.