Cuspindo os caroços na cara dos leitores

[Entrevista que os autointitulados “los cachorros borrachos” fizemos e publicamos na edição de fevereiro do jornal Vias de Fato. Em 2013 vocês ainda vão ouvir falar bastante deste trio cá no blogue: Bruno Azevêdo deve lançar ao menos três livros (começando por A intrusa, cujo anúncio está aí na cabeça), Celso Borges lança O futuro tem o coração antigo e Reuben da Cunha Rocha estreia, tudo pela editora Pitomba]

Vias de Fato entrevista os editores de sua irmã, a revista Pitomba

Os editores da Pitomba: Reuben da Cunha Rocha, Bruno Azevêdo e Celso Borges

POR IGOR DE SOUZA E ZEMA RIBEIRO*

O jornal Vias de Fato e a revista Pitomba têm muito em comum. Feitas quase sem apoio nenhum, as publicações buscam, cada qual a seu modo, dar voz a quem não tem na chamada grande – e “séria” – mídia.

Juntas, as publicações editaram, entre o fim de 2011 e início de 2012, o livro Guerrilhas, coletânea de artigos que Flávio Reis, guru dessa galera, entre entrevistadores e entrevistados, infiltrou na imprensa, tradicional e alternativa, ao longo destes primeiros anos do milênio.

Pitomba e Vias de Fato incomodam. A primeira não toca em política, ao menos não de maneira convencional. É uma revista de poesia, artes gráficas, literatura e sacanagem, no dizer dos próprios editores, os ludovicenses Bruno Azevêdo, Celso Borges e Reuben da Cunha Rocha.

Na mais recente passagem do último por São Luís, Vias de Fato aproveitou para ir ao encontro deles. Era uma tarde cinzenta, a cidade de ressaca das chuvas e do carnaval. Mais que uma entrevista, um descontraído bate-papo dos repórteres do jornal com os editores da Pitomba.

Uma caminhada por algumas ruas do Renascença, os dois repórteres e o trio de entrevistados, antes de ligar o gravador e pedir emprestada a Bruno Azevêdo a máquina fotográfica que captou alguns momentos do encontro (as fotoscas são de Zema Ribeiro). Destino: um boteco próximo, encher os cascos que ele tinha no apartamento com a cerveja que regaria a conversa. De volta ao apê, misto de residência e editora, os melhores momentos do bate-papo.

ENTREVISTA: BRUNO AZEVÊDO, CELSO BORGES E REUBEN DA CUNHA ROCHA

Vias de FatoComo foi que surgiu a ideia da revista?

Reuben da Cunha Rocha – Conheci Bruno na véspera de viajar [Reuben saiu do Maranhão para cursar Mestrado, primeiro em Santa Catarina, depois em São Paulo. Hoje está no Doutorado em Ciências da Comunicação da USP], começo de 2008. Nesse ano a gente conversou bastante por e-mail. Celso sempre foi um papo, de muitos anos. E aí tinha a história da Pitomba, da editora, que era uma discussão que tava rolando.

Celso Borges – A gente criticava o texto que Bruno fez [o Manifesto Pitomba, impresso nos livros que Bruno Azevêdo publicou por sua editora]. Ele é meio que um manifesto, é uma ideia de um texto… e aí, conversa entre a gente… vamos fazer uma revista? Eu sempre gostei de revista.

Reuben – Na verdade, a ideia de fazer revista, ela existe o tempo inteiro na cabeça de quem escreve, eu acho. Desde que me entendo por gente e converso com outras pessoas que escrevem, esse papo de “vamos fazer uma revista” sempre existiu.

Celso – E Bruno sempre trabalhou com fanzine.

#1

Vias de FatoTodo mundo tem alguma experiência, ou com fanzine, ou com blogue, que é uma coisa menos palpável. CB com a [revista] Guarnicê [editada por um grupo de poetas que levava o mesmo nome] ainda na década de [19]80, na época mais novo do que vocês hoje.

Celso – Antes. O [grupo poético] Arte e Vivência, final dos anos 70, aquelas revistas dentro do saquinho. Então, eu faço revista, de estar envolvido, desde o final dos anos 70. Depois veio o [grupo] Guarnicê, depois teve a [revista] Uns e Outros [do grupo Akademia dos Párias]. Eu gosto, acho que a revista dá uma alegria, é muito prazeroso fazer. Agora o exato momento em que decidimos fazer, não lembro.

Bruno Azevêdo – Isso tava sendo discutido, “vamos fazer uma revista”, “vamos fazer uma revista” e rolaram várias coisas. Mas o negócio para mim, pelo menos até onde eu me lembro, virou uma coisa “vamos fazer” quando Celso e Reuben baixaram lá em casa com uma pilha de um metro de revistas de poesia, “ó, é isso aqui que a gente quer fazer”. E eles deixaram lá em casa e vazaram. Vocês lembram disso?! Um monte de revistas! [Enfático, gesticula com as mãos, para dar ideia da grande quantidade]

Vias de FatoNessa pilha de revistas, por assim dizer, as referências da Pitomba? O que inspira vocês em termos de outras revistas que já existiam, ou melhor, que continuam a existir?

Celso – A Coyote inspira a Pitomba, a Oroboro, a Medusa, puta que pariu! São tantas. A Nuvem Cigana é uma coisa linda.

Reuben – A Revista de Autofagia é uma coisa importante também.

Celso – Quando me mandaram por e-mail um fascículo, aquilo é uma coisa linda, bicho, um exemplar único [a revista Nuvem Cigana teve número único]. Só tem uma e lá estão Chacal, Haroldo [de Campos], Augusto [de Campos], Hélio Oiticica, Wally Salomão… toda aquela energia dos anos 70, bicho, aquela revista é linda. Fotos, intervenções, tipografias, tudo ali naquela limitação, quer dizer, a gente chama de limitação porque vê de hoje, com a tecnologia que se tem, mas as intervenções iconográficas, porra, tu é doido? Aquilo é uma referência máxima. Para mim é.

Reuben – Mas acho que uma motivação fundamental, pelo menos para mim, era a coisa da editora. Quer dizer, fazer uma revista com o nome da editora, que é uma forma da editora circular mais rapidamente do que a edição de livros, que, pelo menos na minha cabeça, seria uma coisa mais lenta do que a edição de revistas, que seria uma forma de fazer acontecer.

Celso – Eu acho que revista tem um coração coletivo, coisa que para mim é muito estimulante. Com uma revista você consegue não só motivar as pessoas que estão fazendo, mas ao seu redor criar uma alegria, uma motivação, um esperar por uma Pitomba nova, um esperar por uma revista nova, o que é que vem ali, que forma, que poema. Isso aí é muito mais que um livro, até. Você não espera um livro. Uma revista você espera, você acalenta: “qual vai ser a da próxima revista?”, ou então “posso mandar um poema para revista?”, “posso escrever pra revista?”. As pessoas também querem fazer parte, tem uma coisa de divisão que eu acho legal.

Vias de FatoPorque tem isso de ser um espaço de publicar o material de vocês, quem faz poesia faz, quem faz tradução faz, quem faz quadrinhos faz, quem faz sacanagem faz. Mas tem o lance de publicar coisa dos outros e a revista não tem periodicidade, mas aí tem dois anos e cinco números, então mais ou menos um número a cada quatro, cinco meses. Mas isso não tá definido em lugar nenhum, acho que nem na cabeça de vocês.

Bruno – Não tem nada definido nessa revista em lugar nenhum, a não ser conteúdo. [risos]

Vias de FatoComo é que vocês decidem o conteúdo e a hora de fazer uma Pitomba nova?

Celso – Rapaz, é uma guerra… É uma guerra… [risos]. É uma briga, porque tem uma série de coisas que trabalham contra a gente também, contra cada um de nós e contra nós três juntos, que é a vida que cada um leva, que cada um tem que pagar suas contas, cada um tem sua vida, cada um tem não sei o quê mais.

Vias de FatoA questão geográfica atrapalha um pouco ou não? [Reuben mora em São Paulo]

Celso – Eu acho que a questão da operacionalização é uma coisa difícil, porque Bruno é um cara que trabalha em meio ao caos. Ele faz muita coisa ao mesmo tempo e a gente tem, eu tenho na minha relação com ele, eu tenho que ser um pouco assim…

Bruno – [interrompendo, enfático] Chato!

Celso – Eu tenho que hostilizá-lo, ele me hostilizar, porque é uma guerra, aí são três, mas a minha relação é mais próxima com Bruno porque ele está aqui e Reuben não tá, ele tá longe e então tem uma dificuldade.

Bruno – O trabalho de edição da revista é bem mais fácil que o de editoração da revista, que é até ela sair daquele computador bem ali [aponta para o cômodo do apartamento em que trabalha] para chegar no arquivo impresso. Isso é o mais traumático porque é o que demora mais.

Celso – A ausência de Reuben é sentida, não só por ser uma companhia, um cara que faz falta de estar junto, mas porque se senta eu, ele e Bruno numa tarde a gente já monta o esqueleto, entendeu? Agora eu ficando sozinho com Bruno, e Reuben lá, fica mais complicado porque tem uma dificuldade nessa operacionalização.

Reuben – Importa dizer que muito do trabalho recai sobre Bruno, porque só ele consegue diagramar a revista.

Celso – De texto, geralmente ele não quer se meter. [Irônico:] “ah!, eu não leio poesia” e não sei o quê mais, aquele negócio do rabicó do poema [gargalhadas gerais]. Isso eu divido meio com Reuben: “ah, tá ruim!”, “ah, tá legal!”, quando chega uma coisa com que ele concorda. Mas tem as discordâncias também, porque Bruno não quer ter o voto de minerva, ele se omite. Mas a distância de Reuben também faz com que surjam outras iluminações, coisas que ele descobre por lá, enfim.

Reuben – Mas o negócio de coletar material acaba cada um sacando o que acha interessante, ou pega e lembra alguém, se tem material suficiente para fechar as 44 páginas.

#2

Bruno – Tem coisas que pertencem e não pertencem ao que a gente imagina que a revista comporte. Nós três vamos te dar repostas diferentes sobre o que a revista comporta, mas no final das contas, esse lance que Reuben está falando da coleta, da cota, “pô!, isso daqui vai ficar massa” ou “isso daqui não ia ficar massa”, ou de repente tem um cara que nós três conversamos, que a gente acha uma inteligência, por assim dizer, que poderia estar por aí, tipo o [poeta Fabiano] Calixto, agora nessa última edição que saiu, que é um cara massa e blá blá blá, que está fazendo coisas legais e não sei o quê.

Celso – A gente fica naquela coisa, de abrir a revista, porque a princípio pensou em fazer um negócio de escritores do Norte e Nordeste, ou que estando fora, atuem nesse circuito. Eu já penso que pode abrir e sair um pouco desse sufoco, de que não necessariamente sejam artistas do Norte, mas tem um conceito que a gente não tem mais certeza se continua ou não.

Reuben – Nunca conversamos sobre isso com o passar do tempo. Isso foi posto inicialmente, e eu com o passar do tempo passei a achar que é um conceito armadilha.

Vias de FatoDe repente colocar alguma coisa que possa “despitombar” a revista?

Reuben – Que pode ser bom. Na verdade a gente fica naquela de ficar cavoucando nessa história de Norte e Nordeste e isso servir para legitimar uma ideia de folclore, regionalismo ou panela, de ter que colocar o cara porque ele é nordestino. Então para mim é a mesma questão de colocar gente do sul ou de qualquer lugar e ver que, pera lá!, isso não tem nada a ver.

Bruno – A própria ideia de fundar a editora é porque, num determinado momento, depois de fazer zines e livros, eu percebi que estava completamente marginal, fora do mercado. No final das contas tinha só eu lá dizendo “olha meu livro!, olha meu livro!” e que coisa antipática! A editora impessoaliza, parece uma instituição. Então, o critério para mim parece muito mais: esse sujeito aqui não consegue espaço; é bom e não consegue espaço em algum outro lugar. Porque, porra!, na prática você sabe que se mandar o original para 20 editoras, nenhuma vai te responder. Nenhuma mesmo! A maioria delas, na hora que tu abres o negócio [site], “não recebemos originais, exceto do Paulo Coelho”. Ou se tiveres uma indicação de dentro. Então, nesse aspecto, quando tu estás geograficamente distante, aí o critério geográfico é legítimo, tu não consegues existir, porque tu só consegues mesmo ter acesso a esses caras quando tu conheces alguém, e tu só conheces alguém numa mesa de bar, num lançamento e alguma coisa assim. De outra forma tu não existe, pô! Tu não existe mesmo.

Celso – Tem um elemento na revista que eu acho que não devemos abrir mão, embora seja uma característica e um traço que incomode muita gente, que nós temos essa coisa da despersonalização: as revistas não só não têm um nome na capa, como ela não tem o nome de quem escreve na capa e isso irrita muita gente. Mas esse retorno é pequeno, em todos os sentidos. Então eu acho que tem que manter o atrito, é uma característica da revista. Isso a gente não tem que abrir mão, nem é essa coisa do atrito, é a coisa da irritação mesmo.

Vias de FatoEu acho que é a única revista que não tem o nome na capa.

Bruno – É, porque se colocar o nome vai ter que colocar junto “revista de literatura contemporânea brasileira”. Imagina que coisa ridícula…

Celso – Ia ter que fazer editorial como se fosse um slogan, como se fosse uma frase.

Vias de FatoA propósito, o primeiro editorial de vocês é muito marcante, e eu acho que dá um pouco a ideia, além dessa coisa toda de despersonalização e talvez um pouco de não se levar a sério, eu não sei bem se é isso ou se é só isso, mas o lance do “quer fazer faz” [este, o texto do editorial], já que vocês não têm apoio ou os apoios que têm são pequenos, não cobrem a edição, o negócio sai do bolso mesmo, o lance de não ficar só reclamando, que “o poder público não me apoia”, que “a iniciativa privada é tímida”, isso e aquilo, então é aquela coisa de botar o bloco na rua.

Reuben – A prática é ficar 40 anos esperando até alguém reconhecer que eu sou um bom artista e tem interesse em… [se interrompe] Isso não vai acontecer! Não vai acontecer mais em lugar nenhum, isso acabou, é coisa de até metade do século XX e quem não sacou isso daí, não vai rolar mais nada, entendeu? [risos]. Então, não é uma reação à falta de apoio, é uma reação à mentalidade que espera apoio. Nós não temos apoio, portanto faremos. Porque raios a gente vai esperar apoio se a gente quer fazer o negócio e o quê que isso tem a ver com o Estado? 

Bruno – Os meios são completamente democratizados, digo os meios, as ferramentas, nós somos pessoas adultas, conseguimos excedentes com o nosso trabalho que dá pra fazer essa porra, então que diabos a gente vai ficar esperando uma secretaria abrir um edital?

Vias de FatoMas vocês entrariam num edital?

Bruno – Eu não! A revista não. Não mesmo, cara.

Celso – A gente não botou nem o nome na revista, vai botar o logo de uma fundação ou sei lá… É uma questão de postura mesmo, eu acho que tem que ter um distanciamento, eu acho que eventualmente, não com a revista, mas você pode, como escritor, fazer parceria com o poder público em algum momento, ou como poeta ou como artista subir num palco. Eu já fiz isso. Nenhum livro meu tem um carimbo de uma secretaria de cultura ou fundação cultural. Não vou dizer que nunca vai ter isso, eventualmente pode até ter, mas dentro de mim eu me sentiria um pouco constrangido com aquilo. Eu prefiro não ter, eu acho que o artista tem que manter um distanciamento. Ele pode eventualmente até fazer parceria com o poder público, mas ele tem que manter o poder público como um inimigo, como um cara que não deve se aproximar muito. Eu acho que é ele que não deve se aproximar muito para que não seja atraído, sei lá como é que se pode dizer isso, a gente trabalha com mais autonomia, trabalha com mais força para dizer aquilo que quer porque o poder público, ele vai calar você.

Bruno – Tem a questão que o poder público é tudo, menos público. Ele é pessoalizado. Ele não é pessoalizado apenas ideologicamente, mas socialmente.

Vias de FatoNão é querendo que vocês coloquem ou não uma logomarca, concorram ou não a um edital, recebam ou não recurso. O poder é pessoalizado e aí, tipo: se não tem a Pitomba recebendo verba pública, tem uma porcaria recebendo verba pública e difundindo arte e literatura de qualidade duvidosa.

Bruno – Por mim tudo bem, pra mim tá tranquilo. Eu acho que não devia ter verba pública investida em arte!

Celso – No caso aqui de São Luís é mais triste, não tem nenhuma revista do poder público! É triste! O poder público não faz uma revista de literatura. Podia juntar, fulano me dá um artigo tal, fulano me dá um quadro tal, mas ninguém tem é motivação. Eles não saberiam como administrar a divisão desse bolo. Como eles não podem contemplar a todos, só poderiam contemplar alguns, então eles decidem não fazer e não fazem.

Bruno – Pois é, porque não haveria nenhum critério estético, haveria um critério de geração, de subservilismo [sic].

Celso – Em Natal, por exemplo, existe revista do poder público.

Bruno – Tem aquela revista da Biblioteca Pública de Curitiba.

Vias de Fato[O jornal] Cândido. Cândido é lindo! [A revista] Helena e tal, que é dessa grossura [gesticula com os dedos], que é da biblioteca também.

Reuben – Tem um uma coisa interessante nesse negócio de edital no Brasil, que é por meio deles, especialmente da Petrobrás, que se tem conseguido que o artista se coloque como profissional. Ele pode ficar oito meses ou um ano escrevendo um livro. Isso é um trabalho, não é um favor. Isso não deixa de ser interessante, a figura do artista como profissional, que vai ter um dinheiro para fazer isso e não ter que correr numa coisa para, pelo menos, conseguir pagar o livro. Isso historicamente não é desprezível, mas isso gera uma série de comprometimentos que não faz sentido o sujeito se meter nisso daí. Você pega um livro de Joca [Reiners Terron, escritor], que o cara teve que passar por uma série de burocracias assim enorme só para mudar o título, que tinha sido inscrito um título e ele queria colocar outro e não podia. Com o mercado não é diferente, não dá pra dizer que se eu estiver sendo patrocinado por uma empresa privada eu seria mais livre do que se estivesse sendo patrocinado por uma empresa pública. Pra mim não faz diferença.

Bruno – A questão é, até onde eu consigo ver, a política do edital tá fazendo gente rica ficar mais rica.

Celso – O cara pode entrar também, pode fazer a parceria com o poder público, mas manter sua integridade.

Reuben – O problema é que, por onde começou essa história, não sei por onde começou, mas por onde se desenvolveu bastante foi no cinema, em que se chega a um ponto onde o sujeito não faz filme se não tiver dinheiro público. Quer dizer, não passa pela cabeça do sujeito que se ele não tiver 100 mil para fazer o filme, ele que faça o filme. Tu achas que as verbas vêm de onde? Se o sujeito quiser fazer um filme ele faz nesse apartamento aqui, com duas câmeras ou uma câmera, e seis atores. Ele não vai conseguir fazer um épico hollywoodiano, com duzentas locações, um filme na Amazônia etc., alguns projetos dependem realmente de dinheiro, mas o que eu quero chamar a atenção é para a imobilidade do cineasta. O sujeito não faz. Mais radical e mais independente que se possa fazer no Brasil, hoje ele tem dinheiro de lei de incentivo.

Vias de FatoPatrocínio da Petrobrás. Todo filme brasileiro começa “este filme foi selecionado pelo Programa Petrobrás Cultural” e depois logomarca, logomarca, logomarca.

Reuben – E se o sujeito não conseguir, ele não vai fazer o filme.

Bruno – Tem gente que faz filme massa sem dinheiro público, como no [documentário] Brega S/A [sobre a cena musical contemporânea em Belém do Pará], que começa logo “esse filme não tem dinheiro público nenhum”.

Celso – Mas isso é muito excludente, cara. Porque um filme como esse vai ter um público muitíssimo menor.

Reuben – Não necessariamente.

Bruno – Eles distribuem de graça na internet.

Vias de FatoTem um ponto, voltando a essa história da Pitomba aqui e do cenário, que é a história da Pitomba, que está em São Luís e São Luís que tem um histórico de artistas e intelectuais a serviço de dados grupos políticos. Como é que a revista se situa nesse campo, já que ela está à margem?

Celso – Ela se situa contra essas pessoas. Se tu pegares a primeira Pitomba, lá no [texto de Roberto] Bolaño [traduzido por Reuben na contracapa] é uma porrada; a segunda contracapa, cada contracapa é uma porrada. Na revista tem todas as repostas que tu tá falando aí. Acho que a segunda é que fala melhor dos artistas, aquilo é uma porrada!

Bruno – A revista tem uma série de indicações, mas as coisas não são dadas.

Reuben – A própria ideia de se manter distante dessas relações já fala sobre esses artistas e o fato de nenhum deles estar na revista.

Vias de FatoSe a esquerda abomina, a direita ignora.  Aquela história de alienante e alienado. A esquerda clássica, naquele modelo de partidos e sindicatos.

Celso – Há um silencio. Me mostre alguém que tenha se manifestado sobre a Pitomba publicamente. [O artista plástico] Jesus Santos [link para assinantes com senha] que escreveu n’O Estado do Maranhão.

Bruno – E [José] Loredo [proprietário da Livraria Resistência Cultural, que se negou a vender exemplares da revista, alegando ofensas ao cristianismo], que excomungou a gente! É o silêncio total. Não existe discussão sobre arte em São Luís.

Celso – Com raríssimas exceções, esses três, Loredo, Jesus Santos e o blogue do Zema, nunca ninguém falou nada sobre a Pitomba publicamente. Esse é o ponto!

Vias de FatoModéstia às favas, não existe crítica.

Bruno – Queria ou não a gente tenta ainda fazer, nem que seja resenhando livro um do outro.

Celso – A única crítica que rolou foi do Loredo e do menino lá, o Ronald [Robson], defendendo em blogue e tal. Agora, que a gente sabe que pessoas da esquerda não gostaram, a gente sabe. O que eu quero dizer é que não existe, a única vez que alguém falou foi da direita. Por que a revista tem a provocação, ela tem arrogância, vamos dizer assim.

Vias de FatoÉ iconoclasta total, se é que isso pode ser um adjetivo.

Celso – A gente sabe que nos bares se fala dela.

Bruno Azevêdo dá um gole durante o papo

Bruno – A revista tem uma existência concreta nem que seja nas conversas de bar, e, porra!, eu quero é estar na conversa de bar.

Celso – Na Pitomba, às vezes, se sobressai um pouco o lance da imagem, um editorial ou uma coisa que Bruno faça. Mas ali, velho, estão 60% de poesia, pode ver, ou é tradução ou é alguma coisa que eu faço, ou é coisa de alguém.

Bruno – Pode ver que esse negócio de poesia deu tanto na minha cabeça que fiz uma fotonovela.

Vias de FatoQue eu achei sensacional! E isso volta para aquela discussão sobre financiamento, independência e coisa e tal, porque se tu tivesses um apoio do que quer que fosse, tirando [o bar] Chico [Discos] e [a livraria] Poeme-se, mas tu irias criticar tua própria revista dentro da revista?

Bruno – Rapaz, ninguém ia me publicar senão eu. Quase todas as coisas que eu escrevo, não é nada enquadrado assim, ninguém consegue transformar em um produto fácil para dizer “isso aqui é isso aqui” e a revista tá meio nesse negócio.

Reuben – Isso é uma coisa que deve perturbar a leitura de quem está aqui porque talvez a leitura da revista seja um negócio difícil de localizar. Primeiro que a revista não é uma revista de poesia. Não tem uma ordem, não tem uma prioridade. Então, [o professor] Flávio Reis contou uma história do primeiro lançamento da revista que talvez possa ser ilustrativo. Ele disse que tava sentado no lançamento da revista e tinha um pessoal dizendo “vem cá, olha isso daqui, essa revista não tem como vender”, querendo dizer que era um negócio mal acabado e tal. O que não deixa de ser interessante também. E Flávio perguntou: “rapaz, vocês acham que esse pessoal está interessando em vender?” Mas eu tô dizendo isso porque eu tenho a impressão de que a gente não tá preocupado com nada, então, isso dá certa flexibilidade de critérios, que no fim das contas a gente bota o que tá a fim de botar e não bota o que não está. Pronto.

Celso – E as pessoas ficam, talvez, procurando um sentido, uma estratégia.

Bruno – Uma razão de ser, [irônico:] onde se situa o marxismo contemporâneo na narrativa.

Celso – Tem um negócio de confundir, de desabilitar, de você não saber direito. Rapaz, você tem uma tradução de [o poeta e. e.] cummings e o cara lá comendo as hóstias, tem a pornografia, tem as coisas opostas, que não teriam uma unidade. A revista trabalha quase como se não houvesse um conceito que ligasse uma coisa a outra.

Reuben da Cunha Rocha ri: “a Pitomba não tem absolutamente nenhuma seriedade”

Reuben – Agora aí, eu acho, e pessoalmente, se ninguém percebeu, isso precisa ser dito, que daí vem talvez o mais interessante da revista: o fato de que ela não tem absolutamente nenhuma seriedade. De critérios, e não tem nada assim que se possa dizer que a revista não publicaria, poderia até não publicar por falta de interesse ou gosto pessoal nosso, como não achar bom, mas coisa tipo censura de conteúdo, moralismo, não tem como dizer que não tem uma revista na literatura que se possa dizer isso. Toda revista de literatura é séria. A seriedade acompanha, seja a poesia seja a prosa. Escritor é um sujeito sério. Foi a única revista até hoje que conseguiu fazer isso daí foi a Pitomba. Inclusive daí vem alguma fraqueza, porque a gente publicou muito texto ruim ao longo dessas cinco edições. Agora, o que levou a isso foi de onde vem a principal força dela, que é isso daí.

Celso – Agora imagina uma revista em que você faz um assassino de funcionários públicos [a série O matador de funcionários públicos, de Bruno] onde 80% da população é funcionário público. É claro que você vai ter uma raiva introjetada na cabeça de muita gente.

Vias de FatoÉ porque também tem muito o lance de você só poder falar de dentro. Para você falar de funcionário público você tem que ser funcionário público.

Bruno – E funcionário público não vai falar porque já está morto de feliz por estar lá.

Vias de FatoOu você tá empertigadinho lá, contente porque o salário não atrasa etc., até atrasa [lembrando o calote de João Castelo (PSDB) às vésperas de deixar o cargo e o parcelamento da dívida pelo atual prefeito Edivaldo Holanda Jr. (PTC)]. O que fica provado é que o pessoal perdeu a capacidade de rir de si mesmo. Seja funcionário público, seja sei lá o quê.

Bruno – Esse negócio dO matador ninguém comenta, eu acho isso tão engraçado, ninguém diz nada.

Reuben – Nem pra dizer que “eu não gostei disso”.

Bruno – Moreira da Silva passou a vida inteira sendo motorista de ambulância. O cara, um dos criadores do samba de breque, um dos maiores cantores do samba brasileiro, teve uma carreira longeva no samba e ele chegou a viajar e passar três meses em Portugal fazendo turnê e o chefe dele dizendo “não se preocupe que você é um funcionário de utilidade nacional” e pronto. Tu não achas que houve gente que precisou ser socorrida pela ambulância que Moreira dirigia, ou deveria dirigir? Eu não posso achar graça disso, por mais que seja engraçado.

Celso – Tem também a história da alta e da baixa cultura. Muitos olhares sobre a revista são de crítica, do mau gosto que algumas pessoas devem achar, mas também que há eventualmente uma pobreza, que pertence a uma baixa cultura, que não é uma literatura que seja levada a sério. Eu acho que isso a Pitomba também coloca na cabeça das pessoas. “Isso daqui é literatura?”, isso é uma questão que também vem à tona. Tem a questão do pornográfico e erótico. E aí se tem um especialista no assunto [aponta para Bruno]. Tu olhas lá o [quadro] A origem do mundo, do [pintor Gustave] Courbet e mostra o sexo lá e tal. Pois é, isso é mau gosto? É erótico ou pornográfico? Eu sempre venho observando essa coisa, do que é mais literatura, do que é literatura mais séria, do que não é.

Vias de FatoVocês acham que há um desprezo total por parte da crítica? É por isso que ninguém comenta O matador de funcionários públicos ou outra coisa?

Bruno – Que crítica? Não existe crítica! A gente desprezaria se a crítica existisse.

Celso – O único cara que fez alguma crítica foi Ronald Robson. O único, o único! Foi uma crítica de acordo com o que ele pensa.

Reuben – Uma crítica inteligente, o cara leu a revista e raciocinou em cima daquilo ali, se dispôs a escrever sobre uma revista da qual ele sequer gostou. Por outro lado, a gente não deixa de ter respostas entusiasmantes. Não dá para ser injusto.

Bruno – Rapaz, o papel da revista é grosso demais para ser papel higiênico. Então de alguma forma alguém lê.

Reuben – Também, essa relação é tipicamente nossa, né? Quem foi que gostou, quem foi que não gostou e a gente começa a mapear o negócio. A diferença é que a gente está fazendo isso daqui sem nenhuma intenção de por conta disso o negócio começar a “fulano de tal não entra, cicrano também não”. Então a questão não é tanto de gostarem ou não gostarem, mas de um retorno que dissesse que a revista é interessante por isso, não é interessante por aquilo.

Bruno – Eu penso muito mais em livros do que na revista. Eu penso muito mais na proposta do livro, que ‘nego’ tem que fazer seus livros e tal. Talvez eles tenham uma possibilidade de exploração de ideias mais interessante, enfim, a ideia é continuar fazendo livro e revista.

Reuben – A revista essencialmente é um negócio efêmero, por mais que ela continue, que tenha 20 edições, com o tempo ela vai se perdendo. Livro, o sujeito guarda. Revista chega uma hora em que o cara vende pro sebo, dá pros amigos, perde e tal. Agora, isso não é um problema, o lance é permitir que ela fosse mais experimental ainda, mas “isso daqui vai se perder”, foda-se! O importante é testar a mão e ver o que dá para fazer e o que não dá para fazer.

Vias de FatoCelso, tu estás com mais de 50 e já fazia revista com menos de 20.

Celso Borges: poesia e teimosia

Celso – Rapaz, se eu tiver saúde com 80, uma revistinha lá eu vou estar fazendo…

Vias de FatoPor tudo aquilo que a gente conversou aqui às vezes tu não te sente meio pregando no deserto, não bate certa depressão? Será que alguém vai ler a revista?

Celso – Não bate depressão. Acho que às vezes bate um desestímulo. Mas aí tem o lance da disciplina. Sempre foi assim e sempre vai ser. Tá na minha cabeça, tá na minha alma, não tem resposta para isso. É como se fosse uma coisa que eu precisasse fazer.É uma doença, uma maldição, como diz Fabreu [o poeta Fernando Abreu].

Vias de FatoComo é a seleção do que a Pitomba, a editora, não a revista, o que ela publica e não publica?

Bruno – É uma questão pessoal, o que eu acho que deva ser publicado.

Vias de FatoUma vez eu perguntei, que eu nem lembro sobre o quê, mas qual é a sensação de colocar um selo na capa de um livro, e tu me respondeu que era ilusão de achar que tem uma editora.

Bruno – É. É isso mesmo.

Vias de FatoComo é o financiamento disso? Tu? Tu e o autor? Depende?

Bruno – O disco [Z de Vingança] do [Marcos] Magah eu paguei todo. Exceto a gravação, o resto eu paguei tudo. Porque eu peguei o disco, esse cara ta aí, não tem dinheiro nenhum. Ele tá com o disco tem uns seis meses e esse disco precisa existir. Tem tudo a ver com a ideia da editora. Porque eu só fiz O Monstro Souza porque Souza [proprietário do cachorro-quente homônimo que inspirou o livro] me deu boa parte da grana para fazer o livro, então eu tenho uma certa obrigação e vamos ver o que vai acontecer. O trabalho de editoração de outros livros eu não cobrei nada pra ninguém. Do [poeta] Dyl [Pires, O perdedor de tempo], da [poeta] Jorgeana [Braga, A casa do sentido vermelho, a ser publicado em breve]. Por enquanto é assim que funciona, o livro da [jornalista] Karla [Freire, Onde o reggae é a lei] eu e ela que pagamos tudo pro livro sair.

Vias de FatoE as vendas?

Bruno – Já vendeu umas 110 cópias. No Riba [livraria Poeme-se] já esgotou, eu repus hoje; na [livraria] Leitura eu ainda não fui; no Chico eu também ainda não fui. Tem tido certa saída. Já recuperou 30% do gasto. Eu nunca espero dinheiro de volta. Quer dizer, só em prestação de serviços que pode ser reinvestido como em achar um cara como Magah. Vai sair o livro de Reuben, o da Jorgeana. Tem uns livros para lançar aí e sempre aparecem outras coisas. Mandam coisas, me mandam originais, mas eu fico sempre desconfortável em ler porque vai que eu leio e o livro é uma merda? Então eu sempre tenho que dizer alguma coisa. Se me aparecer um livro de poesia eu jogo para esses dois aqui.

Vias de FatoEntão, a editora usa os editores da revista como conselho editorial, digamos assim?

Bruno – É, eu jogo direto para eles. Ainda mais porque se aqui em São Luís sabem que tem uma editora que publica livro de poesia, tu é doido!, ia ter todo dia 20 livros de poesia aqui em casa. Todo mundo é poeta, sabe aquele cara bem ali? [aponta um transeunte pela janela] Ele é poeta, pô! “Ó, São Luís”, e coisa e tal. A poesia é apologética em relação à cidade ou preocupada em falar da própria poesia. É o negócio do rabicó.

Reuben – Para mim essa é a grande ironia, a maior obra de Nauro Machado é essa tiração de onda de com todo mundo: “Ô, meu poeta!”, todo mundo é poeta.

Bruno – Esculhambou geral.

Vias de FatoOutra afinidade de vocês é a música. Vocês estiveram juntos no palco para o lançamento de Belle Epoque [mais recente livro de poemas lançado por Celso]. Tem alguma possibilidade ou previsão de vocês tocarem juntos novamente?

Celso – A gente queria fazer um lance de rock’n roll com leitura. O grande lance é a disponibilidade de tempo. Pra mim é na hora, fazer um som com esses camaradas. Agora tem que ser uma coisa igual ao que teve no Belle Epoque. Ali a gente teve um mês livre para fazer aquilo. [O baterista André] Grolli, [o violonista André] Lucap, esse rapaz [Bruno] totalmente disponível, [o guitarrista] Reuben. No dia em que Bruno me ligar pra gente fazer um som eu tô aqui na hora e Reuben pega o helicóptero dele.

Reuben – Ah, de novo não, mas outra. Fundamental é o cara quebrar a ideia de que ele vai conseguir manter as coisas. O fundamental aqui sempre foi fazer tudo. O sujeito tem tempo para fazer um som, ele vai fazer, não tem, ele vai fazer outra coisa. Tem para um zine, ele vai fazer, não tem, faz outra coisa. Se não ele vai ficar a maior parte do tempo parado e fazendo as coisas no tempo livre, as coisas não vão durar. O lance é o tempo livre. Se juntar de novo, as coisas vão mudar, tudo muda o tempo todo.

 

Celso – A música talvez seja a coisa que mais nos ligue. Eu tenho uma preferência, Reuben tem outra, mas entre a gente bota ali o rock. A gente se une bastante, bota o rock’n roll ali. Tem uma identificação com a linguagem do rock. Tem essa diferença de Bruno não gostar de poesia, tem a formação dele em quadrinhos. A minha é precária, ficou para trás. Eu tento pegar alguma coisa com ele, mas eu não tenho a formação e a influência que tem na obra dele.

Reuben – Restos Inúteis [título de poema de Celso que deu nome à banda que o acompanhou no show de lançamento do livro] foi um nome que muita gente não gostou, quer dizer, algumas pessoas. Porque não é sério. Não basta ser resto, ainda tem que ser inútil.

Bruno – Se fosse Parnasianos Alados…

Pitomba cinco, Pitomba quinta

Quinta edição da revista Pitomba! terá relançamento na UFMA, nesta quinta-feira. Além do que anuncia a imagem abaixo, haverá fotoprojeção de Kenny Mendes e discotecagem de Danilo Santos. A promoção é do Centro Acadêmico de Filosofia.

Divulgação

Tempo de Pitomba!

Joacy James

Há quem não goste de pitomba, a fruta, pelo excessivo trabalho, haja paciência, que ela dá para ser apreciada: tirada a casca, rói-se até o caroço, um quase nada azedinho de prazer.

Há quem não goste da revista com nome de fruta, vai entender, talvez por razões opostas. A Pitomba chega ao quinto número, fruto dos esforços de um pequeno time de talentosos teimosos: Bruno Azevêdo, Celso Borges e Reuben da Cunha Rocha, todos por demais conhecidos dos poucos mas fieis leitores deste blogue.

Não merecesse apreciação por nada, a revista por si só já estaria escrita entre nossas grandes revistas de artes por alguns motivos. E eu não tou falando de nosso quintal-Maranhão.

Juntar estas três cabeças pensantes em um projeto, o primeiro, escritor hoje reconhecido nacionalmente, o segundo, um poetaço, teimoso que já fazia revistas antes mesmo dos outros pares terem nascido (saibam: não é fácil manter acesa essa chama), o terceiro, hoje morando em São Paulo, talentoso poeta, competente tradutor.

Fazer uma revista bonita, a baixo custo, mapeando talentos, mesclando artes visuais, poesia, sacanagem, literatura, hq, bom humor.

Meter as mãos nos bolsos, quando o patrocínio e as vendas em bancas não cobrem os custos (o que sempre acontece!).

Louvem-se a livraria Poeme-se e o bar Chico Discos: nossas multinacionais culturais locais não são megaempresas, mas têm colaborado um bocado ao longo dos últimos anos para iniciativas inteligentes, interessantes. São as duas únicas logomarcas que aparecem nas páginas da revista, oxalá sirvam de exemplo a outros pequenos, médios, grandes empresários.

Abre este post um cartum bomba inédito do saudoso Joacy James, uma das artes nas páginas desta Pitomba number five. Há ainda fotos de André Lucap (a capa é dele também), traduções de Samarone Marinho (de poetas argentinos) e Reuben da Cunha Rocha (e. e. cummings), poemas de Celso Borges, contos do pernambucano Fabiano Calixto, quadrinhos de Bruno Azevêdo, Rafael Rosa e Ricardo Sanches.

O lançamento é hoje às 19h, no Chico Discos.

Pra todo mundo se jogar!

Aviso, de já!: lançamento da revista Pitomba #5, quinta que vem (10), no Chico Discos:

Divulgação

Com a presença dos editores Bruno Azevêdo, Celso Borges e Reuben da Cunha Rocha.

 

A maior miniturnê de lançamento do mundo

O Fabreu é um cara sábio, já ouvi não sei quantas vezes o mano Reuben dizer isso, com o que concordo.

Ele tem um jeito de monge, seja pelos óculos ou pelo pouco cabelo que conserva, num corte militar, à falta de outro adjetivo, que de militar o poeta tem nada e, nunca ouvi a opinião dele, mas aposto meu reino que ele é até contra o serviço militar obrigatório (como este blogueiro também é, e a favor da desmilitarização das polícias, mas isso é outro assunto). Além do quê, tirando o deslocamento cotidiano para o trabalho, Fabreu quase nunca sai de casa, a não ser que a coisa valha muito a pena (estou devendo ajudá-lo a devorar uma peixada em seu apartamento, dívida que, não duvidem, terei o maior prazer de pagar em breve).

Como é o caso de ele lançar em Brasília seu mais recente livro, aliado involuntário, como anuncia a imagem que ilustra este post.

Fabreu, aliás, é como nós, íntimos, chamamos o jornalista e poeta Fernando Abreu, figura querida, parceiro de Zeca Baleiro em hits como Alma nova, Cachorro doido e Guru da galera. Autor de três livros de poesia, o que ele lança quarta-feira em Brasília mais O umbigo do mudo e Relatos do escambau.

À colônia maranhense em Brasília e/ou aos que gostam de poesia em geral, fica o recado. E digo mais: Fabreu tem o que dizer, um dos argumentos com que lhe convenci a abrir o blogue. E mais: acredito que um dos segredos da sabedoria do bardo Fabreu está na capacidade de zo(mb)ar de si mesmo. O título deste post, roubado daqui, prova isso.

Ora, se a gente não tira uma auto-onda, alguém vai fazê-lo, né? Como perguntaria o Tom Zé, “por que então essa mania de parecer tão sério” que acomete a tantos poetas por aí?

Lawrence Ferlinghetti recusa prêmio húngaro sobre Direitos Humanos

POR CAROLYN KELLOGG
DO LOS ANGELES TIMES BOOKS

TRADUÇÃO: ZEMA RIBEIRO

O poeta em frente à sua livraria em 2003

O poeta e editor Lawrence Ferlinghetti, proprietário da City Lights Bookstore em San Francisco, declinou de um prêmio húngaro de mais de 64 mil dólares, alegando preocupações sobre direitos civis e liberdade de expressão.

Não é pequena a ironia de que o prêmio recusado por Ferlinghetti, o Prêmio Internacional de Poesia Janus Pannonius (Janus Pannonius International Poetry Prize) seja oriundo de uma divisão húngara do PEN (caneta em inglês, a sigla), organização internacional que apoia a liberdade de escrever e frequentemente realiza campanhas para ajudar escritores que foram presos ou silenciados.

Ao saber que o prêmio foi parcialmente financiado pelo governo húngaro, Ferlinghetti escreveu uma carta expressando suas preocupações. “Se o prêmio é em parte financiado pelo governo húngaro, e as políticas de direita deste regime tendem ao autoritarismo e o consequente cercear das liberdades de expressão e civis, penso ser impossível, para mim, aceitá-lo nos Estados Unidos. Assim, devo recusar o prêmio em seus termos atuais”, diz um trecho.

Ferlinghetti (93) serviu a Marinha na Segunda Guerra Mundial. Estava na invasão da Normandia e visitou Nagasaki uma semana depois da bomba atômica.  Ela “era como um par de quilômetros quadrados cobertos de nada, mas com cabelo humano e ossos saindo, algo horrível de se ver”, declarou ao PBS (Public Broadcasting Service) há 10 anos. A experiência relatada foi o início das convicções políticas do pacifista.

Mas Ferlinghetti é também um lutador. Em 1956 ele colocou sua jovem livraria e editora no centro dos debates sobre a liberdade de expressão ao publicar Uivo, de Allen Ginsberg. O editor chegou a ser preso, mas foi absolvido pela corte, após provar que o poema não era obsceno.

Ao rejeitar o prêmio, Ferlinghetti tentou doar o dinheiro a um fundo de apoio a casos de liberdade de expressão na Hungria, mas não ficou satisfeito com os esforços da PEN húngara em atender seu requerimento.

* O tradutor agradece a leituratenta e as dicas preciosas de Igor de Sousa e Reuben da Cunha Rocha.

Só me tornei editor porque não arrumei um!

Obra publicada em edição da revista Pitomba

Ficaria feliz em ter alguém que cuidasse de toda a parte chata do trabalho. Sobraria mais tempo pra escrever e terceirizaria o custo do material todo, que lucro mesmo eu nunca esperei. Grifes também fariam bem ao espírito, se calhasse.

Mas não calhou.

Tenho aqui tantas cartas de recusa de originais, que dava pra escrever um romance nas costas delas. Um dia uso pra alguma coisa, existe estilo, humor e sarcasmos deliciosos nelas.

A ideia da editora foi a de criar uma falácia. E se eu não fosse eu? Se me institucionalizasse? Criasse um nome de fantasia? O de batismo tinha falhado de todas as maneiras.

Meses depois, transformei o incômodo num pequeno texto chamado Manifesto Pitomba, no qual tentava enumerar problemas e soluções, mas que acabou brutalmente censurado pelo Reuben [da Cunha Rocha] e pelo Celso [Borges] — que têm mais senso do ridículo que eu — mas que insisto em colar, pequenininho, nos meus próprios livros. É no ridículo que opero.

Mas vamos lá. Ao problema.

Nossas possibilidades de edição se resumem a duas secretarias de cultura que valem menos que a merda do pombo da cumeeira do Oscar Frota. Os editais são escritos por um paquiderme, executados por um protozoário e resultam em livros tão feios que, ao longo dos anos, recusei-me a ler vários por não suportar o contato com o objeto.

Os caras não se importam com algo com o qual eu me importo muitíssimo, e isso me emputecia! Me inscrevi nesses editais por anos e anos, ganhei algumas vezes, mas nunca saía nada! É preciso que vocês entendam que um dia eu levei esse povo muito a sério. Eu até lia os poemas, porra!

Com o tempo, passou a me incomodar mais a atitude dos autores, que se sujeitam ao [Concurso Literário e Artístico] Cidade de São Luís todos os anos, sabendo do embuste, como se sujeitam aos editais da Secma (quando esta os faz). O trabalho deles ficava, ao logo dos anos, tão medíocre quanto o esquema todo. Parecia que os editais, antes de promover o tal fomento à produção, a viciava. Há de se tirar o chapéu ao funcionismo, conseguir travar gerações inteiras com uma estratégia de edição tosca e migalhenta como esta é um lance de gênio. Gente que, anos antes, tava amolando as pontas das facas aos murros.

A Pitomba é uma forma positiva de recusa à calhordice geral, ao amadorismo da oficialidade, devolvendo a ofensa na forma de livros ofensivos, porque ousamos achar que o livro é um troço importante, bonito, tesudo e tal. Também é uma maneira de existir, e qualquer existência fora das paredes das repartições, no Maranhão, é transgressora.

&

Texto de Bruno Azevêdo, dono da Pitomba Livros e Discos, que publica as coisas dele [Breganejo Blues e O Monstro Souza, entre outros] e publicou, com o Vias de Fato, o Guerrilhas, do Flávio Reis. O reclame foi publicado no Suplemento Cultural e Literário JP Guesa Errante, do Jornal Pequeno, sábado passado (30/6).

A Pitomba edita também a Pitomba. Digo, o selo/editora publica a revista, editada por Bruno com os citados Celso e Reuben, que também publicaram textos sobre a Pitomba, a revista, no Guesa. O do último tá no blogue dele (donde roubei a ilustração do post). O do remanescente da Guarnicê, se ele me mandar, que ver mesmo o Jornal Pequeno de sábado, eu não vi, eu penduro cá no blogue.

Pitomba! no Chico Discos

 

Nesta quinta-feira (15) o Papoético cede seu espaço semanal ao lançamento do número 4 da revista Pitomba!, editada por Bruno Azevêdo, Celso Borges e Reuben da Cunha Rocha.

No ringue do pensamento

Ao escrever sobre Guerrilhas (2012), de Flávio Reis, quando o classificou acertadamente como “figura de exceção entre nossos pensadores e professores”, Reuben da Cunha Rocha abriu um leque que pode e deve ser ampliado quando somamos ao “homem magro de fala digressiva”, dois outros professores do naipe: Flávio Soares e Wagner Cabral.

Pugilistas do pensamento, o trio se encontra numa mesa-ringue tendo por mote o lançamento (detalhes na imagem que abre o post), na UFMA, do citado livro, “coletânea de artigos publicados por Flávio Reis na imprensa maranhense ao longo da última década”, o sucessor de Grupos políticos e estrutura oligárquica (2007) e Cenas marginais (2005).

Bancado pelo bolso do autor, como os anteriores, Guerrilhas foi publicado no início deste ano, com os selos da editora Pitomba! e do jornal Vias de Fato, sem trazer qualquer referência à universidade onde seu autor dá aula – a contribuição radical aos debates em torno dos assuntos que aborda e sua visão aguçada, por si só já justificariam a publicação pela própria UFMA, mas Flávio é um dissidente ácido e prefere a liberdade de outros caminhos.

REIS, SOARES e CABRAL, como são chamados em citações acadêmicas, vão certamente distribuir socos no status quo, seus modos de ver/rever o Maranhão porradas certeiras, diretas, no estômago, sobretudo dos acostumados a velhas famas, por vezes injustificadas e ufanistas.

O mito francês e a dança dos historiadores, O Maranhão bárbaro e sua miséria historiográfica, Oligarquia e medo, O nó-cego da política maranhense, A política do engodo e o engodo da política, para citar títulos de alguns artigos de Guerrilhas, violência urbana, jornalismo, poesia, cinema, música, literatura e psicanálise serão munição para este debate “peso”, expressão quase sempre usada por Flávio Reis para definir algo muito bom, extraordinário, seja um disco, um livro, um filme ou um aluno acima da média.

A pauta certamente se ampliará e os três professores darão conta do recado, imperdível, eu diria. Roubando mais um par de aspas de Reuben – tirando o “peso” aí de cima, são dele as outras ao longo do texto –, que qual este blogueiro, tem no autor de Guerrilhas um de seus heróis, cabe repetir: “É chegado o tempo do arsenal contra o repertório”.

A arte de produzir ideias perigosas

REUBEN DA CUNHA ROCHA*

Guerrilhas, coletânea de artigos publicados por Flávio Reis na imprensa maranhense ao longo da última década, campo minado de fustigações sem centro, sobrevoa e permite ver, como numa fotografia aérea, um traço terminante da aventura de seu autor, figura de exceção entre nossos pensadores e professores – o cultivo radical da dissidência.

Permite ver, mas veja, não é que o torne visível, isso não passa batido aos leitores de suas outras obras (Cenas marginais e Grupos políticos e estrutura oligárquica no Maranhão), tampouco aos alunos do homem magro de fala digressiva segurando livros como facas, misturando dois ou três autores para ver se explode; ocorre que nessa recente investida os elementos sobem todos à mesa – temas, sim, e o território. Dança imprescindível a toda guerrilha, saber jogar com o espaço, pervertê-lo em arapuca, cemitério de engodos. No caso, é mesmo nossa imprensa que, invariável e totalmente comprometida, por mil golpes de astúcia deixou-se infiltrar pelos mordazes artigos desse livro, também o próprio território das ideias, no qual Flávio opera articulações vitais, nunca no interesse dalgum “campo” mas da erosão de nosso oco solo mental.

O olhar esclarecedor sobre as relações de força, a política e suas redondezas – descaso, cinismo, violência –, espaço antigo da reflexão do autor, que nunca cedeu ao apelo das conciliações típico de certa esquerda “prática” ou de cartilha, notadamente a universitária, incapaz de se desvencilhar do desejo de mandar adivinhado no esgoto exposto das alianças; a exímia capacidade de enredar fios de nossa história mal contada, pondo-nos à vista de nós mesmos (“Antes da MPM”, “O nó-cego da política maranhense”, “Oligarquia e medo” etc.); o mergulho em obras de arte desestabilizadoras ou no mínimo provocantes, cuja incidência sobre sua escrita é a bela mostra dum pacto com as potências da imaginação; mesmo as incursões pela psicanálise, disciplina cujas sugestões e descobertas fundamentais nunca frearam uma tendência fortemente ordenadora, cheia de andaimes cientificistas propícios ao folclore burguês – Flávio é mestre em transformar tais zonas em impulso de nutrição, aproximando-se disso ou daquilo conforme as contingências da balbúrdia.

Apenas não se confunda o prisma de temas que o autor encara com o pano surrado da interdisciplinaridade, escudo acadêmico que nunca serviu, a olho nu, para mais do que recheio de linguiça em formulários de não-sei-quantas vias. Aqui o caso é de pura indisciplina, do livre pensar e do gosto por uma boa briga.

Panorama de intervenções na parca discussão local, a mira em riste no rumo de nossa arena de ideias, o Maranhão persiste como ruído de fundo em cada tópico, sem contar que é o centro mobilizador na quase totalidade dos artigos. Começando por uma sequência de pauladas dadas no epicentro da querela em torno da fundação de São Luís, que na verdade é a discussão dos níveis inacreditavelmente obtusos, para não dizer mesquinhos, em que se deram e dão as reações ao trabalho de Maria de Lourdes Lauande Lacroix, passando pelas análises matadoras do emaranhado atávico entre política, desmando e miséria, das condutas paroquiais com relação ao poder, e da ofensiva de mídia, mercado e academia no comércio ridículo da cultura, esta insígnia a ser ostentada por uma intelectualidade (no fundo um punhado de funcionários de governo distribuídos entre repartições, instituições de saber e a “classe artística”) que a tudo vê como se a um grande curral, com narcisismo indisfarçável e característico.

Compõe-se quadro a quadro uma galeria em que figuram, por exemplo, certo juiz, personagem de Nascimento Moraes num livro de 1923, trazido à roda em Guerrilhas, juiz de faroeste a resolver tudo na bala ou no bogue, à luz do dia, em pleno centro da cidade em cenas inacreditáveis sobretudo porque poderiam ter ocorrido na tarde de ontem. Ou quem sabe se repitam amanhã, como de fato se repetiriam, na execução do professor Flávio Pereira pelo policial civil Olivar Cavalcante (o pistoleiro segue solto) e na do artista Geremias Pereira da Silva, o Gerô, espancado até a morte por uma gangue de policiais militares – à luz do dia, em pleno centro da cidade, cabeça do século XXI.

A história geral de nossa canalhice, quer se exerça pela violência elevada a valor, a distinção social, com a invariável impunidade que não cessa de adoecer nossa sensibilidade coletiva, quer se exerça pela constrangedora passividade a alimentar eternamente a estrutura de nossa sujeição, praticamente voluntária, demonstrando que a única reforma eleitoral que importa é o suicídio coletivo dos políticos.

Assistindo, como assistimos, a uma escalada do uso oficial da mentira enquanto narrativa dos “feitos” de uns e outros (nossa cota, parece, da escalada do fascismo em várias esferas da vida nacional – passarela em que desfila com o perigoso traje da falsa ausência), nem se pode afirmar que o autor, nas fissuras que causa, enfoque as coisas pelo avesso, ou se pelo avesso ele as encontra.

Flávio, claro, tem estômago. A atenção que dedica à casca grossa dos eventos não passa sem uma reversa escrita de precisão & excesso, que revela para desviar ou o contrário, dilatando pupilas, abrindo narinas, temperando perspectivas. Correm por aí, nutrindo os planos de fuga, figuras de Júlio Bressane, Elyseu Visconti, Bruno Azevêdo, Cesar Teixeira, Celso Borges e tantos meliantes cumplices de arruaça nos quais o autor ensina a ver os truques para se manter vivo, isto é, íntegro e mandando bala.

Seu fôlego de saque se trama justamente na capacidade de farejar em temas, textos e acontecimentos o cheiro dalguma pólvora. “Isso aqui não é pra entender, mas pra sentir o cheiro”, quantas vezes não ouvi de Flávio em sala de aula ou pelas salas do afeto, diante de questões fascinantes e árduas ante as quais o lance sempre foi fazer o que se pode. Disso não faltam mostras em seu texto ágil, cheio de toques analíticos jamais impostos à força de argumentações exaustivas, mas ofertados na fluência de caracterizações e imagens.

A condição do pensamento é a de estar nas curvas mais sem amparo, distante do que já se sabe e impõe-se como instância regulamentar. Não é para ordenar que se necessita de ideias. O resto são intelectuais de Sessão da Tarde, erguendo-se aqui e ali para constranger proposições de problemas (“se nada presta, que fazer?”), como se o nebuloso das respostas desmentisse a evidência das perguntas.

Que fazer, então? Sempre, apenas, o que se pode; muitas vezes se avacalha. Como Tom Zé, Rogério Sganzerla ou os Sex Pistols, Flávio Reis ensina que quaisquer ingredientes servem à feitura de bombas, desde que haja sacação, argúcia, inteligência e – sobretudo – que o sujeito não arregue. É chegado o tempo do arsenal contra o repertório.

*Reuben da Cunha Rocha é poeta e pesquisador. Edita, com Bruno Azevêdo e Celso Borges, a revista de poesia, artes gráficas & sacanagem Pitomba!.

&

Serviço: Flávio Reis lança Guerrilhas dia 16 (quinta-feira), às 19h. no Papoético (Chico Discos, Rua Treze de Maio, esquina com Afogados, sobre o banco Bonsucesso). Entrada franca. O livro custa R$ 20,00.

John Cage

/Além do mais, somos criminosos. Ali, fora da lei, dizemos a verdade.// Não estamos pondo as coisas em ordem (isso é função das empresas): estamos apenas facilitando processos para que qualquer coisa possa acontecer.// Fazendo o que não sabemos fazer. Sem técnica.// Inútil cantar canções de ninar para quem não consegue dormir.// Fazemos o que fazemos por pura contradição.// Se não há esperança, não há com o que se preocupar.// O que temos não seria pior se chamado por outro nome. Veblen o chamou de sistema do preço, Mills o chamou de elite do poder. Provavelmente não passam de umas noventa e nove pessoas envolvidas com o mercado financeiro. Curiosa forma de jogatina.// Nós insistimos no uso contínuo das faculdades estéticas.// Não aprendemos nada com o que já sabemos.// O que já fizemos conspira contra o que ainda é preciso fazer.// Plataforma presidencial: prometo, sendo eleito ou não, continuar meu trabalho sem me preocupar com você; acabar com as leis; oferecer crédito ilimitado à sociedade inteira independentemente de nacionalidade.// Observando as diferenças, lado a lado com os derrotados, aprendendo com o oprimido a viver fora da lei sem cometer crimes. Escravizar-se a todas as coisas. (Não há por que se tornar Rei)// Às vezes nós borramos a distinção entre arte e vida; às vezes tentamos esclarecê-la. Não nos apoiamos numa perna só. Apoiamo-nos em ambas.// Estamos dando os primeiros passos. Em breve conseguiremos andar.// Não temos ídolos: nós acreditamos no que fazemos./

&

O trecho acima é do famoso diário de John Cage (do qual, confesso: nunca tinha ouvido falar, do famoso diário, antes de lê-lo, este trecho, aqui). Traduzido e montado por meu amigo-irmão Reuben da Cunha Rocha, o petardo ocupa a contracapa do terceiro número da revista Pitomba!, editada por ele, Bruno Azevêdo e Celso Borges (clique aqui para baixar as duas primeiras edições).

Clica pra baixar!

E na imagem acima para baixar a terceira.

Ainda tá em tempo?: feliz 2012!

Cultura em 2011

Aos 45 do segundo tempo, às vésperas do fechamento da edição de dezembro do Vias de Fato (nº. 27, capa acima, ora nas melhores bancas da Ilha), inventei de fazer uma retrospectiva cultural. No último dia 12 encaminhei a uma pá de agentes culturais um e-mail com a seguinte pergunta: “Para o bem ou para o mal, no campo cultural, o que você destacaria numa retrospectiva particular do ano que se encerra?”.

Alguns responderam, outros não; outros ainda o fizeram depois do fechamento do jornal. O blogue traz abaixo um mix do que saiu na edição impressa do mensal com respostas que chegaram depois à caixa de e-mails do blogueiro (os depoimentos em itálico só aparecem acá).

RETROSPECTIVA CULTURAL

O jornal Vias de Fato traz aos leitores uma retrospectiva construída a muitas mãos – a coletividade uma característica da publicação. Veja o que diversos agentes culturais destacaram entre os acontecimentos do ano que se encerra

ZEMA RIBEIRO

Ano em que o mensal Vias de Fato completou dois de circulação ininterrupta – apesar de todas as dificuldades – e véspera do quarto centenário da capital maranhense – há controvérsias – 2011 foi marcado por diversos acontecimentos na área cultural.

Em vez de fazer uma retrospectiva certamente incompleta, resolvemos ouvir gente da área, que entende do assunto. Maranhenses ligados ao setor, residentes ou não aqui ou mesmo nem nascidos, mas com alguma ligação com o estado, destacaram o que de bom e ruim aconteceu no ano que se encerra.

“Para o bem ou para o mal, no campo cultural, o que você destacaria numa retrospectiva particular do ano que se encerra?” foi a pergunta feita pelo Vias de Fato. Leia abaixo as respostas.

O crítico Alberto Jr.: otimismo

“A primeira coisa que me vem à cabeça ao pensar em cultura neste ano de 2011 é a palavra ‘otimismo’, sobretudo em relação ao trabalho que muitos artistas vêm desenvolvendo de forma independente na busca de uma cena cultural cada vez mais urbana e ‘conectada’ com as experiências desenvolvidas em outros estados.

Um exemplo disso é o pessoal do gênero pop/rock, que, neste ano, conseguiu produzir shows e eventos fazendo circular pela ilha bandas alternativas com trabalho autoral e promovendo esse diálogo musical dentro dos circuitos nacionais de festivais de música independente. Cito aqui o Coletivo Velga, Garibaldo e o Resto do Mundo, Gallo Azzuu, Megazines, Nova Bossa, entre outros.

Beto Ehongue, Dicy Rocha, Tássia Campos, Milla Camões, Bruno Batista e Djalma Lúcio me fizeram bater muitas palmas em todos os projetos que estiveram envolvidos.

Algumas casas noturnas também me ofereceram bons encontros e boas experiências sonoras. Salve o Odeon Sabor e Arte que voltou com boas energias e a novidade regueira que é o Porto da Gabi. Experiências transcendentais.

No difícil campo das artes cênicas, a Pequena Companhia de Teatro, a Santa Ignorância Cia. de Teatro e o talento do dramaturgo Igor Nascimento não deixaram eu me acomodar na confortável resignação de fruir de espetáculos simples. Foram geniais!

Tivemos quatro festivais de cinema com programação de qualidade e algumas com caráter popular que me fizeram chorar com a vida e arte de grandes artistas e inclusive com alguns filmes que serviram bem mais do que ter pago qualquer valor para um analista ou psicólogo. Quando a ficção ajuda até a tua subjetividade.

Enfim, pelos exemplos que citei, percebe-se a pouca referência a instituições ou órgãos públicos como apoiadores desses projetos. O otimismo está aí: essa sensação de testemunhar experiências culturais contemporâneas que nos afastam de qualquer saudosismo ou nostalgia com outras décadas e colocam nossos sentidos para viver o presente, sem vícios, sem dependências e com a coragem de quem confia na autoestima de nossa produção cultural contemporânea.

E o próximo ano será bem melhor!”

Alberto Júnior, radialista e crítico musical

“O fato mais marcante foi a grande quantidade de shows em São Luís no início do ano. Foi uma verdadeira explosão de bons shows e shows inéditos ou quase inéditos em São Luís. Infelizmente o ano de 2011 não prosseguiu com a grande “leva” de shows, talvez por acanhamento de muitos produtores, mas os primeiros meses do ano foram realmente surpreendentes. Só para lembrar, tivemos apenas em abril, Pitty, Marcelo D2, Lobão, Richie Spice, Doro Pesch e outros. O primeiro semestre de 2011 também nos agraciou com shows de Jason Mraz, Adriana Calcanhotto, Marcelo Camelo, Blues Etílicos, Arnaldo Antunes e muitos outros. O segundo semestre também pode ser lembrado com shows do Teatro Mágico e os internacionais Blind Guardian e Flo Rida. Dezembro será fechado com chave de ouro com show de Paulinho Moska, em mais uma edição do Prêmio da Rádio Universidade. Com certeza esqueci de mencionar vários outros shows, mas todos esses shows provaram que São Luís pode sim receber grandes nomes da música brasileira e exportações da música pop”.

Andréa Barros, jornalista, ex-assessora de comunicação da Lima Dias Turismo, agência responsável pela vinda de muitos dos shows citados à capital maranhense

Ehongue lembra a dinheirama despejada no carnaval carioca em detrimento dos artistas que produzem no Maranhão

“Queria tanto estar agora escrevendo algo de bom sobre os rumos culturais de nossa cidade/estado em 2011, sério mesmo. Queria poder dizer que grandes eventos aconteceram e melhor ainda acreditar que o ano seguinte mostra uma luz clara no fim do túnel, mas não dá. Ficamos carentes de políticas culturais onde ainda prevalecem as decadentes e assistencialistas programações de São João e Carnaval.

Os milhões dedicados à escola de samba Beija Flor, a Praia Grande abandonada e outros milhões dispersados em uma árvore de natal são só algumas das aberrações que indicam que nossa terra anda completamente na contramão das necessidades. Isso tudo merece um DELETE.

Fora da esfera oficial aconteceram coisas boas, como por exemplo o Prêmio Nacional de Música recebido pela dupla Alê Muniz e Luciana Simões. Isso serve de inspiração para toda uma geração de músicos maranhenses que mesmo sem o apoio ou a lembrança dos órgãos que trabalham com cultura continuam teimando com talento e criatividade.

Em 2012 desejo a todos um ano mais sincero e promissor.”

“Beto Ehongue, compositor e produtor musical, homem à frente das bandas Negoka’apor e Canelas Preta

“Destacaríamos, em 2011, o Papoético como uma ideia que germinou e está criando raízes no panorama cultural da cidade. Apesar de ainda não ter a visibilidade necessária na mídia, está se expandindo entre as pessoas que pensam e se preocupam com a cultura em São Luís e no Maranhão. Como evento, São Luís, Outros 400 [temporada de nove shows apresentada pelo compositor Joãozinho Ribeiro e convidados no Novo Armazém] foi um acontecimento que reuniu a nata da música e da cultura maranhenses nos últimos meses do ano.

Também citaríamos o Café Literário, promovido no [Centro de Criatividade] Odylo Costa, filho, organizado pela professora Ceres Fernandes e, finalmente lembramos, para lamentar, o pouco caso que a Prefeitura de São Luís dedicou à Feira do Livro, um evento agregador e com grande potencial econômico, turístico e cultural, mas que está sendo continuamente esvaziado devido à miopia dos atuais administradores da cidade”.

Beto Nicácio, arte-educador, publicitário e quadrinhista, e Iramir Araújo, historiador, publicitário e quadrinhista, a Dupla Criação

Para Mesito, Feira do Livro foi decepcionante

“A decepcionante 5ª. Feira do Livro de São Luís (Felis). Para mim foi a maior decepção cultural nos últimos tempos”.

Bioque Mesito, poeta

Para o editor da Pitomba!: "De mal (...) quase tudo que tenha (...) alguma oficialidade"

“O Papoético é um lance massa! É o que vejo de mais interessante, por ser um lance coletivo e agregador, sem falar na pinga. De mal houve quase tudo que tenha as mãos de alguma oficialidade: tombamento do boi, feira do livro, essas coisas”.

Bruno Azevêdo, escritor, autor de Breganejo Blues e O Monstro Souza, editor da revista Pitomba! e, a partir deste número, colunista do Vias de Fato

“Na música eu destacaria a trajetória de sucesso de Cine Tropical, que deu o Prêmio da Música Brasileira ao Criolina. Na literatura, o lançamento de aliado involuntário, novo livro de poemas de Fernando Abreu”

Celso Borges, poeta e jornalista, parceiro da Alê Muniz e Luciana Simões em São Luís-Havana, faixa que levou o troféu de melhor música no Prêmio Universidade FM 2010

Prêmio do Criolina e livro de Fabreu foram os destaques para CB, aqui visto em uma de suas elogiadas performances

“Vamos logo para o bem.
Mesmo não sendo lá essas coisas, difícil não destacar no ano de 2011, no campo cultural e longe dos afagos oficiais, os lançamentos primorosos dos CDs de Bruno Batista e de Nosly, o amadurecimento  da dupla Criolina, a garra e a beleza das performances de Celso Borges, o Papoético do Paulão [o poeta e jornalista Paulo Melo Sousa], o Café Literário, o livro do Fernando Abreu, os Outros 400, projeto de Joãozinho [Ribeiro] etc . Saldo positivo.

De tristeza: a continuada  favelização da Praia Grande e a perda de D. Teté.”

Chico Saldanha, compositor, lançou Emaranhado em 2007 e, ao lado de Cesar Teixeira, Joãozinho Ribeiro e Josias Sobrinho, levou o troféu de melhor show do ano no prêmio Universidade FM 2011

Memória cinemetográfica

“Como a minha área de atuação é o cinema, acho que é importante destacar que em 2011 tivemos várias mostras e festivais. Isso é uma importante conquista para o público, que certamente teve acesso a produções destacadas no cenário nacional e no internacional.

Não podemos esquecer também esse maravilhoso trabalho do cineasta Murilo Santos de devolver às comunidades aquilo que a sua câmera registrou com o passar dos anos, tanto na forma de sessões como na de belos painéis fotográficos, além dos novos vídeos gerados nesses encontros.”

Francisco Colombo, cineasta e professor universitário, curador das mostras de Cinema Infantil e Cinema e Direitos Humanos na América do Sul, realizadas em São Luís em 2011

Gildomar Marinho entra em estúdio em janeiro para gravar sucessor de Olho de Boi (2009) e Pedra de Cantaria (2010)

“O destaque é o próprio jornal, com sua linha editorial que se configura um contraponto à cultura vivenciada no Maranhão atualmente, eivada de vícios, paternalismos e extremamente violenta contra qualquer perspectiva de emancipação cultural. Vias vai às veias, às tripas, aos fatos. Um soco no estômago de uma elite autocrática. Um sopro de vida à verdadeira imprensa livre”.

Gildomar Marinho, compositor

Para Lena Machado, destaque foi o show de Cesar Teixeira

“O show Bandeira de Aço de Cesar Teixeira em julho, no Circo da Cidade. Ver o nosso querido poeta feliz e à vontade no palco, cantando clássicos, além de apresentar inéditas como Cubanita e Boi de Medonho foi maravilhoso. Tão bom que não canso de perguntar: e aí, Cesar, quando seremos presenteados com o segundo?!!”

Lena Machado, cantora

Descaso com artistas entre as lembranças de Milla Camões, que estreia em disco ano que vem

“O que me marcou de forma positiva foi o Lençóis Jazz e Blues Festival. Claro, houve a minha participação, mas muito mais pelo fato de São Luís ter entrado, definitivamente, na rota comercial deste tipo de música, no Brasil. Além de, por falar em rota, termos tido também, bons shows (apesar de, às vezes, a preços exorbitantes, por conta da falta de espaço adequado para as apresentações ou mesmo falta de compromisso dos contratantes), boas peças de teatro, enfim. Vi um suspiro de qualidade entrando nas veias da cidade e isso me deixa feliz. Dois fatos me deixam extremamente triste: a falta de responsabilidade e compromisso de donos de bares, casas noturnas e governantes com a música em geral (não pensem que calotes, prejuízos etc., acontecem só com uma fatia: inclua aí TODOS os estilos), e, embora redundante, a pergunta anual, que continua sem resposta: “Até quando?”; e a perda de figuras importantes de nossa cultura, a exemplo de Dona Teté. Seu cacuriá continuará vivo, por que existem pessoas dispostas a se comprometer com seu legado. Mas quantos mestres morreram, esquecidos em interiores deste Estado, quantas culturas, quantas danças estão entrando em extinção, por não haver interessados em repassar ao próximo seu conhecimento? Aulas de cultura popular, de arte em geral, nas escolas; a aprovação e inclusão definitivamente dessa Lei [que torna obrigatório o ensino de música nas escolas], seria de grande valia. E que 2012 nos traga felicidade, poesia, música e arte ao cubo!”

Milla Camões, cantora

Falecimentos de Carlos de Lima e Dona Teté entre os maus momentos lembrados por Moema

“Tivemos bons e maus momentos, alegres e tristes. Com certeza a morte de D. Teté e a do Sr. Carlos Lima foram nossas grandes perdas. Alegres foram os outros momentos, incluindo (para quem gosta): o carnaval, as festas juninas, as feiras, principalmente a de livros e a de artigos de vários paises. O lançamento do livro de Aymoré Alvim, meu irmão, foi um dos melhores momentos da nossa Academia. Lamentáveis os fatos que envolveram o Prof. Saraiva [acusado de racismo por estudantes da UFMA], manchando uma reputação construida com muito sacrifício, ao longo de muitos anos”

Moema de Castro Alvim, sebista, proprietária do Papiros do Egito

Papoético de Paulão entre os mais lembrados na retrospectiva

“Acompanhei pouco as agitações culturais este ano. Só estive mesmo ligado no Papoético, mas, acho que a revista Pitomba! fez a diferença. Fazer literatura, no Maranhão, hoje em dia, é ato de heroísmo e publicar é altruísmo puro. A Pitomba! deu uma importante contribuição, aliando agitação literária com um material de qualidade, gerando, inclusive, polêmica, o que serviu para oxigenar o cenário da cultura local”.

Paulo Melo Sousa, jornalista e poeta, coordenador do Papoético, tertúlia semanal realizada no Chico Discos (Rua 13 de Maio, Centro)

“Eu destacaria o filme A alegria, de Felipe Bragança e Marina Meliande, bem como a Trilogia Coração no Fogo, da qual o filme faz parte, pelas razões que já expus aqui. É um cinema que produz, com suas imagens oxigenadas, outras maneiras de ver. Munição pesada para a imaginação, o sonho e a coragem”.

Reuben da Cunha Rocha, jornalista e poeta

Ricarte Almeida Santos lembra bons momentos, apesar da ausência de política cultural, objeto de seu estudo no mestrado em Cultura e Sociedade (UFMA)

“Para o bem: o projeto Outros 400 [temporada capitaneada pelo compositor Joãozinho Ribeiro, no Novo Armazém]; o show Rosa Secular II [com Chico Saldanha, Joãozinho Ribeiro, Josias Sobrinho e convidados, Bar Daquele Jeito, 10/12]; o lançamento do cd Eu não sei sofrer em inglês, o segundo de Bruno Batista;  o show Bandeira de Aço, de Cesar Teixeira [Circo da Cidade, junho]; a Mostra de Cinema Infantil [Cine Praia Grande, 12 e 13/10]; o Festival Guarnicê de Cinema; as várias rodas de choro em vários locais da Ilha (de shoppings a botequins); o lançamento do cd A Canção de Cartola na voz de Léo Spirro. Para o mal: nem um passo dado no sentido de uma política cultural para o Maranhão; o governo de Roseana Sarney financiando o carnaval da Beija Flor carioca; a morte de Dona Teté; a cultura de eventos que ainda prevalece; e o abandono da Praia Grande”.

Ricarte Almeida Santos, sociólogo e radialista, apresentador do dominical Chorinhos & Chorões, às 9h, na Rádio Universidade FM (106,9MHz)

Urias critica parte da classe artística

“São Luís, 400.000 lamentos. Um povo é o reflexo de seu governo ou o governo é reflexo do seu povo? Estamos no ápice da mediocridade no nosso fazer cultural (talvez com exceção para as “brincadeiras” populares). Uma secretaria medíocre, cercada de nós, artistas ainda mais medíocres, que sempre pensamos que nosso trabalho é a maravilha. A miséria que vem nos cercando, sem dúvida, vai sendo refletida na qualidade de nossos produtinhos “inventados” e não criados com um debruçar sobre si mesmo para por em prática um processo que venha alterar e complementar a consciência de quem somos nós. Ouvi outro dia de um amigo “artista”: “Ah!, esse negócio de processo (!!!!), de treino e ensaio pesado me enche o saco. Agora tudo é processo! Eu quero mais é fazer!”. Acho que todos nós realmente temos o direito de fazer o que nos dá na telha e nos desejos, mas na minha liberdade de pensar, penso também que esse papo é de “artista” que não tem que batalhar para viver da arte que faz e tem casa, comida e roupa lavada, além de não dar a mínima pro seu crescimento pessoal, o que por si só justifica a busca de um processo de trabalho..”

Urias Oliveira, ator premiado internacionalmente, botando o dedo na ferida

Wilson Marques é outro que destaca o cinema em 2011

“Destaco o primeiro Festival Internacional de Cinema, da Lume, evento de alto nível que infelizmente foi pouquíssimo prestigiado pelo público de São Luís”.

Wilson Marques, escritor, lançou em 2011 A Lenda do Rei Sebastião e o Touro Encantado em Cordel

ZéMaria Medeiros destaca evento próprio e descaso com artistas pelo poder público

“Os 9,7 anos de A Vida é uma Festa, os lançamentos dos cds Onde tá o coro, de ZéMaria Medeiros & A Casca de Banana, e Arriba Saia, de Omar Cutrim, os falecimentos de Mundica e Dona Teté, os atrasos entre seis meses e um ano para pagamento de cachês de artistas, um absurdo!, o carnaval 400 anos da Beija Flor, ridículo!, o desprezo da produção musical do Maranhão pelos maranhenses, em valorização do axé, breganejo, pornoforró e tchans!”

ZéMaria Medeiros, poeta e músico, comanda há mais de nove anos o happening A Vida é uma Festa, que acontece semanalmente às quintas-feiras na Praia Grande

Feliz Pitomba! nova!

Bobos da corte maranhense refestelam-se no carnaval carioca: o povo paga a conta

Ontem encaminhei ao Vias de Fato a página de cultura da edição deste mês, que chegará às bancas junto com o terceiro número da revista Pitomba!: o lançamento desta está marcado para esta sexta (16), às 19h, no Bar do Porto, aberto ao público (a revista custa R$ 5,00).

O que fiz para o jornal “que não foge da raia”: uma retrospectiva cultural. Diversas personalidades da cultura do Maranhão responderam à pergunta “para o bem ou para o mal, no campo cultural, o que você destacaria numa retrospectiva particular do ano que se encerra?”

O resultado você poderá conferir na edição impressa do Vias de Fato (aqueles que foram questionados por e-mail e responderam após o fechamento da edição terão suas respostas publicadas cá no blogue, junto das dos que responderam a tempo) e talvez você estranhe eu tanto falar do jornal quando o post deseja outra coisa.

O lance é o seguinte: entre as boas lembranças de alguns agentes culturais está o nascimento, a consolidação da revista Pitomba! Houve mesmo quem lembrasse da polêmica, de que tomou parte este blogue, envolvendo a publicação e o leitor-livreiro José Lorêdo, cujo texto que remonta à inquisição, acabou indo parar nas páginas do número 3 da de-vez-em-quandal editada por Bruno Azevêdo, Celso Borges e Reuben da Cunha Rocha. Dúvida que não quer calar: venderá a livraria Resistência Cultural este número da Pitomba!?

Abre este post poster encartado no caroço da revista, publicado com exclusividade neste blogue, retratando personalidades como a cantora Alcione, o secretário de saúde Ricardo Murad, o de cultura Luiz Bulcão, a governadora Roseana Sarney, o “sempre ridículo” Pergentino Holanda (cf. Flávio Reis) e outros “poderosos”, baba-ovos e quetais. Os maranhenses na festa carioca da Beija-Flor, paga com dinheiro dos que não serão convidados para esta festa podre. O derramamento de dinheiro público para bancar o carnaval alheio, de samba-enredo fruto de ensandecimento coletivo, foi outro fato lembrado na retrospectiva cultural do Vias de Fato, “para o mal”.

Apesar da turma ilustrada por Joka, 2011 fecha com saldo positivo, as sobrevivências de Pitomba! e Vias de Fato, sem o apoio de quaisquer verbas governamentais, provas incontestes disso, exceto, é claro, em se tratando das contas bancárias dos editores das publicações.

Abaixo, detalhes sobre o lançamento do novo número da Pitomba! e os nomes de quem está nesta edição.

Em cima da hora: Pitomba! no Chico

Logo mais às 19h meus amigos Bruno Azevêdo e Celso Borges participam de debate-papo em que relançam o número 2 da revista Pitomba!, editada por ambos mais Reuben da Cunha Rocha, ora em SP.

O relançamento acontece no Papoético, organizado semanalmente, sempre às quintas-feiras, pelo poeta Paulo Melo Sousa, vulgo Paulão.

Acontece no Chico Discos, sebo charmoso que ocupa o segundo piso do prédio em cujo primeiro está o Banco Bonsucesso, na esquina das ruas Treze de Maio e Afogados, no centro da capital maranhense.

Em tempo: tristeza ver, esquinas antes, um banco, uma “loja de crédito” ocupando a casa em que outrora funcionou a saudosa Livraria Athenas.

Ingressos para o Papoético grátis. A Pitomba! sai por apenas R$ 5.