Chorografia do Maranhão: Nonatinho

[O Imparcial, 6 de julho de 2014]

Natural de Penalva, professor da Escola de Música e pandeirista do Instrumental Pixinguinha, o percussionista Nonatinho é o 35º. Entrevistado da série Chorografia do Maranhão

Foto: Rivanio Almeida Santos
Foto: Rivanio Almeida Santos

 

TEXTO: RICARTE ALMEIDA SANTOS E ZEMA RIBEIRO
FOTOS: RIVANIO ALMEIDA SANTOS

Raimundo Nonato Soeiro Oliveira aparentava certa timidez quando a chororreportagem o encontrou na porta da Escola de Música do Estado do Maranhão Lilah Lisboa de Araújo [EMEM]. Carregando o case com o pandeiro, o músico convida o primeiro chororrepórter a entrar e sentar. A tevê da recepção transmite Bélgica e Estados Unidos, pelas oitavas de final da Copa do Mundo, e instrumentista e entrevistador dividem educadamente as atenções entre a partida e a conversa – não necessariamente nessa ordem.

No papo, Nonatinho, como é mais conhecido o percussionista do Instrumental Pixinguinha, professor da EMEM há 12 anos, revela ter lido algumas edições anteriores da série Chorografia do Maranhão, cuja 35ª. edição traria seu depoimento. O chororrepórter tranquiliza-o contando causos de entrevistas anteriores, informando-lhe que a conversa tem um caráter completamente informal.

Mas o penalvense nascido em 9 de julho de 1967 já parecia ter perdido totalmente a timidez. Com a chegada do restante do time, diga-se, o outro chororrepórter e o chorofotógrafo, o professor conduziu todos ao salão Leny Cotrim Nagy, o mesmo em que a série conversou com Zezé Alves [flautista, Chorografia do Maranhão, O Imparcial, 9 de junho de 2013], seu colega de Escola e Pixinguinha.

Filho de José Oliveira, comerciante e músico, e da dona de casa Maria José Soeiro Oliveira, Nonatinho é o único homem entre os cinco filhos. Já apresentou monografia ao curso de graduação em Música da Universidade Federal do Maranhão. “Estou concluindo uns créditos que fiquei devendo”, disse ele, que pretende publicar o trabalho.

No dia seguinte à entrevista, pelo chat do facebook, ele complementou-a, destacando a importância da série e de Deus – é evangélico – em sua vida: “Hoje sou evangélico e tudo o que faço me sinto na obrigação de agradecer a Deus. Inclusive por um bom período atuei como ministro de louvor. Não fiz isso na entrevista. Como esse é um registro que vai permanecer na história do nosso estado não gostaria de perder a oportunidade de falar dEle”, registrou.

Foto: Rivanio Almeida Santos
Foto: Rivanio Almeida Santos

 

Teu pai sustentava a família com música? Eu não sei dizer. A partir de quando eu tinha uns cinco anos, ele sustentava com um comércio. Quando se desfez a história dos conjuntos, cada colega procurou seu rumo, uns foram ser alfaiates, sapateiros, comerciantes. Ele foi ser comerciante e também trabalhar numa terra herdada, ele foi tomar conta. Ele ainda chegou a trazer algum sustento, mas em épocas festivas, carnaval, ele parava o comércio para se dedicar um pouco à música. A vida dele era basicamente isso, ele gostava muito de pescar, chamava o pessoal, passava três dias, vinha, tudo ele comercializava.

Você lembra, na infância, de como era a atmosfera musical em tua casa? O que se ouvia? Geralmente essas festas que ele fazia eram de promessa. Ele gostava muito de fazer o Baile de São Gonçalo, tambor de crioula. Sempre que ele fazia, ele fazia o barraco ao lado e fazia o baile. Eu ouvia o que as bandas tocavam na época, forró, sempre instrumental, não tinha nada cantado, marchas. Depois eles começaram a tocar a própria discoteca [a disco music], imitando as radiolas.

Você acha que o fato de seu pai ser baterista e percussionista influenciou no teu fazer musical ou você só veio se interessar por isso depois? Essa influência foi total. A minha mãe tinha um problema muito sério, os primeiros filhos dela, ou ela abortava ou, quando nascia, geralmente com dois anos, no máximo, morriam. Eu sou de um grupo que entre três, um morria, dentre esses três eu escapei. Eu via que meu pai lutava muito comigo nesse sentido, de me mostrar as coisas, me mostrar a vida. Quando eu me entendi ele me levava pra festa, eu tava o tempo todo do lado dele. Quando ele ia tocar fora, ele levava, ele tinha a preocupação de tentar passar. Quando a festa ia ser lá, os colegas dele deixavam os instrumentos, então o meu brinquedo passou a ser esses instrumentos. Às vezes na própria quitanda ele montava a bateria e ficava tocando, o pessoal gostava de vê-lo tocando, e ele tocava muito bem, diziam isso. Hoje essa coisa de apreciar, de ver músico tocar, de ver performance, vai muito [da herança] dele. Depois, passado um tempo, ele viu que eu precisava estudar, eu tive que ir para a cidade, Penalva.

Você morava num povoado. Como era o nome? Bom Jesus, que era [onde ficava] a terra dele com os três irmãos.

Essa lembrança de você ir para festas acompanhando teu pai, você tem desde que idade? Acho que aos oito anos. É aquela coisa de garoto que vai sendo levado e de repente está ali envolvido.

Então sempre houve apoio por parte de teus pais para que você seguisse o ofício da música? Sim, da parte do meu pai. A minha mãe não gostava muito, pela própria questão, pra ela não era uma profissão, não trouxe muita coisa para ela, mesmo como esposa, tanto que quando ela viu que eu queria estudar música, ela disse “será que tu vai seguir o mesmo caminho do teu pai?”, aquela coisa. Ele mesmo, por essa questão de não ter aquele sucesso, dizia “vai depender de você, você tem outras opções”. Ele tinha um filho do primeiro casamento, esse filho fez concurso para a marinha, era enfermeiro, vivia bem. E ele vivia me apontando: “olha, segue o exemplo de teu irmão, teu irmão tá bem”. A vontade dele mesmo era que eu fosse militar.

Você chegou a tocar com ele nessas festas? Não cheguei a tocar. Cheguei a dar umas canjas, ele me botava, em determinado momento, ele dizia “olha meu filho aí”, e os músicos gostavam, ficavam elogiando.

Você tocava o quê? Pandeiro? Bateria. Tem uma coisa interessante que eu acho que marcou muito, era um senhor que tocava sempre do lado dele, muito bem. Ele ia muito lá pra casa, era muito amigo de meu pai. Quando era festa ele era o primeiro a chegar. Não consigo lembrar [o nome dele], eu era muito garoto. Eu lembro dessa pessoa, tocava muito bem, ele tinha uma forma, meu pai dizia [que ele] “jogava muito bem”. Ele não falava tocar, falava jogar.

Você chegou a estudar música em Penalva ou só depois de vir à São Luís? Quando eu saí de lá, eu perdi totalmente o contato com música. Fui mesmo [para a sede de Penalva] para estudar, morar com um padrinho, foi mesmo a questão de estudo, não tive mais oportunidade. Mas eu ficava assim, aquela coisa tava dentro do sangue. Quando eu saía do colégio, no meu caminho tinha uma casa que tinha um conjunto, eles ensaiavam. Às vezes eu saía da escola e ficava ali em frente ouvindo. Mas também não passava daquilo, não cheguei a me aproximar. Passei aquele tempo todo mais dedicado aos estudos, recuperar o tempo perdido. Eu só fui estudar mesmo a partir dos nove anos. Lá no interior as escolas não tinham muita base. Aí perdi totalmente o contato. Ele [seu pai] também deixou mais de fazer festa. Com 14 anos eu voltei pra lá [para o povoado Bom Jesus], e já fui ter outra vida, na roça mesmo. Passei aquela fase de adolescência, que eu não queria mais ficar, queria voltar para casa [dos pais]. Só vim retomar [o contato com música] quando eu vim pra cá [para São Luís].

Quando é que você veio para cá? Eu vim com 17 anos. A oportunidade que eu tive de vir para cá para São Luís foi o seguinte: na época tinha uma juíza, ela ia medir as terras e papai pegou amizade com essa juíza e um advogado. Uma dessas vezes, eu indo para lá, levar alguns documentos, ela disse: “rapaz, tu não quer ir para São Luís? Não quer trabalhar lá em casa? Você pode trabalhar de vigia, estou precisando de alguém”, ela vivia procurando. Eu disse “olha, vou falar com meu pai, se ele aceitar…” Aí fui falar com ele, ele disse “tu que sabe”. Quando ele disse “tu que sabe”, no outro dia eu já estava lá com a bolsa e foi uma nova fase. Eu via a possibilidade de retomar meus estudos. Mas não pensando na questão musical.

Você disse que passou um tempo afastado da música. Você chegou a ter outra formação, que não a musical? Não, só trabalhando lá mesmo. A princípio foi como vigia mesmo, depois eu comecei a trabalhar com documentos, levava documentos no tribunal eleitoral, ela era juíza eleitoral. Eu fiquei como uma pessoa de ir resolvendo as coisas, e morando na casa dela.

E a partir de quando você se interessou novamente pela música? Outra coisa interessante. Eu já estava querendo trabalhar, arrumar outro tipo de trabalho, procurar uma independência maior, até em termos de moradia, ajudar os pais. Aí um dia eu vi no jornal um anúncio que um escritório estava precisando de pessoas. Eu peguei o dinheiro, sempre fui de guardar, aí saí para comprar uma beca bacana, calça social, sapato social, para ir ao escritório. Na época era a Mesbla [extinta loja de departamentos], era ali na Rua Grande. Quando eu chego lá, eu não sei por que, no segundo andar, bem na prateleira, a primeira coisa que deu na vista foi um pandeiro, um pandeirinho vermelho. A princípio eu pensei que era decoração. Uma loja de roupa, vendia outras coisas, estava lá. Chamei o vendedor: “vem cá, esse instrumento aí está à venda?” Aí ele deu o valor. O que vocês acham? Eu comprei a roupa ou o pandeiro? [risos]. Comprei o pandeiro!

Aí você nem foi ao escritório? Nem fui. Aí depois bateu a depressão. O quê que eu vou fazer com isso? Aí era época de eleição, nessa época os candidatos pegavam os ônibus, levavam o povo em caravanas para votar. Eu fui numa, levei o pandeiro. Quando o ônibus parou bem em frente à casa de meu tio, sempre muito rígido, da Sucam [a extinta Superintendência de Campanhas de Saúde Pública, órgão do governo federal], mandava estudar, queria ver as coisas melhores. Quando ele me viu chegar com o instrumento, que eu fui cumprimentá-lo, ele disse: “ah, tu tá nessa bagunça?” Depois eu fui à casa de meu pai, pensei que ele também ia falar algo, ele disse: “agora você vai ser um músico, comprou seu instrumento”. Aquilo foi tão forte em mim que eu disse “rapaz, agora eu vou estudar”. Foi um incentivo. Voltei para São Luís, mas sem saber onde estudar, onde procurar. Um belo dia eu vi um jornal falando da Rita Ribeiro [cantora, hoje Rita Beneditto], foi quando eu soube que havia uma escola de música. Eu guardei esse jornal, já estava no Liceu Maranhense. E com esse pandeirinho já comecei a formar grupos, a gente fazia apresentações, mas já de olho na Escola [de Música]. Comecei primeiro no Liceu. Quando foi em 1992, eu passando por acaso na Rua de Santo Antonio, ouvi o som dos instrumentos, “ah, é aqui que é a Escola”. Foi uma entrada para nunca mais sair.

Quem te recebeu? Eu fiz o teste com Raimundo Luiz [bandolinista, hoje diretor da EMEM, Chorografia do Maranhão, O Imparcial, 15 de setembro de 2013] e tudo aconteceu muito rápido, por que eu já tinha essa experiência do interior, com o pai com banda. Eu comecei logo a participar de grupos. Meus primeiros parceiros foram a Java, que hoje está na Paraíba, é professora de sax, o Fernando, foi professor aqui, hoje está em Brasília. Começamos a nos apresentar no auditório.

Você entrou [na EMEM] para estudar percussão? Bateria. Havia uma bateria que ficava lá no mirante e ninguém usava. Havia um grupo de jazz, eu me entrosei com eles e comecei. Depois eu entrei nos grupos, tipo Big Band, depois Metal e Cia. Como eu já estava no Metal e Cia. com [Antonio] Padilha, foram contratados Rogério [Leitão, baterista] e Jeca [percussionista] e eu comecei a ter aulas com eles. O Jeca mais, o Rogério me influenciou muito na coisa da leitura, ele sempre estava pelos corredores lendo, com métodos.

Como é que o Instrumental Pixinguinha surge nessa história? Eu costumava ver o Instrumental ensaiando, as apresentações, mas eram só professores, na época. Eram [os instrumentos de] cordas, Garrincha [baterista] e Lazico [Lázaro Pereira, percussionista]. Me chamava a atenção, mas não me interessava na época, por que meu trabalho era a Big Band, o Metal e algumas coisas de MPB, eu comecei com Shirley, é uma cantora de coral, que resolveu cantar em algumas salas. Foram as primeiras apresentações que eu fiz fora, fizemos no DAC [o Departamento de Assuntos Culturais da Universidade Federal do Maranhão], éramos eu, Nonato Privado [violonista] e ela. Eu tinha vontade [de tocar no Instrumental Pixinguinha], mas tinha muito receio, pois tinha-os como mestres. Marcelo [Moreira, violonista], Lazico, eu considerava muito bom no pandeiro, “será que eu vou conseguir tocar?” Quando surgiu a oportunidade de ir para Brasília, fazer um curso de verão, eu me entrosei com a turma, Marcelo, Raimundo, e eles “vamos ali, tem uma turma de choro e tal”. Na época eu andava com um pandeiro 12 [polegadas], a turma se reunia lá, mas não tinha pandeirista. Eu cheguei com o pandeiro, comecei a tocar, eu sem saber com quem eu estava tocando [risos]. A gente passou 15 dias lá fazendo o curso de verão. Depois Raimundo chegou e disse assim: “rapaz, tu sabe quem tá tocando aí?” Eu: “quem?” E ele: “Henrique Cazes [cavaquinista]” Aí foi que caiu a ficha! Quando foi no outro dia, o pessoal se reunia, sempre muito brincalhões, um deles: “e aí, pandeiro? Vai hoje?” Aí aquela música começou a entrar. Eu sempre fui um cara muito inseguro, às vezes eu sabia que tinha aquela coisa dentro de mim, mas não sabia se eu queria ser músico. E entra outra figura, do interior, um senhor que sempre me deu muita força, falava de meu pai, dizia “olha, você vai ser um grande músico”, me incentivava. Uma vez eu organizei lá a questão do 7 de setembro [as comemorações alusivas ao Dia da Independência do Brasil] e ele se empolgou muito com isso, eu sempre gostei de participar das bandinhas, tocando tarol. Certo dia a gente tocando lá, eu vi esse senhor assistindo, montado no cavalo. Quando eu olhei para ele, o vi com aquele sorriso, como quem diz “eu não disse?” E por incrível que pareça, quando eu cheguei em Brasília me veio essa figura. Aí bateu o medo, mas eu lembrei dele dizendo “você consegue, você é capaz”. Quando eu voltei eu sabia que era o caminho que eu queria. Comecei a acompanhar o Pixinguinha onde eles iam, nos bares, na praia. Aí eu procurei ver uma oportunidade de estar dando canjas, pedia pra Lazico, nas primeiras oportunidades que não dava para Lazico eu já estava lá tocando.

Teu interesse por choro começa com esse curso de verão em Brasília ou já existia antes alguma relação tua com essa música? Eu acho que começa lá, quando eu vi os mestres, a forma como os vi tocando, eu me encantei. Foi muito forte. Raimundo ainda me levou, a gente saiu, e numa dessas, tinha acabado um concerto, “vamos ali que o cara vai estar lá”, o Henrique Cazes. Ficamos nós três, eu gravei a conversa toda, até hoje eu tenho pena dessa fita, que eu perdi. Só eu, ele e Raimundo. Ele começou a falar de Pixinguinha, do choro, de várias pessoas, contou várias histórias.

O Cazes, então, teve um papel importante nessa tua aproximação com o choro. Isso, com certeza!

Além do Pixinguinha, da Big Band e do Metal e Cia., você participou de outros grupos musicais? Não. Depois eu comecei a fazer uns trabalhos com [a cantora] Rosa Reis e MPB, bares, acompanhando cantores, comecei a ser conhecido. Até hoje toco com [a cantora] Laura Lobato, principalmente confraternizações, casamentos. Chegamos a tocar uma temporada num shopping, outra no Zanzibar [bar na Av. Litorânea, extinto] na época.

Você também fez o caminho de entrar na Escola como aluno e depois se tornou professor. Como é que se deu essa transição? Como foi que você se tornou professor da Escola? Exato! Professor eu só vim ser de fato quando eu entrei como concursado, em 2000. Eu sempre estive por ali, participando com os grupos. O Mestre Tomaz me levou para o Convento das Mercês, estavam iniciando um trabalho com os meninos, tinha uns meninos de percussão, ele era o maestro da banda, e eu fui, estava precisando. Foi o meu primeiro trabalho como professor, carteira assinada. Quando eu vinha do Convento das Mercês pra Escola de Música na Rua de Santo Antonio, eu passava aqui atrás [nos fundos da EMEM, na Rua do Giz], era a época em que estavam reformando este prédio. E eu dizia para mim mesmo que quando a escola viesse pra cá, eu tinha que ser professor aqui, meio que profetizava que ia ser professor. Era meu caminho todos os dias. Meus colegas também haviam se tornado professores, Fernando, Java, eles me incentivavam muito. Depois teve outra oportunidade, eu fui para Curitiba. Lá eu conheci o Bolão [Oscar Bolão, baterista e percussionista], já foi totalmente divisor de águas. Também tive a oportunidade de conhecer o Luiz Otávio Braga [violonista], um cara muito bacana mesmo! Dei sorte de chegar nos lugares e não ter pandeiro, “ah, você é pandeirista, chega aqui”. Aí teve o concurso, quando eu vim de lá eu já vim pensando, comecei a me preparar. Eu tava numa fase, ou seria professor ou ia desistir de música, foi uma fase complicada. Todo mundo estava buscando uma, digamos, estabilidade.

Você participou de um capítulo muito importante da música do Maranhão, que foi a gravação do disco do Instrumental Pixinguinha [Choros Maranhenses, 2005], o primeiro disco exclusivamente de choro gravado por aqui. O que isso significou para você? Pra mim, na época, foi oportunidade. De estar registrando um trabalho, era o primeiro cd maranhense de choro, de compositores maranhenses. Na época eu não sei se eu tinha noção do que eu estava fazendo, da importância. Hoje eu vejo isso. Foi um momento muito importante pra gente.

Quase 10 anos depois do lançamento do disco de vocês, os membros do Pixinguinha têm conversado, pensado sobre o lançamento do segundo cd? Tem-se pensado, Juca [do Cavaco, Chorografia do Maranhão, O Imparcial, 13 de abril de 2014] tem falado. Teve uma fase que eu tava meio, “rapaz, tu está no Pixinguinha, não tá, como é?”. Cada um estava para um lado, independente, fazendo trabalhos. Sempre que tem um projeto é preciso reunir, o disco está ainda mais como um projeto, pelo menos para mim.

Você relatou que o choro veio depois do curso de verão em Brasília. Hoje você se considera um chorão? Pergunta difícil! [risos]. Primeiro eu teria que saber o que é um chorão, o que é ser chorão. Por que hoje na verdade eu faço de tudo, eu toco de tudo. Pra ser chorão, seria um cara que está participando de todos os movimentos, tudo o que é movimento estar lá, participando ativamente. Eu sou um músico que adquiri habilidades de tocar em qualquer estilo. Eu toco em big band, orquestra de jazz, MPB. Mas tenho um respeito muito grande pelo choro, foi onde encontrei maior oportunidade de trabalho. Como músico, foi o choro que me deu isso. Eu sempre tive medo do rótulo. Tipo: se o cara é roqueiro, ele pode tocar samba, mas ninguém vai chamá-lo para tocar, por que acha que ele só sabe tocar aquilo.

Qual a importância do choro? É uma música nossa, talvez onde a gente possa ter tudo o que a gente precisa para se desenvolver como músico. Em todas as áreas. Para desenvolver os ouvidos, você vai ouvir as mais lindas melodias, as mais lindas harmonias criadas, deixadas aí, permanecendo por mais de século, música com qualidade. O choro é uma escola. Todo músico, dentro do Brasil, que quer ser músico, tem que passar pelo choro. É uma fonte, uma fonte que hoje está vindo gente de todo lugar do mundo querendo beber dessa fonte.

Se ela é tudo isso, por que ter medo de se assumir como chorão? Exatamente por isso! [risos]

O choro praticado no Rio tem como base rítmica o samba. A ida dos nordestinos para o Rio de Janeiro levou outros ritmos que foram incorporados nas rodas de choro, como o baião, o calango, o frevo. Você acha que os ritmos do Maranhão, tão ricos e tão plurais, podem ser incorporados nas rodas de choro? Com certeza! Se você observar no disco do Instrumental Pixinguinha, tem uma levada naquela música [Candiru, faixa que abre o disco] do Zezé Alves [parceria com Omar Cutrim] que tem uma levada de lelê [imita com a boca a batida do pandeiro].

Mas isso ainda é muito tímido por aqui. É. O choro é uma música muito aberta, cabe tudo o que você colocar. Você pode botar o maracatu, o samba, o baião, ele pega de tudo. O choro na verdade é uma forma de tocar. Falta se assumir, “esse é meu ritmo” e colocar lá.

7 respostas para “Chorografia do Maranhão: Nonatinho”

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