Biografia de Zózimo Barrozo do Amaral está à altura de sua elegância, importância e bom humor

[O Imparcial, hoje]

Em mais de 600 páginas, Joaquim Ferreira dos Santos faz profundo e bem-humorado mergulho na vida do colega com quem trabalhou

 

O jornalista Zózimo Barrozo do Amaral em foto de Joëlle Rouchou
O jornalista Zózimo Barrozo do Amaral em foto de Joëlle Rouchou

Joaquim Ferreira dos Santos já contava quase década e meia de profissão quando foi contratado para ser repórter da coluna de Zózimo Barrozo do Amaral, quando este editou o mítico Caderno B do Jornal do Brasil, em 1983.

Enquanto houver champanhe, há esperança. Capa. Reprodução
Enquanto houver champanhe, há esperança. Capa. Reprodução

É minucioso e superengraçado o volume que dedica a retratar a vida do colega: Enquanto houver champanhe, há esperança: uma biografia de Zózimo Barrozo do Amaral [Intrínseca, 2016, 637 p.; R$ 69,90]. A frase-título encimava o “painel do ego”, diante do qual trabalhava o personagem, com fotos de celebridades colunáveis, às vezes com o colunista ao lado, os inseparáveis cigarro e copo de bebida nas mãos.

O livro começa pelo episódio em que o bem-nascido Zózimo esbanja grã-finagem e bom humor ao ser preso pelo regime militar e seguir por uma bem-sucedida sequência de episódios quase sempre hilariantes, a mais perfeita tradução do “ganha-se pouco mas é divertido”, embora este não fosse bem o caso do colunista social – como os leitores perceberão quando converterem, para valores atuais, seu salário quando da transferência para O Globo, já na década de 1990.

Aliás, chamá-lo simplesmente de colunista social talvez o diminua. O episódio da prisão, que abre o livro, demonstra inequivocamente, que Zózimo não se ocupava apenas de jantares elegantes da sociedade, regras de etiquetas e o ti-ti-ti do “quem come quem” (para usar uma expressão do autor) típico desta função supostamente mais fácil e glamourosa do jornalismo.

Jornalismo, com J maiúsculo, era o que praticava Zózimo Barrozo do Amaral, às vezes com pitadas de literatura – não raro só os implicados em suas notas cifradas entendiam d/o que ele estava falando. E nisso residia a graça: o leitor comum, o jornal ao lado de seu café com leite, pão e manteiga, adorava imaginar-se íntimo daqueles ambientes que por vezes sequer frequentava. Tudo temperado a muito bom humor.

O personagem de Joaquim Ferreira dos Santos frequentou as páginas do noticiário, sendo um dos jornalistas mais influentes do país, por mais de três décadas, até a morte, em 1997 – este talvez o único episódio triste de toda a narrativa, ainda assim contado de forma bem-humorada. Zózimo tinha consciência da importância de seu ofício e ia pessoalmente à cata de notícias, isto é, o expediente esticava diariamente por jantares, boates e restaurantes. De algum modo, morreu em consequência de seu ofício, e isto também o torna grande.

O que faz o autor, valendo-se de seu talento e da elegância de seu próprio texto, um dos melhores do jornalismo brasileiro, hoje, e servindo Zózimo como exemplo, é dar verdadeiras lições de jornalismo, história, cultura, política e sociedade brasileiros, passando por todos estes cenários, ao longo do período.

Num tempo em que se apregoa a morte – ou no mínimo um respirar por aparelhos – do jornalismo e as colunas sociais contentam-se com o copiar e colar de releases enviados por assessorias, Enquanto houver champanhe, há esperança é um livro necessário, não apenas para quem é do ramo.

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