A voz das avós 

A tirinha da Laerte (publicada na Folha de S.Paulo do último dia 3), que me levou a terminar de escrever este texto, começado há algum tempo...
A tirinha da Laerte (publicada na Folha de S.Paulo do último dia 3), que me levou a terminar de escrever este texto, começado há algum tempo…

O dj Victor Hugo, querido amigo, foi adotado pela avó de uma amiga: ele ia para a casa dela, levava uma vitrolinha e uns discos de vinil, que punha para tocar, ganhando da simpática velhinha umas cervejinhas, que brindava com a neta.

Até hoje eles mantêm a tradição de, anualmente, se encontrarem, sempre na data do aniversário da avó dela, com os vinis e a vitrolinha, além das cervejas, é claro, agora pagas por eles mesmos, para celebrar sua memória. Achei a história comovente.

Minha avó fumou a vida inteira e parou uns meses antes de falecer, vitimada por um câncer de pulmão, aos 80 anos, há quase cinco — já sofria também de Alzheimer. Era uma figura. Lembro de alguns de seus ditos, que já pensei em compilar. Tomo café sem açúcar há bastante tempo. Ela gostava com. “De amargura já basta as que eu passo na vida”, dizia, fazendo graça.

Maria Lindoso, seu nome, não tinha papas na língua: dizia o que tinha de dizer na cara, sem meias palavras, doesse a quem doesse. Para o bem e para o mal. Meu avô Antonio Viana, com quem foi casada por quase 50 anos, até seu falecimento, 13 anos antes, costumava adverti-la: “Maria, tu ainda vai levar uma bolacha”, referindo-se ao seu jeito despachado de ser. A gente se divertia com as tiradas e ri ao lembrar.

Depois que me separei da mãe de meu filho, ela manifestou seu descontentamento. Apresentei-lhe companheiras, posteriormente, sempre recebidas com o muxoxo: “ainda não é esta”.

Diana, cuja nossa história de amor e reencontro minha meia dúzia de leitores já conhece, tem, entre suas tatuagens, três frases de expoentes das letras brasileiras: Ferreira Gullar (1930-2016), Guimarães Rosa (1908-1967) e Clarice Lispector (1920-1977).

São elas, respectivamente: “Voai comigo sobre continentes e mares” (do “Poema sujo”), “O que a vida quer da gente é coragem” (do Grande sertão: veredas”) e “Liberdade é pouco. O que eu desejo ainda não tem nome” (de “Perto do coração selvagem”).

Suas escolhas para marcar na pele dizem muito do ser que é, com quem aprendo todos os dias, que tenho finalmente a alegria de dividir. Pode soar piegas dizer, mas esperei por isso a vida inteira, mesmo quando eu não sabia.

Conversando sobre avós, ela me contou da sua também saudosa dona Mary Benedita, mãe de sua mãe, caxiense da Cabeceira dos Cavalos, que radicou-se em Pedreiras após casar, e não se conformava de ver a neta com os joelhos ou cotovelos ralados por se juntar aos meninos em brincadeiras menos delicadas, típicas de uma época em que as telas não eram realidade.

“Desse jeito nenhum homem vai querer casar contigo”, advertia a vovó, primeira porta de entrada ao feminismo que Diana estuda, pratica e, por que não dizer, (me) ensina.

Nossas mães, também já avós, se conheceram e se deram super bem. Nossas avós não tiveram a oportunidade, nem mesmo nós, de conhecer as avós um do outro.

Gosto de pensar que elas tenham se encontrado onde quer que estejam e nos vendo de cima, tenham tido o seguinte diálogo:

“Finalmente Diana encontrou alguém que quisesse casar”.

“É, finalmente é essa”.

Selfie na plateia do show de Mônica Salmaso no último dia 6 de setembro, no Teatro Arthur Azevedo
Selfie na plateia do show de Mônica Salmaso no último dia 6 de setembro, no Teatro Arthur Azevedo

Gerô é o homenageado de hoje da Rádio das Tulhas

Moizes Nobre e Gerô. Reprodução
Moizes Nobre e Gerô. Reprodução

Ontem (22) completaram-se 17 anos do assassinato de Jeremias Pereira da Silva, o Gerô (1961-2007). Artista popular, cantor, compositor, escritor, cordelista e repentista, ele foi “confundido” – era negro – com um assaltante e torturado até a morte por policiais militares.

O episódio causou indignação na classe artística e na sociedade geral, à época. A então deputada estadual Helena Heluy (PT) propôs e conseguiu aprovar a lei nº. 8.641/2007, que estabelece a data de 22 de março como Dia Estadual de Combate à Tortura.

No carnaval de 2008, o Bloco Tradicional Pau Brasil, do Anjo da Guarda, homenageou Gerô, com o samba “Salve Gerô!“, de Gigi Moreira (1957-2020), Jeovah França, Josias Sobrinho e deste cronista. Em 2009, a Secretaria de Estado da Cultura do Maranhão (Secma), através de seu plano fonográfico, lançou o cd póstumo “A Peleja de Gerô”, reunindo gravações do artista. O álbum permite perceber sua versatilidade, verve afiada e bom humor.

Gerô será homenageado hoje (23) na Rádio das Tulhas, a tertúlia semanal capitaneada pelos djs Ayawo Noleto e Victor Hugo, na Feira da Praia Grande, palco de emboladas de Gerô. Com entrada franca, o evento começa ao meio-dia e vai até às 18h. A edição de hoje contará com as presenças de colegas de ofício do homenageado: Paulinho Nó Cego, Pedro Nobre e Moizes Nobre – ao pandeiro, acompanhando o artista, na imagem que abre/ilustra este texto.

Pontos de Luz marca retorno de Lena Machado aos palcos

[release que escrevi para o show da próxima sexta, 10]

Há quase um ano e meio sem apresentar um show solo, cantora mostrará, no Barulhinho Bom, repertório com algumas experimentações

Com dois discos na bagagem, Lena Machado está há quase ano e meio sem se apresentar em shows solo. Alguns fatores contribuíram para esse exílio temporário: o trabalho além da música, a conclusão do bacharelado em Comunicação, grau obtido ano passado, e as dificuldades de captação de recursos para realizar um show com a qualidade e o capricho que o público merece.

A cantora não reclama da ausência nem dá tom resignado à própria fala. “É uma ausência aparente, por que embora eu não tenha feito shows solo, apareci, aqui e ali, em participações especiais, em apresentações de amigos, a exemplo do Regional Tira-Teima e da gravação ao vivo do primeiro disco de Joãozinho Ribeiro, momento de grande emoção e aprendizado”, conta.

Pontos de Luz foi o nome escolhido pela cantora para seu novo espetáculo. “É o título de um poema do [médico, músico e ator] Marcelo Bianchinni. Ele postou no face[book], falando das “pessoas raras que amamos, que são pontos de luz na madrugada louca em que vivemos””, revela a cantora, conectada aos tempos modernos.

Público e banda certamente serão pontos e luz a iluminar a cantora, ela ponto de luz que iluminará os presentes com seu talento e graça. No show Lena Machado será acompanhada por João Simas (violão e guitarra), Rui Mário (acordeom e teclado), Robertinho Chinês (bandolim e cavaquinho) e Fofo (bateria). No repertório, obras de nomes como Adriana Calcanhotto, Batatinha, Bororó, Cartola, Cesar Teixeira, Chico Saldanha, Flávia Wenceslau, Odibar, Paulo César Pinheiro, Paulo Diniz, Pedro Luís, Roque Ferreira, Suely Mesquita e Vanessa da Mata.

Poucos nomes se repetem ao longo dos 14 números pensados para o show. Uma coisa que Lena Machado não deixou durante a ausência nem nunca deixa de fazer é ouvir música. “A linha do repertório que adotei pro show é toda uma experimentação; as músicas estão entre o que tenho escutado neste período, coisas que gosto e que estava buscando a oportunidade de fazer, mas ao mesmo tempo não são canções que ficam longe daquilo que tenho feito. É música popular brasileira na sua diversidade, canções que nem sempre são executadas, por isso podem até soar como inéditas para alguns. Tem um pouquinho de tudo nessa história, mas é um show com uma pegada mais intimista, de quem tá retomando a produção musical e tá continuando um caminho. Como um alongamento depois de uma noite de sono”.

Em Pontos de Luz Lena Machado contará com as participações especiais de Chico Saldanha, Dicy Rocha e Tássia Campos. Antes e depois do show haverá discotecagem com Victor Hugo, do blogue Música Maranhense. O show acontece dia 10 de maio (sexta-feira), às 21h, no Barulhinho Bom (Lagoa). Os ingressos custam R$ 15,00. A produção é assinada por Tairo Lisboa.

Tião Carvalho faz show no Papoético

Depois do sucesso de Chico Saldanha e Josias Sobrinho, que se apresentaram quando o Papoético ainda tinha como palco o Chico Discos, o projeto idealizado pelo poeta e jornalista Paulo Melo Sousa leva ao palco do Restaurante Cantinho da Estrela (Rua do Giz, 175, Praia Grande), o compositor Tião Carvalho.

É uma segunda empreitada mais arrojada de produção de um acontecimento semanal que já soma mais de 70 encontros, desde sua primeira edição, em novembro de 2010. Maranhense de Cururupu, o cidadão paulistano – vive em SP há mais de 25 anos – Tião Carvalho mostrará em Tiãozinho e sua gente, título do espetáculo, músicas autorais e sucessos de nomes do Maranhão, a exemplo de João do Vale, cujo repertório gravou em seu mais recente disco, Tião canta João, inteiramente dedicado à obra do mestre pedreirense.

O show acontece dia 5 de julho (quinta-feira), às 21h. Os ingressos custam apenas R$ 15,00. O evento tem apoio cultural da Livraria Poeme-se e da Banca de Revistas da Praia Grande. Na ocasião Tião Carvalho (voz) será acompanhado de Ana Flor (voz), Noel Carvalho (percussão), Ariel Coelho (percussão), Netinho (violão e guitarra), Tiago Lindoso (bateria) e Renata Amaral (contrabaixo, do grupo A Barca).

A abertura fica por conta da discotecagem de Victor Hugo, tocando música maranhense direto do vinil, num primoroso trabalho de pesquisa.